Impeachment: últimas decisões mostram desrespeito ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa – Por Beatriz Vargas Ramos, Alexandre Gustavo Melo Franco de Moraes Bahia, Diogo Bacha e Silva e Marcelo Andrade Cattoni de Oliveira

12/06/2016

Temos acompanhado, passo a passo, o desenrolar do processo de impeachment da Presidenta Dilma Rousseff. Inevitavelmente, a principal preocupação tem sido a de denunciar o sistemático desrespeito à Constituição, assim como às garantias que a conformam, desde o momento do recebimento da denúncia pelo Presidente da Câmara, ora afastado, Dep. Eduardo Cunha.

Assim, por diversas vezes, tem-se alertado para o fato de que o processo de responsabilidade política pelo impeachment não é um julgamento político destituído de garantias para o denunciado, senão que um julgamento jurídico, cujas balizas são determinadas pela Constituição e pela lei[1]. Ora, tal afirmação é parte de uma leitura do instituto do impeachment na sua integridade.

A falta de respeito às garantias processuais no processo de impedimento da Presidenta Dilma Rousseff é, assim, parte da própria crítica à inconstitucionalidade desse processo. Recentemente, o Senador Antonio Anastasia – PSDB-MG, Relator da Comissão Processante no Senado Federal, monocraticamente indeferiu pedido da defesa da Presidenta, consistente na juntada de gravações e degravações de áudios entre o Senador Romero Jucá e o ex-presidente da Transpetro Sergio Machado, bem como as conversas entre este e o Senador Renan Calheiros[2]. Para o indeferimento, o Relator utilizou-se da argumentação segundo a qual tais fatos não estavam em questão no pedido de impeachment.

Também, por meio da questão de ordem levantada pela Senadora Simone Tebet (PMDB-MS), o prazo de alegações finais para a defesa da Presidente havia sido fixado em 5 (cinco) dias[3]. Contrariamente, portanto, ao estabelecido durante o processo de impeachment do Presidente Collor, em que o prazo de alegações finais foi de 15 (quinze) dias, em aplicação por analogia do que dispõe o artigo 11, da Lei nº 8.038/1990.

Essas decisões tomadas pela Comissão Processante no Senado Federal relevam profunda desconsideração quanto ao conteúdo da ampla defesa no impeachment, um desrespeito, portanto, às garantias processuais da denunciada, e inevitavelmente levantam a suspeita de que isso teria por objetivo abreviar o rito e acelerar a conclusão do processo. Com efeito, a abreviação do rito seria benéfica para o atual governo interino, já que, dia após dia, e como demonstram as gravações divulgadas na imprensa, elucida-se que o processo de impedimento da Presidenta Dilma Rousseff poderia ter apenas um único propósito, qual seja, o de beneficiar os parlamentares envolvidos em caso de corrupção.

Quanto à redução do prazo de alegações finais, antes da aprovação do cronograma dos trabalhos da Comissão Processante, o Senador Raimundo Lira (PMDB/PB), seu Presidente, decidiu exercer o poder de retratação e manter o cronograma original, apresentado pelo Senador Antonio Anastasia, que previa 15 (quinze) dias para apresentação de alegações finais. O objetivo foi evitar futuras alegações de nulidade por parte da defesa, que certamente seriam reconhecidas pelo STF[4]. Com isso, o Presidente do STF, no exercício da Presidência do Processo de Impeachment, Min. Ricardo Lewandowski julgou, em sede recursal, prejudicado o pedido interposto pela defesa da Presidente que questionava a redução do prazo[5].

Ora, no caso da redução do prazo para apresentação de alegações finais, por mais que a própria Comissão tenha evitado um questionamento acerca de ofensa à ampla defesa, ainda assim esse cerceamento subsiste, no tocante ao indeferimento da produção de provas.

Em primeiro lugar, a decisão do Presidente da Câmara pelo recebimento da denúncia no processo de impeachment delimita os parâmetros da acusação e, com base nela, dever-se-á proferir as decisões, seja a de autorização na Câmara dos Deputados, seja a do julgamento no Senado Federal, já que a correlação entre a denúncia e o julgamento é uma garantia inerente ao devido processo legal. E assim deve ser, na medida em que o denunciado não poderá jamais ser condenado por crime de responsabilidade que não esteja devidamente individualizado no âmbito da denúncia instauradora como também nos termos em que esta foi recebida pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal[6].

Não se trata, aqui, de mera transposição de categorias próprias do processo jurisdicional para o processo de impeachment, ainda que aplicável subsidiariamente o Código de Processo Penal, mas de aplicação configuradora da garantia do devido processo legal a um processo de natureza sancionatória.

Basta pensarmos que só se poderá falar de processo enquanto cadeia normativa de atos, situações jurídicas e posições subjetivas, interconectados à preparação final de um provimento (procedimento), animada pelo contraditório, enquanto garantia de participação daqueles que por este último serão afetados, com paridade de armas[7]. Assim, sem as garantias do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, não há sequer a possibilidade de se reconhecer a existência de um processo, no sentido jurídico-constitucional. Sem as garantias, o “processo” não passa de simples ritualística, mera sequência de atos ilegítimos e sem validade. Como, então, devemos pensar as garantias processuais no processo de impeachment, em especial a ampla defesa?

Assim, não apenas a defesa deve desconsiderar tudo o que foi imputado na específica denúncia recebida contra a Presidenta Dilma – já que a própria decisão de recebimento pelo Presidente da Câmara reduziu o âmbito da acusação aos decretos suplementares de 2015 e aos atrasos das equalizações do Plano Safra –, como também não se pode esperar que a defesa contra-argumente sobre o que não constitui a matéria da acusação. Situação completamente distinta, entretanto, é o direito da defesa de contextualizar o próprio ato de recebimento da denúncia – um evidente desvio de poder – e, enfim, o próprio processo de impeachment, com base nas conversas gravadas por Sérgio Machado, diálogos que reforçam a tese defensiva de que o processo tem origem num acordo político espúrio. Não à toa, a Constituição da República, no art. 5º, LV, estabelece a “ampla defesa, com os meios e recursos a elas inerentes”, no sentido de se conferir a plenitude ao direito do acusado. Nessa medida, todo e qualquer meio probatório e todos os recursos que possam ser utilizados pela defesa, desde que lícitos, mesmo que não previstos em lei, têm sua admissibilidade resguardada pelo dispositivo constitucional em comento.

Veja-se: a admissibilidade de todo e qualquer meio probatório é diretamente determinada pela Constituição. A não admissão de qualquer meio probatório lícito acarreta, de plano, cerceamento de defesa. Devemos, pois, para isso, diferenciar, de acordo com a teoria do direito probatório, a admissão, a produção e a valoração de todos os meios probatórios.

A valoração da prova, ao contrário, é ato exclusivo, ainda que sujeito ao contraditório, do órgão julgador, que deverá, no momento da decisão, levá-la em consideração ou não, conforme sua relevância fundamentada racionalmente para o deslinde da questão.

Ora, desta forma, o cerceamento de defesa no processo de impeachment é evidente por si mesmo, na medida em que o Relator da Comissão Processante do Senado não admitiu a juntada de provas pela defesa quando, em verdade, a própria Constituição determina sua admissão, independentemente de seu conteúdo, que elas serão objeto de valoração pelo órgão julgador e não pelo de admissão. Ou seja, a valoração da prova produzida pela defesa é de competência do órgão julgador, no caso do impeachment, pelo plenário do Senado Federal (art. 52, II, CR/88). A decisão do Relator é, inclusive, uma usurpação da competência do Plenário do Senado Federal que é quem deve valorar as provas produzidas, apreciar os fatos à luz do corpus probatório resultante da fase de instrução.

Poder-se-ia pensar, ainda, se tal amplitude da defesa seria aplicável ou não ao processo de impeachment. Para tanto, basta nos lembrarmos da “força gravitacional do precedente”[8] do Supremo Tribunal Federal, no Caso Collor. No julgamento do Mandado de Segurança n. 21.564/DF (Rel. Min. Octavio Gallotti), o Supremo Tribunal Federal enfrentou a questão da ampla defesa no processo de impeachment.

Naquela oportunidade, o Supremo Tribunal delimitou os papéis constitucionais atribuídos à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal em consonância com a Constituição, a saber, cabe a este a acusação, o processo e o julgamento e àquela o juízo de admissibilidade ou de autorização do processo, entendimento depois ratificado pelo julgamento da ADPF nº 378[9]. Tais funções reverberam, certamente, na amplitude e na extensão da garantia da ampla defesa; mas, como afirmado pelo Supremo Tribunal Federal, mesmo no juízo de admissibilidade na Câmara dos Deputados não se pode deixar de garanti-la.

Mais ainda, sabendo-se que é no âmbito do Senado Federal que ocorrerá o juízo acusatório e o julgamento do impedimento, então, é nesta fase que o conteúdo da garantia deve ser ampliado e esta aplicada da forma mais eficaz, para assegurar o cumprimento dos fins a que se destina.

Indeferir a juntada de provas sob a alegação de que isso não condiz com o objeto do processo[10], portanto, constitui cerceamento de defesa, já que esta deve ter a maior amplitude possível, consoante mandamento constitucional, além do que constituiu valoração indevida do conteúdo probatório por órgão incompetente que, certamente, ocasiona nulidade do processo que, como bem disse Leonardo Yarochewsky, já nasceu viciado desde o princípio[11].

Infelizmente, melhor sorte não se pode dizer da forma como as “onze ilhas” do Supremo Tribunal Federal [12] têm se comportado quando chamadas a se pronunciar sobre o processo de impeachment.

Assim é que, contrariando o estabelecido pelo Tribunal no Mandado de Segurança n. 21.564/DF, o Min. Ricardo Lewandowski indeferiu recurso feito pela defesa da Presidenta quanto ao pedido de produção/juntada daquelas provas acima mencionadas – os áudios do ex-Presidente da Transpetro – ao processo. O argumento do Ministro foi o de que aquele material estaria protegido por sigilo, uma vez que os áudios envolvem a delação daquele investigado.

Ora, as falas dos interlocutores por si sós não configuram crime. E não valem necessariamente como confissão, sobretudo num marco legal em que nem a confissão ou a cooperação premiada possuem, em si mesmas, valor comprobatório, mas no conjunto de todas as provas admitidas. Essas gravações, contudo, têm valor como prova de defesa para terceira pessoa implicada, aliás, a principal implicada, a Presidenta da República. Afinal, essas gravações não são em princípio ilegais, já que feitas por um dos interlocutores, que participou da conversa gravada. E não vieram a público por intermédio da terceira pessoa implicada e referida na conversa. Nesse sentido, elas devem ser consideradas, para efeito de defesa da Presidenta, ré no processo de impeachment e, como tal, detentora dos direitos decorrentes do princípio do favor rei. Segundo o mencionado princípio, a prova que favorece o acusado em geral – seja direta ou indiretamente – deve ser sempre admitida, em qualquer circunstância. Outra coisa é se poderão servir ou não como prova de crime em processo judicial da Lava Jato, algo que deverá ser resolvido no âmbito daquelas ações e não no processo de impeachment.

Outros recursos também foram rejeitados pelo Presidente do Supremo Tribunal, no exercício da competência recursal, como Presidente do Processo de Impeachment: um do Senador Aloysio Nunes, que pretendia limitar o número de testemunhas de defesa[13], assim como outros dois recursos feitos pela defesa da Presidenta que pediam o afastamento do Relator do processo na Comissão Processante, o Senador Antonio Anastasia: o Ministro Lewandowski não visualizou motivos que sustentassem o pedido de afastamento por suspeição (art. 36, da Lei 1.079/1950)[14].

Ainda, o Ministro Lewandowski, no despacho em que delibera sobre as alegações de cerceamento do direito de defesa da Presidenta – sobre questões como prazos exíguos para vista de documentos e manifestação sobre requerimentos –, entende que o momento atual do processo o impediria de decidir sobre as ilegalidades arguidas. Para ele:

“Bem examinado o pleito, entendo que não há o que deliberar sobre a manifestação (...). Registro que o Presidente do Supremo [sic] e do processo de impeachment somente assumirá diretamente a coordenação dos trabalhos, decidindo questões incidentais, em uma eventual terceira fase do procedimento, na qual todos os integrantes do Senado serão chamados a definir o destino da Presidente da República afastada. No entanto, por hora, cabe a mim exclusivamente a competência recursal, que deve ser exercida apenas para expungir do feito eventuais vícios e nulidades flagrantes que possam contaminar o julgamento como um todo”.

No entanto, ele conclui que a manifestação da defesa não teria “formulado nenhum requerimento de reforma das decisões proferidas no âmbito da Comissão Especial”, razão pela qual ele não poderia deliberar sobre elas. De toda sorte, ele não vislumbrou que tivesse havido “decisão passível de reforma” e também questionou se o meio formal usado pela defesa – “protesto” – não configuraria um recurso.

Sobre essas últimas decisões, há que se pontuar que, mais uma vez, o Ministro Lewandowski perde a oportunidade de garantir a regularidade do processo[15]. Ora, como é possível que, diante de um caso de nulidade absoluta – como é o cerceamento de defesa, através de expedientes como a concessão de prazos exíguos – o Presidente do Supremo Tribunal não as reconheça de ofício? Pouco importa, afinal, para o caso, se o meio utilizado pela defesa não se configura “recurso em sentido técnico”: as nulidades apontadas podem ser declaradas mesmo que não tivessem sido alegadas, simplesmente porque configuram inaceitável violação de garantias processuais seculares, previstas em todos os ordenamentos jurídicos do Ocidente e, especificamente, na Constituição de 1988.

Ao contrário do que diz o Ministro Lewandowski, não é outro senão este o momento adequado para se evitar a consolidação/permanência nos autos de “vícios e nulidades flagrantes” que podem – e vão – “contaminar o julgamento como um todo”. Assim, igualmente não é de todo descabida a arguição de ausência de imparcialidade por parte do Relator da Comissão Processante, uma vez que, claramente, possui posição política favorável ao impedimento e viria demonstrado isso na forma de condução dos trabalhos.

De tal modo que, infelizmente, seja o Tribunal em geral, seja seu Presidente, aqui, em particular, vêm demonstrando certa ausência de afeição a garantias fundamentais relativas ao processo. Se não se poderia esperar imparcialidade de Deputados e Senadores no exercício da relatoria e do voto, ao menos dever-se-ia esperar do Presidente da mais alta Corte o compromisso em corrigir desvios que fossem verificados ao longo do procedimento.

Cerceamentos ao direito de defesa e violações em geral ao devido processo legal, mal apreciados e rejeitados pelo Supremo Tribunal Federal em decisões monocráticas – que se tornam decisões definitivas, seja de fato, por não serem levadas ao Plenário, seja em razão de terem sido referendadas por este, ainda que ao arrepio da própria jurisprudência do Tribunal – ou em decisões definitivas de seu Presidente, também Presidente do processo de impeachment, inevitavelmente, acabam por demonstrar, que as críticas feitas por tantos juristas e políticos, à ausência de “coerência e integridade”, inclusive por parte da Corte e de seus integrantes, constituem tarefa republicana se de denunciar publicamente o caráter inconstitucional e golpista do atual processo de impeachment.


Notas e Referências:

[1] Conforme recente obra que publicamos: BAHIA, Alexandre Gustavo Melo Franco Moraes, BACHA E SILVA, Diogo, CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade. O IMPEACHMENT e o Supremo Tribunal Federal: história e teoria constitucional brasileira. Florianópolis: Empório do Direito, 2016.

[2] Notícia disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2016-06/anastasia-nega-pedido-de-dilma-para-incluir-audios-de-machado-no, acesso em 06 de Junho de 2016. Sobre o conteúdo dos áudios, vale lembrar: “Nos áudios registrados por Machado, que vieram a público nas últimas semanas, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) sugere que a saída da presidente Dilma resultaria em um pacto para conter o avanço da Operação Lava Jato e livrar políticos de serem investigados. A defesa de Dilma alegava que o material era a prova de que o processo do impeachment representa desvio de poder. No pedido, formulado pelo ex-advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, os áudios serviriam para a defesa demonstrar a ‘única finalidade que movia importantes parlamentares e líderes políticos na construção do processo de destituição do atual governo’” – http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,lewandowski-rejeita-recurso-de-dilma-para-incluir-audios-de-sergio-machado-no-processo-do-impeachmen,10000055818, acesso em 06 de Junho de 2016.

[3] Notícia disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2016-06/cardozo-apresenta-primeiro-recurso-contra-prazo-do-impeachment-no-senado, acesso em 06 de Junho de 2016.

[4] Notícia disponível em: http://www12.senado.leg.br/noticias/videos/2016/06/comissao-do-impeachment-preve-depoimentos-de-testemunhas-ate-17-de-junho, acesso em 06 de Junho de 2016.

[5] Notícia disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=318125, acesso em 06 de Junho de 2016.

[6] No âmbito do processo penal e como garantia do devido processo legal do acusado: OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de Processo Penal. 10ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. ´p. 507.

[7] FAZZALARI, Elio. Istituzioni di diritto processuale. Padova: CEDAM, 1994. Ver também GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria do processo, 2ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2012.

[8] DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. 2ª ed. Trad. Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 176.

[9] Sobre tais precedentes ver: BAHIA, Alexandre Gustavo Melo Franco Moraes; BACHA E SILVA, Diogo; CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade. O IMPEACHMENT e o Supremo Tribunal Federal: história e teoria constitucional brasileira. Florianópolis: Empório do Direito, 2016.

[10] As provas indeferidas, ao contrário do que ficou decidido, estão, sim, relacionadas ao objeto da acusação, porque elucidam o contexto político no qual o impeachment foi pensado, no qual as denúncias foram “encomendadas”, recebidas e processadas. Têm, portanto, muito a revelar sobre o “conjunto da obra que resultou no impeachment”, embora não expliquem a dinâmica do Plano Safra ou a técnica da contabilidade orçamentária. À luz da história política que levou à decisão de afastamento da Presidenta Dilma Rousseff, a própria matéria da acusação assume a dimensão de simples artificialismos e tecnicalidades que se mostram, na pior das hipóteses para a acusada, altamente controvertidos e duvidosos, para o efeito de embasarem uma condenação por crime de responsabilidade.

[11] YAROCHEWSKY, Leonardo Isaac. Julgamento de Impeachment no Senado é nulo por negar Direito de Defesa à Dilma. Disponível em: http://justificando.com/2016/06/06/julgamento-de-impeachment-no-senado-e-nulo-por-negar-direito-de-defesa-a-dilma/, acesso em 06 de Junho de 2016.

[12] A expressão é do Prof. Conrado Hübner Mendes, repetida em entrevista dada ao Blog Os Constitucionalistas: “O STF se manifesta como “onze ilhas” pelo menos de duas maneiras. Em primeiro lugar, quando suas decisões colegiadas correspondem a nada mais do que a soma de votos individuais, sem maiores interações comunicativas entre eles. São decisões fragmentadas, com argumentos diversos, que dificultam a identificação de um fundamento comum. Uma colcha de retalhos. É verdade que, estatisticamente, a maior parte das decisões colegiadas é composta de decisões unânimes, nas quais se segue o voto do relator (aparentemente, o contrário das ‘onze ilhas’). Isso acontece, sobretudo, nos acórdãos das Turmas. Porém, se olharmos mais atentamente para esses números, percebemos que, quando o caso é controverso e de maior exposição pública do Plenário, a regra é o modelo fragmentado. Praticamente, nenhum ministro do STF resiste à tentação de se expressar com sua própria voz quando está sob os holofotes, mesmo se concorda com a linha de outro voto, ou se o que tem a dizer for, no limite, redundante. Ninguém abre mão da vaidade autoral, nem quando isso teria potencial para estimular uma Corte melhor, que toma decisões melhores. Em segundo lugar, o Supremo Tribunal Federal se manifesta como ‘onze ilhas’ na pura e simples ausência do colegiado em 90% das decisões que a Corte toma. O STF é, na maior parte do seu tempo, um ‘tribunal monocrático’. Um ministro pode individualmente tomar decisões liminares que consumam efeitos irreversíveis, engavetar casos e jogá-los para um futuro indefinido, desengavetar casos que estavam aguardando julgamento há muitos anos ou poucos meses. O STF é refém dos caprichos de cada um dos seus ministros. Nada melhor define as ‘onze ilhas’ (...). O STF vive o ápice de suas patologias institucionais. Chamar de supremocracia o protagonismo do Supremo Tribunal Federal é, no entanto, dar ênfase num alvo errado, na minha opinião. Hoje, preocupa menos o poder do STF enquanto Tribunal do que o poder de cada um dos seus ministros. Ministros têm o poder de sequestrar o Plenário por meio de seus pedidos de vista e de suas decisões liminares. Cortes fortes existem no mundo. Cortes desgovernadas e reféns do capricho e dos cálculos pragmáticos de cada um dos ministros, isso não há. Claro que devemos discutir os limites do poder de um tribunal. Mas antes temos que resolver uma questão preliminar: por que um ministro, à luz da justificativa de que “precisa pensar melhor sobre o caso”, pode ficar 6 meses, um ano, 5 anos, com o processo em sua gaveta?”. Disponível em: http://www.osconstitucionalistas.com.br/conrado-hubner-mendes-o-stf-e-refem-do-capricho-dos-seus-ministros, acesso em 07 de Junho de 2016.

[13] Ver notícia publicada em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=318280, acesso em 07 de Junho de 2016.

[14] Ver notícia publicada em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=318278, acesso em 07 de Junho de 2016.

[15] Assim, também, em mais uma decisão do dia 8/06, em que o Min. Lewandowski não conheceu o recurso apresentado pela Senadora Vanessa Grazziotin, contra decisão da Comissão Processante. A Comissão havia indeferido questão de ordem formulada pela Senadora, tendo apreciado “de forma global” e não individualizada os requerimentos apresentados de produção de provas. Para a Senadora, “o relator do processo, senador Antonio Anastasia, analisou o conjunto de requerimentos com base ‘na sua discricionariedade individual, julgando o que é mais conveniente para o seu convencimento’, assumindo, isoladamente, a posição de juiz.” (Cf. http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=318458). Em sua decisão, o Min. Lewandowski considerou que “sua atribuição como presidente do processo se restringe ao examinar a legalidade procedimental dos atos praticados, e não interferir no encaminhamento das deliberações relativas aos requerimentos junto à Comissão. Esta, ‘formada pelos juízes da causa, exercendo a faculdade de aceitar ou rejeitar provas, entendeu ser possível o julgamento agrupado dos pedidos, bem como necessárias ou desnecessárias algumas das provas requeridas’. Assim, considera inviável, por meio de recurso, determinar o acolhimento irrestrito e compulsório de todas as diligências requeridas pelos senadores, ‘sob pena de ofensa ao princípio da colegialidade’.” (Cf. http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=318458). Surpreendentemente, o argumento da Colegialidade, que serviria para ele, Min. Lewandowski, não decidir sozinho, não serviu para que ele, Lewandowski, desse provimento a um recurso, justamente, contra uma decisão do Relator da Comissão Processante, tomada de forma monocrática e, portanto, não colegiada.


 

Imagem Ilustrativa do Post: Manifestação contra PMDB // Foto de: Camila Lara/Editorial J // Sem alterações

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