Henrique Pizzolato: O mensaleiro fujão que se deu bem, será? Requisitos para progredir ao regime semiaberto. O STF vai arregar?

30/10/2015

Por Antônio Julião da Silva - 30/10/2015

Um dos condenados no processo do “Mensalão” (Ação Penal n. 470 do STF)[2], o ex-Diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato empreendeu fuga para a Europa em setembro de 2013 utilizando o passaporte do irmão morto.

Preso em Maranello, na Itália, quatro meses depois, travou uma batalha jurídica para evitar ser extraditado para o Brasil alegando que os presídios brasileiros não reuniam condições de recebê-lo.

Disse, inclusive, que preferia morrer à cumprir pena no Brasil. Pelo jeito, se conformou com o novo lar!

A imprensa passou a especular quando o mensaleiro será beneficiado com a progressão de regime prisional.

A partir do momento em que o indigitado condenado obtiver a progressão para o regime semiaberto, poderá desfrutar do trabalho externo, oportunidade em que será possível trabalhar fora do presídio, recolhendo-se após o horário do expediente e nos finais de semana.

Cumprido 1/6 do total das penas privativas de liberdade também poderá desfrutar de saídas temporárias.[3]

Tratando das regras do cumprimento da pena no regime semiaberto, prevê o Código Penal[4]:

“Regras do regime semi-aberto

 Art. 35 – [...].

1º - O condenado fica sujeito a trabalho em comum durante o período diurno, em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar. 

2º - O trabalho externo é admissível, bem como a frequência a cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou superior.”

Prevê a Lei n. 7.210/84[5]:

“Art. 37. A prestação de trabalho externo, a ser autorizada pela direção do estabelecimento, dependerá de aptidão, disciplina e responsabilidade, além do cumprimento mínimo de 1/6 (um sexto) da pena.”

Condenado à pena privativa de liberdade que totaliza 12 (doze) anos e 7 (sete) meses de reclusão em regime fechado, quando poderá pleitear aludido benefício?

Eis a íntegra da pena que foi cominada a Pizzolato na Ação Penal n. 470/STF[6]:

“[...]

por unanimidade, condenar o réu HENRIQUE PIZZOLATO pelo delito de peculato (art. 312 do CP), itens III.2.a e III.3(a.3) da denúncia, e, por maioria, fixar a pena de reclusão em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses, mais 220 (duzentos e vinte) dias-multa, no valor de 10 (dez) salários mínimos cada, tudo nos termos do voto do Ministro Joaquim Barbosa (Relator); 

por unanimidade, condená-lo pelo delito de corrupção passiva (art. 317 do CP), item III.3 (a.1) da denúncia, e, por maioria, fixar a pena de reclusão em 3 (três) anos e 9 (nove) meses, mais 200 (duzentos) dias-multa, no valor de 10 (dez) salários mínimos cada, tudo nos termos do voto do Ministro Joaquim Barbosa (Relator);

por maioria, condená-lo pelo delito de lavagem de dinheiro (art. 1º, incisos V e VI, da Lei nº 9.613/1998), item III.3 (a.2) da denúncia, e, por maioria, fixar a pena de reclusão em 3 (três) anos, mais 110 (cento e dez) dias-multa, no valor 10 (dez) salários mínimos cada, tudo nos termos do voto do Ministro Joaquim Barbosa (Relator); 

[...].”

Como forma de proporcionar o retorno gradual do preso em sociedade, objetivando sua reintegração, dispõe a Lei de Execução Penal (Lei n. 7.210/84)[7], no caput do art. 112, quais os requisitos necessários para a evolução do regime prisional:

“A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão.” (grifei)

A regra é clara (momento Arnaldo César Coelho).

O primeiro requisito para obtenção da progressão de regime prisional é o cumprimento ao menos de 1/6 do total de sua pena privativa de liberdade.[8]

Deve também ostentar bom comportamento carcerário, não bastando que possua mérito, mas que demonstre encontrar-se apto em adaptar-se ao regime prisional menos rigoroso[9].

Precisará cumprir 1/6 da pena de 12 anos e 7 meses de reclusão = 2 anos, 1 mês e 5 dias.

Sabe-se que o tempo em que Pizzolato permaneceu preso na Itália será descontado da pena aplicada no processo do Mensalão, conforme determina o artigo 42 do Código Penal[10]:

“Computam-se, na pena privativa de liberdade e na medida de segurança, o tempo de prisão provisória, no Brasil ou no estrangeiro, o de prisão administrativa e o de internação em qualquer dos estabelecimentos referidos no artigo anterior.”

Há informações de que tenha permanecido preso na Itália do dia 05 fevereiro de 2014 até 28 de outubro de 2014 (8 meses e 23 dias), e voltou a ser preso em 12 de fevereiro de 2015 até ser extraditado para o Brasil, quando chegou no dia 23 de outubro de 2015 (8 meses e 11 dias).

Ficou preso na Itália por 1ano, 5 meses e 4 dias.

O requisito objetivo (cumprimento de 1/6 da pena) será alcançado após cumprir mais 8 meses e 1 dia.

Preencherá o requisito objetivo (cumprimento de 1/6 da pena) no mês de junho de 2016.

Esse tempo ainda poderá ser reduzido pela remição da pena, a saber:

“Art. 126[11]O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena.

1o A contagem de tempo referida no caput será feita à razão de:       

I - 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar - atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional - divididas, no mínimo, em 3 (três) dias;      

II - 1 (um) dia de pena a cada 3 (três) dias de trabalho.       

2o [...] 

8o A remição será declarada pelo juiz da execução, ouvidos o Ministério Público e a defesa.       

Art. 127.  [...].     

Art. 128.  O tempo remido será computado como pena cumprida, para todos os efeitos.”  (sublinhei)

Ocorre que, como foi condenado pela prática de crimes contra a administração pública, além dos requisitos contemplados pelo artigo 112 da Lei de Execução Penal (cumprimento de 1/6 da pena e bom comportamento carcerário), haverá ainda a necessidade de ressarcir o erário pelo roubo praticado, nos termos do que dispõe o § 4º do art. 34 do Código Penal:

“O condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais.”

Essa condicionante para viabilizar a progressão ao regime semiaberto (ressarcir o erário pelo roubo praticado) já foi exigido pelo Ministro do STF Roberto Barroso, do também mensaleiro e ex-deputado federal do PT e ex-presidente da Câmara dos Deputados João Paulo Cunha (virou poeta: aproveitou a estadia na penitenciária e escreveu o livro “Quatro & outras lembranças”)[12], por ocasião do julgamento do pedido de progressão de regime para o aberto, assim ementado:

“EXECUÇÃO PENAL. PROGRESSÃO DE REGIME. CRIME CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. DEVOLUÇÃO DO PRODUTO DO ILÍCITO. 1. É constitucional o art. 33, § 4º, do Código Penal, que condiciona a progressão de regime, no caso de crime contra a Administração Pública, à reparação do dano ou à devolução do produto do ilícito. 2. Tendo o acórdão condenatório fixado expressamente o valor a ser devolvido, não há como se afirmar não se tratar de quantia líquida. 3. A alegação de falta de recursos para devolver o dinheiro desviado não paralisa a incidência do art. 33, § 4º, do Código Penal. O sentenciado é devedor solidário do valor integral da condenação. 4. Na hipótese de celebração de ajuste com a União para pagamento parcelado da obrigação, estará satisfeita a exigência do art. 33, § 4º, enquanto as parcelas estiverem sendo regularmente quitadas. 5. Agravo regimental desprovido. (Ag. Reg. na Progressão de Regime na Execução Penal 22/Distrito Federal, julgado em 17 de dezembro de 2014, Sessão Plenária, por maioria de votos, vencido o Min. Marco Aurélio).”[13]

Do Acórdão, pinço a seguinte passagem:

“[...].

11. Todavia, em matéria de crimes contra a Administração Pública – como também nos crimes de colarinho branco em geral –, a parte verdadeiramente severa da pena, a ser executada com rigor, há de ser a de natureza pecuniária. Esta, sim, tem o poder de funcionar como real fator de prevenção, capaz de inibir a prática de crimes que envolvam apropriação de recursos públicos. A decisão que se tomar aqui solucionará não apenas o caso presente, mas servirá de sinalização para todo o país acerca da severidade com que devem ser tratados os crimes contra o erário. (destaquei)

12. [...].”

Há ainda a condicionante do pagamento da pena de multa!

O Plenário do STF, à unanimidade, vencido também o Min. Marco Aurélio, firmou o entendimento de que, para o deferimento da progressão de regime prisional, se faz necessário o pagamento da pena de multa, conforme julgamento do Ag. Reg. na Progressão de Regime na Execução Penal 20/Distrito Federal[14], sob relatoria do Min. Roberto Barroso, julgado em 15 de abril de 2015, analisando pedido de progressão formulado pelo também mensaleiro Rogério Lanza Tolentino:

“EXECUÇÃO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. INADIMPLEMENTO VOLUNTÁRIO DA PENA DE MULTA. PROGRESSÃO DE REGIME. IMPOSSIBILIDADE.

1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal firmou orientação no sentido de que o inadimplemento deliberado da pena de multa cumulativamente aplicada ao sentenciado impede a progressão no regime prisional. Precedente: EP 12-AgR, Rel. Min. Luís Roberto Barroso.

2. Tal regra somente é excepcionada pela comprovação da absoluta impossibilidade econômica do apenado em pagar a multa, ainda que parceladamente.

3. Agravo regimental desprovido.” (destaquei)

As penas de multa de Pizzolato totalizam 530 (quinhentos e trinta) dias-multa, no valor de 10 (dez) salários mínimos cada.

Agora é com o Ministro Roberto Barroso, tomara que não arregue.


 

Notas e Referências:

[1]   Bacharel em Direito pela UFSC, pós-graduado em Relações Internacionais pela UNISUL e em Gestão do Serviço Público pela UDESC. Autor das seguintes obras jurídicas: “Prática da Execução Penal” (6ª edição), “Lei de Execuções Penais Interpretada pela Jurisprudência do STF, STJ e TJSC (3ª edição) e “Juizados Especiais Cíveis e Criminais Interpretada pela Jurisprudência do STF, STJ e TJSC” (3ª edição), todos pela editora Juruá

[2] Disponível em < http://stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=11541 >. Acesso em 27 de outubro de 2015.

[3] Sobre o assunto, ver nosso artigo “35= 5X7. Pela revogação da Súmula 520 do STJ.” Disponível em < http://emporiododireito.com.br/35-5x7-pela-revogacao-da-sumula-520-do-stj-por-antonio-juliao-da-silva/ >. Acesso em 28 de outubro de 2015.

[4] Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848.htm >. Acesso em 27 de outubro de 2015.

[5] Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L7210.htm >. Acesso em 27 de outubro de 2015.

[6] Disponível em < http://stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=11541 >. Acesso em 27 de outubro de 2015

[7] Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L7210.htm >. Acesso em 27 de outubro de 2015.

[8] MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução Penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11/07/84. 10. ed. revista e atualizada. São Paulo: Atlas, 2002, p. 381

[9] MIRABETE, Julio Fabbrini. Op. cit., p. 389.

[10] Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848.htm >. Acesso em 27 de outubro de 2015.

[11] Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L7210.htm >. Acesso em 28 de outubro de 2015.

[12] Disponível em < http://www1.folha.uol.com.br/poder/2015/04/1613087-joao-paulo-cunha-lanca-livro-de-poemas-escrito-na-prisao.shtml >. Acesso em 28 de outubro de 2015. Acesso em 28 de outubro de 2015.

[13] Disponível em < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=8038320 >. Acesso em 28 de outubro de 2015.

[14] Disponível em < http://stf.jus.br/portal/processo/verProcessoPeca.asp?id=306858483&tipoApp=.pdf >. Acesso em 28 de outubro de 2015.

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução Penal: comentários à Lei nº 7.210, de 11/07/84. 10. ed. revista e atualizada. São Paulo: Atlas, 2002.


Antônio Julião da SilvaAntônio Julião da Silva é Bacharel em Direito pela UFSC, pós-graduado em Relações Internacionais pela UNISUL e em Gestão do Serviço Público pela UDESC. Autor das seguintes obras jurídicas: “Prática da Execução Penal” (6ª edição), “Lei de Execuções Penais Interpretada pela Jurisprudência do STF, STJ e TJSC (3ª edição) e “Juizados Especiais Cíveis e Criminais Interpretada pela Jurisprudência do STF, STJ e TJSC” (3ª edição), todos pela editora Juruá.


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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


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