De 2015 a 2016: estamos no “buraco de minhoca”?

31/12/2015

Por Tiago Gagliano Pinto Alberto - 31/12/2015

Olá a todos!!!

A astronomia tem se empenhado em estudar a origem e o conteúdo dos chamados buracos negros, assim como o seu contraponto, o buraco branco. Parece que a versão mais aceita da substância existente em ambos os eventos é, ao mesmo tempo, o tudo e o nada. Karl Schwarzschild (1873-1916), astrônomo alemão que descobriu o que hoje entendemos como buraco negro, explicou, nas palavras do físico Carlos Alberto dos Santos, que “quando um corpo muito massivo colapsa devido ao seu próprio peso, ele atingirá um tamanho crítico a partir do qual se transformará em um ponto com densidade infinita, onde as leis da física deixarão de valer, e até mesmo o tempo deixará de existir. Na linguagem científica, o ponto encontrado por Schwarzschild era denominado singularidade no espaço-tempo e tinha em sua volta um intenso campo gravitacional.”[1].

Einstein, ao que relata o físico brasileiro, teria evoluído a teoria de Shwarzschild ao compreender que as singularidades indicariam a existência de um buraco negro, um buraco branco na outra ponta e, ligando-os, o que denominou “buraco de minhoca”, derivada da chamada “ponte Einstein-Rosen (ponte ER)”[2], que ligaria o nosso universo a um universo paralelo.

Os eventos podem, então, sob o ponto de vista de um leigo, ser descritos assim: i) no buraco negro, as leis da física deixam de valer; os corpos colapsam sobre o seu próprio peso; e os corpos atingem densidade infinita; ii) o buraco de minhoca funciona como uma espécie de túnel, ligando o universo como conhecemos atualmente a um universo paralelo que desconhecemos; iii) e, finalmente, o buraco branco é o outro lado do buraco negro, por onde saímos, supostamente, após passar pelo túnel.

Dito isso, traçando um paralelo com o nosso ano de 2015, vejamos aonde exatamente nos encontramos.

Em breve retrospectiva, não há como deixar de dizer que esse ano de 2015 foi, no mínimo, animado. De “Operação Lava-jato” a impeachment, tivemos de tudo, tanto no ácido e lamacento terreno da política, como em discussões jurídicas e sociais interessantes. Homens com várias mulheres, mulheres com vários homens; famílias com diversos rótulos...[3]

Parece que estamos de fato colapsando em nossa própria massa. Vivemos algo como um buraco negro da existência brasileira. O ano de 2015 pode ser chamado de várias coisas, menos de monótono. “Nunca antes na história desse país”, parafraseando o protagonista que virou antagonista, tivemos tamanha corrupção descoberta e lotação de políticos em carceragens; e ainda faltam alguns... Por outro lado, se o criador gerou criatura, de suas entranhas não parece ter brotado boa coisa. Atribui-se a Sêneca o dito famoso segundo o qual “nenhum vento sopra a favor de quem não sabe para onde ir”. É exatamente isso o que visualizamos em nosso dia-a-dia.

Inflação em alta, dólar no mesmo sentido, política econômica indefinida, política enquanto politicagem bem definida (no sentido do caos), sociedade confusa e pilantragem em alta. Dá para dizer que sabemos para onde vamos?

Retomando o paralelo com a astronomia...

Se existe um “buraco de minhoca”, é exatamente o que vimos acontecer no ano de 2015. Após colapsar em si mesmo, o Brasil fez um excelente trabalho ao demonstrar suas dificuldades ao mundo. Desde acidentes ambientais de proporções dantescas até a incrível demonstração de como podemos ser tão descarados no quesito gatunagem, tivemos a oportunidade de nos tornar ainda mais conhecidos no mundo inteiro pela nossa, digamos, peculiaridade brasileira.

Estamos em um espaço de tudo e nada ao mesmo tempo, assim como no buraco negro. Desse modo, não há como deixar de dizer, em contraponto ao que transparece como ruim, que também as instituições sérias estão trabalhando – e muito. A Polícia Federal, Ministério Público Federal e Poder Judiciário estão exercendo um papel cívico muito importante no descortino da corrupção que entremeia a nossa “pátria-amada Brasil”. A operação “Lava-jato” é um marco, já reconhecido como tal, que trouxe crédito a quem exerce seu papel público honestamente, ademais de influenciar positivamente a sociedade como um todo. Tenho certeza que após a prisão de tantos seres de difícil definição existentes no lamaçal político, todos os que exercem a sua labuta diária nas mais áridas condições se sentiram orgulhosos do funcionamento das Instituições públicas; e, por isso, passaram a trabalhar com muito mais satisfação.

Claro, o exemplo da Lava-jato é apenas um entre os muitos existentes e que não são diariamente alardeados. Mas é marcante e, como tal, deve mesmo ser comemorado e chamado à tona para lembrar que se, por um lado, já colapsamos em nossa própria massa, estamos também atravessando um túnel, um buraco de minhoca, rumo a algo que não se sabe exatamente o que significa, um universo paralelo em que possamos, por exemplo, reler esta coluna e, a partir dela, concluir que saímos por um buraco branco que, em todo seu esplendor, demonstre-nos uma nova realidade, algo em que possamos acreditar e viver efusivamente.

Acredito no ano de 2016 para isso. Não que, de uma hora para outra, deixaremos de ter crises, problemas, gatunagens ou situações similares. Não. Infelizmente ainda veremos muito disso ocorrer. Não é preciso ser vidente-de-fim-de-ano para dizer que em 2016 ainda enfrentaremos muitas situações que nos deixarão envergonhados, embaraçados perante o público, com vergonha de dizer que habitamos neste “ortinorríntico” país, ou, ainda, que elegemos certa escória para nos representar. Mas, se para atravessar o buraco negro temos necessariamente que colapsar, de outro tanto, por intermédio desse colapso, atingimos uma densidade infinita, ou seja, um marco por meio do qual poderemos, no futuro, dizer que vivemos no fosso e dele escapamos; que saímos da miséria e rumamos à saúde, boas práticas, educação plena; que evoluímos da corrupção endêmica para a controlada, com destino a, quem sabe, o alcance da civilidade; e que, enfim, atravessamos o buraco de minhoca e, ao sair pelo buraco branco, fizemos do nosso universo paralelo uma nova casa, de esperança, alegria, felicidade e alteridade.

Tudo isso para 2016! Parece muito para esperar?! Não sei, mas ao menos, novamente trazendo Sêneca ao debate, já temos uma direção de vento para nos deixar conduzir.

Excelente 2016 e boas festas!

Um grande abraço a todos. Compartilhe a paz!


Notas e Referências:

[1] Texto disponível em http://cienciahoje.uol.com.br/colunas/do-laboratorio-para-a-fabrica/buraco-negro-buraco-branco-e-buraco-de-minhoca. Acesso em 27 dezembro de 2015.

[2] Referência a um texto escrito por Einstein e Nathan Rosen (1909-1995), físico israelense, em 1935.

[3] Veja-se, a título de exemplo, o seguinte caso: https://noticias.gospelprime.com.br/primeiro-casamento-3-mulheres-brasil/ Acesso em 16/12/2015. Não estou tecendo qualquer juízo valorativo, mas meramente descritivo, assinalando o ineditismo desta situação.


 

thiago galiano

Tiago Gagliano é Doutor em Direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Professor da Escola da Magistratura do Estado do Paraná (EMAP). Professor da Escola da Magistratura Federal em Curitiba (ESMAFE). Coordenador da Pós-graduação em teoria da decisão judicial na Escola da Magistratura do Estado de Tocantins (ESMAT). Membro fundador do Instituto Latino-Americano de Argumentação Jurídica (ILAJJ). Juiz de Direito Titular da 2ª Vara de Fazenda Pública da Comarca de Curitiba.


Imagem Ilustrativa do Post: Lonely Galaxy Lost in Space // Foto de: NASA Goddard Space Flight Center//

Sem alterações

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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


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