Juízes criminais e suas sentenças fast - food, vai uma decisão aí?

08/02/2016

Por Elias Guilherme Trevisol - 08/02/2016

A prática judicial forense não deixa dúvidas, as decisões dos magistrados criminais estão cada vez mais suscintas e com menor profundidade. Assoberbados de processos em pauta para julgamento e com um Sistema que só alimenta a demanda, apressam-se para atender seu ofício judicante, sem no entanto, a devida análise das provas e demais elementos processuais, resultando em sentenças em massa ou de produção, em série.

Denota o ilustre doutrinador Alexandre Morais da Rosa, em brilhante obra, que na busca pela eficiência, magistrados criminais estão numa empreitada que visa a sumarização do processo penal, não importante se tal elemento constitucional (art. 37, da Constituição Federal), ponha a baixo direitos fundamentais como a ampla defesa, o direito à recursos, etc. O discurso, portanto, pauta-se pela produção eficiente do Juiz, porém, desencadeia condenações "fast-food", do tipo "peça pelo número", implicando na "McDonaldização" do direito procesusal penal e na "standatização da acusação", tudo em nome de uma "McPena-Feliz"[1].

Exposta a verdade fática e prática do cotidiano forense na seara penal, há que analisarmos os fatores incidentes no presente dilema de sentenças penais sem o devido apuro em cotrapartida de um processo penal que visa a proteção democrática e controle do Poder do Estado perante o acusado[2].

Em princípio, dever-se-ia perseguir um processo penal de modelo acusatório e não inquisitório como temos hoje, ao menos de forma jurisprudencial, na fase de inquérito policial, não existindo o sistema misto, como alguns doutrinadores insistem em argumentar[3].

A superação do dilema entre qual Sistema penal está vigente no país, se inquisitório ou acusatório, se faz urgente, devendo haver adequação do Sistema às normas de Direitos Humanos (normas e Pactos Internacionais) e à Constituição Federal de 1988[4].

O Sistema acusatório teve seu berço no direito grego e se faz imperativo em nosso processo penal atual, configurando um processo de partes - acusador e acusado - situação em que o Juiz se queda inerte, imparcial, mero espectador das provas produzidas tanto pelo órgão acusador, quanto pela defesa, delineando um processo penal em contraditório, portanto, mais justo[5].

Com vistas à aplicação de um processo penal acusatório em nosso país, houve a edição da nova Lei nº 13.245/16, modificando em parte o inquérito policial, oportunizando ao Advogado apresentar razões e quesitos na defesa de seu cliente (artigo 7º, XXI, a)), todavia, embora louvável a intenção legislativa, a implementação do Sistema acusatório deve ter contornos não só legais, mas culturais, no intuito de fazermos valer decisões judiciais mais equilibradas e que respeitem o contraditório e a ampla defesa[6].

Há aqui, sobretudo, que priorizarmos o Princípio do Contraditório, direito, em suma, das partes à contrapor o que a outra arguiu em seu desfavor.[7]

É no cenário procedimental em contraditório que se deve fazer a análise das provas pelo magistrado criminal, protegendo o direito das partes em poder exercer os próprios diereitos de cada uma.

É dizer, permitir uma adequada acusação pelo Ministério Público ou querelante e em contrapartida, ainda mais relevante dado ao Princípio Constitucional da Inocência, ofertar ao acusado o amplo direito à defesa, tanto técnica, qaunto pessoal.

Realizando o modelo de Sistema acusatório, estará assegurando o Estado-Juiz, a mínima dialeticidade e paridade de armas entre as partes[8].

Daí que se deve sobrepor o Sistema penal acusatório, imantado de vários princípios constitucionais, ao solitário princípio da eficiência da administração pública, ou seja, embora saibamos que há pressão contidiana aos Juízes para que julguem de forma mais rápida, atualmente exigência também regulada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), deve haver, na prática, o efetivo respeito às regras de Direitos Humanos, inclusive, harmonizando as decisões para com os Pactos Internacionais relacionados ao tema e concreto alinhamento das decisões ao que regra nossa Lei Maior, iniciando por uma leitura constitucional do direito penal[9].

É na análise do Sistema penal acusatório que podemos desconstituir as repetidas sentenças penais reformadas através dos recursos. Se evitarmos os erros de julgamento, tanto de procedimento (error in procedendo), quanto do próprio julgamento da matéria (error in judicando), durante o processo penal, não teremos mais que ouvir "qual é o número de seu pedido?" e nos depararmos com sentenças penais condenatórias ao estilo "fast-food", afinal, nem sempre estamos com fome, mas almejamos sim, a efetiva e prática Justiça por parte do judiciário.


Notas e Referências:

[1] ROSA, Alexandre Morais da. Guia Compacto do Processo Penal conforme a teoria dos jogos. 2ª Ed. Florianópolis: Editora Lumen Juris, 2013. p. 01.

[2] LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. 9ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 66.

[3] ROSA, Alexandre Morais da. A teoria dos Jogos aplicada ao Processo Penal. 2ª Ed. Florianópolis: Editora Empório do Direito, 2015. p. 56.

[4] Ibidem. p. 59.

[5] LOPES Jr., Aury. Fundamentos do Processo Penal. 1ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p . 140.

[6] VIEIRA, Renato Stanziola. Paridade de Armas no Processo Penal. 2º Volume. 1ª Ed. Brasília, DF: Gazeta Jurídica, 2014. p. 23.

[7] CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel; GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria Geral do Processo. 26ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 61.

[8] LOPES Jr., Aury. Fundamentos do Processo Penal. 1ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p . 141.

[9] LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. 9ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 70.


Elias Guilherme Trevisol. . Elias Guilherme Trevisol é Doutorando em Direito e Ciências Sociais pela Universidade de Córdoba, Argentina. Advogado Criminalista. . .


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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


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