Coluna Espaço do Estudante
Em sessão realizada no dia 14/10/2015, o Superior Tribunal de Justiça, por maioria dos votos, negou provimento aos Embargos de Divergência em Recurso Especial nº 1.403.532 (admitido como representativo de controvérsia nos termos do art. 543-C do CPC e da Resolução nº 8 de 7/8/2008/STJ).
Os Embargos versavam sobre divergência jurisprudencial entre a Primeira e Segunda Turmas do Tribunal, precisamente o REsp nº 841.269/BA, de relatoria do Ministro Francisco Falcão, exarado no sentido de que a tributação de IPI na revenda de produto importado consistiria em bitributação (na verdade, tratar-se-ia de bis in idem) e, portanto, vedada pelo ordenamento; e o REsp nº 1.403.532/SC, de relatoria do Ministro Og Fernandes, que entendeu pela possibilidade de dupla incidência do IPI (tanto no desembaraço como na revenda).
Em dissidência inaugurada pelo Ministro Mauro Campbell Marques, e perfilhada pelos Ministros Assusete Magalhães, Sérgio Kukina, Olindo Menezes e Herman Benjamin, foram vencidos os Ministros Benedito Gonçalves (Relator) e Regina Helena Costa, culminando na negativa de provimento do EREsp nº 1.403.532.
A questão – incidência ou não de IPI na revenda de produtos importados que não sofreram, no estabelecimento importador, qualquer industrialização – já é antiga e passou por constantes oscilações.
A despeito do REsp nº 841.269/BA, que entendia pela impossibilidade de nova tributação de IPI na revenda do produto importado, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça vinha seguindo rumo diverso, consolidando a tese de que a tributação na revenda era viável e decorria da redação dos artigos 46 e 51 do CTN (REsp nºs 1.393.102, 1.385.952, 1.398.721, 1.247.788, 1.420.066.
Todavia, no dia 11/06/2014, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, também em Embargos de Divergência em Recurso Especial (nº 1400759), fundamentado na divergência entre o mesmo REsp nº 841.269/BA, de relatoria do Ministro Francisco Falcão, e o REsp nº 1.400.759, de relatoria da Ministra Eliana Calmon, pareceu alterar diametralmente a questão: reconheceu a ocorrência de bitributação (bis in idem) na cobrança de IPI na revenda de produtos importados que não sofreram, no estabelecimento importador, qualquer industrialização.
No julgamento, vencidos os Ministros Sérgio Kukina, Herman Benjamin e Assusete Magalhães, prevaleceu o entendimento dos Ministros Ari Pargendler, Arnaldo Esteves Lima, Napoleão Nunes Maia Filho, Og Fernandes e Benedito Gonçalves pela não incidência de IPI na revenda de produtos importados.
Impende destacar que a questão de mérito foi amplamente discutida e contou com interessantes ocorrências, como a revisão de posicionamento do Ministro Og Fernandes, membro da Segunda Turma e antes filiado à tese de incidência:
Esclarece-se, de início, que não se desconhecem os precedentes da Segunda Turma deste Tribunal Superior, da qual sou membro julgador, no sentido da possibilidade de dupla incidência do IPI na hipótese retratada nos autos. Contudo, após análise mais apurada sobre o tema, com a permissão aos que entendem de modo diverso, tenho que a interpretação da legislação de regência não permite a dupla incidência.
Houve, ainda, retificação de voto pelo Ministro Arnaldo Esteves Lima, que, em uma primeira oportunidade, havia seguido o Relator, Ministro Sérgio Kukina, no sentido de que não haveria bis in idem:
Embora tenha proferido voto, na sessão de julgamento de 12/03/14, no sentido de acompanhar o eminente Ministro SÉRGIO KUKINA, relator, a fim de conhecer dos embargos de divergência em recurso especial e negar-lhes provimento, peço vênia para retificá-lo, de modo a acompanhar a divergência inaugurada pelo eminente Ministro ARI PARGENDLER, pelas breves razões que passo a expor.
A questão parecia se revestir de maiores ares de segurança jurídica, uma vez que, em havendo julgamento por órgão de maior representatividade (1ª Seção), não haveria razão para o posicionamento – ampla e devidamente debatido – ser alterado em curto espaço de tempo.
Com isso, foram proferidos diversos julgados (AgRg no AgRg no REsp nº 1430403, AgRg no REsp nº 1461864, AgRg no REsp nº 1490386 e etc.) que, em razão do decido no EREsp nº 1.400.759, entenderam pela ocorrência de bitributação (bis in idem) na incidência de IPI na revenda de produto importado, v.g.:
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. IPI. IMPORTADOR COMERCIANTE. FATOS GERADORES. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. BITRIBUTAÇÃO. OCORRÊNCIA. ERESP 1.411.749/PR. A Primeira Seção, no julgamento do EREsp 1.411.749/PR (acórdão pendente de publicação), de relatoria do Ministro Sérgio Kukina, relator para acórdão Ministro Ari Pargendler, deu provimento ao embargos de divergência para fazer prevalecer o entendimento adotado no REsp 841.269/BA, segundo o qual, tratando-se de empresa importadora, o fato gerador ocorre no desembaraço aduaneiro, não sendo viável nova cobrança de IPI na saída do produto quando de sua comercialização, ante a vedação do fenômeno da bitributação. Agravo regimental provido. (AgRg no REsp 1466190/PR, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/09/2014, DJe 23/09/2014)
Porém, como já se anunciou, menos de um ano depois da publicação do resultado do EREsp nº 1.400.759 (em 18/12/2014), o STJ reviu – e desculpe-me o pleonasmo – novamente seu posicionamento, agora em recurso representativo de controvérsia, sedimentando por vez a questão.
Melhor sorte não terão os contribuintes que decidirem recorrer ao Supremo Tribunal Federal, uma vez que este já expôs que a questão em tela é de índole infraconstitucional e qualquer ofensa à Constituição se daria por via reflexa (ARE nº 895140 e ARE nº 891.727).
Agora, àqueles que se aproveitaram do breve interregno jurisprudencial e angariaram um “trânsito em julgado”, desejo-lhes um futuro próspero, sem a cobrança de IPI na revenda, cabendo aos demais a diminuição da margem de lucro para encontrar competitividade neste cenário.
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José Gouvêa é Acadêmico de Direito da 10ª fase do Curso de Direito da Universidade Federal de Santa Catarina
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