Por Cândido Furtado Maia Neto – 16/02/2017
Proteção à inviolabilidade da vida e a integridade física, contra Pena de Morte e a Prisão Perpétua via Procedimento de Extradição ou Expulsão Solicitada
Em busca da eficiência das autoridades brasileiras para a proteção da dignidade da pessoa humana, a fim de serem tomadas todas as medidas legais cabíveis a situação jurídica que envolva brasileiro ou brasileira preso(a) no exterior.
O sistema de repressão penal nacional e global precisa seguir a principiologia das Nações Unidas, constante nas cláusulas dos instrumentos internacionais de Direitos Humanos.
As regras de direito penal e especialmente de processo penal devem possuir um norteamento básico, isto é, todas as Nações que se comprometem e dizem respeitar a dignidade humana, a vida, o regime democrático e o humanismo em geral, os termos de suas Cartas Magnas (contrária a pena capital, a prisão perpétua, a tortura e ao tratamento carcerário cruel e desumano), devem promover Boas Práticas de Justiça Penal-Penitenciária, facilitando a reciprocidade e a cooperação entre Estados, no intuito de desburocratizar o sistema criminal através de uma nova visão para adotar medidas jurisdicionais e diplomáticas mais céleres e úteis aos cidadãos de todo o mundo.
A Carta da República Federativa do Brasil expressa:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
III - ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;
XLVII - não haverá penas:
a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;
b) de caráter perpétuo;
c) de trabalhos forçados;
d) de banimento;
e) cruéis;
XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;
§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
As Nações Unidas no seu compêndio de Direitos Humanos aprovou instrumentos e normas contra a sanção capital, como por exemplo: 1 - Resolução 2857 (XXVI) da Assembleia Geral da ONU (1971); 2 - Garantias para a Proteção dos Direitos das Pessoas Sujeitas a Pena de Morte (ONU/1984); 3 - Aplicações das Garantias para a Proteção dos Direitos das Pessoas Sujeitas a Pena de Morte (ONU/1989); 4 - Princípios relativos a uma eficaz prevenção e investigação das execuções extrajudiciais, arbitrárias ou sumárias (ONU/1989); 5 - Resolução 1990/29 do Conselho Econômico e Social (ONU/1990).
Em matéria de prisão perpétua cabe salientar que a experiência científica através dos registros da literatura especializada ou a doutrina moderna, bem como a prática ou a abordagem empírica do encarceramento humano, tem demonstrado, em toda a história universal da prisão e da pena privativa de liberdade que o processo de prisionalização só é capaz de produzir efeitos negativos nefastos e irreparáveis, como a estigmatização e a rotulação que recebem os ex-presidiários. Na prisão perpétua sequer é possível a ressocialização ou reintegração social, portanto, um encarceramento ainda mais irracional e inútil, nem mesmo a disciplina prisional é administrável aos condenados por toda a vida. Razão esta que os Estados democráticos e humanitários estabelecem um limite obrigatório para o cumprimento da pena[1], a fim do apenado continuar com esperança na liberdade.
Todos os brasileiros serão reprimidos ao cometerem crimes no território nacional ou no exterior, devendo a autoridade competente buscar a sua repatriação por meio de extradição ou expulsão a pedido, para ser processado e julgado pela Justiça brasileira.
Expressa a Parte Geral do Código Penal pátrio (Lei nº 7.209/1984), o princípio da extraterritorialidade; a saber:
Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:
II - os crimes:
a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir[2];
b) praticados por brasileiro;
§ 2º - Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições:
a) entrar o agente no território nacional;
b) ser o fato punível também no país em que foi praticado;
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição;
d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena;
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável.
O brasileiro preso no exterior pode ser transferido ao território nacional, quando investigado e processado para ser julgado pelas autoridades do sistema judicial do Brasil, é o denominado “translado de preso e/ou translado de processo”. Até quando, o brasileiro, já tenha sido condenado no exterior, pode ser repatriado para cumprir a pena em seu País, próximo de seus familiares e de seu povo, em busca da reintegração social.
A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil (art. 8º CP); porque a sentença estrangeira possui eficácia e as mesmas consequências quando devidamente homologada, para surtir efeitos jurídicos próprios, não depende da existência de tratado de extradição com o País de cuja autoridade judiciária emanou a sentença, ou, na sua falta, basta requisição do Ministro da Justiça (art. 9º “b” CP).
Por sua vez, o Código de Processo Penal (Dec-lei nº 3.689/1941) disciplina que:
Art. 787. As sentenças estrangeiras deverão ser previamente homologadas pelo Supremo Tribunal Federal para que produzam os efeitos do art. 7o do Código Penal.
Art. 788. A sentença penal estrangeira será homologada, quando a aplicação da lei brasileira produzir na espécie as mesmas consequências e concorrem os seguintes requisitos:
I - estar revestida das formalidades externas necessárias, segundo a legislação do país de origem;
II - haver sido proferida por juiz competente, mediante citação regular, segundo a mesma legislação;
III - ter passado em julgado;
IV - estar devidamente autenticada por cônsul brasileiro;
V - estar acompanhada de tradução, feita por tradutor público.
Art. 789. O procurador-geral da República, sempre que tiver conhecimento da existência de sentença penal estrangeira, emanada de Estado que tenha com o Brasil tratado de extradição e que haja imposto medida de segurança pessoal ou pena acessória que deva ser cumprida no Brasil, pedirá ao Ministro da Justiça providências para obtenção de elementos que o habilitem a requerer a homologação da sentença.
§ 1o A homologação de sentença emanada de autoridade judiciária de Estado, que não tiver tratado de extradição com o Brasil, dependerá de requisição do Ministro da Justiça.
Nos regimes democráticos o sistema legal visa um modelo de Justiça Restaurativa[3] e não apenas Repressivo, modernamente olha-se para o futuro e não ao passado, busca-se o arrependimento do ato com o reconhecimento do erro praticado, e isto será eficientemente alcançado se o infrator estiver sendo processado e julgado no País de sua nacionalidade, posto que a moralidade e o status social tende a funcionar no âmbito doméstico, ou seja, a vergonha existe entre conhecidos.
A Justiça criminal se baliza na imparcialidade judicial, na presunção de inocência, no direito a ampla defesa, no contraditório, e num Ministério Público verdadeiramente humanístico, onde a acusação tem como responsabilidade o “onus probandi”.
Condenação criminal somente com provas certas, precisas e concretas, e a pena privativa de liberdade como “ultima ratio” das espécies de sanções permitidas no mundo moderno.
A transferência de pessoa estrangeira ao País de sua nacionalidade, como já afirmamos, não depende de Tratado ou Convenção internacional, basta uma simples solicitação e a vontade das administrações judiciais de ambos os Estados.
A representação diplomática brasileira (Embaixada e/ou Consulado do Brasil) deve prestar toda assistência devida ao brasileiro preso, seja diplomática através de tradutores e interpretes junto às autoridades policiais e em todas as audiências judiciais, jurídica com a contratação de advogado habilitados no País da prática do ilícito, bem como, material.
O amparo consular ao nacional preso no exterior não se restringe a prestação de assistência judiciária, mas também toda espécie de assistência material, através do fornecimento de roupas, cobertores, alimentos e produtos de higiene pessoal; porque muitos países não fornecem tais utensílios particulares.
Assim rezam os artigos 15 usque 20 das Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento dos Reclusos – 1955; Princípios Básicos para o Tratamento dos Reclusos (ONU/1990); e Conjunto de Princípios para Proteção de Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma de Detenção ou Prisão (ONU/1988); estes não são instrumentos internacionais do tipo de tratado, porém possuem reconhecimento tácito universal com validade jurídico-moral.
O brasileiro(a) preso no exterior possui o direito fundamental de receber informações (documentos) por escrito sobre o motivo e todas as circunstâncias que justifiquem sua prisão em território alienígena; bem como o nome das autoridades responsáveis por ela (policiais, representante do Ministério Público e juiz), em nome de uma justa e publica audiência.
Saliente-se que o governo da Republica Federativa do Brasil ao aderir o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (ONU/1966 – BR 1992), bem como o Pacto de San José da Costa Rica ou Convenção Americana sobre Direitos Humanos (OEA/1969 – BR 1992), instrumentos internacionais que passaram a pertencer e integrar o ordenamento jurídico pátrio, com grau de hierarquia e prevalência ante as normas ordinárias vigentes, uma forma de garantias legais de todos os cidadãos brasileiros que se encontram no território nacional, competindo à representação diplomática brasileira (embaixada e/ou consulado) proteger e prestar ampla assistência ao nacional no exterior.
Faz-se necessário ainda que a representação diplomática e/ou consular junte aos autos (no estrangeiro) certidões de antecedentes criminais fornecidas por autoridades do sistema legal brasileiro, para demonstrar a primariedade e reafirmar o princípio da presunção de inocência, e a conduta do preso (cidadão-brasileiro).
Não olvidemos da Declaração sobre Direitos Humanos dos Indivíduos que não são Nacionais nos Países em Vivem - ou que estão temporariamente em trânsito (Res. 40/144 ONU/1985)
Todo Estado-Membro da Organização das Nações Unidas, incluindo os sistemas regionais de proteção dos Direitos Humanos (Asiático[4], Africano[5], Árabe[6], Europeu [7]e Interamericano[8]) se obriga a respeitar Pactos, Convenções e Tratados de Direitos Humanos, cito: Declaração Universal (ONU/1948 – artigo V, VII, VIII, IX, X e XI); Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (ONU/1966); Convenção contra a Tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanas ou degradantes (ONU/1984), e etc.
Ao Ministério Público brasileiro incumbe a proteção dos cidadãos brasileiros que residem no território nacional e no exterior (art. 127 CF), ante o princípio da prevalência internacional dos Direitos Humanos (art. 4º III CF), e ao respeito a inviolabilidade da vida e a dignidade da pessoa humana.
Os presos estrangeiros sofrem muito, toda sorte de desumanidade[9], são discriminados pelos demais (presos nacionais), estão expostos a diversas formas de bullying, constrangimentos, passando de réu à vítima do sistema prisional, sujeitos a maus-tratos, a violência sexual e física, a furtos/roubos de pertences pessoais, são colocados em alas ou celas separadas e imundas. Na verdade, se o encarceramento por muitos doutrinadores é comparado ao “inferno na terra”, a prisão no exterior é pior do que isto.
As Diretrizes das Nações Unidas (ONU/1990) para os representantes do Ministério Público de todo o mundo, sem distinção, dispõe:
Papel no processo penal
10. As funções dos Membros do Ministério Público estão estritamente separadas das funções de juiz.
11. Os Membros do Ministério Público desempenham um papel ativo no processo penal, nomeadamente na decisão de determinar a investigação criminal, e quando a lei ou prática nacional o autorizam, participam na investigação criminal, supervisionam a legalidade da investigação criminal, supervisionam a execução das decisões dos tribunais e exercem outras funções enquanto representantes do interesse público.
12. Os Membros do Ministério Público exercem as suas funções em conformidade com a lei, equitativamente de maneira coerente e diligente, respeitam e protegem a dignidade humana e defendem os direitos da pessoa humana, contribuindo, assim, para garantir um procedimento criminal correto e o bom funcionamento do sistema de justiça.
14. Os Membros do Ministério Público não encetam nem continuam investigações criminais ou fazem o possível para suspendê-las se um inquérito imparcial revelar que a acusação não é fundada.
16. Quando os Membros do Ministério Público recebem contra as suspeitas provas que eles sabem ou têm motivos razoáveis para suspeitar que foram obtidas por métodos ilícitos, que constituem uma grave violação dos direitos da pessoa humana e que implicam em particular a tortura ou um tratamento ou castigos cruéis, desumanos ou degradantes, ou que tenham implicado outras violações graves dos direitos do homem, recusam utilizar essas provas contra qualquer pessoa que não seja aquela que recorreu a esses métodos, ou informam o tribunal em consequência, e tomam todas as medidas necessárias para que seja feita justiça.
Alternativas ao processo crime
18. De acordo com a sua legislação nacional, os Membros do Ministério Público examinam com toda a atenção a possibilidade de renúncia aos procedimentos judiciais, de pôr termo aos processos de forma condicional ou incondicional ou de transferi-los para fora do sistema judiciário oficial, respeitando plenamente os direitos do ou dos suspeitos e da ou das vítimas. Os Estados devem, para esse fim, examinar atentamente, a possibilidade de adotar métodos de transferência dos casos presentes aos tribunais não só para aligeirar a pesada carga de processos que lhes estão distribuídos, mas também para evitar o estigma criado pela detenção antes do julgamento, a formação da culpa e a condenação e os efeitos perniciosos que a detenção pode implicar.
A importância dos Direitos Humanos se reveste na efetivação do devido processo legal e de uma pena aceitável ou humanamente permitida, para prevenir, desde já, possível atentado de lesa humanidade por consequência de um resultado trágico que possa acontecer com condenação criminal em base a pena de morte ou prisão perpétua contra um brasileiro no exterior.
O governo da República Federativa do Brasil pode e deve interceder em favor da repatriação do cidadão brasileiro preso no exterior, requerendo de pronto a extradição, ainda que não exista condenação, aplicando-se as regras do Tratado-Tipo de Extradição das Nações Unidas, aprovado em sessão plenária da Assembleia-Geral da ONU, em 14.12.1999, a saber:
Artigo 6º: “O Estado requerido, se a sua legislação o autorizar, pode conceder a extradição após recepção de um pedido de detenção provisória, na condição de que a pessoa reclamada consinta expressamente, na presença de uma autoridade competente, em ser extraditada”.
Através do Ministério da Justiça ou do setor diplomático, o governo da República Federativa do Brasil, possui legitimidade para requerer às autoridades estrangeiras competentes, o translado do preso e do processo investigatório ou até a própria ação criminal, destacando as provas (interrogatório, declarações testemunhais e elementos técnico-periciais, como objetos e instrumentos do crime), documentos estes devidamente traduzidos ao português e legalizados pela representação diplomática, instruído com indicações precisas sobre o local, a data, a natureza e as circunstâncias do fato criminoso, a identidade do cidadão brasileiro extraditando e, ainda, cópia dos textos legais sobre o crime, a competência, a pena e sua prescrição, antes mesmo do cidadão nacional ser julgado e/ou condenado; respeitando direitos de terceiras pessoas[10]; na hipótese de crime internacional de tráfico de drogas, por não existirem vítimas diretas (tipo penal de “crime sem vítima”), tal prática delitiva não chega a provocar dano a quem quer que seja (sujeito passivo = vitima indireta e nem sequer à sociedade em geral), ainda que o crime de tráfico de drogas consume-se com o simples transporte, trazer consigo e apreensão da droga, onde a tutela-jurídica, não é ofendida (saúde pública), é uma forma de “tentativa”, vez que não se concretizou a venda, o repasse ou a distribuição do entorpecente no território estrangeiro. Sendo está mais uma razão para o brasileiro preso ser transferido para ser processado e julgado em solo pátrio, e assim não há que se falar em impunidade.
Ressaltamos a lei processual penal brasileira:
Art. 780 CPP. Sem prejuízo de convenções ou tratados, aplicar-se-á o disposto neste Título à homologação de sentenças penais estrangeiras e à expedição e ao cumprimento de cartas rogatórias para citações, inquirições e outras diligências necessárias à instrução de processo penal.
Art. 782 CPP. O trânsito, por via diplomática, dos documentos apresentados constituirá prova bastante de sua autenticidade.
De acordo com os fundamentos do Tratado-Tipo de Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal (ONU/1990), e o que rege o Tratado-Tipo sobre a Transmissão de Processos Penais (Res. 45/118 - ONU/1990), as autoridades brasileiras estão autorizadas legalmente para requerer a extradição e/ou a expulsão de brasileiro preso no exterior, comprometendo-se o governo nacional, a processa-lo e julgá-lo em solo pátrio, isto é, pela Justiça doméstica, nos termos do artigo 88 do Código de Processo Penal.
Art. 88. No processo por crimes praticados fora do território brasileiro, será competente o juízo da Capital do Estado onde houver por último residido o acusado. Se este nunca tiver residido no Brasil, será competente o juízo da Capital da República.
Por sua vez, o Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) “in analogia” com a lei processual penal ajuda a entender o tema da cooperação jurisdicional internacional:
Art. 26. A cooperação jurídica internacional será regida por tratado de que o Brasil faz parte e observará:
I - o respeito às garantias do devido processo legal no Estado requerente;
II - a igualdade de tratamento entre nacionais e estrangeiros, residentes ou não no Brasil, em relação ao acesso à justiça e à tramitação dos processos, assegurando-se assistência judiciária aos necessitados;
III - a publicidade processual, exceto nas hipóteses de sigilo previstas na legislação brasileira ou na do Estado requerente;
IV - a existência de autoridade central para recepção e transmissão dos pedidos de cooperação;
V - a espontaneidade na transmissão de informações a autoridades estrangeiras.
§ 1º Na ausência de tratado, a cooperação jurídica internacional poderá realizar-se com base em reciprocidade, manifestada por via diplomática.
Agir de ofício judicial e/ou diplomaticamente, de modo célere para transferir um cidadão brasileiro que se encontra preso no exterior, para evitar condenação a pena de morte e a prisão perpétua, principalmente, na hipótese dos denominados de “crimes sem vítima”, dentre eles o tráfico internacional de drogas, que em alguns países possuem repressão severíssima, cominando sanção capital.
Ao cidadão brasileiro quando expulso ou extraditado do País onde é acusado da prática de ilícitos, caberá os custos do transporte ao solo pátrio, que integralizarão as despesas do processo-crime[11]. O governo brasileiro poderá a princípio, arcar estes custos e posteriormente cobrar administrativa ou judicialmente, por se tratar de dívida ativa de valor segundo as normas da legislação da Fazenda Pública.
Hoje existem aproximadamente 3.200 presos estrangeiros no Brasil, sendo que desse total 90% estão encarcerados por tráfico de drogas, na qualidade de “mulas” ou “laranjas”[12]. Se os presos estrangeiros fossem transferidos aos países de suas nacionalidades, aliviariam sobremaneira o custeio do sistema prisional, bem como aumentaria o numero de vagas nas cadeias públicas e penitenciárias brasileiras[13].
Pergunta-se. Por que manter os estrangeiros presos (provisórios e condenados) nos estabelecimentos penais do Brasil? Por que não entrega-los as autoridades de seus respectivos países, para que possam melhor se defender na língua de seu idioma pátrio e ainda receber visitas de seus familiares?
Nesse sentido, o expresso na Lei nº 6.815/1980 (Lei do Estrangeiro), precisa de aplicação e interpretação mais adequada, isto é, sempre em benefício da pessoa presa (regra geral e básica do direito penal democrático), o que melhor lhe convém (análise de escolha do direito processual-penal, forma de processamento e julgamento), comparativamente com os ditames expressos nos instrumentos internacionais de Direitos Humanos, prevalentes e hierarquicamente superiores à lei brasileira.
Art. 65. É passível de expulsão o estrangeiro que, de qualquer forma, atentar contra a segurança nacional, a ordem política ou social, a tranquilidade ou moralidade pública e a economia popular, ou cujo procedimento o torne nocivo à conveniência e aos interesses nacionais.
Art. 66. Caberá exclusivamente ao Presidente da República resolver sobre a conveniência e a oportunidade da expulsão ou de sua revogação.
Parágrafo único. A medida expulsória ou a sua revogação far-se-á por decreto.
Art. 67. Desde que conveniente ao interesse nacional, a expulsão do estrangeiro poderá efetivar-se, ainda que haja processo ou tenha ocorrido condenação.
Art. 89. Quando o extraditando estiver sendo processado, ou tiver sido condenado, no Brasil, por crime punível com pena privativa de liberdade, a extradição será executada somente depois da conclusão do processo ou do cumprimento da pena, ressalvado, entretanto, o disposto no artigo 67.
Art. 90. O Governo poderá entregar o extraditando ainda que responda a processo ou esteja condenado por contravenção.
Mutatis mutandis, em comparação aos ditames da lei pátria com as normas especificas de outros países (referente a expulsão), nos referindo a expulsão solicitada pelo governo brasileiro quando da existência de um cidadão preso no exterior, este portanto figura como estrangeiro. Ao nosso ver basta um requerimento administrativo do governo brasileiro (do Presidente da República) ao do País onde se encontrar um brasileiro preso, simples assim.
O Brasil dará exemplo ao mundo, repatriando os brasileiros presos no exterior, e extraditando ou expulsando todos os estrangeiros que se encontram presos no território nacional, transferindo o preso provisório e o preso condenado aos países de suas nacionalidades para que sejam processados, julgados e para que cumpram penas segundo as leis e regras de cada País.
Com este tipo de ação proativa em favor da dignidade e proteção do cidadão brasileiro preso, as autoridades governamentais com funções no Ministério das Relações Exteriores-MRE, no Ministério da Justiça e no Ministério Público melhor desempenharam seus ofícios voltados à cooperação jurisdicional internacional em matéria penal, dando exemplo ao mundo.
Assim a República Federativa do Brasil instituída como Estado Democrático de Direito se fundamentará verdadeiramente no princípio da reciprocidade e da prevalência dos Direitos Humanos, assegurando com efetividade - na prática – os direitos e garantias fundamentais individuais do cidadão brasileiro preso no exterior[14].
Acredita-se na eficiência administrativa (jurisdicional e diplomática) do Ministério da Justiça, do Ministério das Relações Exteriores (Embaixadas/Consulados do Brasil) e do Ministério Público (Procuradoria-Geral da República), para a suprema e imperiosa presteza do exercício legal de suas funções.
Por serem os Direitos Humanos universais, respeitam os valores regionais do planeta (ocidente e oriente), de acordo com suas características sociais, políticas e econômicas. Os Direitos Humanos não possuem fronteiras e nem nacionalidade, onde todo individuo detêm dignidade humana, no contexto amplo de uma cidadania global igualitária, sem discriminação ou qualquer distinção.
São as garantias fundamentais que asseguram os valores e a soberania das leis de cada País, sendo direito de todo cidadão ser devidamente processado e julgado por um juiz ou Tribunal imparcial do Estado de sua nacionalidade, regra essa prevalente à luz dos instrumentos internacionais de Direitos Humanos, que independe do lugar (País) aonde tenha ocorrido o ato ilícito. Esta é uma garantia mundial para todos os seres humanos, na proteção do direito a inviolabilidade da vida, da liberdade e da integridade física.
Se um governo estrangeiro, aceita e adota a pena de morte e a prisão perpétua em suas leis, seja por critério de política penal-penitenciária, é livre que o faça, mas em relação aos seus nacionais, e não como modelo de justiça criminal local em grave prejuízo aos Direitos Humanos de um cidadão estrangeiro, ainda mais quando seu País repugna veementemente a pena de morte e a prisão perpétua.
Notas e Referências:
[1] No Brasil, segundo o Código Penal o limite máximo de cumprimento da pena privativa de liberdade está fixado em 30 (trinta) anos (art. 75 CP); em outros sistemas legais a pena pode ser menor ou maior.
[2] Lei nº 11.343/2006 - Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.
Convenção Única sobre Entorpecentes (ONU/1961); Convenção sobre Substâncias Psicotrópicas (ONU/1971); Convenção Contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas (ONU/1998); Acordo Sul-Americano sobre Entorpecentes e Psicotrópicos (1973) Ver Mercosul e Unasul.
[3] "A Nova Criminologia à luz do Direito Penal e da Vitimologia" - Antonio Beristain (Espanha) Ed. UNB – Universidade de Brasília. Brasília, 2000, pgs. 193 (livro); original; “Nueva Criminologia, desde el Derecho Penal y la Victimologia”, ed. Tirant lo Blanc, Valencia, espana, 1994. Tradutor Maia Neto, Cândido Furtado.
[4] Carta Asiática dos Direitos Humanos 1977, Declaração por ONGs.
A Declaração de Bangkok, de 29 de março e 2 de abril de 1993, reuniu, não só representantes dos Estados da Ásia oriental, mas de toda a Ásia, presentes: Bahrain. Bangladesh. Butão, Brunei. China, Chipre, República Popular e Democrática da Coreia, Fiji, índia. Indonésia, Ira (República Islâmica do), Iraque, Japão, Kiribati, Kuwait. República Democrática Popular do Laos. Malásia. Maldivas. Mongólia, Myanmar. Nepal, Omã, Paquistão, Papua Nova Guiné. Filipinas, República da Coreia, Samoa. Singapura. Ilhas Salomão, Sri Lanka. República Árabe da Síria, Tailândia, Emirados Árabes Unidos e Vietnã. encontro que se realizou de acordo com a Resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas 46/116, de 17 de dezembro de 1997, em preparação para a Conferência Mundial sobre Direitos Humanos que se realizou em Viena, 1993.
[5] Carta Africana sobre Direitos Humanos e dos Povos teve sua origem na antiga Organização da Unidade Africana (OUA), substituída pela União Africana (UA), em 2000. A Resolução AHG/Dec. 115 (XVI), aprova o projeto da Carta Africana, em Banjul, Gâmbia (Janeiro/1981), entrando em vigor no ano de 1986.
[6] Declaração Islâmica Universal dos Direitos Humanos, de 1981; Declaração dos Direitos Humanos do Cairo, de 1990; Carta Árabe dos Direitos Humanos, 1994.
[7] Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (1950);Carta Social Europeia (1966/1999); Carta Social Europeia Revista (1966); Carta Europeia de Autonomia Local (1985); Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (2000/2009), outros...
[8] Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (OEA/1948); Carta Internacional Americana de Garantias Sociais (OEA/1948); Convenção Americana sobre Direitos Humanos / Pacto de San Jose da Costa Rica (OEA/1969). Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais "Protocolo de São Salvador" (OEA/1988); Princípios e Boas Práticas para a Proteção das Pessoas Privadas de Liberdade nas Américas (OEA / 2008).
[9] Maia Neto, Cândido Furtado: 41. "INCONSTITUCIONALIDADE DA EXECUÇÃO DA PENA DE PRISÃO: ABUSO DE AUTORIDADE E FLAGRANTE VIOLAÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS" (revisado). RT, Revista dos Tribunais; Publicação Oficial dos Tribunais de Justiça; Ano 83, n.707, Setembro de 1994 - São Paulo-SP. Direitos Humanos: Doutrinas Essenciais, vol II, Ed. RT, SP, 2011, pg. 385
[10] Se for a hipótese de crime com vítima direta, onde está possui o direito de indenização ou ressarcimento dos danos causados pelo crime. No Brasil essa situação está prevista no artigo 63 usque 68 do Código de Processo Penal (ação ex delicto), e no artigo 91 do Código Penal, como efeito da sentença condenatória.
[11] O art. 49 e segs. do Código Penal refere-se a aplicação da pena de multa, e está deve ser destinada ao fundo penitenciário criado para a manutenção do sistema prisional; quer dizer, transladado o preso brasileiro ao seu País, cabe ao magistrado incluir as despesas da transferência do exterior, no montante geral da pena de multa, retornando, desta forma, os valores para os cofres públicos.
[12] “Mula” do crime internacional de tráfico de drogas, significa que está transportando certa quantidade para terceiros (verdadeiros traficantes. “Laranja” do crime internacional de tráfico de drogas, refere-se a alguém que não tem a intenção de transportar entorpecente e pensa estar transportando outra coisa.
[13] O Brasil conta hoje com cerca de 700 mil presos em um sistema penitenciário que apresenta um déficit de 350 mil vagas. O custo médio mensal por preso gira em torno de R$ 2.400,00 (fonte CNJ/MJ/Defensoria Pública Federal/2012).
[14] Maia Neto, Cândido Furtado: "Os Novos Conceitos do Novo Direito Internacional-Cidadania, Democracia e Direitos Humanos". Editora América Jurídica; Rio de Janeiro-RJ/2002; in “JUSTIÇA E COOPERAÇÃO INTERNCIONAL EM MATÉRIA PENAL À LUZ DOS DIREITOS HUMANOS”, pgs.33/52.
Cândido Furtado Maia Neto é Procurador de Justiça – Ministério Público do Estado do Paraná. Pós Doutor em Direito. Mestre em Ciências Penais e Criminológicas. Especialista em Direito Penal e Criminologia. Expert em Direitos Humanos (Consultor Internacional das Nações Unidas – Missão MINUGUA 1995-96). Professor Pesquisador e de Pós-Graduação. Docente para Cursos Avançados de Direitos Humanos e Prática de Justiça Criminal no Estado Democrático. Secretário de Justiça e Segurança Pública do Ministério da Justiça (1989/90). Membro da Associação Nacional de Direitos Humanos (Andhep) e da Sociedade Europeia de Criminologia. Condecorado com Menção Honrosa na V edição do Prêmio Innovare (2008). Cidadão Benemérito do Paraná (Lei nº 15.721/2007). Autor de inúmeros trabalhos jurídicos publicados no Brasil e no exterior. www.direitoshumanos.pro.br
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