Da desnecessidade de ordem judicial para quebra de sigilo de dados telefônicos pela autoridade policial

20/03/2016

Por Alexander Meurer - 20/03/2016

O sigilo das comunicações telefônicas é protegido no inciso XII, do art. 5º da Constituição da República, e o sigilo das informações contidas no diálogo efetivado entre os interlocutores só pode ser quebrado mediante a competente ordem judicial, nas hipóteses e na forma da lei n.º 9.296/1996.

"Constituição da República Federativa do Brasil

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;"

"Lei n.º 9.296/96.

Art. 1º A interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o disposto nesta Lei e dependerá de ordem do juiz competente da ação principal, sob segredo de justiça.

Parágrafo único. O disposto nesta Lei aplica-se à interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática.

Art. 2° Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer qualquer das seguintes hipóteses:

I - não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal;

II - a prova puder ser feita por outros meios disponíveis;

III - o fato investigado constituir infração penal punida, no máximo, com pena de detenção.

Parágrafo único. Em qualquer hipótese deve ser descrita com clareza a situação objeto da investigação, inclusive com a indicação e qualificação dos investigados, salvo impossibilidade manifesta, devidamente justificada.

Art. 3° A interceptação das comunicações telefônicas poderá ser determinada pelo juiz, de ofício ou a requerimento:

I - da autoridade policial, na investigação criminal;

II - do representante do Ministério Público, na investigação criminal e na instrução processual penal."

Com efeito, o sigilo dos dados telefônicos, que se vincula aos elementos referentes aos titulares das linhas, aos numerais de IMEI,  aos Sim Cards (“chips”), bem como às ligações efetivadas e recebidas por tal ou qual linha telefônica, não ficou abrangido em tal dispositivo, e mais recentemente passou a ser compreendido como alocado no inc. X do art. 5º da Constituição Brasileira, transmutando-se em uma das facetas do direito à intimidade.

"Constituição da República Federativa do Brasil

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;"

Nesse sentido lecionado o Ministro Gilmar Mendes,

"não se confundem comunicação telefônica e registros telefônicos, que recebem, inclusive, proteção jurídica distinta. Não se pode interpretar a cláusula do artigo 5º, XII, da CF, no sentido de proteção aos dados enquanto registro, depósito registral. A proteção constitucional é da comunicação de dados e não dos dados”.  (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 91.867/PA. Relator: Ministro Gilmar Mendes. Brasília /DF: DJ 24.04.2012).

Não se olvide que tal direito é sobremaneira importante, pois protege informações ligadas à vida pessoal do cidadão, e por tal tais dados devem, em regra, ficar fora do alcance do Estado, exigindo-se justa causa para que autoridades públicas tenham acesso a eles, quando forem do interesse de investigações criminais.

No entanto, a par de sua importância, de forma diversa ao sigilo dos dados bancários e fiscais (art. 5º, inc. X, da Constituição), da busca e apreensão domiciliar (art. 5º, inc. XI da Constituição) e da interceptação das comunicações telefônicas (art. 5º, inc. XII, da Constituição), o direito ao sigilo dos dados telefônicos não está abarcado pela cláusula de reserva de jurisdição, por falta de previsão para tanto.

Nesse sentido, ensina Renato Brasileiro de Lima

"Destarte, o objeto da lei n.º 9.296/96 não abrange a quebra do sigilo de dados telefônicos. Como já se manifestou a jurisprudência, a  Lei n.º 9.296/96 é aplicável apenas às interceptações telefônicas (atuais, presentes), não alcançando os registros telefônicos relacionados a comunicações passadas. Logo, a quebra do sigilo dos dados telefônicos contendo os dias, os horários, a duração e os números das linhas chamadas e recebidas, não se submete à disciplina das interceptações telefônicas regidas pela lei 9.296/96. Em outras palavras, a proteção a que se refere o art. 5º, inciso XII, da Constituição Federal, é da comunicação de dados, e não dos dados em si mesmos.

Portanto, diversamente da interceptação telefônica, a quebra do sigilo de dados telefônicos não está submetida à clausula de reserva de jurisdição. Logo, além da autoridade judiciária competente, Comissões Parlamentares de Inquérito também podem determinar a quebra do sigilo de dados telefônicos com base em seus poderes de investigação (CF, art. 28, §3º), desde que o ato deliberativo esteja devidamente fundamentado." (LIMA, Renato Brasileiro de. Legislação Penal Especial Comentada. 2. ed. Salvador/BA: JusPodivm, 2014. p. 142. Grifos nossos).

Ora, cediço é que, quando a Constituição exige prévia ordem judicial para a obtenção de elementos de prova, não há outra maneira de acessá-los, requere-los ou executá-los diretamente por qualquer outro órgão ou autoridade do Estado.

É o que defende o Ministro Celso de Mello

"O postulado da reserva constitucional de jurisdição importa em submeter, à esfera única de decisão dos magistrados, a prática de determinados atos cuja realização, por efeito de explícita determinação constante do próprio texto da Carta Política, somente pode emanar do juiz, e não de terceiros, inclusive daqueles a quem se haja eventualmente atribuído o exercício de "poderes de investigação próprios das autoridades judiciais". A cláusula constitucional da reserva de jurisdição - que incide sobre determinadas matérias, como a busca domiciliar (CF, art. 5º, XI), a interceptação telefônica (CF, art. 5º, XII) e a decretação da prisão de qualquer pessoa, ressalvada a hipótese de flagrância (CF, art. 5º, LXI)- traduz a noção de que, nesses temas específicos, assiste ao Poder Judiciário, não apenas o direito de proferir a última palavra, mas, sobretudo, a prerrogativa de dizer, desde logo, a primeira palavra, excluindo-se, desse modo, por força e autoridade do que dispõe a própria Constituição, a possibilidade do exercício de iguais atribuições, por parte de quaisquer outros órgãos ou autoridades do Estado." (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança n° 23452/RJ. Relator: Ministro Celso De Mello. Brasília/DF. DJ 12-05-2000. Grifos nossos).

Isto posto, não se tratando de elementos de prova resguardados pela cláusula de reserva de jurisdição, e tratando-se de investigação criminal objetivando elucidar infração penal, o Poder Constituinte e o legislador infraconstitucional atribuíram prerrogativas ao Delegado de Polícia para que esse, como titular de investigação criminal, tenha autonomia e liberdade para requisitar as informações e diligências que entender pertinente na busca da verdade.

Trata-se do denominado Poder Requisitório do Delegado de Polícia, delineado no enunciado de número14, lavrado no II Encontro Nacional de Delegados de Polícia sobre Aperfeiçoamento da Democracia e Direitos Humanos:

"O poder requisitório do delegado de polícia, que abrange informações, documentos e dados que interessem à investigação policial, não esbarra em cláusula de reserva de jurisdição, sendo dever do destinatário atender à ordem no prazo fixado, sob pena de responsabilização criminal. "(Federação Nacional Dos Delegados De Polícia Civil. Enunciados do II Encontro Nacional dos Delegados sobre Aperfeiçoamento da Democracia e Direitos Humanos. 2015. Disponível em: http://fendepol.com/noticia/noticia.php?url=enunciados-encontro-nacional-delegados. Acesso em: 15/03/2016).

Nesse ínterim, as prerrogativas do cargo de Delegado de Polícia estão positivadas no artigo 6º, inc. III, do Código de Processo Penal, e, de forma mais específica e recente, no art. 2º, § 2º, da lei n.º 12.830/2013, os quais buscam validade no comando albergado no artigo 144, § 4º, da Constituição Federal.

"Constituição da República Federativa do Brasil

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.

"Código de Processo Penal – decreto-lei n.º 3689/1941

Art. 6º  Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá:

III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias;"

"Lei n.º 12.830/2013

Art. 2º  As funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais exercidas pelo delegado de polícia são de natureza jurídica, essenciais e exclusivas de Estado.

.2º Durante a investigação criminal, cabe ao delegado de polícia a requisição de perícia, informações, documentos e dados que interessem à apuração dos fatos."

Tais ditames constitucionais/infraconstitucionais  nada mais fizeram do que dotar o Delegado de Polícia, no exercício de suas funções, dos poderes necessários para o cumprimento de sua atividade fim: a busca da verdade na apuração de um fato penalmente relevante.

Como se percebe, a lei n.º 12.860/2013 positivou, de forma clara, o direito de a Autoridade Policial requisitar perícias, informações, documentos e dados, quando estiverem ligados diretamente à investigação criminal.

Dessa monta, inegável se tratar de prerrogativa da Autoridade Policial requisitar todo e qualquer tipo de dado que seja de interesse à apuração dos fatos em uma investigação policial, desde que esses dados não estejam abarcados pela cláusula de reserva de jurisdição.

Francisco Sannini Neto e Eduardo Luiz Santos Cabette, ao tratarem da lei n.º 12.830/2013, discorreram que

"o chamado “Poder Requisitório” do Delegado de Polícia, eis que no exercício de suas legítimas funções lhe é dado, por força da lei, o poder de requisitar quaisquer “informações, documentos e dados que interessem à apuração dos fatos”. É notório que os dados cadastrais e respectivas documentações constantes de arquivos e bancos de dados de empresas de telecomunicação móvel ou fixa ou mesmo de instituições financeiras, se adequam perfeitamente a essa espécie de informação a ser colhida diretamente pelo Delegado de Polícia na presidência do Inquérito Policial ou de qualquer outra investigação de Polícia Judiciária." (SANNINI NETO, Francisco; CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Poder requisitório do Delegado de PolíciaRevista Jus Navigandi, Teresina,ano 19n. 410022 set. 2014. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/32089>. Acesso em: 10 mar. 2016. Grifos nossos).

Nesse sentido é a jurisprudência dos Tribunais Superiores

"Não há ilegalidade na quebra do sigilo de dados cadastrais de linhas telefônicas os quais, conforme o tribunal de origem, foram obtidos por autoridade policial que recebeu de magistrado senha fornecida pela Corregedoria de Polícia Judiciária. Isso porque, conforme entendimentos do STF e do STJ, o disposto no artigo 5º, XII, da CF não impede o acesso aos dados em si, ou seja, o objeto protegido pelo direito à inviolabilidade do sigilo não são os dados em si, mas tão somente a comunicação desses dados. O entendimento do tribunal de origem é que sobre os dados cadastrais de linhas telefônicas inexiste previsão constitucional ou legal de sigilo, já que não fazem parte da intimidade da pessoa, assim como sobre eles não paira o princípio da reserva jurisdicional. Tal entendimento está em consonância com a jurisprudência do STJ." (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental em Habeas Corpus de n° 181546/SP. Relator: Ministro Marco Aurélio Bellizze. Brasília/DF. DJ 11/02/2014. DJe 18/02/2014. Brasília (DF).

Postas as premissas, evidencia-se que os registros telefônicos relacionados a comunicações passadas são inegavelmente espécies de dados, e que não estão eles protegidos pela cláusula de reserva de jurisdição, de forma que resta claro estar dentro das prerrogativas da Autoridade Policial o poder de requisitar tais elementos de prova diretamente às operadoras de telefonia.

Com efeito, esse poder deferido à Autoridade Policial evidentemente acarreta verdadeiro conflito de direitos fundamentais: de um lado está o direito à privacidade e à intimidade do suspeito/investigado; do outro, o direito do seio social, da coletividade, em ver solucionadas as demandas investigativas referentes a infrações penais.

Ora, é certo que as informações referentes aos dados telefônicos, dentre eles as ligações pretéritas efetuadas e recebidas pelos interlocutores, estão intrinsicamente vinculadas à vida íntima do indivíduo.

Porém, a mitigação desse segredo não atinge de maneira tão profunda a privacidade do sujeito, pois o Estado, via Autoridade Policial, não conhecerá o que foi falado ou escrito entre os colocutores.

O que ocorre é apenas a análise técnica de informes objetivos, ligados a contatos feitos entre comunicadores, tais como numerais usados, horas e locais das chamadas, localização das Estações Radio Base onde as linhas se conectaram, dados que em nada interferem no íntimo das relações interpessoais.

Ademais, nenhum direito se reveste de caráter absoluto. Como bem dito pelo professor Alexandre de Moraes

"Os direitos humanos fundamentais, dentre eles os direitos e garantias individuais e coletivos consagrados no art. 5º da Constituição Federal, não podem ser utilizados como um verdadeiro escudo protetivo da prática de atividades ilícitas, tampouco como argumento para afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de total consagração ao desrespeito a um verdadeiro Estado de Direito". (MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 18. ed. São Paulo/SP: Atlas, 2005, p. 27).

Nos mesmo sentido é o ministro Celso de Mello

"Não há, no sistema constitucional brasileiro, direitos ou garantias que se revistam de caráter absoluto, mesmo porque razões de relevante interesse público ou exigências derivadas do princípio de convivência das liberdades legitimam, ainda que excepcionalmente, a adoção, por parte dos órgãos estatais, de medidas restritivas das prerrogativas individuais ou coletivas, desde que respeitados os termos estabelecidos pela própria Constituição. O estatuto constitucional das liberdades públicas, ao delinear o regime jurídico a que estas estão sujeitas - e considerado o substrato ético que as informa - permite que sobre elas incidam limitações de ordem jurídica, destinadas, de um lado, a proteger a integridade do interesse social e, de outro, a assegurar a coexistência harmoniosa das liberdades, pois nenhum direito ou garantia pode ser exercido em detrimento da ordem pública ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros." (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança de n°23452/RJ . Relator: Ministro Celso de Mello. Brasília/DF. DJ 16/09/1999. DJe 12/05/2000. Brasília (DF).

Diante disso, diante do conflito entre o direito à privacidade do indivíduo, nele compreendido o dos dados de suas comunicações (mas não as comunicações em si), e o interesse público exteriorizado em uma investigação criminal que visa elucidar uma infração penal, deve esse último prevalecer.

Nesse sentido já se posicionou o Supremo Tribunal Federal, ao analisar tema análogo, a regra posta no art. 41, p. único, da Lei de Execução Penal, lei n.º 7.210/1984, que prevê que a possibilidade de a autoridade administrativa responsável pela gestão de presídio interceptar correspondências de presos que se destinem ao exterior do presídio.

Nesse caso, entendeu a Corte Máxima do país que o direito à privacidade e à intimidade do preso deve ceder espaço aos ditames de segurança pública, disciplina prisional e a própria preservação da ordem jurídica, uma vez que “a cláusula tutelar da inviolabilidade do sigilo epistolar não pode constituir instrumento de salvaguarda de práticas ilícitas” (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n° 70.814-5/SP. Relator: Ministro Celso de Mello. Brasília/DF. DJ 01/03/1994. DJe 24/06/1994).

Sob a mesma logica, sopesando os valores constitucionais em confronto, evidentemente deve prevalecer aquele que vai ao encontro do bem da sociedade, e sendo a segurança pública mais do que um dever do Estado, mas um direito e uma responsabilidade de todos (art. 144, caput, da Constituição da República), deve ser instrumentalizada de forma tal que garanta ao cidadão uma investigação policial de qualidade, séria, célere e eficaz.

Com efeito, o Estado tem de garantir as ferramentas necessárias para que os órgãos de investigação criminal possam exercer seu mister, mas sem deixar de lado a preservação de suas garantias e de seus direitos fundamentais. Vale dizer, há de existir uma coexistência pacífica e equilibrada entre os direitos do Estado investigador e os do cidadão investigado.

É nesse sentido o Poder Requisitório do Delegado de Polícia: "Deve a Autoridade Policial ter em mãos a capacidade de requisitar, de forma rápida e eficiente, diretamente, toda e qualquer informação necessária à elucidação de uma infração penal, desde que não esteja sob o manto da cláusula de reserva de jurisdição, sempre com vistas a buscar a verdade sobre fatos juridicamente relevantes, e ao mesmo deve o Delegado de Polícia garantir que os elementos de prova coletados sejam usados, única e exclusivamente, no bojo do procedimento policial, com objetivo de elucidar a infração penal, observando o direito ao sigilo de tais informações." (CASTRO, Henrique Hoffmann Monteiro de. Requisição de dados é imprescindível na busca do delegado pela verdade. Revista Consultor Jurídico, fev. 2016. Disponível em: < http://www.conjur.com.br/2016-fev-02/academia-policia-poder-requisitorio-delegado-essencial-busca-verdade>. Acesso em: 15/03/2016.)

Ademais, tendo a Autoridade Policial tais dados em seu poder, por prerrogativa funcional, também tem o dever legal de resguardá-los, sobe pena de incorrer no ilícito penal de violação de sigilo profissional, previsto no art. 325, do Código Penal Brasileiro, além de eventuais sanções administrativas, próprias da instituição a que seja vinculado.

"Código Penal Brasileiro – decreto lei n.º 2848/1940

Violação de sigilo funcional

Art. 325 - Revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em segredo, ou facilitar-lhe a revelação:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa, se o fato não constitui crime mais grave."

Desta monta, entender que está abarcado pelo Poder Requisitório do Delegado de Polícia o direito/dever de colher todo e qualquer dado referente às comunicações telefônicas, desde que ligadas a uma investigação criminal, significa elevado avanço no cumprimento do direito à segurança pública, sem olvidar dos direitos fundamentais. (CASTRO, Henrique Hoffmann Monteiro de. Requisição de dados é imprescindível na busca do delegado pela verdade. Revista Consultor Jurídico, fev. 2016. Disponível em: < http://www.conjur.com.br/2016-fev-02/academia-policia-poder-requisitorio-delegado-essencial-busca-verdade>. Acesso em: 15/03/2016).

Sob outra ótica, é cediço que o Delegado de Polícia, quando em seu mister, determina a apreensão de aparelhos celulares e/ou equipamentos equiparados em investigações policiais em andamento, pode também determinar o acesso aos registros das ligações pretéritas gravadas nos eletrônicos, sendo prescindível ordem judicial para tanto.

Nesse sentido se manifestou o Supremo Tribunal Federal

"Suposta ilegalidade decorrente do fato de os policiais, após a prisão em flagrante do corréu, terem realizado a análise dos últimos registros telefônicos dos dois aparelhos celulares apreendidos. Não ocorrência. 2.2 Não se confundem comunicação telefônica e registros telefônicos, que recebem, inclusive, proteção jurídica distinta. Não se pode interpretar a cláusula do artigo 5º, XII, da CF, no sentido de proteção aos dados enquanto registro, depósito registral. A proteção constitucional é da comunicação de dados e não dos dados. 2.3 Art. 6º do CPP: dever da autoridade policial de proceder à coleta do material comprobatório da prática da infração penal. Ao proceder à pesquisa na agenda eletrônica dos aparelhos devidamente apreendidos, meio material indireto de prova, a autoridade policial, cumprindo o seu mister, buscou, unicamente, colher elementos de informação hábeis a esclarecer a autoria e a materialidade do delito (dessa análise logrou encontrar ligações entre o executor do homicídio e o ora paciente). Verificação que permitiu a orientação inicial da linha investigatória a ser adotada, bem como possibilitou concluir que os aparelhos seriam relevantes para a investigação. 2.4 À guisa de mera argumentação, mesmo que se pudesse reputar a prova produzida como ilícita e as demais, ilícitas por derivação, nos termos da teoria dos frutos da árvore venenosa (fruit of the poisonous tree), é certo que, ainda assim, melhor sorte não assistiria à defesa. É que, na hipótese, não há que se falar em prova ilícita por derivação. Nos termos da teoria da descoberta inevitável, construída pela Suprema Corte norte-americana no caso Nix x Williams (1984), o curso normal das investigações conduziria a elementos informativos que vinculariam os pacientes ao fato investigado. Bases desse entendimento que parecem ter encontrado guarida no ordenamento jurídico pátrio com o advento da Lei 11.690/2008, que deu nova redação ao art. 157 do CPP, em especial o seu § 2º (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 91.867/PA. Relator: Ministro Gilmar Mendes. Brasília /DF: DJ 24.04.2012. Grifos nossos)."

Como se percebe, o fato de ter sido verificado o registro das últimas chamadas efetuadas e recebidas nos aparelhos celulares apreendidos em poder de investigados, cujos registros se encontravam gravados nos próprios eletrônicos, não configura quebra do sigilo telefônico.

Desta feita, a possibilidade de a Autoridade Policial verificar, diretamente com as operadoras, as ligações efetuadas e recebidas, bem como a localização das Estações Rádio Base – ERB’s de numerais telefônicos de pessoas apontadas como suspeitas de terem praticado infrações penais, é conduta idêntica à realização da análise das ligações efetivadas e recebidas diretamente nos aparelhos apreendidos.

Com efeito, sobre esse tema, o Ministro Luiz Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, ao jugar o Habeas Corpus de n.º 124.322/RS, que trata da possibilidade de a Autoridade Policial requisitar diretamente à operadora os dados colhidos por uma estação de celular em determinada data, hora e local, definiu que é atribuição do Delegado de Polícia coletar tais informações diretamente, não existindo vícios na falta de ordem judicial para tanto.

Pela importância do julgado, faz-se mister a transcrição na íntegra da decisão:

"A obtenção direta pela autoridade policial de dados relativos à hora, ao local e à duração das chamadas realizadas por ocasião da prática criminosa não configura violação ao art. 5º, XII, da CF/88. Precedentes. 2. Habeas Corpus a que se nega seguimento.

Decisão: 1. Trata-se de habeas corpus, com pedido de concessão de medida liminar, impetrado contra acórdão unânime da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, da relatoria da Ministra Maria Thereza de Assis Moura, assim do: PENAL. HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO, DESCAMINHO E TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. PRÉVIO MANDAMUS DENEGADO. PRESENTE WRIT SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. INVIABILIDADE. VIA INADEQUADA. INVIOLABILIDADE DO SIGILO DO TEOR DAS COMUNICAÇÕES E DOS DADOS TRANSMITIDOS PELA VIA TELEFÔNICA. ANTERIOR JUDICIAL PARA A QUEBRA. INDISPENSABILIDADE. SOLICITAÇÃO DA AUTORIDADE POLICIAL À OPERADORA DE TELEFONIA MÓVEL. EMPRESA RESPONSÁVEL POR ESTAÇÃO DE RÁDIO-BASE. REGISTROS DOS NÚMEROS DE TELEFONES DA LOCALIDADE. DADOS CADASTRAIS EXTERNOS À COMUNICAÇÃO. DATA E HORÁRIO DO DELITO INVESTIGADO. PRÉVIA AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. NÃO EXIGÊNCIA. EVENTUAL EXCESSO COM OS REGISTROS LOGRADOS. POSTERIOR SUBMISSÃO AO CONTROLE DO PODER JUDICIÁRIO.POSSIBILIDADE. AUTORIZAÇÃO DO MAGISTRADO PARA A QUEBRA DO SIGILO DO TEOR DAS COMUNICAÇÕES. OCORRÊNCIA. REGISTROS ANTERIORMENTE OBTIDOS PELA AUTORIDADE JUDICIAL QUE DELIMITARAM O REQUESTADO. PROVA EMPRESTADA. SUPOSTAS EIVAS. DEFICIÊNCIA NA INSTRUÇÃO.CONSTRANGIMENTO ILEGAL. NÃO VERIFICAÇÃO. AUSENTE DOCUMENTAÇÃO COMPROBATÓRIA NOS AUTOS. CONSIDERAÇÕES DAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. ARRIMO NO COLACIONADO AOS AUTOS ORIGINÁRIOS. ENTENDIMENTO DIVERSO. AFERIÇÃO. REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. INVIABILIDADE.FLAGRANTE ILEGALIDADE. INEXISTÊNCIA. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. 1. É imperiosa a necessidade de racionalização do emprego do habeas corpus, em prestígio ao âmbito de cognição da garantia constitucional e em louvor à lógica do sistema recursal. In casu, foi impetrada indevidamente a ordem como substitutiva de recurso ordinário. 2. O teor das comunicações efetuadas pelo telefone e os dados transmitidos por via telefônica são abrangidos pela inviolabilidade do sigilo - artigo 5.º, inciso XII, da Constituição Federal -, sendo indispensável a prévia autorização judicial para a sua quebra, o que não ocorre no que tange aos dados cadastrais, externos ao conteúdo das transmissões telemáticas. 3. Não se constata ilegalidade no proceder policial, que requereu à operadora de telefonia móvel responsável pela Estação Rádio-Base o registro dos telefones que utilizaram o serviço na localidade, em dia e hora da prática do crime. 4. A autoridade policial atuou no exercício do seu mister constitucional, figurando a diligência dentre outras realizadas ao longo de quase 7 (sete) anos de investigação. 5. Ademais, eventuais excessos praticados com os registros logrados podem ser submetidos posteriormente ao controle judicial, a fim de se verificar qualquer achincalhe ao regramento normativo pátrio. 6. In casu, a autoridade policial não solicitou à operadora de telefonia o rol dos proprietários das linhas telefônicas ou o teor do colóquio dos interlocutores, apenas os numerários que utilizaram a Estação de Rádio-Base na região, em período adstrito ao lapso delitivo, não carecendo de anterior decisão judicial para tanto, sobressaindo, inclusive, a necessidade da medida policial adotada, que delimitou a solicitação para a quebra do sigilo das conversas dos interlocutores dos telefones e da identificação dos números que os contactaram, feita perante o Juízo competente, que aquiesceu com a obtenção do requestado. 7. A alegação defensiva de eivas na juntada de prova emprestada de outros feitos não pode ser objeto de exame, pois deixou-se de proceder à demonstração do asserido, mediante documentação comprobatória suficiente, que evidenciasse a tese, não sendo possível apurar, portanto, qualquer ilegalidade. 8. Impende ressaltar que cabe ao impetrante a escorreita instrução do habeas corpus, indicando, por meio de prova pré-constituída, o alegado constrangimento ilegal. 9. Ao refutar a ocorrência de pecha na juntada do conteúdo de autos diversos, enalteceu o magistrado singular que o juiz titular do feito, atendendo ao requerimento da autoridade policial, remeteu cópia integral dos autos, tendo o Colegiado de origem salientado a inexistência de qualquer ilicitude da prova emprestada, uma vez que precedida de autorização judicial, sendo anexado ainda cópia integral aos autos, restando garantido, portanto, o pleno exercício dos princípios constitucionais do contraditório e ampla defesa. 10. Com arrimo no acervo dos autos originários, a conclusão da instância ordinária não é passível de exame, pois, para se adotar diverso entendimento, há necessidade de revolvimento do acervo fático-probatório, providência incabível na via estreita do habeas corpus. 11. Habeas corpus não conhecido. 2. Extrai-se dos autos que o paciente foi denunciado pela suposta prática dos crimes de roubo qualificado, contrabando ou descaminho e tráfico de entorpecentes. Segundo a denúncia, a partir da análise de dados implicados nas operações Plata e Lince da Polícia Federal, apurou-se que o ora paciente, acusado de ser um dos líderes de organização criminosa que atuaria no contrabando/descaminho em larga escala na fronteira com o Uruguai, teria determinado o roubo de carga anteriormente apreendida pela Inspetoria da Receita Federal de Jaguarão/RS e guardada na Estação Aduaneira de Fronteira (porto seco) de Jaguarão/RS. 3. Após o recebimento da denúncia, defesa requereu ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em sede de habeas corpus, o reconhecimento da ilegalidade da prova decorrente do monitoramento telefônico. Além disso, sustentou a invalidade da prova emprestada, relativa às Operações Lince e Plata. 4. O Tribunal Regional, por maioria de votos, denegou a ordem por entender ausente qualquer ilegalidade na obtenção, diretamente pela autoridade policial, dos números de telefones que foram utilizados em uma determinada localidade, não havendo sequer indicação do proprietário da linha, tampouco o teor das conversas. Relativamente à prova emprestada, a Corte afastou a nulidade arguida pela defesa, tendo em vista que a juntada aos autos da ação penal teria sido precedida de autorização judicial. O acórdão foi assim ementado: Processo penal. Habeas corpus. Estação rádio-base. Números utilizados em determinada localidade. Garantia constitucional (art. 5º, XII). Inaplicabilidade. Prova emprestada. 1. O inc. XII do artigo 5º da CF garante o sigilo das comunicações dos dados, mas não dos dados em si. Interpretação no sentido de que o sigilo se estende aos dados, ou seja, informações, contidas em qualquer suporte, físico ou eletrônico, inviabilizaria a produção de prova em qualquer processo judicial ou administrativo, pois o dispositivo autoriza a flexibilização apenas em relação às comunicações telefônicas, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal, em razão de sua instantaneidade e efemeridade. 2. Bem por isso, outras informações, como os dados cadastrais dos usuários, relações de chamadas e números que utilizaram determinada estação rádio base, não estão sujeitos à disciplina da Lei 9.296/96, que regulamenta a parte final do inc. XII do art. 5º. 3. Com muito mais razão não há falar em sigilo - com necessidade de prévia autorização judicial - nas hipóteses em que a informação obtida diretamente pela autoridade policial junto às companhias telefônicas restringiu-se aos números de telefones que foram utilizados em uma determinada localidade, não havendo sequer indicação do proprietário da linha, tampouco do teor das conversas efetivadas. 4. A Constituição somente submete à controle jurisdicional prévio, a chamada reserva de jurisdição, medidas de três ordens, a saber: a interceptação telefônica em sentido estrito (CF, art. 5º, XII); o ingresso em domicílio sem autorização do proprietário e fora dos casos de flagrante delito, desastre ou socorro (CF, art. 5º, XI e CPP, art. 241) e a prisão fora dos casos de flagrante delito, prisão militar ou crime militar (CF, art. 5º, LXI). Há, ainda, casos em que a legislação impõe autorização judicial prévia, como se dá, por exemplo, com a infiltração policial (Lei nº 9.034/95, art. V; Lei nº 11.343/06, art. 53, I). 5. Os demais atos administrativos, incluindo aqueles praticados pela autoridade policial, estão sujeitos apenas a controle jurisdicional a posteriori, ainda que impliquem restrição de direito fundamental. Afirmar que toda restrição a direito fundamental depende de prévia autorização judicial implicaria a paralisação da atuação policial e administrativa, e o banimento do poder de polícia do Estado. 6. Se toda e qualquer restrição da intimidade e da vida privada requeresse autorização judicial, seria necessário, sob pena de paralisação da atuação administrativa, que um juiz atuasse, exemplificativamente: a) em todas as patrulhas policiais, para autorizar eventuais buscas pessoais; b) em todos os postos aduaneiros, incluindo portos, aeroportos e alfândegas terrestres, para autorizar a abertura da bagagem dos viajantes; c) em todos os estabelecimentos prisionais, para examinar a legalidade de eventual revista em celas ou em visitantes. 7. Os direitos fundamentais não são absolutos de modo que a medida tomada pela autoridade policial que implique sua restrição é permitida, desde que seja proporcional, ou seja, necessária, adequada e proporcional em sentido estrito. 8. No caso dos autos, a medida era necessária, pois não havia outro modo de obter informação acerca dos possíveis autores do roubo da carga apreendida. 9. A medida era também adequada, pois serviu aos fins de identificar um grande número de ligações de telefones oriundos de Ribeirão Preto-SP, o que se confirmou como algo atípico no perfil dos usuários da região e levou à identificação de possíveis responsáveis pela autoria do fato. Ainda no requisito da adequação, destaco que a medida não representou uma devassa ou restrição desarrazoada da vida privada e da intimidade de terceiros. Isso porque o pedido limitou-se à obtenção dos números utilizados, partindo daí, após a análise dos dados, o pedido de interceptação, devidamente justificado, em relação a alguns terminais. Como se vê, do fornecimento dos números não resultou prejuízo algum para os demais usuários do serviço. Somente se poderia falar em violação indevida da vida privada se fosse revelada publicamente a localização de algum terceiro, de modo a expor algum fato desabonador, como o fato de estar naquele local e data um cônjuge infiel, um empregado em falta ao serviço ou um aluno gazeteiro. Não há notícia, porém, de qualquer utilização indevida das relações de números obtidas inicialmente as quais, não custa frisar, sequer identificavam os titulares das linhas. 10. Por fim, quanto à proporcionalidade em sentido estrito, verifico que se investigavam crimes graves, de tráfico de drogas e roubo majorado, este cometido com emprego de armas, por uma pluralidade de agentes, em um depósito aduaneiro, por agentes que, dissimuladamente, se fizeram passar por policiais federais, tendo por objeto carga descaminhada apreendida anteriormente, de alto valor. Como se vê, trata-se de delitos graves, pelo menos um deles cometido com ousadia e sofisticação, tendo por objeto bens sob a guarda da administração pública e colocando em risco a integridade corporal e a vida de servidores públicos e de particulares, demonstrando à saciedade que não se tratou de uma restrição desproporcionada. 11. Não há ilegalidade na prova emprestada - interceptação telefônica - quando precedida de autorização judicial, sendo anexada aos autos cópia integral de seu conteúdo, possibilitando o pleno exercício dos princípios constitucionais do contraditório e ampla defesa.” 5. No Superior Tribunal de Justiça, reiterou-se a alegação de invalidade do monitoramento telefônico decorrente da devassa, sem prévia autorização judicial, dos dados capturados pelas estações rádio-base de Jaguarão/RS. Da mesma forma, reafirmou-se que a prova emprestada teria sido importada de um processo a outro desacompanhada das decisões que autorizaram esse compartilhamento. 6. A Sexta Turma da Corte Superior de Justiça, em deliberação unânime, não admitiu a impetração e rejeitou a possibilidade da concessão da ordem de ofício por entender que: (i) a inviolabilidade do sigilo não abrange os dados cadastrais, sendo possível a sua obtenção sem prévia autorização judicial; (ii) a alegação de que não teria havido autorização judicial para a juntada aos autos da ação penal da integralidade dos feitos relativos às operações Plata e Lince contrariaria as informações prestadas pelo Juízo de origem e a premissa fática do acórdão regional. 7. No presente habeas corpus, sustenta-se o cabimento de habeas corpus substitutivo de recurso ordinário, na hipótese de coação ilegal manifesta”. No mérito, alega-se que a interceptação telefônica autorizada judicialmente decorreu de anterior diligência policial realizada sem o devido controle judicial. Afirma-se que a obtenção direta pela autoridade policial de dados relativos à hora, ao local e à duração das chamadas realizadas mediante a utilização da Estação Rádio Base de Jaguarão implicou a violação de informações privadas, protegidas pelo sigilo constitucionalmente assegurado. Sustenta-se, nesse contexto, a descoberta do terminal telefônico pertencente ao paciente e a posterior autorização judicial para a interceptação telefônica estariam contaminadas pela ilegalidade na origem da diligência, de modo que toda prova derivada deve ser excluída da ação penal. 8. Com base nesse arrazoado, requer-se, em sede liminar, a suspensão da ação penal e, no mérito, seja determinado o desentranhamento da prova impugnada. Decido. 9. A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal consolidou o entendimento no sentido da inadmissibilidade do uso da ação de habeas corpus em substituição ao recurso ordinário previsto na Constituição Federal (v.g HC 109.956, Rel. Min. Marco Aurélio,e HC 104.045, Rel.ª Min.ª Rosa Weber), de modo que, em rigor, a hipótese processual é a de não conhecimento da impetração. 10. Ademais, em análise preliminar, observa-se que o acórdão impugnado está em consonância com a orientação do Supremo Tribunal Federal no sentido de que não se confundem comunicação telefônica e registros telefônicos, que recebem, inclusive,proteção jurídica distinta. Não se pode interpretar a cláusula do artigo 5º, XII, da CF, no sentido de proteção aos dados enquanto registro, depósito registral. A proteção constitucional é da comunicação de dados e não dos dados (HC 91.861, Rel. Min.Gilmar Mendes). 11. Nessas condições, indefiro a liminar. Abra-se vista dos autos à Procuradoria-Geral da República. Publique-se. Brasília, 29 de outubro de 2014.Ministro Luís Roberto BarrosoRelatorDocumento assinado digitalmente. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n° 124322/RS. Relator: Ministro Roberto Barroso. Brasília/DF. DJ 29/10/2014. DJe 03/11/2014)."

Veja-se bem, se é possível ao Delegado de Polícia solicitas às operadoras, diretamente e sem ordem judicial, a quebra de sigilo de dados de uma Estação Rádio Base de telefonia, coletando informações que contém elementos não só de suspeitos de crimes, mas também de todo e qualquer cidadão que tenha feito uso de seu aparelho celular em região coberta por aquela torre de telefonia, nada há nada que desabone, então, ao mesmo Delegado solicitar, também de forma direta, os dados cadastrais de determinada linha, de determinado numeral de IMEI, com informações de hora, data, e local das chamadas efetuadas e recebidas, de numerais telefônicos e/ou aparelhos vinculados diretamente em investigações policiais que apurem práticas de infrações penais.

Desnecessário frisar que eventuais excessos por parte das Autoridades Policiais podem verificados a posteriori pela Autoridade Judiciária, pois os procedimentos em que se originam quebras do sigilo dos dados telefônicos e resultam em Inquéritos Policiais são remetidos ao Poder Judiciário, por força do §1º, do art. 10, do Código de Processo Penal:

"Art. 10.  O inquérito deverá terminar no prazo de 10 dias, se o indiciado tiver sido preso em flagrante, ou estiver preso preventivamente, contado o prazo, nesta hipótese, a partir do dia em que se executar a ordem de prisão, ou no prazo de 30 dias, quando estiver solto, mediante fiança ou sem ela.

1o A autoridade fará minucioso relatório do que tiver sido apurado e enviará autos ao juiz competente."

Ademais, todos os procedimentos investigativos, sejam registros de ocorrências, ofícios ou relatórios de informações, ficam armazenados nas Delegacias de Polícia, onde, em visitas in loco, é plenamente possível às Autoridade Judiciárias efetuarem o competente controle de legalidade das ações investigativas.

Sobre esse controle judicial posterior ao ato policial, a Suprema Corte, no julgamento do Recurso Extraordinário de n.º 603616, que teve repercussão geral reconhecida, por maioria de votos, na data de 05.11.2015, firmou a tese de que

"a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário N° 603616. Relator: Ministro Gilmar Mendes. Brasília, DF, De 05/11/2015. Provas obtidas mediante invasão de domicílio por policiais sem mandado de busca e apreensão. Brasília (DF): 09/11/2015. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/diarioJustica/listarDiarioJustica.asp?tipoPesquisaDJ=AP&numero=603616&classe=RE. Acesso em: 15/03/2016)."

Ora, se é possível o controle judicial a posteriori de um direito resguardado por cláusula de reserva de jurisdição, a inviolabilidade do domicílio, plenamente possível é a mesma espécie de controle sobre um direito que, a par de sua importância no ordenamento jurídico, não tem o mesmo tratamento pela Magna Carta.

Diante do exposto, conclui-se que o direito ao sigilo dos dados telefônicos não é amparado pela chamada reserva de jurisdição, e por tal, somado ao Poder Requisitório das Autoridades Policiais, estão os Delegados de Polícia devidamente autorizados pelo sistema legislativo pátrio e pela lógica jurisprudencial dos Tribunais Superiores, desde que por decisão por eles fundamenteda, a requisitar diretamente às operadoras de telefonia as informações sobre numerais de linhas a elas vinculados, os dados sobre seus titulares e seus elementos cadastrais, numerais de IMEIs, descrição de chamadas efetuadas e recebidas, localizações de estações rádio base onde os aparelhos se conectaram, bem como toda e qualquer informação necessária à elucidação de uma infração penal, resguardado ao Poder Judiciário o controle a posteriori de todos os atos de investigação que envolvam tais elementos de prova.


Alexander Meurer. Alexander Meurer é Bacharel em direito pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná - UNIOESTE, Campus de Francisco Beltrão/PR, curso do ano de 2007 a 2011. Agente de Polícia Civil do Estado de Santa Catarina no período de novembro do ano de 2009 a junho do ano de 2014. Delegado de Polícia do Estado do Paraná de junho do ano de 2009 até a atualidade. .


Imagem Ilustrativa do Post: FOR CHRISTS SAKE...IT'S CHRISTMAS!!! // Foto de: Isengardt // Sem alterações

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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


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