Impressões sobre a Lei 13.245/16

08/03/2016

Por Emmanuel Levenhagen Pelegrini - 08/03/2016

Parte da comunidade dos advogados aplaudiu em pé a sanção da presidente da República à lei nº 13.245/16. Segundo a mídia noticiou, a partir dessa lei os advogados passaram a ter seus poderes ampliados nas investigações envolvendo seus clientes.

Será isso mesmo? Afinal, a referida lei ampliou as prerrogativas dos advogados? É o que passaremos a analisar.

Fruto de um inegável poder de convencimento e de uma notória influência da OAB no Congresso Nacional, a Lei nº 13.245/16 passou a prever expressamente a possibilidade de o advogado examinar, em qualquer instituição dotada de atribuição investigativa, autos de flagrante e de investigação de qualquer natureza. Também passou a fazer parte das prerrogativas dos causídicos  assistir  seus clientes durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta do interrogatório ou depoimento prestado, podendo, inclusive, no curso da investigação, apresentar eventuais manifestações e quesitos.

Pois bem.

No que toca à primeira  “novidade” (inciso XIV), nada de novo foi acrescentado. Uma aplicação mais efetiva da súmula vinculante nº 14 resolveria a questão. Não havia, portanto, nesse ponto, necessidade da alteração legislativa. Talvez pelo fato de a súmula se referir expressamente apenas a órgão com competência de polícia judiciária – caso das polícias civil e federal - , a alteração faça algum sentido e tenha alguma relevância, já que passa a alcançar, agora sem divergências, as investigações presididas pelo Ministério Público. Muito provável que esta tenha a sido a intenção do legislador, motivada sobretudo pelas recentes operações comandadas pelo instituição, a exemplo da estrelada “Lava Jato”.  Cabe frisar ainda que a Convenção Americana de Direitos Humanos também já garante ao profissional advogado prerrogativa semelhante. Ao debruçar-se sobre o art. 8º. 2. b, a Corte Interamericana de Direitos Humanos decidiu, no caso Barreto Leiva versus Venezuela, que o “art. 8.2.b convencional se “aplica inclusive antes de que se formule uma acusação em sentido estrito”. Ainda segundo a Corte,  para que o dispositivo em questão satisfaça os fins que lhe são inerentes, é necessário que o investigado tome ciência do que há contra ele antes mesmo de se manifestar sobre eventual acusação oficialmente formulada. Nas palavras do tribunal,  “Para que o mencionado artigo satisfaça os fins que lhe são inerentes, é necessário que a notificação ocorra previamente a que o imputado renda sua primeira declaração ante qualquer autoridade pública” (Caso Barreto Leiva vs. Venezuela, § 30). Assim, apesar da aparente novidade, nada de original foi trazido pelo inciso XIV da nova lei, senão tornar claro como a luz do sol a possibilidade de acompanhamento, por advogado, das investigações conduzidas pelo Ministério Público.

Inovação, esta sim, pode ser vista no inciso XXI. Segundo esse novo dispositivo, os investigados passam a ter o direito de ser assistidos por advogado na fase investigativa de qualquer procedimento desta natureza, sob pena de nulidade absoluta do depoimento e de todos os elementos de prova dele decorrentes, direta ou indiretamente.

Neste ponto deve surgir alguma celeuma. Teria a lei tornado obrigatória a participação da defesa técnica também na fase de investigação, à semelhança do que que é exigido na fase judicial? Penso que não. Em realidade, o que o inciso XXI buscou foi apenas assegurar a presença da defesa técnica nas apurações, em qualquer espécie de investigação. Em momento algum o legislador afirmou que a realização de atos investigatórios sem a presença de advogado passa a acarretar a nulidade do procedimento investigatório. O que não mais se admite, sob pena de nulidade -  e esta foi a intenção da lei - , é o advogado ser impedido, pela autoridade, de acompanhar seu cliente em eventual depoimento por ele prestado. A defesa técnica, agora, tem o direito, a prerrogativa de amparar seu cliente nos atos extrajudiciais de inquirição. E não pode ser impedida de estar ao seu lado, e, se for o caso, a juízo da autoridade, de apresentar manifestação por escrito. Portanto, a lei não tornou obrigatória a presença do advogado na fase de investigação; garantiu ao investigado, isto sim, o apoio desse profissional. Assim, a autoridade deve adotar cautelas adicionais. Nesse sentido, ao intimá-lo (o investigado) a prestar depoimento, deve informá-lo do seu direito de ser assistido e acompanhado  por um defensor. Comparecendo ao lado deste, as perguntas  serão feitas na presença de ambos, ocasião em  que poderão apresentar manifestações a respeito do fato objeto da investigação, sujeita, no entanto, à avaliação da autoridade (art. 14, CPP). Por sua vez, na hipótese de o investigado comparecer sozinho, desacompanhado de advogado, desnecessária será a nomeação de um defensor ad hoc, pois, como visto, a lei não tornou necessária a presença da defesa técnica nestes atos.

Enfim, penso que, de forma geral,  nenhuma alteração substancial adveio com essa lei. O que mais chama a atenção mesmo é a consagração, agora explicitada, do poder investigatório do Ministério Público, que muito bem vem fazendo à sociedade brasileira. Isso sim é inegável.


Emmanuel Levenhagen Pelegrini. . Emmanuel Levenhagen Pelegrini é Promotor de Justiça em Minas Gerais. . . .


Imagem Ilustrativa do Post: At work... / Warsaw Pride 2009 // Foto de: David J // Sem alterações

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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


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