Coluna ABDPRO
Considerações iniciais
“Não há mais liberdade, a liberdade só pertence a homens livres. E quem se preocupou em formar homens livres?”
Este é um texto de guerra sob todos os aspectos.
Política, Poder e Direito. É evidente o significado imediato da conhecida frase de Clausewitz, que afirma que a guerra é a continuação da política por outros meios. Menos evidente, todavia, é que a recíproca é tão verdadeira quanto assustadora: assassinatos, ameaças, destruição de reputações e sabotagem, fazem com que a política, à evidência que em grau menos pulsante, seja a continuação da guerra por outros meios. Até aposta-se na força argumentativa das ficções necessárias de que “a política é a arte do possível”, ou o “espaço do debate”, sob pena de abrir-se fogo francamente e estabelecer-se a completa barbárie. Mas, na prática – vale dizer, na política real – é notório que há um considerável grau de barbárie. E isso obviamente não é um juízo de valor; é um fato. Parece, aliás, que incontestável.
Outro fato é que a política tomou conta do Direito, como já se sabe há anos e como bem demonstrou Hans Kelsen[1]. Ocorre que a classe política, os operadores do Direito e a própria sociedade civil parecem não compreender adequadamente o jogo de Poder que ocorre dentro do Direito, especialmente na atualidade brasileira, porque desconsideram a complexa natureza do Poder.
À vista disso, este ensaio adota uma metodologia descritiva: quer-se apenas identificar panoramicamente o jogo de Poder que ocorre no Direito brasileiro e esclarecer por que grande parte dos agentes (ativos e passivos) dessa trama parece não ter ideia do papel que exercem nessa constante disputa.
Para a abordagem do tema, o estudo se dará em três momentos sucessivos, a saber: (i) busca, com base nos estudos de Bertrand de Jouvenel, esclarecer a causa fundamental que facilitou a expansão do Poder ao ponto que se conhece hoje; (ii) explica os traços fundamentais que naturalmente fazem com que o Poder seja Poder – uma espécie de natureza do Poder, como caracterizou o autor francês – e, por fim; (iii) lança luzes sob o projeto expansionista de Poder que acontece contemporaneamente no Brasil, com o intuito de compreender o processo como “contrapoder” nessa complexa rede de disputas. O texto, em suma, é um grande compilado das ideias de Jouvenel aplicadas ao Direito brasileiro. Da primeira à última frase.
- O velho problema da confusão entre palavras e coisas – a expansão do poder no estado laico
Equívoco corriqueiro, que revoga os fatos e estabelece falácias em jargões, é que a monarquia foi altamente poderosa e arbitrária. Geralmente proferida por detratores antipáticos ao modelo, essa representação grosseira desconsidera “apenas” que as maiores hecatombes de que se ouviu falar ocorreram justamente sob a tutela de Estados laicos. Isso tem um porquê. E esse porquê é justamente o agudo e irrefreável crescimento do Poder – crescimento, aliás, que não encontra retração. É da sua própria natureza não dar um passo atrás. E quando o dá, repetindo o dito popular, é apenas para tomar impulso para saltos maiores.
Isso é evidente quando observado que disputa por Poder e guerras sempre andaram lado a lado. Talvez com alguma divergência absolutamente irrelevante para os objetivos desta reflexão, tal como algumas poucas exceções que fogem à regra, pode-se observar esse fato. Com efeito, numa das batalhas memoráveis do século XIV – Poitiers – aproximados 50.000 homens estavam em combate. Em 1515, observa-se um número aproximado na Batalha de Marignano. Avançando mais de um século, o número ganha um sútil acréscimo na principal batalha da guerra dos Trinta Anos, em Nördlingen: aproximados 65.000 homens. Daí por diante – e não por acaso – o número eclode. São 200.000 homens em Malplaquet (1709); 450.000 em Leipzig (1813) e mais de 50.000.000 na segunda guerra mundial (1939-1945)[2].
Como e por que o Poder expandiu tanto, ao ponto de virar tal máquina de extermínio? Como conseguiu convencer os indivíduos de que lhe deviam a sua própria vida?
Bertrand de Jouvenel traz, em obra profunda e detalhada, um rol de causas desse fenômeno, os quais, por uma questão de espaço, não serão reproduzidos integralmente. Quer-se apenas chamar para uma causa em específico, uma vez que é consideravelmente contrária àquilo que o senso comum profere e que as mentes, por mais bem-intencionadas que sejam, tendem a negligenciar.
A causa para a expansão do Poder – que se pretende analisar de forma mais pormenorizada – foi, justamente ao contrário do que se pensa, a laicização do Estado, bem representada na queda da monarquia.
Não é incomum o recurso a Luís XIV como justificativa para a associação entre teocracia e arbítrio. A célebre frase “L'État, c'est moi” causa impacto e parece reificar uma arbitrariedade irrefreável. Mais impressionante ainda é sua reivindicação, que poderia integrar qualquer manual de tirania, de que “aquele que deu reis ao mundo quis que eles fossem honrados como seus representantes, reservando-se a ele só julgar suas ações. Aquele que nasceu súdito deve obedecer sem murmurar: essa é sua vontade"[3].
Ocorre que tais frases, das quais as recém mencionadas são apenas pequenos exemplos, não tiveram o condão de refletir a realidade tal como parcela do imaginário atual a concebe. Disso decorre a necessidade de esclarecer a diferença entre palavras e coisas. Se o rei reivindicava que fosse tratado como um Deus, disso não se segue que o era. Isso porque na autoproclamação e reconhecimento dos príncipes como representantes imediatos de Deus não está consolidado um Poder; pelo contrário, está consolidado um fardo de “que a autoridade deles era apenas um mandato, e que deviam, portanto, usá-la segundo a intenção e a vontade do Senhor do qual a receberam”[4]. Dessa forma, seguiam-se limitações óbvias ao exercício do Poder, sobretudo pelo costume e pelo Direito divino.
Ilimitado, por outro lado, é o Estado laico que recebe o aval direto da “pureza” científica e da arrogância da razão humana, que acha que tudo pode controlar, cujo baluarte mais expressivo é a ficção da “soberania popular”. Ora, se na monarquia o Poder geralmente era ancorado (i) pelos obstáculos do Direito divino; (ii) pelos costumes de uma tradição forte no domínio social e, por fim; (iii) pela sua própria personificação na figura do monarca, diferente passa a ser o modelo opositor. Com a ruptura fornecida pelo abandono da monarquia, o Poder encontrou uma forma de expansão invertendo todos esses fundamentos: agora, o Poder passa a decorrer direto da soberania popular, sendo acompanhado pela praga do relativismo moral e por sua própria abstração.
Aqui, o raciocínio é simples: como o Poder decorre da vontade geral da soberania do povo – e não mais do Direito divino – o Poder não pode errar, porque é o próprio povo em exercício. As amarras rígidas do Direito divino também desmoronam, porque a vontade geral não é mais perene por natureza, mas maleável e pueril[5].
Que avanço impressionante do Poder! Com isso, passava a agir de forma ilimitada, e sempre legítima, sem esbarrar nos entraves do Direito natural. A razão humana, consolidada na “soberania do povo” e na “vontade geral”, foi capaz de impor, através de uma verdadeira cortina de fumaça, uma aceitação moribunda aos atos mais atrozes que o Poder pudesse cometer. Atuaram como agentes colaboradores dessa expansão questões mais periféricas que são corolários lógicos dessa inversão de fonte do Poder: a abstração não nos deixa mais saber quem é o verdadeiro Poder – agora não é mais o monarca X ou Y, agora são “eles”; o elevado relativismo moral faz com que decisões do Poder, por mais tacanhas que sejam, não encontrem um freio moral porque não existem mais verdades; a noção de “tecnocracia” e a consolidação do ideal “cientificista”, do qual decorre uma elevação da ciência ao patamar do sacral.
Assim, na prática, houve uma troca no fundamento do Poder. Antes, o Direito divino, que exercia com excelência o freio ao Poder; agora, a fonte do Poder é a razão humana. Ou seja, os atos de Poder passam a ser ilimitados porque o seu agente é o seu próprio fiscal. Fica difícil de frear seus avanços quando age respaldado pela soberania popular. Mais ainda quando o Poder age cumprindo diretrizes científicas.
Isso explica por que o nazismo foi um sucesso sob a perspectiva do Poder. Nada pôde lhe deter, pois teve como seus aliados principais não a Itália e o Japão, mas a soberania popular e a ciência – que não se esqueça o “Ein Volk, Ein Reich, Ein Führer” e que o antissemitismo encontrou nos mais respeitados cientistas seus maiores defensores.
Daí que também é compreensível o porquê de a monarquia jamais ter conseguido – como os Estados contemporâneos conseguem com facilidade – impor aos homens a obrigação militar[6]. Tal prodigioso passo não seria possível sem o auxílio da ideia de uma soberania popular, fundamento germinal do Estado laico. Se um rei quisesse solados, teria de pagar. Aliás, o Poder era tão incipiente na monarquia que suas próprias contribuições “tributárias”, durante um longo período, não foram sequer permanentes. Como bem observa Jouvenel, somente ao final da Guerra dos Cem Anos “que o hábito do sacrifício permitirá estabelecer um imposto permanente – a talha – que sustenta um exército permanente - as companhias de ordenança”[7]. São, contudo, exércitos remunerados; não decorrentes de uma obrigação civil.
Disso tudo que decorre o contributo essencial da democracia para a expansão irrefreável do Poder. Os Estados democráticos, ao contrário do que se imagina, são verdadeiros estopins para que Poder ecloda, dado o seu forte elemento de laicidade.
Basta observar.
Afirma Jouvenel que a troca da monarquia pela democracia foi acompanhada por um desenvolvimento pujante dos instrumentos coercitivos, uma vez que “nenhum rei dispôs de uma polícia comparável à das democracias modernas”[8]. De fato, ao observar-se a estrutura do Poder moderno, é risível comparar o seu alcance com aquele que detinham os monarcas. Muito com a ajuda da tecnologia – é verdade –, hoje o Poder conta com instrumentos de controle específico. Agências, polícias especializadas, exército e ferramentas das mais variadas espécies de controle e observação dos aspectos mais íntimos do indivíduo. O Poder se agigantou de uma forma que um Monarca jamais poderia sonhar. Assim, é diagnóstico cirúrgico afirmar que “o que chamam o advento da democracia é propriamente a transferência do Poder constituído a novos detentores ou, se preferirem, a conquista da Cidade do Comando por novos ocupantes”[9].
Ora, havendo novos ocupantes no comando, supostamente racionais e representando a vontade geral, há uma óbvia facilitação para que o Poder enfraqueça as garantias individuais e, logicamente, encontre sua expansão, uma vez que no sopesamento entre o indivíduo e o interesse geral, deve-se fazer valer a força do coletivo. Então, é mais uma vez preciso Jouvenel, quando afirma que a “ficção democrática atribui aos regentes a autoridade do Todo”[10] e que a democracia “centralizadora, regulamentadora e absolutista, mostra-se, portanto, como o período de incubação da tirania”[11]. Traduzindo em termos mais claros: a democracia jamais esteve no front adverso da tirania, mas foi sua fiel escudeira quando exercida sem o devido controle.
Quem insiste em acreditar no fato de que o Poder se encontrava ilimitado na monarquia – e encontrou seu verdadeiro freio racional nos Estados laicos –, não faz outra coisa além de resvalar na modalidade mais imperdoável de inépcia, que confunde palavras e coisas, porque acredita na força das palavras de Luís XIV e Napoleão em detrimento da realidade em si mesma. Palavras, frases ou até mesmo livros não têm o condão de revogar os fatos, exceto na visão míope daqueles que agem academicamente como torcedores. Isso já não causa espanto, uma vez que na academia brasileira, especialmente no Direito, o “wishful thinking” é a metodologia oficial.
Pode-se concluir, assim, como nem sempre existe uma correlação entre palavras e coisas – retomando o velho problema da disputa de “narrativas”. Ao deparar-se com as palavras de Luís XIV, imagina-se uma atuação vil e tirânica; ao ler-se a frase de Napoleão, que afirmou que “o governo atual é o representante do povo soberano”, imagina-se um governo dócil com seus comandados, que lançará, com todas suas forças, as mais implacáveis diatribes contra todo ato arbitrário que violentar o seu próprio povo. Ledo engano.
Ao fim e ao cabo, é possível explicar esse avanço do Poder explorando outras tantas causas e observando uma gama de tantos outros eventos. O objetivo aqui, é desnecessário dizer, não é exaurir o tema, mas, por outro lado, estabelecer uma primeira premissa descritiva que parece ser irrefutável, advinda da obra de Jouvenel: o Poder não teve outro movimento que não fosse a sua própria expansão na história da humanidade, encontrando, justamente no Estado laico, um dos seus grandes aliados para tanto.
Da dualidade que rege o Poder
Se é verdadeira a primeira premissa descritiva estabelecida, é necessário agora se concentrar na funcionalidade da natureza do Poder. O que faz com que o Poder seja Poder? Quais suas características mais fundamentais e inafastáveis? Obviamente, assim como no tópico pretérito, essa investigação será exercida de maneira pontual, sem adentrar nos aspectos mais específicos. Aos interessados no estudo com maior fôlego, faz-se a menção direta da investigação aprofundada de Bertrand de Jouvenel.
O Poder conseguiu o anonimato, uma de suas armas mais poderosas. Criou expressões e narrativas ficcionais, que maquiam a sua verdadeira face e seus interesses reais, por mais abjetos que sejam. Afinal, é difícil mesmo saber quem são “eles”.
Nessa diretriz, uma das grandes vitórias do Poder no campo das narrativas, alcançado com o auxílio da democracia, foi o subterfúgio que leva o nome de “Nação”. A ideia cínica de que o Poder não mais trabalha para atender os interesses particulares de um seleto grupo é, como diz Jouvenel, “uma ideia muito bonita, mas infelizmente ela não explica um fenômeno muito amiúde observável: a posse do aparelho de Estado por uma vontade particular que dele se serve para dominar a Sociedade e explorá-la com fins egoístas”[12].
E isso é um fato. Vê-se, na prática, que os agentes do Poder acabam por formar uma espécie de “metasociedade” – uma sociedade instituída pela sociedade geral, com o fito de tomar decisões que atendam exclusivamente os seus interesses particulares, dentre os quais um dos primeiros é a automanutenção no Poder. Evidentemente que os ditos interesses socias são preteridos, ainda que escancaradamente visíveis, caso sejam contrários aos seus próprios interesses. Exemplo clássico (e brasileiro) disso é o famoso referendo de 2005 que tratou da questão do armamento do país, no qual 2/3 da população, na prática, teve que ceder aos interesses e vontades particulares daqueles que ocupavam o Poder no momento[13].
Disso decorre uma característica essencial do Poder: ele é, por natureza, egoísta. Indiferente que seja mais à esquerda ou mais à direita. Aquele que o ocupa, que o toma, não está interessado somente em promover o interesse da Nação. Está interessado em promover aquilo que lhe parece mais adequado sendo essa a razão pela qual “os habitantes do Poder o defendem da mesma forma que os opiomaníacos defendem seu vício” [14]. Novamente, trata-se de um fato e não de um juízo de valor.
Assim, fica clara a dupla movimentação do Poder – uma atenção aos anseios sociais; uma atenção aos desejos da “metasociedade” que ocupa a Cidade do Comando. É evidente que isso não é um mal em si mesmo, assim como a chuva não pode ser considerada um mal em si por ser molhada. Apenas o é. Se não tivesse a característica do egoísmo, já não seria mais exercício de Poder. E quando o Poder não é exercido com egoísmo, já não temos mais o exercício de Poder real, mas apenas um simulacro, prestes a ser tomado por algum grupo que esteja disposto a exercê-lo. Exemplo evidente disso foi dado por Luís XVI, na França, que era conhecido por ser uma figura extremamente dócil à nobreza da época.
Alguém poderia contestar a alegação do egoísmo do Poder – princípio egoísta, denomina Jouvenel[15] – com a observação de inúmeros exemplos em que o Poder foi exercido em proveito da sociedade. Isso, contudo, não seria uma verdadeira objeção por dois motivos: primeiro, porque não se está defendendo que o Poder seja exclusivamente egoísta, mas que possui uma dualidade natural que fatalmente contará com elementos egoístas; segundo, que do fato de que determinado agente do Poder toma uma decisão que seja vantajosa para a sociedade – e por vezes tomado verdadeiramente pelas melhores intenções – não se segue que não se pautou em seu próprio ego.
Explica-se. Ora, qual a diferença existente entre o Rei que concedia festas àqueles cujo apoio lhe era imprescindível para continuidade de sua autoridade e a edição de medidas políticas atuais, que visam a atender setores específicos da sociedade para cooptar seus votos? O raciocínio é exatamente o mesmo: o atendimento ocorre em nível social para que o próprio detentor do Poder consiga prosperar em sua influência, lá permanecendo. É exatamente nesse sentido, aliás, que ocorrem as atuais disputas políticas: por trás de todo grupo social, estão alguns indivíduos se vendendo como os mais justos e preparados reivindicadores da defesa dos seus interesses específicos. Novamente, pode-se conceder que parcela dos postulantes ao Poder são bem-aventurados e que tomem boas medidas para a sociedade. Mas o seu caráter egoísta também é inegável, pois ninguém se mantém no Poder sem – antes de qualquer outra coisa – fazer a autopromoção como o mais preparado para falar e lutar em nome alheio. A dualidade e o egoísmo são fatos. Conditio sine qua non do Poder, aliás.
É exatamente nesse sentido que vai a lição de Jouvenel, ao identificar essa dualidade do Poder. Diz o escritor francês que “o condutor [do Poder] se convence facilmente de que quer apenas servir o conjunto, e esquece que sua verdadeira motivação é o prazer da ação e da dilatação. Não duvido que Napoleão fosse sincero no momento em que dizia em Caulaincourt: ‘as pessoas se enganam, não sou ambicioso ... Comovo-me com os sofrimentos dos povos, quero vê-los felizes, e os franceses o serão se eu viver dez anos’"[16].
Ocorre que é exatamente desse egoísmo que surge o inimigo.
O egoísmo pressupõe, por definição, a existência do outro. E o outro necessariamente precisa ser ruim, especialmente na disputa pelo Poder. Não existe egoísmo sem o outro, porque não posso me autoproclamar como melhor – e não posso defender a minha ascensão ou manutenção no Poder – se não existir um adversário ou um inimigo (palavra que melhor descreve o que ocorre na disputa pelo Poder). Trata-se do batido “nós vs. eles”, que é típico da linguagem da disputa do Poder. Divide-se para conquistar.
Dessas características da disputa do Poder envolvendo a questão do egoísmo e do inimigo, chama-se a atenção para linhas de conflito que aderem pretensões revolucionárias – aquelas que visam a solapar algum tirano, propondo alguma espécie de ruptura institucional. Nessa linha, a disputa e consolidação do Poder se dá em três momentos sucessivos: (i) criam-se denúncias esquizofrênicas, no mundo das ideias, contra um tirano que jamais o foi e estabelecem-se fortes crença de combate contra suas respectivas arbitrariedades; (ii) chega-se na incapacidade de encontrar o tirano no mundo prático e; (iii) consolida-se, assim, um tirano de verdade ao seu final. Isso fica muito claro quando a “Revolução na França liberta os camponeses das corveias feudais mas ela os obriga a usar o fuzil e persegue os refratários; ela suprime as ordens de prisão sem julgamento, editadas pelo rei, mas eleva a guilhotina nas praças públicas” [17]. Ou, ainda, quando Hitler “liberta” o povo alemão do judaísmo.
Interrompe-se a abordagem sobre aspectos que naturalmente caracterizam o Poder porque as principais questões que careciam de estabelecimento estão delimitadas. Há muito mais sobre a natureza do Poder e suas características inevitáveis. Contudo, para analisar o quadro de disputa de Poder no Brasil, a explicação acerca do seu caráter expansionista, tal como sua necessidade de estabelecimento de um inimigo a ser combatido, e de sua natureza egoísta, são suficientes para se entender um pouco mais o quadro atual.
Vale reiterar, novamente, que são todas premissas factuais que ocorreram ao longo da história. São condições essenciais para a existência do Poder. Quando existem pretensões expansionistas, lutas contra tiranos que não o são e o egoísmo, inevitavelmente se estará falando de disputas de Poder. Por isso que a obra de Bertrand de Jouvenel poderia ter sido lançada no séc. V, na Revolução Francesa ou dentro de cem anos. Sempre será atual.
Dessa forma, o que o leitor acaba de observar sobre o Poder não pretende idealizá-lo. É apenas a tentativa de uma demonstração mais clara de sua verdadeira face.
Em vão se terá provado mil vezes a nocividade do poder arbitrário
Até aqui foram analisadas as principais características do Poder sob uma perspectiva macro, para que seja possível a melhor compreensão das disputas e tensões que ocorrem nesse jogo. Observar-se-á, agora, tais questões ocorrendo dentro do espectro jurídico brasileiro e o papel do Processo, lido como instituição de garantia, frente a tudo isso.
O presente ensaio obviamente não tem a pretensão de oferecer saídas ao problema de expansão do Poder. Menos ainda de tentar corrigir sua própria natureza. O ponto agora é uma leitura de como as sociedades modernas conseguem lidar com suas tensões dentro do possível. A resposta para isso é até singela: “se uma Sociedade quer limitar as devastações da guerra, não há outro meio senão limitar as faculdades do Poder” [18].
Com efeito, é isso que tem ocorrido através daquilo que Jouvenel chama de “contrapoderes”. A advocacia é, por exemplo, um contrapoder (= garantia). Atua em favor do indivíduo não sendo outra a razão pela qual os tiranos desprezam-na, sobretudo se exercida contra o Estado. Hitler mantinha severas restrições com a lei e com os advogados, que considerava “defeituosos por natureza” e se irritava até mesmo com o fato de que eram chamados de “doutores”[19]. Não é diferente com relação ao processo quando lido sob a perspectiva do garantismo[20]. Quando se observa o capítulo 39 da Carta aos Barões de 1215, tal como na expressão devido processo legal, cunhada no 28º Estatuto do Rei Eduardo III em 1354, percebe-se no processo uma verdadeira “gênese garantista”, como bem observou Igor Raatz[21]. O Processo nasce como uma garantia contra o Poder, vale dizer, nasce como um contrapoder.
Os contrapoderes, pelos entraves que apresentam aos planejamentos ostensivos do Poder, causam-lhe incômodo. Nada mais natural, portanto, que o Poder trabalhe sempre no sentido de dissolvê-lo[22]. Daí que fica fácil de compreender os ataques contemporâneos contra o processo: de um lado, atuam aqueles que atribuem toscamente ao garantismo uma espécie de fomento à criminalidade; de outro, aqueles que fazem leituras que visam a dilacerar a natureza garantista do processo, relendo-o como um instrumento servil aos interesses do Poder[23]. Em ambos os casos, há apenas um objetivo: o aumento dos próprios poderes em desfavor do indivíduo[24].
Vê-se, assim, que as correntes que colocam o processo como boi de piranha de todos os problemas de política criminal contemporânea, no fundo, movimentam-se exatamente da mesma maneira descrita no tópico anterior. Ora, observou-se que as pretensões expansionistas do Poder de jaez revolucionário agem em três frentes sucessivas. Retoma-se: (i) criam-se denúncias contra um tirano que jamais o foi e estabelecem-se fortes crença de combate contra suas respectivas arbitrariedades; (ii) chega-se na incapacidade de encontrar o tirano no mundo prático e; (iii) consolida-se, assim, um tirano de verdade ao seu final.
Eis o modus operandi exposto. Aqueles que entendem que o garantismo é promotor da criminalidade seguem exatamente na linha pretérita: o processo, inimigo da tirania por definição, passa a ser considerado como o tirano da vez. Por isso que o mínimo racional que se espera de uma investigação de relação de causa e efeito fica revogado nessas hipóteses argumentativas. Isso é observável, geralmente em redes sociais, pelos poucos caracteres em caixa alta que sustentam que o garantismo é causa cujo efeito é a criminalidade. Logo, o raciocínio canhestro conclui que a tirania da criminalidade advém do processo.
Ora, é despiciendo dizer que a conclusão de que o perverso estado político de uma nação, que tem seus indivíduos pulverizados com mais de 60.000 homicídios por ano, tem como causa o garantismo – ou melhor, o espantalho do garantismo, que nesse ponto já deixou de ser o que é para ser aquilo que querem que seja – é um disparate dos piores que já se viu. Não é a garantia do processo que impulsiona o homicida a puxar o gatilho, ou o agente público a assaltar o erário. Aliás, fosse o processo a causa, em outros países também deveria haver esse problema, já que não foi nenhum brasileiro que redigiu a Carta aos Barões.
Não se desconsidera, é verdade, que parcela da doutrina até pode ter manipulado conceitos, transformando o garantismo em um sinônimo de política de desencarceramento. Mas aí já não se está mais falando do garantismo, mas sim de um espantalho e outros absurdos. A desvirtuação do que o garantismo efetivamente é, portanto, ocorre de ambos os lados e por isso o esclarecimento e a limpeza conceitual são urgentes. O Brasil é o país cuja doutrina colocou na conta do positivismo jurídico a ocorrência do nazismo (como uma teoria jurídico-descritiva poderia fazer isso?) e que começa a colocar na conta do garantismo a criminalidade, como se estivesse necessariamente atrelado a posições políticas de esquerda. Nada poderia ser mais falso[25].
Não é diferente a linha de raciocínio do instrumentalismo processual. A pretensão de realocação de Poder parte do pressuposto de que a lealdade canil ao processo é causa cujos efeitos são injustiças materiais e empecilhos ao alcance da verdade dos fatos, como se o processo fosse um meio voltado a esses fins. Por essa razão que toda medida tomada para atender esses fins abstratos (justiça, verdade etc.) é sempre legítima[26], quando, na verdade, tratam-se apenas de conceitos porosos e indeterminados que só têm servido para legitimar investidas em desfavor da esfera individual dos integrantes de uma sociedade.
Dito de outra forma, acende-se uma vela para a “justiça” (que vem através de diversas expressões tais quais instrumentalismo, cooperativismo[27], formalismo-valorativo, neoconstitucionalismo etc.) e estão autorizados os atos mais atrozes e as medidas mais arbitrárias possíveis – ou seja, na prática autoriza-se o arbítrio e a expansão do Poder do agente estatal. É justamente disso, aliás, que decorre o acerto cirúrgico de Lúcio Delfino quando identifica no instrumentalismo um projeto de Poder[28].
A arrogância da razão humana talvez seja a pior desgraça da modernidade e ocupa um papel cimeiro aqui. Ora, filósofos disputaram por mais de 2.000 anos conceitos como a justiça e não conseguiram argumentos cabais para um ou para outro lado. Contudo, não é incomum observar um juiz achando que pode (e sabe) fazer justiça nos casos que julga e, assim, atropelando uma garantia de quase dez séculos do indivíduo, como o devido processo legal. Na verdade, parcela considerável da dogmática não sabe o que o Processo é (garantia/contrapoder), mas acha que domina uma questão infinitamente mais complexa, como a justiça.
Existem inúmeros exemplos disso. Cite-se a lição dos Professores Marinoni, Mitidiero e Arenhart, por sua relevância e importância, que afirmam que “como se reconhece que a lei é o resultado da coalizão das forças dos vários grupos sociais, e que por isso frequentemente adquire contornos não só nebulosos, mas também egoísticos, torna-se evidente a necessidade de submeter a produção normativa a um controle que tome em consideração os princípios de justiça”[29]. De novo: não se duvida das melhores intenções daqueles que proferem esse tipo de afirmação. Contudo, para que essa espécie de afirmação fosse responsável, seria imperioso que os autores explicassem todos os problemas envolvendo o tema “justiça”, os seus mais de 2.000 anos de discussão e, por fim, o que entendem por “justiça”[30].
No fundo, parece que os processualistas simplesmente não sabem o tamanho e a complexidade do problema do tema “justiça” e todas as suas consequências políticas e teóricas. Isso porque aqueles que efetivamente sabem e discorrem sobre o assunto advogam justamente pela tese contrária. Ora, como sabem do tamanho do problema – o que é justo? E para quem? – e conhecem as limitações que um jurista naturalmente tem, defendem a tese de que esse é um problema no qual o operador do Direito não deve adentrar, dada a sua incapacidade “técnica” de lidar com o tema.
O engenheiro que se acha em condições de fazer uma cirurgia cardíaca provavelmente levará o paciente a óbito, porque não está preparado para lidar com o problema. O raciocínio não difere no caso de juristas, que desprezam o fato de que são burocratas que têm o papel de aplicar a legislação vigente ao caso concreto que se oferece, e acreditam cegamente que seu papel é o de fazer “justiça” custe o que custar, até porque quem paga esse “custe o que custar” nunca é o próprio juiz; é o jurisdicionado. E paga um preço alto. Assim como o engenheiro que levará o paciente a óbito, os juristas que acham que podem fazer justiça, obviamente além de não a fazerem, também criam problemas. Daí que se compreende quando o Professor Eduardo Fonseca faz a afirmação – tão forte quanto verdadeira – de que o processualismo brasileiro está mergulhado “num campo de frouxidão conceitual e de analfabetismo teórico-político”[31].
Vê-se, então, que na prática jurídica atual manipulam-se diariamente conceitos como “justiça”, “verdade” e “processo” com uma irresponsabilidade irritante. É possível de se aceitar, em um bar, que um leigo diga que entre a justiça e o processo, deve-se optar pela justiça. Isso porque o leigo acha que a justiça é sua aliada e o processo seu inimigo, quando na verdade é o processo que o protege dos arbítrios que a palavra justiça pode lhe impor.
A consequência disso no campo jurídico é que o ativismo rasteiro fomentado por esse ideal de “justiça” faz com que o Poder se fortaleça e comece a avançar em níveis maiores. Sua expansão é insaciável e, no Brasil, aqueles que deveriam operar como contrapoderes começam a se encantar pelo canto das sereias: a doutrina, o Poder Judiciário e o Ministério Público[32].
Natural do Poder, ele conquista as almas. Aqueles que o exercem, têm sede; aqueles que são seus sujeitos passivos, devoção. Isso é assim porque “ambiciosa, cada autoridade particular tende a crescer, egoísta, a consultar apenas seu interesse imediato, ciosa de abocanhar a porção das outras autoridades”[33]. É normal que o homem médio, que observa uma senhora que não recebe sua dívida de um devedor que esbanja dinheiro em redes sociais, ache “justo” que se prenda o passaporte para que seja compelido ao pagamento[34]. Também é natural que se espume de raiva quando um agente público escapa de uma condenação porque os critérios para a interceptação telefônica não foram preenchidos. Contudo, no Brasil também é natural que, no primeiro caso, um juiz faça uso do instrumentalismo processual e no segundo, de ataques ao Processo, para atingir os fins que deseja. E a própria doutrina chancela isso. E a cereja do bolo vem quando alguns políticos, autoproclamados liberais, comemoram isso! Como um liberal comemora arbítrios contra a liberdade de um indivíduo? Parece que desconsideram que o Poder judiciário também é.... Poder!
Ocorre que quando juízes solapam o processo e fazem aquilo que querem, fazem com que o Poder entre em estado de dilatação à medida em que as liberdades dos indivíduos definham. E, paradoxalmente, são aplaudidos por isso. Isso é assim porque “o crescimento de sua autoridade é visto pelos indivíduos bem menos do que como um empreendimento contínuo contra sua liberdade, e sim como um esforço destruidor das dominações às quais estão subjugados”[35].
Na verdade, essa é uma característica muito peculiar das garantias, sobretudo na época das narrativas. O devido processo legal, aplaudido no caso do pai que mata aquele que estupra sua filha, torna-se repugnante, a luz da massa, quando é reivindicado pelo réu do processo de corrupção. Nessa linha, diz Jouvenel que “os direitos subjetivos, legítimos quando cobriam uma modesta propriedade, tornam-se odiosos quando abrigam uma riqueza imensa, não importa o meio com que tenha sido adquirida, a extensão que possua, o uso que dela se faça. E assim a maioria dedica-se à destruição desses direitos, fazendo a liberdade sucumbir com eles”[36].
E, observados todos esses fatos pretéritos, chega-se ao ponto que se quer demonstrar. Novamente, um fato. À medida em que o Poder Judiciário-ministerial[37] avançou; o processo (liberdade) foi sendo sufocado e os indivíduos passaram mais e mais a serem vítimas do arbítrio.
A banca paga e recebe. E sempre recebe mais do que paga. Os arbítrios cometidos contra a figura pública repugnante são saudados, mas ter-se-á que conviver com o outro lado da moeda. Daí que é apenas sintomático que juízes conduzam audiências aos berros e murros nas mesas, intimidando partes, testemunhas e advogados; que servidores desprezem a achincalhem jurisdicionados; que inquéritos sejam abertos de ofício pelo STF; que exposições de pensamentos que contrariem o MP e o Judiciário sejam alvo de censura sistemática (e nem de longe refere-se apenas ao recente caso do STF vs. O Antagonista e Crusoé[38]); que ministros se julguem abertamente como aqueles que detêm o conhecimento para “empurrar a história” de um país inteiro em detrimento da lei positiva. É apenas o Poder em seu estado mais natural: arbitrário, expansionista, egoísta, prepotente e atacando o seu principal inimigo, que é a liberdade dos indivíduos. O fato que aqui se buscou elucidar, com tudo isso, agora já se tornou simples: ao avançar sobre o processo e sufocá-lo, o Poder Judiciário e o MP não fazem outra coisa senão esmagar a própria liberdade dos indivíduos. Com a expansão do modo que ocorre, caminha-se (ou caminhou-se) para a atuação arbitrária, porque ilimitada, do Poder Judiciário e do MP.
Já é sabido que alguém, depois disso tudo, ainda dirá; “confio mais no Judiciário ou no MP tendo todo esse Poder do que no Executivo e no Legislativo” ou “prefiro que os contrapoderes sucumbam e não acho que um arbítrio dessa classe seja um mal em si”. Ora, já é sabido porque se tratou aqui de uma fênix e “em vão se terá provado mil vezes a nocividade do Poder arbitrário, ele renascerá sempre. Para afastá-lo, é preciso que os homens se cansem de pagar muito caro por uma chance mínima de que a arbitrariedade os favoreça, como se cansam de uma loteria onde vêm perdendo há muito tempo. Mas ele sempre se recupera por promessas de irresistível sedução”[39].
O Poder arbitrário encontra seu inimigo nos homens livres. Mas quem se preocupou em ser livre?
Considerações finais
O presente texto procurou explicar o jogo de Poder que ocorre no Direito brasileiro, com base nas preciosas observações de Bertrand de Jouvenel. Há um avanço do Poder estatal, através dos comandos do Judiciário e do MP que se encaminham fortemente para o arbítrio, uma vez que está aberta a temporada de caça ao processo, garantia tão fundamental dos indivíduos. Conforme o Poder avança, o processo perde o ar e é sufocado.
Essa tensão entre Poder e processo é um fato. A atuação voraz do judiciário responde os apelos populares e não existem dúvidas de que grande parcela dos que aplaudem e postulam esses avanços do Poder são bem-intencionados. Idealizam um país totalmente livre da criminalidade e sem injustiças materiais, e acreditam que a chave para que essa utopia se concretize está na completa submissão aos comandos do Estado, especialmente às medidas de repressão capitaneadas por um MP e um Poder Judiciário sem limitações.
Disso tudo, conclui-se que a atuação ilimitada do Poder já não é mais um horizonte distante. Já tem tempo que a advocacia tem sido uma atividade difícil – não são raros os casos em que advogados, sobretudo os criminalistas, são atacados nas ruas –; que a reivindicação de respeito ao processo virou sinônimo de vigarice e subserviência a injustiças; que agentes públicos estatais demonstram publicamente (as redes sociais estão aí) sua sede por mais e mais Poder, julgando-se como as únicas almas boas o suficiente para exercê-lo em melhor atendimento aos interesses da “Nação”. Com isso, alguns deles, mesmo que sem saber, repetem frases já ditas e atitudes já tomadas por alguns tiranos ao longo da história.
Da parte deste texto, não se prescreve nada. Não se oferece soluções para um problema tão complexo. Apenas observa-se que o Poder cresce e paulatinamente aniquila tudo aquilo que ousa tentar interrompê-lo, porque é exatamente isso que se faz com inimigos em uma guerra. Esse Poder que cresce, no Brasil, é exatamente aquilo que expressiva parcela da população quer, que os próprios agentes desejam e que alguns poucos tentam se opor. O que se procurou demonstrar é uma singela correlação: à medida em que o processo definha, o arbítrio – e não a justiça – aumenta. O processo não é inimigo da justiça; é inimigo do arbítrio. O ponto, contudo, é que no quadro atual consolidou-se um clamor pelo arbítrio.
Talvez seja da própria natureza humana implorar por sua subjugação. Ao longo dos anos, talvez o ser humano tenha mostrado suficientemente que a devoção pela submissão faz parte do seu estado natural. Daí que vem o acerto, mais uma vez, de Bertrand de Jouvenel quando diz que “não é à atualidade que devemos pedir a explicação de nossa infelicidade, mas à História”[40].
Notas e Referências
[1] KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 8. ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009. passim.
[2] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. São Paulo: Editora Peixoto Neto, 1998. p. 181.
[3] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 51.
[4] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 54.
[5] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 68.
[6] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 27.
[7] Jouvenel identifica aí um “passo prodigioso dado pelo Poder: em vez de mendigar uma contribuição em circunstâncias excepcionais, ele conta agora com uma dotação permanente, e fará todo o empenho para aumentá,la” . JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 27.
[8] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 43.
[9] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 298.
[10] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 324.
[11] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 35.
[12] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 132.
[13] Sabe-se que a divergência política é aquilo que mais causa cegueira nos debates acadêmicos. Embora a afirmação de que o estatuto do desarmamento não atendeu o interesse da população possa causar algum ranger de dentes, trata-se de um fato. O exemplo seria igualmente verdadeiro se os sinais fossem trocados: caso a maioria da população optasse pelo desarmamento, não seria surpresa se um eventual governo mais à direita optasse por desconsiderar essa opção, porque isso é da própria natureza do Poder. Agora, não é possível negar que a o estatuto do desarmamento foi contrário ao interesse geral da população, já começando pelo seu próprio nome. A população rogou pelo armamento, mas teve que ficar com um estatuto do.... desarmamento!
[14] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 152.
[15] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 154.
[16] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 155.
[17] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 274.
[18] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 185.
[19] RACHLIN, Robert. Roland Freisler and the Volksgerichtshof: The court as an instrument of terror. In: STEINWEIS, Alan; RACHLIN, Robert (Ed.) The law in Nazi Germany: ideology, opportunism, and the perversion of justice. New York: Berghahn, 2013. p. 67-68.
[20] COSTA, Eduardo José da Fonseca. O processo como instituição de garantia. Consultor jurídico, 16 nov. 2016. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2016-nov-16/eduardo-jose-costa-processo-instituicao-garantia>. Acesso em 27. abr. 2019.
[21] RAATZ, Igor. Processo, liberdade e direitos fundamentais. Revista de processo, v. 288, p. 21-54, 2019.
[22] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 358.
[23] Nesse sentido, ver RAATZ, Igor; ANCHIETA, Natascha. Uma “teoria do processo” sem processo? A breve história de uma ciência processual servil à jurisdição. Revista brasileira de direito processual (impresso), v. 26, p. 177, 2018.
[24] No âmbito teórico acompanhou-se essa promoção da subserviência ao Poder. Não é por acaso que a teoria do processo do século XIX limitou-se a tornar o processo um instrumento, em algo desprovido de substância. O discurso em favor da pseudo autonomia do processo foi, na verdade, um discurso da sua subjugação ao Poder. Ver em: ANCHIETA, Natascha. Em busca da substancialidade constitucional do processo: os percalços do desenvolvimento histórico da ciência processual: da noção instrumental à noção substancial de processo. Empório do direito, 15 abr. 2019. Disponível em: <https://emporiododireito.com.br/leitura/8-em-busca-da-substancialidade-constitucional-do-processo-os-percalcos-do-desenvolvimento-historico-da-ciencia-processual-da-nocao-instrumental-a-nocao-substancial-de-processo>. Acesso em 28. abr. 2019.
[25] Para uma demonstração de como o garantismo não está necessariamente vinculado com posições políticas de esquerda ou de direita, ver COSTA, Eduardo José da Fonseca. Garantismo, liberalismo e neoprivatismo. Empório do direito, 11 jun. 2018. Disponível em: <https://emporiododireito.com.br/leitura/garantismo-liberalismo-e-neoprivatismo>. Acesso em 27. abr. 2019.
[26] Indispensável destacar o papel dos pamprincípios nessa disputa de linguagem. Ver STRECK, Lenio Luiz. Verdade e consenso: constituição, hermenêutica e teorias discursivas. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
[27] Nesse sentido, ver CREVELIN, Diego. O caráter mítico da cooperação processual. Empório do direito, 06 dez. 2017. Disponível em: <https://emporiododireito.com.br/leitura/abdpro-10-o-carater-mitico-da-cooperacao-processual-por-diego-crevelin-de-sousa>. Acesso em 25. abr. 2019.
[28] DELFINO, Lúcio. O processo é um instrumento de justiça? (desvelando o projeto instrumentalista de poder). Empório do direito, 28 abr. 2019. Disponível em: <https://emporiododireito.com.br/leitura/10-o-processo-e-um-instrumento-de-justica-desvelando-o-projeto-instrumentalista-de-poder>. Acesso em 30. abr. 2019.
[29] MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Luiz; MITIDIERO, Daniel. Curso de processo civil: teoria do processo civil. São Paulo: RT, 2015. p. 56.
[30] Além, é claro, de outras questões, como, por exemplo, com base em quais dados assumem a premissa absolutamente arbitrária de que os denominados “contornos nebulosos e egoístas” ocorrem apenas no Poder Legislativo e não no Poder Judiciário?
[31] COSTA, Eduardo José da Fonseca. Garantismo, liberalismo e neoprivatismo. op. cit.
[32] Em diversas passagens da obra de Jouvenel, isso fica claro. A título exemplificativo, “no momento em que o agente do Poder vem pegar o homem em seu domínio privado, para forçá-lo ou impedi-lo de agir, ele é assistido de todo um aparelho coercitivo ao qual o homem sozinho não saberia resistir. Entregue a si mesmo, este é escravo do Poder. Só deixará de sê-lo se um contrapoder puder deter o braço dominador. Esse foi o primeiro papel dos tribunos na antiga Roma, e sua instituição representou para a plebe o começo da liberdade. Tal missão, na Inglaterra e, por imitação, nos Estados Unidos, foi atribuída ao juiz”. JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 388.
[33] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 170.
[34] Para uma crítica nesse sentido, ver RAATZ, Igor. O juiz defensor da moral, o juiz defensor da verdade e o juiz defensor da lei: instrumentalismo, cooperativismo e garantismo processual. Empório do direito, 01 abr. 2019. Disponível em: <https://emporiododireito.com.br/leitura/6-o-juiz-defensor-da-moral-o-juiz-defensor-da-verdade-e-o-juiz-defensor-da-lei-instrumentalismo-cooperativismo-e-garantismo-processual-1>. Acesso em 30. abr. 2019.
[35] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 170.
[36] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 410.
[37] Sabe-se que o MP não é um Poder. Mas tem agido como tal e esse ensaio está preocupado com a leitura dos fatos como são; não como deveriam ser. Nesse sentido, ver COSTA, Eduardo José da Fonseca. O fundamento do Ministério Público. Empório do direito, 18 mar. 2019. Disponível em: <https://emporiododireito.com.br/leitura/4-o-fundamento-do-ministerio-publico>. Acesso em 30. abr. 2019.
[38] A ver, por exemplo, recente caso em que justamente o STF que anulou decisão que vinha tolhendo liberdade de imprensa: <https://jovempan.uol.com.br/noticias/brasil/celso-de-mello-derruba-censura-a-jovem-pan-por-comentario-de-marco-antonio-villa.html>.
[39] Jouvenel mostra ainda que parece ser da própria natureza humana esperar por figuras messiânicas: “Aliás, examinando-se os romances, as peças de teatro, os filmes, as crônicas policiais dos jornais que cativam o público, percebe-se também que existe uma demanda muito grande de acontecimentos, espetáculos e personagem que saiam do comum. O poder arbitrário responde a essa necessidade”. JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 171.
[40] JOUVENEL, Bertrand de. O poder: história natural de seu crescimento. op. cit. p. 25.
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