Ser um analfabeto funcional digital pode ser um problema para o operador do direito?

15/07/2015

Por Alexandre Morais da Rosa e Danielle Mariel Heil - 15/07/2015

Em tempos de processo digital, novas tecnologias, o exercício da prática forense não pode desprezar os avanços, sob pena de passar vergonha e causar impacto negativo. Daí que toda uma geração incapaz de se atualizar sofre com as novas atividades, não sabe, muitas vezes, sequer manusear os e-mails, quanto mais lidar com processos digitais, documentos em formatos específicos e processos na “nuvem”. Enfim, por mais que não seja um requisito obrigatório, diante das novas tecnologias forenses, o “analfabeto funcional digital” sofre. E muito. Xingar o computador ou o sistema não resolve, embora não sejam poucos os impropérios lançados contra a máquina. Tanto assim que profissionais da “velha guarda” contratam jovens apenas para fazer o “peticionamento”, acompanhar as intimações, dado que os processos físicos desapareceram.

Superada a necessidade de propiciar a alternativa da petição protocolada de maneira física, muitos profissionais simplesmente abandonaram a profissão, dado que não conseguem acompanhar a nova dinâmica. O acesso à Justiça digital exige novas competências, daí a importância dos cursos de atualização e compreensão da nova realidade virtual. Não só advogados, ainda que sua performance dependa muito desta atualização, mas todos os agentes jurídicos precisam estar incluídos.

O sujeito avesso à tecnologia, então, arrisca-se a ser responsabilizado eticamente pelo “analfabetismo funcional digital”, dada sua exclusão digital, questão que merece ser trabalhada no contexto da inclusão digital judicial. Por sua desídia digital, muitas vezes, pode ser apontando como negligente, especialmente quando se desvelam novos horizontes de pesquisa (google, facebook, twitter, etc.). Basta um equívoco na intimação e o prazo se vai, por exemplo.

Isto porque a incompetência tecnológica deixou de ser apenas uma desvantagem competitiva para se transformar em dever de cuidado, próprio da atividade jurídica. Cada vez mais há acesso ao material online, revistas, artigos, informações, sistemas de push, enfim, toda uma gama de atividades que o profissional sem email fica alijado. Somos, todos, arrostados pela tecnologia.

Se o processo é uma luta por informação qualificada, além dos antigos detetives, auxiliares de investigação, o espaço da internet precisa ser vasculhado por esconder informações preciosas que são relegadas por quem não consegue fazer uma pesquisa qualificada. Não basta dar uma “googada”, pois os mecanismos de busca e indexição precisam ser conhecidos com certo saber técnico. Daí a importância de que a inclusão digital possa ser ampliada e fomentada.

Apenas para noticiar, no caso da abordagem em Griffin v. Maryland, 192 Md. App. 518 (2010), o Tribunal americano considerou uma "questão de competência profissional" que os advogados devem investigar sites de redes sociais como parte de suas diligências. (o tribunal de recurso não verificou qualquer problema com a ideia de que os advogados têm a obrigação de rever as evidências de mídia social como parte de sua diligência.) (aqui)

Usar a palavra correta, o termo adequado, assim, pode causar impacto positivo nos julgamentos, sendo que a desinformação e alienação digital traz consigo a desatualização, além de impedir o acesso ao novo horizonte do universo online. A manutenção da aversão tecnológica, portanto, pode gerar riscos graves na apresentação das teses jurídicas e levar à responsabilização civil, por exemplo, pela perda de um prazo e de uma chance (aqui). A disponibilidade da informação online é elemento necessário na elaboração das táticas e estratégias das partes, ainda mais quando o processo é uma luta por informação qualificada (aqui).

Da mesma forma, o armazenamento, a criptografia, mecanismos de segurança, quer de arquivos de computador, quer da “nuvem”, precisam levar em conta as possíveis invasões e roubos, dado o caráter confidencial das informações das partes e a responsabilidade ética daí advinda. Controles internos, limitações de download, etc., entram na nova dinâmica da segurança da informação, até porque o recente vazamento de 400GB em dados da empresa de segurança Hacking Team, com dados, senhas, emails, contratos sigilosos, bem demonstrou que mesmo empresas de segurança sofrem ataques (aqui). Por fim, ainda, em alguns casos os advogados estão sendo substituídos por sistemas inteligentes, como é o caso da empresa Omini Financeira, que automatizou seu departamento jurídico (aqui).

Os temas são muitos e não podemos mais deixar de pontuar é: um profissional do direito alheio à tecnologia tendencialmente terá uma performance pior do que o incluído digitalmente. Novos horizontes (digitais) se tornaram realidade e, parece que não podemos mais ficar de fora. Se você leu este artigo, por certo, não está tão por fora digitalmente.


Referências  [i] MORAIS DA ROSA, Alexandre. A Teoria dos Jogos aplicada ao Processo Penal. Lisboa/Florianópolis: Rei dos Livros/Empório do Direito, 2015.


 Livros Publicados pelos autores na Editora Empório do Direito: Compre os livros dos autores aqui. a-teoria-dos-jogos-aplicada10994062_1549001075350774_8142308690169324819_no-processo-eficiente-na-logica135 processo-penal-no-limite                                      


Alexandre Morais da Rosa é Professor de Direito Penal e Processo Penal da UFSC e do Curso de Direito da UNIVALI-SC (mestrado e doutorado). Doutor em Direito (UFPR). Membro do Núcleo de Direito e Psicanálise da UFPR. Juiz de Direito (TJSC).

Email: alexandremoraisdarosa@gmail.com  Facebook aqui                                                                                                                                                    


Danielle Heil (1)Danielle Mariel Heil é advogada, atualmente Procuradora Adjunta do Município de Brusque-SC, especialista em Direito Constitucional pela Fundação Educacional Damásio de Jesus e em Direito Penal e Processual Penal pela Escola do Ministério Público de Santa Catarina.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                   


Imagem Ilustrativa do Post: Inside The Old Courthouse, Beaumaris, Anglesey - Wales. // Foto de: Jim Linwood // Sem alterações

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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


   

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