Alienação parental: análises, perspectivas e desafios no mundo jurídico

11/03/2017

Por Gabriela Araujo Souza Lima - 11/03/2017

1 - Introdução

A pretensão do presente artigo é antes de tudo esclarecer os institutos, suas realizações no direito moderno e descobrir o melhor guardião para o menor alienado, estabelecendo se é meio apto somente pelo Direito Civil ou se também deve sê-lo pelo Direito Penal.

O estudo sobre a Alienação Parental é de fundamental importância para o direito da família e o direito da criança e juventude, se tornando recentemente uma preocupação no direito criminal.

Esta temática enfatiza a necessidade de identificação dos casos em concreto, que geram a quebra da relação de um genitor com um infante ou menor, trazendo uma desordem emocional de vida para todos os envolvidos. O direito de família regula e ordena as relações familiares que são consagradas constitucionalmente como célula máster e núcleo da comunidade. A família, considerada a base social, é a primeira atingida pelos reflexos da Alienação Parental (LEITE, 2014, p.56).

A noção de Alienação Parental surgiu com o psicólogo Richard Gardner, em 1985, quando desempenhava função de investigação na Universidade de Columbia. Definiu-se o transtorno pelo qual um progenitor transforma a consciência dos seus filhos, mediante várias estratégias, com objetivo de impedir, ocultar e destruir os vínculos existentes com o outro progenitor, que surge principalmente no contexto da disputa da guarda e custódia das crianças, por meio de uma campanha de difamação contra um dos pais, sem justificação, resultando da combinação de um sistemático endoutrinamento (lavagem ao cérebro) [thought reform – reforma do pensamento] por parte de um dos progenitores e das próprias contribuições da criança, destinadas a denegrir o progenitor objeto desta campanha (GARDNER, 2001, p.55).

François Podevyn (2001) foi um dos responsáveis por difundir e despertar o interesse sobre a questão da Alienação Parental na Europa, explicando que há um efeito perverso em relação a ideia de que o interesse dos filhos é primordial e que o melhor genitor são ambos os pais, pois, se os pais não se entendem, o conflito é levado aos tribunais e se degenera numa guerra onde cada um procura demonstrar que o outro é um mau genitor.

A discussão em torno do problema que envolve as famílias em processos de separação, divórcio e guarda está acontecendo em várias partes do mundo, se tornando, portanto, uma preocupação mundial.

2 - Desafios da Alienação Parental no Brasil

No Brasil foi sancionada a Lei nº 12.318/2010, que dispõe sobre alienação parental e altera o artigo 236 da Lei nº 8.069 de 13 de junho de 1990, normatizando o assunto e introduzindo conceitos pouco discutidos pelo Poder Judiciário.

Pela perspectiva legal, “considera-se ato de Alienação Parental a interferência na formação psicológica da criança e do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este”. (Artigo 2° da Lei 12.318/2010).

De acordo com a Associação Brasileira Criança Feliz a alienação parental consiste em programar uma criança para odiar, sem motivo, um de seus genitores, até que a própria criança ingresse na trajetória de desconstrução desse genitor. (...) A alienação parental possui muitos rostos e fala muitas línguas. Pode manifestar-se de formas muito diferentes, mas todas elas configuram um abuso contra a criança prejudicando seu desenvolvimento emocional saudável e as relações afetivas primordiais (TRINDADE, 2014. p.8).

3 - Comportamentos que caracterizam a Alienação Parental

Pode-se dizer que os comportamentos que caracterizam a alienação parental são os mais diversos possíveis, que se encontram arrolados no parágrafo único, da Lei brasileira 12.318/2010, que dispõe o seguinte:

Parágrafo único.  São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros: I - realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade; II - dificultar o exercício da autoridade parental; III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor; IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar; V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço; VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente; VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós”.

Sobre a prática desses comportamentos, a Associação Brasileira Criança Feliz diz que “os filhos submetidos a essas situações, em geral, não têm consciência das verdadeiras causas de seu comportamento, preferindo aceitar as restrições transmitidas pelas mensagens do alienador quando eles próprios não possuem razões para se afastar do alienado” (Cartilha sobre Alienação Parental, Volume I, Associação Brasileira Criança Feliz).

No entanto, embora a alienação parental seja normalmente constatada quando se chega ao processo de divórcio e disputa pela guarda dos filhos, é possível que isso ocorra durante a relação conjugal. Isso é fato preocupante, pois em que pese a existência hoje de um ordenamento jurídico a esse respeito, não existem meios preventivos para a prática da Alienação Parental, antes de se chegar ao conhecimento das Varas de Família (TRINDADE, 2014, p.14).  

4 - Síndrome da Alienação Parental X Alienação Parental

A Alienação Parental (AP) difere-se da Síndrome de Alienação Parental (SAP) no exato ponto em que a última não é senão a consequência daquela.

Douglas Darnall (2009) chama de Alienação parental a fase que procede a Síndrome, ou seja, quando ainda não está introjetado na mente das crianças o aborrecimento do pai/mãe alienador em desfavor do alienado.

A síndrome da alienação parental não se confunde, portanto, com a mera alienação parental. Aquela geralmente é decorrente desta, ou seja, a alienação parental é o afastamento do filho de um dos genitores, provocado pelo outro, via de regra, o titular da custódia. A síndrome da alienação parental, por seu turno, diz respeito às sequelas emocionais comportamentais de que vem a padecer a criança vítima daquele alijamento (FONSECA, 2006, p. 164).

Via de regra, a alienação é a programação de uma criança para odiar um dos seus genitores, sendo uma prática de vingança do alienador contra seu ex-conjuge. É obtida por meio de um trabalho incessante, muitas vezes sutil, por parte do alienador, trabalho que requer tempo, e esta é uma estratégia de alienação, uma vez que o objetivo da síndrome é eliminar os vínculos afetivos entre o progenitor alienado e seu filho (MADALENO, 2015, p. 45).

Os atos mais comuns praticados pelo alienador são: desqualificar o outro genitor diante de terceiros; ocultar recados, e-mails, telefonemas ou presentes do alienado, apresentar o novo companheiro como pai ou mãe dos filhos; referir-se de modo pouco polido em relação ao(à) novo(a) companheiro(a) do genitor alvo; proibir que as crianças usem as roupas ou presentes dados pelo pai ou pela mãe ou falar que são feios; dizer que irá embora, ficará doente ou aplicará um castigo se o filho mantiver qualquer tipo de contato com o outro; impedir que o alienado participe de assuntos importantes relacionados aos filhos, como questões escolares ou de saúde; organizar inúmeras atividades com os filhos no período reservado às visitas do genitor alvo; envolver pessoas próximas na lavagem cerebral das crianças; culpar o outro pelo mau comportamento dos filhos; ameaçar de mudar-se para longe ou até mesmo para outro país; telefonar várias vezes aos filhos, sem motivo aparente, quando estão com o genitor alienado (DORNELES, 2013, p. 16).

No entanto, a alienação chega a uma situação crítica quando os atos insistentes do alienador conseguem atingir seu principal objetivo: afastar totalmente a criança do outro parente alienado, criando uma imagem negativa deste. Quando isso ocorre, caracteriza a Síndrome da Alienação Parental. Esta síndrome não se confunde com a própria ação alienadora, pois ela decorre da reiteração dessas ações de alienação, alimentando na criança ou no adolescente o ódio em relação ao outro genitor ou familiar, afastando-a totalmente do seu convívio.

A Síndrome (SAP) pode apresentar três estágios: leve, médio e grave. Inicialmente, com a campanha de desmoralização do alienador, tem-se o afastamento do filho do genitor alienado (estágio leve). Com a evolução da prática de alienação, o filho não deseja acompanhar-se do outro cônjuge (estágio médio). Finalmente, caracterizando o estágio grave, o filho alienado passa a não suportar qualquer laço de convivência do genitor alienado, passando a acreditar nas falsas memórias, que se tornam verdades, causando-lhe um grande trauma psicológico (ARAUJO, 2015, p.3).

Quando a Síndrome da Alienação Parental está instalada, na maioria dos casos surgem sérios problemas na formação e desenvolvimento da criança e do adolescente, causando danos psicológicos irreversíveis, conturbando seus sentimentos e tornando inevitável a destruição dos laços maternos ou paternos.

A expressão “síndrome” é causa de grande controvérsia entre os estudiosos do tema, em que as críticas mais recorrentes baseiam-se no fato de que a “Síndrome de Alienação Parental” não está prevista na CID-10 (Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde) nem no DSM-IV (Manual Diagnóstico e Estatístico de Doenças Mentais), e, por isso, não poderia receber tal denominação (DORNELES, 2013, p. 13).

Ao contrário desse entendimento, Jorge Trindade (2011) defende que o fato de a SAP, também conhecida como “síndrome dos órfãos de pais vivos”, não estar descrita no DSM-IV ou na CID-10, não exclui o seu reconhecimento. Existe, sobretudo, o que vemos na prática, na realidade de cada dia, pois as coisas existem independentemente do nome que se pode atribuir.

5 - Falsas acusações e crimes decorrentes da alienação parental

A alienação parental começou a ser discutida e ter mais repercussão no Direito de Família, pois recaía principalmente em ações de guarda dos filhos e direito de visitas.

No entanto, a prática alienatória deixou de ser restrita somente à área do direito civil, revelando-se na área do direito penal, em virtude de falsas acusações de crimes decorrentes da prática da alienação parental, caracterizando o crime de denunciação caluniosa, previsto no artigo 339, do Código Penal Brasileiro.

Podem ser imputados falsamente diversos crimes a um dos genitores em caso de alienação parental. Os crimes mais comuns são os de maus tratos e os crimes contra a dignidade sexual, em especial o estupro e abuso sexual.

Através dessas falsas acusações do alienador, de crime cometidos pelo alienado, surge a implantação de falsas memórias, ou Síndrome de falsas memórias, que não se confunde com alienação parental, nem com a síndrome dela decorrente.

Nesse sentido, Mônica Guazzelli (2010) define que o que denomina Implantação de Falsas Memórias advém, justamente, da conduta doentia do genitor alienador, que começa a fazer com o filho uma verdadeira “lavagem cerebral”, com a finalidade de denegrir a imagem do outro–alienado-, e pior ainda, usa a narrativa do infante acrescentando maliciosamente fatos não exatamente como estes se sucederam, e então a narrar à criança atitudes do outro genitor que jamais aconteceram ou que aconteceram em modo diverso do narrado.

Os casos mais graves da implantação das falsas memórias são as falsas denúncias de abuso físico, moral e sexual, onde os filhos alienados sofrem consequências preocupantes, capazes de interferir em seu desenvolvimento.

No entanto, apesar de uma denúncia falsa de abuso de qualquer natureza consistir, além de um crime, em uma atitude altamente reprovável, é inegável que aquela que envolve abuso sexual é a mais comprometedora, capaz de destruir a vida do genitor alienado, o qual poderá sofrer sanções na esfera cível e penal.

6 - Danos causados à vítima

A Alienação Parental consiste em prática extremamente grave, capaz de gerar consequências imensuráveis e, em inúmeros casos, irreversíveis para os envolvidos.

De acordo com Maria Berenice Dias (2010), a atitude de programar a criança ou adolescente a odiar um dos pais é levada a efeito pelo alienador (ou alienante). Chama-se de “alienado” tanto o genitor alvo quanto o filho vítimas dessa prática. O processo de alienação parental pode ser consciente ou não e, com intuito de afastar a criança do outro, é geralmente desencadeado pelo detentor da guarda.

Entretanto, as maiores vítimas desse processo são as crianças e os adolescentes, conforme será demonstrado adiante.

Richard Gardner (2001), a partir de sua experiência, conseguiu destacar durante avaliação familiar nas ações de custódia dos filhos, uma série de distúrbios vivenciados pela criança que sofrem a alienação parental, gerando sequelas que interferiram no seu desenvolvimento psicológico, descrevendo que nesse distúrbio vemos não somente a programação (“lavagem cerebral”) da criança por um genitor para denegrir o outro, mas também contribuições criadas pela própria criança em apoio à campanha denegratória do genitor alienador contra o genitor alienador.

A criança é a que mais sofre com a prática da alienação parental, uma vez que é usada como meio de vingança, passando a ter seus sentimentos manipulados e confundidos, sofrendo danos psicológicos que podem prejudicar seu desenvolvimento.

Portanto, quando os atos insistentes do alienador conseguem instalar a Síndrome (SAP), o comportamento infantil sofre alteração, onde o ódio e o desprezo ao genitor alienado são vigentes.

Os efeitos prejudiciais provocados pelos atos de alienação parental variam de acordo com a idade da criança ou do adolescente, sua personalidade, com o tipo de vínculo antes estabelecido e com a capacidade de resiliência do filho e do genitor alienado, além dos outros fatores, alguns mais explícitos, outros mais encobertos (TRINDADE, 2011, p.25).

A alienação parental pode desenvolver no menor significativos transtornos psiquiátricos e psicológicos, indissociáveis na sua vida, trazendo, portanto, sérios efeitos emocionais.

Os maiores danos emocionais causados nas crianças e nos adolescentes pela prática da alienação parental são: ansiedade, crise de pânico, tristeza, medo, desejo de isolamento, insegurança, depressão crônica, comportamento agressivo, transtornos de identidade e de imagem, desespero, culpa, falta de organização e dupla personalidade, podendo evoluir para condição de alcoólatra e drogado, numa extrema baixa autoestima, podendo em alguns casos chegar até mesmo ao suicídio (DORNELES, 2013, p. 19).

O diretor Allan Minas, em seu documentário “A morte inventada”, relata, por meio de depoimentos, como a alienação parental e suas consequências vitimam pais e filhos pela conduta dos alienadores. No depoimento de Rafaella, ela diz que ficou 11 anos sem conviver com o genitor, tendo em vista as mentiras contadas pela mãe, o que fez com que sentisse um vazio enorme pela falta do pai em seu crescimento (ANDRADE, 2017, p. 215).

Acerca dos danos causados pela Alienação Parental, Muriel Gustavo de Andrade (2017) afirma que os danos são tão devastadores, que vez ou outra, é noticiada em jornais as tragédias causadas pelos litígios conjugais decorrentes destes atos, como foi o caso de uma mãe que em 13/01/2015, em uma disputa judicial pela guarda das filhas, não se conformando com o fato de ter perdido a guarda para o ex-marido, ceifou a vida das filhas e depois suicidou.

Outro acontecimento trágico ocorrido em Campinas-SP, no início de Janeiro 2017, Sidnei Ramis de Araújo, que se encontrava em processo de regulamentação de convivência desde 2012, matou o filho, a ex-mulher e familiares, pela insatisfação da justiça que determinou visitas monitoradas, em virtude da acusação de sua ex-mulher pela pratica de abuso sexual contra seu filho, que não foi “cabalmente comprovada” (ANDRADE, 2017, p. 1).

Murillo Andrade (2017) faz uma correlação entre os atos de alienação parental e as mortes ocorridas em Campinas-SP, dizendo que estão na ineficiência do judiciário em dar uma resposta rápida às demandas de família, criando com isso vítima de dois lados: “De um, filhos órfãos de pais vivos, vítimas do judiciário arcaico e, de outro, filhos e pais sendo mortos por insanidade causada pela alienação parental”.

Portanto, verifica-se que os danos causados as vítimas atingem tanto o desenvolvimento do filho, bem como a insanidade do genitor-alienado.

7 - Responsabilidade Civil e Criminal da Alienação Parental

A responsabilidade de exercer o controle da jurisdição é do Estado, que assume um compromisso social na efetivação da aplicação da lei. A qualidade da decisão é aferida não só pelo conhecimento técnico dos magistrados, mas também pela humanização da justiça e a aproximação com a realidade social.

A Alienação Parental é um importante problema social, podendo ter inúmeras consequências na nossa sociedade, posto ser um crime pessoal e também social, ainda não tipificado do Código Penal Brasileiro.

Com o advento da Lei da Alienação Parental no Brasil, o aparelho estatal passou a poder identificar e punir tal fenômeno, normatizando algo que há muito tempo já ocorria, mas que não poderia ser combatido a contento.

Com esse avanço, a Lei 12.318/2010, em seu artigo 6°, caput e incisos, enumera os meios punitivos de conduta de alienação, conforme se vê adiante:

Art. 6o  Caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, em ação autônoma ou incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso: I - declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador; II - ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado; III - estipular multa ao alienador; IV - determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial; V - determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão; VI - determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente; VII - declarar a suspensão da autoridade parental.

Nesse contexto, verifica-se que o supracitado artigo ressalva a possibilidade de responsabilização civil e criminal, além das medidas por ele determinadas, estabelecendo que os meios de sanção serão utilizados de forma cumulativa ou não, o que quer dizer que é conferido ao juiz a possibilidade de aplicar um ou mais meios de punição, fazendo que ocorram divergências nas decisões e interpretação da lei no ordenamento jurídico brasileiro.

No entanto, além das sanções previstas na referida Lei, a Alienação parental acarreta dano moral que poderá ensejar indenização civil.

Acerca da responsabilidade civil, o artigo 186, do Código Civil Brasileiro dispõe que “aquele que por omissão voluntária, negligência, ou imprudência causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

Pablo Stolze Gagliano (2011) diz que a responsabilidade civil deriva da agressão a um interesse eminentemente particular, sujeitando, assim, o infrator, ao pagamento de uma compensação pecuniária à vítima, caso não possa repor, in natura o estado anterior da coisa.

Quando ocorre a alienação parental, há violação, por parte do genitor, do dever de proteção ao direito da criança ou do adolescente à convivência familiar. A ação do alienador gera prejuízos, principalmente psicológicos, à criança e ao outro genitor, caracterizando-se como abuso de direito, tornando-se cabível, a reparação dos danos causados por meio de responsabilização civil.

Portanto, verifica-se que os atos praticados pelo alienador são tão prejudiciais ao menor e ao outro genitor que a própria lei previu medidas que o juiz pode tomar para extinguir ou diminuir os efeitos da alienação, sem prejuízo da responsabilização civil e criminal.

Apesar da previsão legal, o sistema judiciário não conseguiu coibir a prática da alienação no seio das famílias, uma vez que ela chega a ser praticada antes mesmo de se chegar ao conhecimento do poder judiciário.

Ocorre que antes da promulgação da lei 12.318/2010, o projeto de lei da alienação parental nº 4053/2008, no seu artigo 10°, acrescentaria um parágrafo único ao art. 236 do Estatuto da Criança e do adolescente, o qual previa a responsabilização penal, com detenção de seis meses a dois anos, no caso de apresentação de falso relato à autoridade Judicial, Policial, ao Ministério Público ou ao conselho tutelar, com o propósito de restringir a convivência da criança ou adolescente com o genitor alvo, o que caracteriza ato de alienação parental. No entanto, o tipo em questão seria diverso do crime de denunciação caluniosa, previsto no artigo 339 do Código Penal, uma vez que não exigiria a prova da ciência do autor em relação a inocência do acusado, de forma que bastava o fato de ser inverídico o relato (DORNELES, 2013, p. 25).

Todavia, o respectivo artigo foi vetado pelo antigo Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva. Como razões do veto, foram apontados os diversos mecanismos já existentes na Lei nº 8.069/1990, capazes de inibir os atos de alienação parental, além da possibilidade de gerar efeitos prejudiciais à criança ou adolescente e àquele que possui o direito que se pretende assegurar.

Portanto, para melhor interesse da criança e do adolescente, como forma de combater a prática da alienação parental, é essencial um novo guardião do direito, reconhecendo os atos da alienação parental como tipo penal.

8 - Necessidade de Criminalizar

Pelo exposto neste artigo, é evidente que o dano causado ao menor pela prática de atos da alienação parental poderá ter sequelas permanentes.

É importante destacar que o cuidado com a criança não é uma mera liberalidade dos pais. Pelo contrário, é um dever legalmente definido. O artigo 227 da Constituição Federativa do Brasil prevê como obrigação da família o cuidado com a criança e com o adolescente, afastando-a de qualquer tratamento cruel e opressor.

De forma mais específica, o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seus artigos 3º, 4º e 130, proíbe qualquer tipo de tortura contra menor, seja física ou psicológica, por quem quer que seja.

No entanto, a responsabilidade com o desenvolvimento infantil saudável não é somente da família, mas também do Estado e da Sociedade.

Assim, diante de um direito violado e danos causados à criança e ao adolescente pela prática da alienação parental, é nítida a existência de fato que poderia ser considerado, em lei, como crime, pois o bem jurídico protegido é a vida e a saúde da criança e do adolescente, sendo possível a configuração do delito pela prática da alienação do sujeito ativo (alienador), que causa danos psicológicos aos sujeitos passivos (criança, adolescente e genitor-alienado), podendo ser enquadrada no tipo penal.

A Lei de Introdução ao Código Penal Brasileiro (Decreto-lei 3.914) faz a seguinte definição de crime: Considera-se crime a infração penal a que a lei comina pena de reclusão ou detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente.

No Brasil está em análise na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 4488/16, que criminaliza atos de alienação parental. A proposta, do deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), pretende alterar a lei de alienação parental (Lei 12.318/10) para tornar crime a conduta com previsão de pena de detenção de três meses a três anos.

No ordenamento jurídico brasileiro não existem meios preventivos para a prática da Alienação Parental, antes de se chegar ao conhecimento no poder judiciário. A criança e o adolescente podem sofrer alienação parental durante a relação conjugal, ou seja, sem mesmo os pais estarem separados, o que poderá causar um grande desequilíbrio familiar e danos à criança e ao adolescente, maiores vítimas dessa prática.

Diante dessa problemática, a melhor forma de se evitar a prática dessa conduta, é a aprovação do projeto de lei 4488/16, que prevê a criminalização da alienação parental, cuja aprovação terá um resultado de suma relevância do ordenamento jurídico.

A importância da criminalização da alienação parental decorre da necessidade social de mais um ramo do Direito, como forma de prevenir o aumento dessa prática na sociedade brasileira, que muitas vezes ocorrem nas famílias, antes mesmo de se chegar ao conhecimento do poder judiciário, com as ações de separação, divórcio e guarda, permitindo que o alienado busque mais um guardião do direito para se proteger da conduta do alienante, através de suas denúncias e/ou queixas-crime.

Inclusive, meios não faltarão para que essa prática seja levada ao conhecimento da autoridade policial competente para investigá-la e indiciar, se for o caso, o autor do crime de alienação parental.

O juiz, em qualquer tipo de ação sob seu julgamento, vislumbrando indícios de prática de alienação parental contra menor, pode pedir a extração de cópias pertinentes de peças dos autos da ação então em andamento, para envio à autoridade policial. Diga-se o mesmo em relação ao Ministério Público.

Além disso, qualquer outra pessoa que identifique a prática de alienação parental (parentes, amigos, vizinhos, professores que acompanham o menor, etc) pode denunciar o fato à autoridade policial, pois, certamente, a futura ação penal a ser ajuizada será “pública incondicionada”.

No entanto, apesar da necessidade de criminalizar a prática da conduta da alienação parental, tendo como grande problemática a crise do sistema carcerário brasileiro, a pena de prisão não seria o meio mais adequando para punir a conduta do alienante.

Do contrário, estaríamos agravando mais ainda a situação do filho-alienado, que, certamente, por conta da privação da liberdade de seu genitor-alienador, ficará distante dele, conturbando mais ainda seus sentimentos, sobretudo causando-lhe danos psicológicos; podendo até mesmo se culpar pela prisão do pai, destruindo ainda mais os laços maternos ou paternos.

A prisão não ressocializa e tampouco reeduca. A tendência mundial é de que a pena de prisão deve ser vista como a última Medida do Direito Penal, surgindo uma crescente necessidade de repensar outras formas de punição do cidadão infrator, tais como as restritivas de direito.

Assim, no caso de criminalização da alienação parental, a melhor solução é o Estado criar programas de parentalidade, como forma de ressocialização e educação do autor do delito e, mais ainda, punir o fato com penas alternativas, sendo as mais comuns as restritivas de direitos, tais como prestação de serviços gratuitos à comunidade ou entidades públicas, interdição temporária de certos direitos, comparecimento em oficinas de parentalidade e palestras educativas etc.

9 - Conclusão:

A pretensão do presente artigo foi esclarecer os institutos, suas realizações no Direito moderno, buscando o melhor guardião para o menor alienado, esclarecendo que além de ser um ramo do Direito Civil, deve ser também um ramo do Direito Penal.

No ordenamento jurídico brasileiro não existem meios preventivos contra a prática da Alienação Parental, antes de se chegar ao conhecimento no Poder Judiciário. A criança e o adolescente, vítimas da prática dessa conduta pelo alienante, podem sofrer alienação parental durante a relação conjugal, ou seja, sem mesmo os pais estarem separados, o que poderá lhe causar danos e um grande desequilíbrio familiar.

Diante dessa problemática, a melhor forma de se evitar a prática dessa conduta é a aprovação do projeto de Lei 4488/16, que prevê a criminalização da alienação parental, cuja competência não foi esclarecida, gerando uma grande lacuna.

No entanto, embora necessária a criminalização dessa prática, não se verifica nada razoável apená-la com privação da liberdade do alienador. Medida suficiente a ressocializar e reeducar o criminoso, para o caso, é a aplicação de penas restritivas de direitos, como a prestação de serviços gratuitos à comunidade ou órgãos públicos, a interdição temporária de certos direitos. Mais ainda, submetê-lo a comparecer a palestras e oficinas de parentalidade, o que, certamente, terá como resultados sua retomada (do alienador) à consciência dos seus atos, a ponto de não mais pretender praticar tais condutas.

Portanto, é de extrema relevância o reconhecimento estatal da prática da alienação parental e dos prejuízos por ela causados, também na esfera do Direito Penal, gerando a responsabilização criminal do sujeito ativo (alienador). Estas práticas já se encontram elencadas na específica Lei 12.318/2010, em seu artigo 6º, mas sem considerá-las, no entanto, como crime.


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Gabriela Araujo Souza LimaGabriela Araujo Souza Lima é Graduada em Direito pela Escola Superior Dom Helder Câmara (2008); especialização em Direito Civil e Processual Civil pela Universidade Anhanguera – Uniderp (2010). Cursando MBA em Liderança e Cooaching na Faculdade Pitágoras de Belo Horizonte. Mestranda no curso de Criminologia na Universidade Fernando Pessoa – Porto/Portugal. Tem experiência na área de Direito desde maio/2010, como Assessora de Juiz de Direito da 1ª Instância do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Dr. Antônio Leite de Pádua. Atuante na 1ª Vara de Família da Comarca de Belo Horizonte-MG.


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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


 

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