A vítima no processo penal brasileiro

19/06/2015

Por Rômulo Andrade Moreira - 19/06/2015

Acabei de ler um alentado estudo em torno da vítima, estudo feito por Ana Paula Alves Barros.

No seu texto, ela afirma, com acerto, que o "estudo sobre a vítima, como parte do crime, é algo muito recente, considerando a organização desse estudo após a Segunda Guerra Mundial (1940-1945).  A Escola Clássica de Beccaria e Fuerbach, a Escola Positiva de Lombroso, Ferri e Garofalo concentravam seus esforços no trinômio delinqüente-pena-crime. No entanto, esse cenário começou a mudar com término da Segunda Guerra e seu terrível legado de ódio, intolerância e racismo. Nos tempos primórdios o reparo do dano era feito a partir da vingança privada contra o ofensor ou seu grupo social. A vítima detinha, em suas mãos, o poder de escolher o tipo de pena que deveria ser aplicada ao agressor. São exemplos de escolhas que o ofendido poderia fazer: punições físicas, a perda dos bens e a até mesmo a morte do seu algoz.  Em um segundo momento, a pena passou a ser um pagamento em dinheiro, feito pelo ofensor à vítima. Nesse caso o Estado passa a intervir, fixando a pena e obrigando a vítima a receber.Nota-se que a sociedade e o próprio Estado não viam a vítima como parte do crime, mas fora dele. Essa concepção estende-se para as Escolas Clássica e Postivista. Na Escola Clássica, por exemplo, havia uma grande preocupação com o crime, já na Escola Positivista a atenção estava voltada para o criminoso.  Esse abando em relação á vítima também pode ser visto em outras áreas do conhecimeneto. (...) Segundo Marlet (1995) os primeiros trabalhos sobre vítimas foram feitos por Hans Gross em 1901. No entanto, consideramos que a sistematização dos estudos em torno da vítima se deram após a Segunda Guerra Mundial. Benjamín Mendelsohn e Von Henting foram dois grandes pesquisadores que contribuíram para a organização dos estudos sobre a vítima.  É muito certa a mudança que pesquisadores como B. Mendelsohn provocaram nos estudos sobre a vítima. Entender a vítima como parte do crime e uma transformação significativa. (...) Sabe-se que os estudos sobre a vítima já tinham começado no primeiro ano do século XX, mas é após a Segunda Guerra que esses estudos são sistematizados e a vítima passa a assumir um papel fundamental, inclusive para o entendimento do crime. Observa-se a notável importância da Segunda Guerra para os estudos sistemáticos da vítima por B. Mendelshon e Von Henting. B. Mendelsohn (1900-1998), advogado nacionalizado israelense, passou a se interessar pelo comportamento das vítimas dos campos de concentração. Esses campos estavam espalhados pela Europa Ocidental e agregavam milhares de pessoas presas por Hitler durante a Segunda Guerra. Judeus, homossexuais, negros e ciganos foram perseguidos e presos em nesses campos para servirem como mão-de-obra. O comportamento dessas vítimas chamou atenção do pesquisador que passou a buscar entender o motivo pelo qual os prisioneiros, mesmo frente a sua iminente morte, trabalhavam nesses locais. Essa relação do nascimento da vitimologia com o pós Segunda Guerra Mundial, é apontado por Fatolico (2007): A vitimologia nasceu após a Segunda Guerra Mundial, mais especificamente em 1947, dois anos após o seu término, em decorrência do sofrimento dos judeus pelo Nazismo de Hitler que teve como resultado milhões de mortos, feridos e desaparecidos. Embora estudos sobre a vítima viessem sendo feitos no início do século XX foi em 1947 que o termo Vitimologia foi cunhado por B Mendelsohn em um Congresso em Bucareste, em sua palestra “Um Horizonte Novo na Ciência Biopsicossocial: a Vitimologia”.  Segundo Piedade Junior (1993), B. Mendelsohn passou a defender a Vitimomologia como uma ciência autônoma. Para o pesquisador, tratava-se de uma ciência sobre as vítimas e a vitimização. Por outro lado, alguns outros pesquisadores viam-na como um ramo da Criminologia, como é o caso de Henry Ellemberger  ao afirmar que a Vitimologia é um ramo da Criminologia que se ocupa da vítima direta do crime e que compreende o conjunto de conhecimentos biológicos, sociológicos e criminológicos concernentes à vítima. Não é nosso objetivo discutir a cientificidade da Vitimologia nesse momento. O que queremos é nos ater ao momento em que se deu a sistematização e organização dos estudos em torno da vítima. Entre muitas contribuições de B. Mendelsohn e de diversos outros pesquisadores, como Hans von Henting, está a conceituação de vítima e a sua classificação. É importante salientar que, a nosso ver, o divisor de águas está não só na importância que a vítima adquiriu posteriormente à Segunda Guerra, mas, também, como ela passou a ser vista. A vítima passou a ser percebida e estudada como parte do crime, um sujeito. O comportamento da vítima passou a ser reconhecido como fundamental para a consumação de um delito. É considerada, por exemplo, sua participação voluntária ou não no ato criminoso. (...) Para ilustrar essa ideia, de vítima como sujeito passivo na eclosão do delito, usaremos a própria classificação de B. Mendelshon. O referido pesquisador dividiu sua classificação de vítima em três grandes grupos. Vejamos: vítima inocente ou ideal, uma vez que não teve a menor participação na produção do resultado; vítima provocadora, imprudente, voluntária e ignorante, caracterizada pela evidente participação prestada aos fins queridos pelo agente; vítima agressora, simuladora e imaginária, que na verdade, deve ser considerada como suposta vítima, uma vez que, na realidade deve ser tipificada como co-autora do resultado querido pelo agente. (...)   Portanto, nota-se uma grande diferença dos estudos sobre a vítima feitos antes e depois da Segunda Grande Guerra. A vítima passa a ser entendida como uma espécie de co-adjuvante do crime.  E mais, passa a ser uma peça fundamental para se entender o crime. Com isso, não estamos olvidando todo o conhecimento produzido sobre a vítima antes da guerra, mas, salientando que a situação de caos durante e no pós- guerra são chaves importantes para entender o desenvolvimento científico dessas pesquisas nesse momento. Isso porque, acreditamos que o auge dessas pesquisas está diretamente relacionado com o contexto gerado pela guerra, como veremos a seguir. Para entendemos o aumento do interesse dos pesquisadores pela vítima após a Segunda Guerra Mundial, se faz necessário mostrar um conjunto de elementos que envolveram as vítimas dessa guerra, especialmente os judeus.    Assim, apresentaremos o nazifascismo com foco no anti-semitismo. Antes disso, é importante lembrarmos que não vemos a Segunda Guerra como contribuição, mas como elemento gerador de mudanças na área científica, social, política, econômica, cultural etc. Paulo Fagundes (2000) considera o nazifascismo como um movimento que foi a resposta a situação que se formou após a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Os anos que se seguiram a esse conflito contribuíram para a formação desse movimento. Segundo o mesmo autor, o que catapultou o movimento nazifascista foi a Crise de 29 e a Grande Depressão, já que gerou um “caldo de cultura” propício para o desenvolvimento desses movimentos. Antes de falar sobre o movimento nazifascista é importante fazermos alguns apontamentos sobre o anti-semitismo. Inicialmente a questão de ódio aos judeus se restringia a questões religiosas e ao imaginário popular. Durante a Idade Média houve perseguição por parte do cristianismo aos judeus. Por isso, nesse momento podemos falar de antijudaísmo. Os cristãos (tanto os católicos, quanto os protestantes) relacionavam a culpa da morte de Cristo aos judeus. Além do elemento religioso, é importante indicar que várias lendas surgiram em torno dos judeus, de forma que os demonizavam. Ocorreu, por exemplo, a disseminação da lenda de que os judeus teriam contaminado a água e poços com a peste bubônica para atingir os cristãos (LUZ, 2006). No entanto, essa situação começou a mudar com a chegada do século XVIII acompanhado dos discursos voltados à razão trazidos pelo Iluminismo. A partir desse período o elemento religioso dá lugar ao quesito racial. Então, torna-se o anti-semitismo e não mais antijudaísmo.Entre 1907 e 1913 Hitler passou a ter contato com literatura anti-semita como as de Karl Lueger (1844-1910), as de Georg Ritter von Schönerer (1842-1921) e de Adolf Lanz (1874-1954). No entanto, somente após a Primeira Guerra Mundial as ideias anti-semitas de Hitler assumiram a forma de um programa. Por outro lado, se faz necessário esclarecer que a política de extermínio do nazifascismo não se restringia a perseguição antisemita. A política assumiu um papel ambíguo, por um lado Hitler previa a eliminação do povo judeu, mas também, queria a expansão da raça ariana. Segundo o autor, tratava-se de uma política eugenista, já que se incentivava o alemão a se relacionar com diversas mulheres (desde que arianas). A solução final para os judeus parte do projeto eugenista de A. Hitler, toma forma nos campos de concentração que foram construídos na Alemanha e nos países dominados pelos alemães durante a guerra. O campo de Auschwitz compôs esse cenário de horror e racismo.  Nesse local, os judeus foram mortos aos milhares nas câmaras de gás. Num relatório de Griksch, em uma visita ao campo de Auschwitz, intitulado A reinstalação dos judeus, é explicitado as etapas seguidas antes de irem para a câmara de gás. Em trens, os judeus chegavam e eram examinados por médicos para avaliar sua aptidão para o trabalho. Aqueles que estivessem saudáveis eram separados para serem incorporados ao trabalho; os doentes curáveis eram submetidos a uma dieta que visava a sua recuperação para, também, fazer parte do grupo de trabalhadores; já os que fossem considerados impróprios ao trabalho eram enviados para as câmaras de gás. Este último grupo era induzido a pensar que estavam sendo levados para se banharem. O local era preparado para levá-los a acreditar nisso. Depois de desmaiarem, seus dentes de ouro eram retirados e seus corpos incinerados. Segundo o autor Oswaldo Henrique Duek Marques (2001) o sofrimento, perseguição e discriminação das vítimas do Holocausto contribuíram para o que autor denomina de “a grande redescoberta da vítima”. Ou seja, segundo o autor, o racismo disseminado pelo movimento nazifascista contribuiu para que os estudos sobre a vítima fossem tratados com mais seriedade. A comunidade internacional, inclusive, voltou seus olhos para essas vítimas.A expressão usada por Marques 2001 ilustra muito bem, em poucas palavras, a ideia que nós propomos discutir. “A grande redescoberta da vítima” não ignora todo o conhecimento e estudos anteriores à Segunda Guerra Mundial e mostra que se trata de um novo momento na história do estudo da vítima. Como desenvolvemos em nosso texto, havia um quadro muito propício para que os pesquisadores e a própria comunidade internacional voltassem seus olhos para a vítima, especialmente quanto ao genocídio provocado por Hitler nos campos de concentração.Portanto, pensamos que o estudo em torno da vítima é modificado por todo o contexto que a guerra gerou.  O cenário provocado pela dizimação em massa dos judeus criou um momento muito favorável para isso. Nota-se uma mudança no entendimento dos pesquisadores em relação a vítima. Para se estudar e entender como se chegou à eclosão de um crime, passa a ser considerado o comportamento da vítima. A Segunda Guerra Mundial escancarou suas portas de terror pelas vítimas que provocou e da forma que o fez.Nada de positivo pode ser visto em meio a uma guerra, mas o ser humano consegue memorá-la através de pesquisas importantes, se levantar em meio ao caos e enxergar possibilidades de mudar o mundo e a leitura dele, sempre batendo nas portas das nossas lembranças para que não esqueçamos as vítimas que o breve século XX fez." (Veja aqui)

Nada obstante fazermos sérias e contundentes críticas à participação da vítima no Processo Penal, dois aspectos, a meu ver, merecem destaques.

Em primeiro lugar, a composição civil dos danos prevista na Lei dos Juizados Especais Criminais (Lei n. 9.099/95). Este acordo realizado na esfera penal tem efeito na esfera cível para se evitar o enriquecimento ilícito, tal como já se prevê na Lei dos Crimes Ambientais – Lei nº. 9.605/98 (art. 12)[2], no Código Penal (art. 45, § 1º., in fine)[3] e no Código de Trânsito Brasileiro – Lei nº. 9.503/97 (art. 297, § 3º.)[4].

A composição civil dos danos nas infrações penais de menor potencial ofensivo deverá sempre ser tentada, ainda que se trate de crime cuja ação penal seja pública incondicionada, ressalvando-se apenas a hipótese da inexistência de vítima determinada. Esta afirmação deflui da própria redação do art. 74, parágrafo único e do art. 76, ambos da Lei n.º 9.099/95.

Em que pese opiniões em contrário, o certo é que a esta conclusão chegou, salvo engano, a maioria dos doutrinadores.

Assim, por exemplo, afirma Ada Pellegrini Grinover:

Frise-se, por oportuno, que, tanto para a ação pública condicionada como para a ação de iniciativa do ofendido, a homologação do acordo civil acarreta a renúncia tácita ao direito de representação ou queixa (...)

No caso de ação de iniciativa pública (incondicionada), ao contrário, a homologação do acordo civil nenhum efeito terá sobre a ação penal.”[5]

Por sua vez, Mirabete adverte que tal homologação, no caso de ação penal pública incondicionada, acarreta dois efeitos penais, senão vejamos:

Evidentemente, homologada a composição, não ocorre a extinção da punibilidade quando se tratar de infração penal que se apura mediante ação penal pública incondicionada, prosseguindo-se na audiência preliminar com eventual proposta de transação ou, não sendo esta apresentada, com o oferecimento da denúncia pelo Ministério Público. Entretanto, se a composição dos danos ocorrer, deve ser ela objeto de consideração do Ministério Público, quando da oportunidade de oferecer a transação, e do juiz, como causa de diminuição de pena ou circunstância atenuante (arts. 16 e 65, III, b, última parte, do Código Penal). Além disso, é evidente que a composição impedirá uma ação ordinária de indenização fundada no art. 159 do Código Civil, ou a execução, no cível, da eventual sentença condenatória (art. 91, I, do Código Penal).[6] Neste ponto discordamos: a composição civil dos danos não impedirá a ação civil ex delicto, apenas obrigará a que se compense de uma posterior indenização concedida no cível o que foi pago no acordo homologado no Juizado Especial Criminal, à semelhança do que prescreve, como dissemos acima, o art. 45, § 1o. in fine do Código Penal, o art. 12 da Lei n. 9.605/98 (Meio Ambiente) e o art. 297, § 3o. da Lei n. 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro)[7].

Vê-se que impostergável será a tentativa de composição civil dos danos, ainda que se trate de contravenção ou de crime de ação penal pública incondicionada[8]. Se assim não o fosse, ferido estaria o princípio constitucional da igualdade (art. 5º., caput, da Constituição Federal), pois a vítima de uma infração de menor potencial ofensivo cuja ação penal fosse pública incondicionada seria tratada diferentemente daquel’outra que sofrera também uma infração da mesma natureza, porém de ação penal pública condicionada à representação. Assim, por exemplo, a vítima de uma ameaça teria direito à composição civil dos danos, enquanto que o ofendido por um constrangimento ilegal não o teria, o que seria um absurdo.

Ademais, note-se que um dos objetivos da lei que criou os Juizados Especiais Criminais é exatamente a reparação dos danos sofridos pela vítima (art. 62). Como observam Ada, Scarance, Luiz Flávio e Gomes Filho “é a primeira vez, no nosso ordenamento, que a legislação abre tão amplo espaço à sua proteção jurisdicional, inserindo-se no generoso e atualíssimo filão que advoga a revisão dos esquemas processuais de modo a dar resposta concreta à maior preocupação com o ofendido.”[9]

Esta atenção com a vítima no processo penal é tema atual e tem sido motivo de inúmeros trabalhos doutrinários, como observou o jurista argentino Alberto Bovino:

Después de varios siglos de exclusión y olvido, la víctima reaparece, en la actualidad, en el escenario de la justicia penal, como una preocupación central de la política criminal. Prueba de este interés resultan la gran variedad de trabajos publicados recientemente, tanto en Argentina como en el extranjero;” (...) mesmo porque “se señala que com frecuencia el interés real de la víctima no consiste en la imposición de una pena sino, en cambio, en ‘una reparación por las lesiones o los daños causados por el delito’[10] Neste sentido, veja-se obra bastante elucidativa de Antonio Scarance Fernandes.[11]

Dois juristas italianos, Michele Correra e Danilo Riponti, também anotaram:

Il recupero della dimensione umana della vittima, molto spesso reificata, vessata, dimenticata da giuristi e criminologi in quanto oscurata da quella cosí clamorosa ed eclatante del criminale, soddisfa l’intento di rendere giustizia a chi viene a trovarsi in una situazione umana tragica ed ingiusta, a chi ha subito e subisce e danni del crimine e l’indifferenza della società.[12]

Seria, portanto, até sob este ponto de vista, descabida qualquer exegese que impedisse a composição civil dos danos nestas hipóteses.

Assim, sempre que estivermos à frente de um delito de menor potencial ofensivo cuja ação penal seja incondicionada ou uma contravenção penal (cuja ação penal é sempre, como em toda contravenção – inclusive vias de fato, pública incondicionada), deve-se oportunizar a composição dos danos civis, observando-se, porém, que a sua homologação não acarreta os efeitos impeditivos da transação penal ou de posterior denúncia ou queixa.

Nestes casos, havendo e sendo homologada a composição civil, não estará o Ministério Público impedido de transacionar ou oferecer denúncia. Adverte-se que a homologação da composição civil em casos que tais não é causa, em absoluto, de arquivamento, mas somente poderá acarretar aquelas conseqüências apontadas por Mirabete e acima transcritas.

Assim, ainda que tenha ocorrido a referida composição, será de rigor a continuidade da audiência preliminar, vigorando, in casu, o princípio da obrigatoriedade ou da legalidade da ação penal que, apesar de efetivamente mitigado pela lei em estudo, não foi excluído de nossa sistemática processual penal, que abraçou o sistema acusatório (ainda que com impurezas) e o da obrigatoriedade da ação penal, reforçados pelo art. 129 da Constituição Federal.

Observa-se que mesmo com o advento da lei especial sob comento, continua em nosso Processo Penal o princípio da obrigatoriedade da ação penal pública a impedir, v.g., o arquivamento do termo circunstanciado em caso de composição civil dos danos em infração de ação penal pública incondicionada, havendo justa causa para a denúncia.

Socorremo-nos, a propósito e mais uma vez, de Mirabete:

A Constituição atual ao permitir a criação dos Juizados Especiais, para a apuração de infrações penais de menor potencial ofensivo, permitindo a transação, não instituiu o princípio da oportunidade nas ações penais públicas, uma vez que tal instituto se refere somente à possibilidade de composição entre as partes, nos termos da lei, após a propositura do processo.”[13]

No mesmo sentido, preleciona Maurício Antônio Ribeiro Lopes:

O princípio da obrigatoriedade da ação penal, desse modo, não foi afastado pela Lei 9.099/95. Ao receber o termo de ocorrência da autoridade policial, o representante do Ministério Público obrigatoriamente deverá adotar uma das seguintes providências: verificar o cabimento de proposta da aplicação imediata da pena não privativa de liberdade (art. 76, caput); oferecer denúncia oral (art. 77, caput); oferecer prova escrita (art. 77, § 2º.), requerer arquivamento (CPP, art. 28); requerer diligências imprescindíveis ao oferecimento da denúncia (CPP, art. 16), ou propor a suspensão do processo.[14] (grifo nosso). Note-se que ao se referir à possibilidade do arquivamento, o autor acima citado coloca em parêntese o art. 28 do Código de Processo Penal como que para delimitar tal possibilidade.

Desta forma, tratando-se de ação penal pública incondicionada, o pedido de arquivamento só será possível, à vista do princípio da obrigatoriedade, se o fato não for infração penal, ou, em sendo, a autoria for desconhecida, ou se não houver justa causa (lastro probatório mínimo), além da hipótese de extinção da punibilidade.

Não nos parece possível, portanto, pedido de arquivamento de um termo circunstanciado em que se noticia uma infração penal de ação penal pública incondicionada pelo só fato de ter havido a composição civil dos danos, quando a lei penal já prevê, como efeito deste acerto, o arrependimento posterior e a circunstância atenuante.

A mitigação implantada pela lei ora comentada não pode ser interpretada a tal ponto que infira não ser possível o oferecimento da transação penal quando haja a composição civil no caso de ação penal pública incondicionada.

Como ensina Afrânio Silva Jardim, “todo o sistema do código está voltado para a propositura da ação penal pública. O exercício desta ação é a regra geral, sendo o arquivamento a exceção, tanto que o legislador não tratou expressamente das hipóteses de arquivamento, mas sim dos casos em que a ação não deve ser exercitada (art. 43).”[15]

É o mesmo autor quem adverte:

É preciso interpretar a Lei n.º 9.099/95 dentro dos postulados dos princípios que informam o nosso sistema processual acusatório e não como desejaríamos que o legislador tivesse dito.”[16]

Por outro lado, pelo princípio da indisponibilidade da ação penal que é corolário da regra da obrigatoriedade, veda-se qualquer manifestação de poder dispositivo no que concerne à promoção e à movimentação do processo penal, refletindo isto o interesse público na determinação do conteúdo da causa penal[17].

Com o advento da Lei n.º 9.099/95, é evidente que também restou mitigado este último princípio quando no seu art. 89 instituiu-se a suspensão condicional do processo para as infrações de pequeno e de médio potencial ofensivo, pois o Ministério Público passou, obedecidos determinados requisitos e pressupostos, a dispor da res deducta in judicio, possibilidade antes expressamente vedada pelo art. 42 do Código de Processo Penal.

Tal aspecto, no entanto, não autoriza, a nosso ver, o arquivamento do termo circunstanciado nas condições colocadas, mesmo porque a suspensão condicional do processo pressupõe processo penal instaurado.

Em complemento à fundamentação acima exposta, veja-se mais uma vez o ensinamento de Afrânio:

Na verdade, o legislador não deu ao Ministério Público a possibilidade de requerer o arquivamento do termo circunstanciado e das peças de informação que o instruírem, quando presentes todas as condições para o exercício da ação penal. Vale dizer, o sistema do arquivamento continua sendo regido pelo CPP, descabendo ao Ministério Público postular o arquivamento do termo circunstanciado por motivos de política criminal. Aqui também não tem o Parquet discricionariedade que lhe permita manifestar ou não em juízo a pretensão punitiva estatal.[18]

Esta composição civil poderá ser conduzida por conciliadores leigos, sendo que a homologação caberá sempre ao Juiz de Direito.

Questão que suscita certa controvérsia na disciplina dos Juizados Especiais Criminais diz respeito à obrigatoriedade ou não da presença do membro do Ministério Público na audiência preliminar de tentativa de composição civil dos danos.

Autores há, como por exemplo, Marino Pazzaglini Filho e outros, que só vislumbram a necessidade da participação do Ministério Público nesta fase caso o ofendido seja incapaz, oportunidade em que o Promotor de Justiça atuaria especificamente para proteger interesse seu (do incapaz) que estivesse sendo prejudicado.[19]

Neste mesmo sentido foi editada a Súmula 07 da Procuradoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo sobre a Lei dos Juizados Especiais Criminais (São Paulo, 22 de novembro de 1995).

Nada obstante o posicionamento em contrário, temos para nós que o entendimento mais acertado é exatamente o oposto, ou seja, aquele segundo o qual a necessidade do representante do Ministério Público na referida audiência é, em qualquer hipótese, impostergável.

A fim de que possamos exarar a nossa opinião a respeito do assunto, necessário se nos afigura a análise dos arts. 72, 73 e 74, da Lei n.º 9.099/95 que dizem respeito à matéria ventilada.

Com efeito, lê-se nos três dispositivos citados o seguinte (grifados por nós):

Art. 72 - Na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Público, o autor do fato e a vítima e, se possível, o responsável civil, acompanhados por seus advogados, o Juiz esclarecerá sobre a possibilidade da composição dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade.

Art. 73 – A conciliação será conduzida pelo Juiz ou por conciliador sob sua orientação.

Parágrafo único – Os conciliadores são auxiliares da Justiça, recrutados na forma da lei local, preferentemente entre bacharéis em Direito, excluídos os que exerçam funções na administração da Justiça Criminal.

Art. 74 – A composição dos danos civis será reduzida a escrito e, homologada pelo Juiz mediante sentença irrecorrível, terá eficácia de título a ser executado no juízo civil competente.

Parágrafo único – Tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação, o acordo homologado acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação.”

Diante dos dispositivos legais acima transcritos, necessariamente são extraídas, desde já, quatro conclusões:

1ª.) A presença do representante do Ministério Público na audiência preliminar é obrigatória;

2ª.) É nesta audiência preliminar que se dará a (primeira) tentativa de composição dos danos (poderá haver uma segunda oportunidade prevista no art. 79);

3ª.) Esta tentativa de conciliação para composição dos danos pode ser conduzida por um Conciliador, que agirá sob a orientação do Juiz de Direito.

4ª.) A homologação do acordo acaso efetivado só poderá ser feita pelo Juiz togado, vedado ao Conciliador esta ou qualquer outra tarefa de natureza jurisdicional.

A primeira de nossas assertivas provém mesmo da literalidade do texto transcrito (art. 72) que não dá margem à interpretação diversa. Neste sentido vejamos a doutrina (todos os grifos são nossos):

Mas a audiência preliminar, conduzida por quem estiver imbuído da adequada mentalidade de mediador, deverá ser o mais informal possível, atendendo aos critérios do art. 62. O juiz (ou conciliador) conversará abertamente com os interessados, deixará que troquem idéias entre si e com ele, induzirá os advogados e o promotor ao mesmo comportamento.[20]

Nesta mesma obra, lê-se adiante:

Os conciliadores funcionarão nos Juizados como multiplicadores da capacidade de trabalho do juiz. Sentarão junto aos protagonistas principais (MP, autuado, vítima, responsável civil e seus advogados) para conduzir o entendimento destes com vistas à auto-composicão.” (p. 118).

Damásio de Jesus afirma que o “Promotor de Justiça participa da composição civil, ainda que o ofendido não seja menor ou incapaz[21]

Mas não é só; para ilustrar vejamos outros doutrinadores:

A audiência de conciliação é o momento mais importante do procedimento prévio. Presentes o órgão do Ministério Público, o autor do fato e a vítima e, se possível, o responsável civil, acompanhados por seus advogados, o juiz dará início à audiência preliminar (...).

Sua participação, bem como a do Ministério Público, deve ser a mais informal possível, não apenas conduzindo, como está no art. 72, mas intervindo nos momentos apropriados, quando a conciliação das partes depender de uma palavra, de um conselho, de uma pequena mudança na proposta.”[22]

A seguir esclarece este mesmo autor que como “estabelece o art. 73, a conciliação será conduzida pelo juiz ou conciliador sob sua orientação”, que deverá “esclarecer o autor do fato e a vítima sobre as vantagens que a conciliação traz para ambos.” (p. 314).

Mirabete assevera:

Por essa razão, devem estar presentes, obrigatoriamente, para a tentativa de conciliação e transação, além do juiz, o representante do Ministério Público, o autor do fato, seu advogado constituído por instrumento próprio ou verbalmente na própria audiência.”[23]

Para este autor, os conciliadores “terão a condição de auxiliares da Justiça e que tentarão, sob orientação do magistrado, promover o acordo entre a vítima, ou eventualmente o responsável civil, e o autor do fato”, tendo “como função apenas presidir, sob a orientação do juiz, a tentativa de conciliação entre as partes, como auxiliares da Justiça que são, nos limites exatos da lei.” (págs. 73/74).

Cezar Roberto Bittencourt afirma também que à audiência preliminar “devem comparecer o Ministério Público, as partes – autor e vítima – e, se possível, o responsável civil, todos acompanhados por seus advogados”, asseverando, ademais, que “a conciliação será conduzida pelo Juiz ou por conciliador.”[24]

Neste mesmo sentido pensam Fátima Nancy Andrighi e Sidnei Beneti, além de Liberato Póvoa e José Maria de Melo; estes dois últimos escreveram:

Como a finalidade precípua da audiência preliminar é a conciliação do autuado com o Ministério Público (com vistas à transação penal) e com a vítima (levando à transação, renúncia ou submissão), a lei determina a imprescindibilidade da presença das partes e do Ministério Público.”[25]

Vê-se, portanto, que a presença de um Promotor de Justiça (ou Procurador da República) na audiência preliminar é necessária e indeclinável até porque acaso não obtido êxito na composição civil (e tendo havido representação ou tratando-se de ação penal pública incondicionada) imediatamente deverá ser dada a palavra ao representante do Ministério Público para que se pronuncie acerca da possibilidade de transação penal ou do oferecimento de denúncia oral.

Ora, se ausente estiver (e sendo o caso de se oportunizar a transação penal) como se passará à segunda fase desta primeira audiência se não se encontrava no recinto o representante do Ministério Público?

Observa-se, a propósito, que a audiência preliminar não tem como fito apenas a tentativa de composição civil dos danos, mas, como bem advertem Marino Pazzaglini Filho e outros, “compõe-se de três fases: composição dos danos civis; transação penal; e oferecimento oral de denúncia.”[26] Indaga-se: sem o Promotor de Justiça como haverá a transação penal ou o oferecimento de denúncia oral?

É sempre bom relembrar, por outro lado, que a participação do Conciliador se reduz à primeira fase da audiência preambular, visto que, à evidência, não detém qualquer poder jurisdicional.

Como adverte o mesmo Mirabete, “o conciliador tem como função apenas presidir, sob a orientação do juiz, a tentativa de conciliação entre as partes (...), portanto, função meramente administrativa (...)”, nada impedindo “que o Juiz interfira nas negociações, devendo fazê-lo obrigatoriamente no caso de apurar alguma irregularidade no decorrer das negociações (...)”, sem obstar, ademais, “que o juiz promova várias audiências concomitantes, a cargo cada uma de um auxiliar, supervisionando o andamento delas e interferindo apenas quando necessário ou aconselhável.”[27]

Sobre esta importante função, assim se pronunciou a Confederação Nacional do Ministério Público em documento oficial:

Conclusão 11 – A participação dos conciliadores na audiência prevista pelo art. 72 da lei cessa com o encerramento da fase de reparação civil dos danos entre ofensor e ofendido, qualquer que seja o seu resultado.”

Aliás, na conclusão anterior a mesma Confederação deixou assentado: “É indispensável a presença do Promotor de Justiça à audiência prevista pelo art. 72 da Lei 9.099/95.”

Ressalte-se que mesmo havendo a composição civil entre as partes, ainda assim, termina a participação do Conciliador, pois a homologação do respectivo acordo (como ato tipicamente jurisdicional), só poderá ser feita pelo Juiz togado.[28]

É evidente que não há falar-se em submissão do Promotor de Justiça ao Conciliador. Absolutamente! Estar ao lado deste auxiliar da Justiça não significa estar a ele submetido, mesmo porque, como já se disse, não haverá nesta fase da conciliação civil nenhum ato que se revista de caráter jurisdicional, fato que redundaria, se assim não o fosse, em grosseira inconstitucionalidade, como advertiu Ribeiro Lopes, para quem “é preciso que se afaste por completo qualquer possibilidade de se conferir ao conciliador poderes superiores ao de mediar a composição dos danos civis”, não sendo possível submeter-se o Ministério Público, na conciliação, “à disciplina do conciliador, mero auxiliar da Justiça (arts. 7º. e 73, parágrafo único desta lei), subvertendo a hierarquia constitucionalmente desenhada.[29]

Relembra-se, ademais, que a condução da composição civil pelo Conciliador está submetida à supervisão do Juiz togado, inclusive no prosseguimento da audiência seja homologando o acordo, colhendo a representação da vítima, ouvindo o Ministério Público para a transação penal ou para o oferecimento da denúncia oral ou mesmo interferindo na própria tentativa de conciliação civil. A atividade do Conciliador repita-se, restringe-se à condução da conciliação entre o autor do fato e o ofendido, e só.

Diante deste quadro, é perfeitamente possível, como, aliás, acima foi mostrado por Mirabete, a realização de mais de uma audiência simultaneamente, cada uma com o seu Conciliador, inclusive em horário noturno e em qualquer dia da semana (art. 64).

Diante do exposto, entendemos necessária a presença do representante do Ministério Público na audiência preliminar, inclusive na fase em que esta é conduzida pelo Conciliador; a audiência preliminar será presidida sempre por um Juiz de Direito, ficando a cargo do auxiliar apenas o encaminhamento da composição civil dos danos; a participação do parquet servirá também para fiscalizar os esclarecimentos prestados pelo Conciliador, funcionando neste primeiro momento da audiência, tipicamente, como fiscal da lei, pugnando ao Juiz togado pela correção de possíveis irregularidades.

Nada impede que o acordo entre a vítima e o autor do fato seja realizado extrajudicialmente, contanto que haja a homologação, a posteriori, no Juizado Especial Criminal.

A composição civil homologada em Juízo acarreta renúncia tácita ao direito de queixa (o que é uma inovação em relação ao art. 104, parágrafo único do Código Penal) ou de representação (inovando igualmente em relação ao nosso sistema, que só previa a sua irretratabilidade[30]). Poderá, também, haver renúncia expressa à representação, usando-se analogicamente o art. 50, CPP.

Se não houver o acordo, à vítima será dada oportunidade para representar, se se tratar de crime de ação penal pública condicionada (se já não o fez na Delegacia de Polícia[31]). O prazo para a representação não mudou, tampouco o dies a quo, continuando a valer o que está escrito no art. 38 do Código de Processo Penal. Atente-se que o prazo de 30 dias previsto no art. 91 (cujo início é o da data da notificação e não da juntada do respectivo mandado – Enunciado 710 da súmula do Supremo Tribunal Federal) é uma norma feita para resolver as questões atinentes aos processos em curso quando do surgimento da referida lei, e tão somente.

Em se tratando de crime de ação penal de iniciativa privada e havendo pluralidade de autores (querelados) e de vítimas (querelantes), poderá haver uma exceção à regra da indivisibilidade (art. 48, CPP), pois o procedimento só terá continuidade (com o oferecimento da queixa) em relação aos que não aceitaram compor-se civilmente, ou seja, existirá ação penal de iniciativa privada em relação a apenas um ou alguns querelados, mesmo tendo havido um terceiro ofensor (que se compôs civilmente). Neste caso, a renúncia ao direito de oferecer queixa não se estenderá aos demais ofensores, não sendo aplicáveis as regras dos arts. 48 e 49 do CPP, ainda que a composição civil tenha sido total (admitir-se o contrário seria a consagração do enriquecimento sem causa, pois o ofensor que não aceitou reparar o dano seria beneficiado com o acordo feito pelo(s) outro(s), configurando-se uma situação de evidente injustiça[32]).

Temos, outrossim, uma exceção à regra da irretratabilidade da representação (art. 25, CPP) quando se lê o art. 79 da Lei nº. 9.099/95, pois mesmo já tendo sido ofertadas a representação e a denúncia na audiência preliminar, o acordo feito posteriormente na audiência de instrução e julgamento impedirá o prosseguimento do feito; ou seja, mesmo após o oferecimento da denúncia, a representação já não terá o condão de legitimar o Ministério Público a continuar acusando.

O segundo aspecto diz respeito à figura do assistente. Com efeito, o Estado, embora titular do jus puniendi, por vezes concede ao ofendido a faculdade de intervir na relação processual penal, seja na condição de titular da ação penal, como ocorre na ação penal de iniciativa privada, seja como assistente do Ministério Público. Na primeira hipótese o ofendido figura na relação como parte necessária, atuando como substituto processual, titular que é do jus accusationis; no outro caso, porém, a vítima não é parte necessária no processo sendo considerada sujeito secundário da relação processual, parte acessória, colateral, contingente ou adjunta. A falta do assistente, portanto, não inviabiliza o início nem a continuidade da relação processual.

Como assistente da acusação pode se habilitar a vítima ou seu representante legal, ou, na falta, o cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. O art. 530-H do Código de Processo Penal dispõe que “as associações de titulares de direitos de autor e os que lhes são conexos poderão, em seu próprio nome, funcionar como assistente da acusação nos crimes previstos no art. 184 do Código Penal, quando praticado em detrimento de qualquer de seus associados.[33]

Diverge a doutrina quanto à função do assistente. Assim, por exemplo, para Borges da Rosa o assistente seria mero auxiliar da acusação ou um “acusador assessor ou auxiliar[34], opinião comungada por Frederico Marques e Espínola Filho[35]. Outros, no entanto, entendem que “a razão de se permitir a ingerência do ofendido em todos os termos da ação penal pública, ao lado do Ministério Público, repousa na influência decisiva que a sentença da sede penal exerce na sede civil”, como explica Tourinho Filho embasado nas lições de Florêncio de Abreu e Canuto Mendes de Almeida[36]. Para nós, acertada é esta última posição, pois só entendemos legítima a atuação do ofendido como assistente quando configurado estiver o seu interesse em uma posterior indenização pelo dano sofrido. Logo, sempre que da infração penal advier prejuízo de qualquer ordem para o ofendido, este estaria legitimado a se habilitar como assistente para pleitear depois a ação civil ex delicto, executando a sentença penal condenatória[37].

Nesta questão, é bom que se note ser a posição do Superior Tribunal de Justiça majoritária no sentido de se permitir a intervenção do assistente ainda que não tenha interesse patrimonial, pois ele “também é interessado na averiguação da verdade substancial. O interesse não se restringe a aquisição de título executório para reparação de perdas e danos. O direito de recorrer, não o fazendo o Ministério Público, se dá quando a sentença absolveu o réu, ou postulando aumento da pena. A hipótese não se confunde com a justiça privada. A vítima, como o réu, tem direito a decisão justa. A pena, por seu turno, é a medida jurídica do dano social decorrente do crime.” (Resp 13.375/RJ).

De toda forma, de há muito a intervenção do ofendido no processo penal vem sendo questionada, muitos a contestando sob o argumento de que caberia ao Estado exclusivamente exercer as funções persecutórias em matéria penal, pois se admitir a intervenção do particular seria aceitar que “su papel en el proceso parece estar teñido de una especie de sentimiento de venganza”.[38]

Analisando o Direito português, por exemplo, o mestre lusitano Germano Marques da Silva esclarece que a “intervenção dos particulares no processo penal é por muitos contestada por poder constituir um factor de perturbação, pois não é de esperar deles a objectividade e a imparcialidade que devem dominar o processo penal, mas é também por muitos outros considerada como uma excelente e democrática instituição e assim o entendemos também”.[39]

Aliás, para este autor português o assistente é um mero colaborador da acusação pública, definindo-o nos seguintes termos: “Sujeito processual que intervém no processo como colaborador do Ministério Público na promoção da aplicação da lei ao caso e legitimado em virtude da sua qualidade de ofendido ou de especiais relações com o ofendido pelo crime ou da natureza deste”.[40]

É importante ressaltar que o corréu no mesmo processo não pode intervir como assistente, pois estaríamos diante da possibilidade de alguém ser, na mesma ação penal, acusado e acusador (em uma caso de lesões corporais recíprocas, por exemplo). O impedimento está expresso no art. 270 do Código de Processo Penal.

Também não é possível a assistência na ação penal de iniciativa privada, pois nos termos do art. 268 do Código de Processo Penal, a intervenção do assistente dar-se-á “em todos os termos da ação pública”. Parece-nos evidente esta impossibilidade, pois nas referidas ações a posição do ofendido já é de titular do jus accusationis, parte principal da relação processual. Nada obstante a clareza do texto legal acima referido, bem como a obviedade do impedimento, o certo é que o próprio Código de Processo Penal previa no procedimento para os crimes de falência a admissão como assistente do síndico ou do credor habilitado, mesmo em se tratando de ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública (arts. 503 e 506 do CPP); mas, como se sabe, estas disposições foram expressamente revogadas pela Lei nº. 11.101/2005. Do mesmo modo, veja-se o acima referido art. 530-H do Código de Processo Penal, a permitir a assistência, ainda quando se trate de crime de ação penal de iniciativa privada, como é o caso do art. 184, caput do Código Penal.

Outra discussão travada na doutrina e na jurisprudência é quanto à possibilidade do Poder Público estar legitimado a ser assistente da acusação. Parte da doutrina não admite que um órgão do Estado auxilie um outro (o Ministério Público) na tarefa de acusar. Seria o Estado-Administração auxiliando-se. Para eles não é razoável juridicamente a possibilidade do Poder Público auxiliar o próprio Poder Público na persecutio criminis. Como sustenta Tourinho Filho se o Ministério Público já atua em nome do Poder Público, “seria uma superfetação a ingerência da Administração Pública na ação penal pública”.[41] Neste sentido há posições jurisprudenciais.

Uma outra corrente, admitindo a assistência do Poder Público, ressalta que os interesses do Ministério Público não são necessariamente coincidentes com os de outros entes públicos, até porque aquele, apesar de ser parte, também tem a obrigação de funcionar no processo como custos legis (art. 257, II, CPP), obrigação à qual não se vincularia a Administração Pública em geral, quando ofendida diretamente por um determinado delito. Exemplificando: em um crime de peculato, o ente público atingido imediatamente pelo fato delituoso não teria necessariamente que admitir a improcedência da acusação (muito pelo contrário), enquanto que o Ministério Público, tendo em vista as suas feições de parte e de fiscal da lei, tem a obrigação legal e institucional de pugnar pela absolvição do acusado, inclusive recorrendo em seu favor.

Ora, se não é sempre coincidente a atuação do Ministério Público com a do outro órgão do Estado, afigura-se-nos possível a presença deste como assistente de acusação.

Bem a propósito, veja-se este julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo:

Tratando-se de ação penal pública promovida pelo Ministério Público, sendo lesada a Municipalidade local, é admissível o ingresso desta como assistente. É que o interesse do bem público geral do órgão ministerial não coincide com o interesse secundário da ofendida”. (RT 688/295). Neste mesmo julgado, lê-se: “Inocorre, na espécie, a superfetação a que alude Tourinho Filho, pois a Municipalidade, enquanto assistente, age na defesa de interesses próprios, estranhos ao interesse geral pelo qual atua o Parquet, segundo destinação constitucional”.

Note-se, a propósito, que no Decreto-Lei n.º 201/67 que dispõe sobre a responsabilidade dos Prefeitos e Vereadores (art. 2º., § 1º.), prevê-se expressamente a possibilidade da assistência ao Ministério Público dos órgãos federais, estaduais ou municipais “interessados na apuração da responsabilidade do prefeito”; da mesma forma, a Lei n.º 7.492/86 que define os crimes contra o Sistema Financeiro Nacional (art. 26, parágrafo único), dispõe que são admitidos a se habilitar como assistentes da acusação a Comissão de Valores Mobiliários – CVM (autarquia federal) e o Banco Central do Brasil; por fim, na Lei n.º 8.078/90 que disciplina a proteção do Consumidor (art. 80), há hipóteses em que se permite a assistência acusatória por meio de órgãos e entidades da administração pública, direta ou indireta, bem como de determinadas associações.

Ao assistente é permitido propor meios de prova[42] que serão produzidos por decisão judicial, após a ouvida do Ministério Público, bem como requerer reperguntas às testemunhas[43], aditar os articulados (não a denúncia[44]), participar do debate oral, arrazoar os recursos interpostos pelo Ministério Público ou por ele próprio e contra-arrazoar os interpostos pela defesa (considerando-se as contra-razões como os referidos articulados), requerer o desaforamento (art. 427 do Código de Processo Penal), além de pedir a prisão preventiva do acusado (art. 311 do Código de Processo Penal). Em relação à possibilidade do assistente da acusação requerer a decretação da prisão preventiva, entendemos só ser possível por conveniência da instrução criminal ou quando for cabível a substituição de medida cautelar anteriormente decretada, especialmente aquelas indicadas no art. 319, IV e VIII.

O assistente poderá interpor os seguintes recursos:

a) recurso em sentido estrito da sentença que decretar a extinção da punibilidade (art. 271, CPP) e da decisão que denegar ou julgar deserta a apelação interposta por ele próprio (art. 581, XV, CPP). É certo que o recurso em sentido estrito previsto no art. 581, XV não está elencado expressamente como passível de impetração pelo assistente, mas esta possibilidade é lógica, pois não seria possível se permitir a apelação (como o faz o art. 271) e não se aceitar o remédio recursal para a sua possível denegação. Este mesmo raciocínio utiliza-se para se admitir a carta testemunhável quando se denegar o recurso em sentido estrito nas hipóteses indicadas pelo 271 e agravo de instrumento contra decisão denegatória dos recursos constitucionais. Como diz Tourinho Filho, “de nada valeria conceder-se-lhe o direito ao recurso se, porventura, lhe fossem negados os meios necessários para preservar e fazer valer aquele direito”.[45]

Ressalve-se que há precedentes no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça, admitindo o recurso em sentido estrito interposto pelo assistente também contra a decisão de pronúncia, posicionamento com o qual não concordamos, principalmente em razão do que dissemos acima a respeito da legitimidade da vítima para atuar como assistente do Ministério Público. Vejamo-los:

HABEAS CORPUS Nº. 71453 – GOIÁS. Relator: Ministro PAULO BROSSARD - Julgamento: 06/09/1994 - Órgão Julgador: 2ª. TURMA - Publicação:  DJ DATA-27-10-94 P. 29163 EMENT  VOL - 01764-01 P. 180. EMENTA: "HABEAS CORPUS". PROCESSO PENAL. SENTENCA DE PRONUNCIA. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO DO ASSISTENTE DA ACUSACAO. LEGITIMIDADE, arts. 271, 584, PAR. 1., e 598 CPP. Desclassificação de homicídio qualificado para simples. Ausência de recurso do Ministério Publico. Recurso do assistente provido pelo tribunal, a fim de reintroduzir as qualificadoras imputadas na denuncia. Matéria controvertida na doutrina e na jurisprudência. Escassos precedentes do STF: RE 64.327, RECr 43.888. Tendência de tratamento liberal da Corte em matéria recursal. Interesse do ofendido, que não está limitado à reparação civil do dano, mas alcança a exata aplicação da justiça penal. Princípio processual da verdade real. Amplitude democrática dos princípios que asseguram a ação penal privada subsidiária e o contraditório, com os meios e recursos a ele inerentes, art. 5º., LV e LIX, CF. Pedido conhecido, mas indeferida a ordem de habeas corpus, diante da legitimidade do assistente para interpor recurso em sentido estrito da sentença de pronúncia, irrecorrida pelo Ministério Público, para obter o reconhecimento da qualificação do homicídio.

RECURSO ESPECIAL Nº. 299730 – PARANÁ – RESP 2001/0003800-0. Fonte: DJ 1/04/2002 P. 00229 RSTJ VOL. 156 P. 560. Relator: Min. VICENTE LEAL. Ementa: PROCESSO PENAL. RECURSO ESPECIAL. SENTENÇA DE PRONÚNCIA. LEGITIMIDADE DO ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. SILÊNCIO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. - O assistente de acusação tem legitimidade para, no silêncio  do Ministério Público, interpor recurso em sentido estrito contra sentença de pronúncia, objetivando o reconhecimento de causa de qualificação do homicídio. - Precedente do STF (HC 71453/GO, Rel. Min. Paulo Brossard). Recurso conhecido e provido. Data da Decisão: 05/03/2002. Órgão Julgador: T6 - SEXTA TURMA

b) apelação da sentença absolutória própria e sumária e da impronúncia (art. 416, CPP). Outrossim, a 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu, por unanimidade, que o assistente de acusação tem legitimidade para apelar contra decisão que homologou a suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei nº. 9.099/95), pois estaria sendo inviabilizada a reparação de danos à vítima. Com a decisão foi cancelado o acordo de suspensão do processo e determinado o prosseguimento da ação penal. O caso envolvia 11 pessoas acusadas de estelionato, em continuidade delitiva, e formação de quadrilha. No caso, em tese, uma decisão condenando os réus pelos crimes apontados na denúncia permitiria ação de reparação na área cível. Essa possibilidade foi afastada pela decisão patrocinada pelo Ministério Público e aceita em primeira instância. A turma julgadora do Tribunal de Justiça paulista entendeu que a função do assistente de acusação não é a de auxiliar o Ministério Público, mas a de defender o interesse da parte prejudicada na indenização do dano. Ou seja, o ofendido participa da ação penal pública por causa do seu interesse civil. Os réus foram processados por formação de quadrilha e estelionato. Os advogados do assistente de acusação alegaram que o benefício da suspensão processual foi concedido sem o preenchimento dos requisitos legais. Afirmam que três dos acusados não poderiam ser beneficiados porque respondem a outras ações penais e que uma já tem condenação anterior transitada em julgado. Em preliminar, o Ministério Público sustentou que a assistência de acusação não tinha legitimidade para apelar e, no mérito, pediu que a decisão fosse mantida. Argumentou que não havia impedimento legal de concessão do benefício a delitos em concurso. O relator, Desembargador Marco Antonio Cogan, acolheu a tese sustentada pelos advogados, apontando que o acordo contrariou súmula do Superior Tribunal de Justiça (“o benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material, concurso formal ou continuidade delitiva, quando a pena mínima cominada, seja pelo somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de um ano”). Ele apontou ainda outras ilegalidades para a concessão do benefício. Segundo o relator, não foram fixadas as condições para o ressarcimento do dano nem se fez prova para descobrir se algum dos acusados estava impossibilitado de arcar com sua parte na reparação. “Patente, portanto, que aqui houve colisão entre os interesses legítimos do assistente da acusação e a proposta ministerial de aplicação de suspensão processual, com evidente prejuízo à empresa vítima, uma vez que poderia essa se valer, em caso de eventual prolação de decreto aflitivo, do emprego desse como título executivo no juízo civil”, completou o relator.[46] Acertada, a nosso ver, esta decisão.

c) carta testemunhável;

d) embargos de declaração. Quanto aos embargos declaratórios (tanto os previstos no art. 382, quanto os do art. 619 do Código de Processo Penal), a sua admissibilidade é evidente, até porque não se pode admitir a perfeita validade de uma decisão judicial que não seja clara e íntegra. Exatamente por isso, qualquer decisão judicial pode ser atacada pelos embargos declaratórios, ainda que não haja previsão específica a esse respeito. Como dizem Ada, Scarance e Magalhães “é inconcebível que fique sem remédio a obscuridade, a ambigüidade, a contradição ou a omissão existente no pronunciamento, que podem chegar até a comprometer a possibilidade prática de cumpri-lo”. Para eles, então, “ainda quando o texto legal, expressis verbis, qualifique a decisão como irrecorrível, deve entender-se que o faz com a ressalva implícita aos embargos de declaração”.[47] Eis, portanto, porque incluímos também tal recurso entre os oponíveis pelo assistente. É a lição, aliás, de José Carlos Barbosa Moreira.[48]

e) recursos extraordinário e especial (Súmula 210, STF). Não o pode na hipótese de decisão concessiva de habeas corpus (Súmula 208, STF). A propósito, por seis votos a dois, o Plenário do Supremo Tribunal Federal aplicou sua própria Súmula 210 para admitir que o assistente de acusação em ação penal incondicionada possa interpor recurso, no caso de omissão do Ministério Público, titular da ação. A decisão foi tomada pela Corte ao negar provimento ao Habeas Corpus (HC) 102085. Nele, a defesa do réu se insurgia contra decisão do Superior Tribunal de Justiça que deu provimento parcial a Recurso Especial lá interposto pelo assistente da acusação. No julgamento prevaleceu a tese defendida pela relatora do processo, Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, de que, embora a Constituição Federal preveja, em seu artigo 129, inciso I, que cabe ao Ministério Público, privativamente, promover a ação penal pública, a própria CF, em seu artigo 5º., inciso LIX, admite que “será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal”. A maioria dos Ministros presentes à sessão de hoje do Plenário entendeu que essa regra do artigo 5º. da CF se aplica, também, à interposição de recurso no caso presente, contra sentença absolutória da ré. A ministra Cármen Lúcia fundamentou-se tanto na doutrina quanto na jurisprudência da Suprema Corte para negar o HC e admitir a legitimidade do assistente de acusação de atuar no processo, como o fez. Entre os precedentes, citou os Recursos Extraordinários (REs) 331990 e 160222 e o HC 76754. No mesmo sentido da ministra Cármen Lúcia votaram os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Ayres Britto, Ellen Gracie e Celso de Mello. Em seu voto, a ministra Ellen Gracie  admitiu um certo desconforto em admitir que uma empresa de factoring, “que vive da compra de cheques”, atue na prossecução criminal. Entretanto, ela se disse compelida a votar no mesmo sentido em que votara o ministro Ayres Britto, de que o MP é um órgão público e, como tal, precisa estar sujeito à constante vigilância do cidadão. “A hipótese não é boa, mas a tese deve ser mantida”, observou a ministra Ellen Gracie. Votos discordantes, o presidente do STF, ministro Cezar Peluso, e o ministro Marco Aurélio, sustentaram a prerrogativa exclusiva do MP de agir na ação penal. Segundo o primeiro deles, a Constituição Federal é clara ao atribuir ao MP, em caráter privativo, a titularidade da ação penal, no interesse do Estado de punir criminosos.Por isso, no seu entender, não há interesse do Estado em defender o interesse patrimonial do ofendido, até mesmo porque, no processo, seu papel deve ser de neutralidade. Exceção só é o caso de omissão do MP o que, no sem entendimento, não ocorreu no processo envolvendo Neusa Tomiello, onde ele se manifestou em alegações finais.Peluso lembrou que “agir”, na ação processual, significa tecnicamente praticar todos os atos. Portanto, segundo ele, “quando se fala em exercício de ação penal, quem pode recorrer é somente quem tem o direito de agir, que é o próprio Estado. Quanto ao assistente, “ele simplesmente adere ao titular da ação, que é o MP”. Ainda segundo o ministro Cezar Peluso, não está em jogo a satisfação de interesses patronais, porque para isso há a via própria, que é a ação cível, que já estaria em curso no presente caso. O advogado que atuou na defesa pediu uma revisão da Súmula 210/STF, lembrando que ela data de 1963. Ele apontou contradição entre os artigos 129, inciso I, da CF, e o artigo 5, inciso LIX, o primeiro dispondo que a ação penal é função privativa do MP e, o segundo, admitindo a ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal. Ainda segundo o advogado, o artigo 598 do Código de Processo Penal, ao admitir a interposição de recurso em ação penal por cônjuge, ascendente , descendente ou irmão “carece de conformidade com a Constituição”. Segundo ele, o dispositivo abriu uma brecha de promoção de vingança, ao permitir ao particular assumir o papel do Estado na promoção da ação.O advogado lembrou que, em 1941, quando foi editado o Código de Processo Penal, o assistente de acusação exercia mais a função de assistente litisconsorcial. Hoje, entretanto, segundo o advogado, ele deveria ter a função de assistente simples.Em sentido semelhante ao da defesa manifestou-se a subprocuradora-geral da República Deborah Duprat. Segundo ela, admitir a atuação do assistente da acusação, no caso, geraria um desequilíbrio entre acusação e defesa, com ofensa ao princípio da proporcionalidade e do direito do contraditório.Segundo ela, a jurisprudência moderna vai no sentido da obediência do princípio da paridade de armas para propor e produzir provas no processo. Ainda conforme Duprat, o papel do assistente, hoje, é mais de participação, de proporcionar o diálogo entre as partes na busca do ideal de justiça.No caso julgado, segundo seu entendimento, o assistente “não está à procura do diálogo e da conciliação, que são o ideal do processo, mas de seu próprio interesse, com visão individualista em confronto com o estado democrático de direito”.

f) agravo de instrumento contra decisão denegatória dos recursos constitucionais (art. 28 da Lei nº. 8.038/90).

O prazo recursal para o assistente é o mesmo estabelecido para as partes principais. Observa-se, porém, que quando o assistente recorre supletivamente o prazo para o recurso começa a correr imediatamente após o transcurso do prazo do Ministério Público, segundo a Súmula 448 do Supremo Tribunal Federal. Este preceito sumular somente se aplica quando o assistente é intimado antes do Ministério Público ou quando corre o prazo para este (RTJ, 68/604). Neste sentido, em decisão unânime, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal confirmou decisão judicial que, por falta de intimação do assistente de acusação, impediu o trânsito em julgado de sentença que havia reconhecido a prescrição da pretensão punitiva do Estado contra o réu. Segundo explicou o Ministro Gilmar Mendes, relator do caso, o direito da vítima de exercer o papel de assistente de acusação foi processualmente negado por “exclusiva omissão” do Magistrado de 1ª instância da causa. A matéria foi julgada na análise de Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC 106710) interposto pelo réu no processo, acusado pelo Ministério Público por denunciação caluniosa contra um Desembargador do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM). O Ministro citou decisão do Supremo no sentido de que o prazo para o assistente da acusação interpor recurso começa a correr a partir do encerramento do prazo do Ministério Público. Ele afirmou ainda que jurisprudência consolidada da Corte determina que o assistente de acusação tem legitimidade para recorrer da decisão que absolve o réu nos casos em que o Ministério Público não interpõe recurso.

Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que o prazo para o assistente de acusação já habilitado nos autos apelar é de cinco dias, após a sua intimação da sentença e terminado o prazo para o Ministério Público recorrer. Com esse entendimento, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça concedeu habeas corpus para anular decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que reconheceu a tempestividade de recurso de apelação interposto pela assistência da acusação em um caso de tentativa de homicídio qualificado. “Em que pese toda a análise sistemática feita pelo juízo, para aplicar igualmente o prazo de cinco dias às partes, é certo que o artigo 598, parágrafo único, do Código de Processo Penal estipula o prazo de 15 dias para a interposição da apelação pelo assistente da acusação, sem qualquer distinção entre estar habilitado ou não”, assinalou o TJSP. Em sua decisão, a relatora, ministra Laurita Vaz, destacou que, ao contrário do que afirma o tribunal estadual, a jurisprudência do STJ e do Supremo Tribunal Federal (STF) há muito é pacífica no sentido de que o prazo de interposição do recurso de apelação para o assistente de acusação habilitado nos autos é de cinco dias, a contar da sua intimação. A ministra ressaltou que o STF tem súmula sobre o tema (488), a qual diz que “o prazo para o assistente recorrer, supletivamente, começa a correr imediatamente após o transcurso do prazo do Ministério Público”. Fonte: BRASIL – Coordenadoria de Editoria e Imprensa do Superior Tribunal de Justiça - Em 19 de novembro de 2012 - Disponível em: http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=107722 Acesso em: 19 de novembro de 2012.

Uma observação urge: é sabido que o art. 598 e seu parágrafo único estabelecem que “o ofendido ou qualquer das pessoas enumeradas no art. 31, ainda que não se tenha habilitado como assistente” tem legitimidade para apelar (além de interesse, evidentemente) quando, “nos crimes de competência do Tribunal do Júri, ou do juiz singular, da sentença não for interposta apelação pelo Ministério Público no prazo legal”, deferindo, inclusive, um prazo bem maior para o recurso (quinze dias a partir da data em que terminar o prazo do Ministério Público).

Ora, a doutrina sempre justificou e admitiu este prazo em triplo concedido à vítima não habilitada como assistente (e aos seus sucessores), exatamente em razão do ofendido (e aquelas demais pessoas) não terem sido intimados da sentença, razão pela qual se justificava um prazo maior pela dificuldade de conhecimento da decisão. Agora, no entanto, estabelecendo a lei (art. 201, § 2º.) que da sentença será também intimada a vítima, parece-nos, à luz do princípio da igualdade, que o prazo deve ser o mesmo de cinco dias previsto no caput do art. 593 do Código de Processo Penal, tornando-se inaplicável o prazo previsto no parágrafo único do art. 598.

Ressalte-se, com Humberto Ávila, que a igualdade (que ele denomina de postulado) “estrutura a aplicação do Direito quando há relação entre dois sujeitos em função de elementos (critério de diferenciação e finalidade da distinção) e da relação entre eles (congruência do critério em razão do fim).” Para ele, a proporcionalidade (que também seria um postulado) “aplica-se nos casos em que exista uma relação de causalidade entre um meio e um fim concretamente perceptível. A exigência de realização de vários fins, todos constitucionalmente legitimados, implica a adoção de medidas adequadas, necessárias e proporcionais em sentido estrito.[49]

Tal princípio está previsto expressamente no art. 5º., caput da Constituição Federal e “significa a proibição, para o legislador ordinário, de discriminações arbitrárias: impõe que a situações iguais corresponda um tratamento igual, do mesmo modo que a situações diferentes deve corresponder um tratamento diferenciado.” Segundo ainda Mariângela Gama de Magalhães Gomes, a igualdade “ordena ao legislador que preveja com as mesmas conseqüências jurídicas os fatos que em linha de princípio sejam comparáveis, e lhe permite realizar diferenciações apenas para as hipóteses em que exista uma causa objetiva – pois caso não se verifiquem motivos desta espécie, haverá diferenciações arbitrárias.[50]

Para Ignacio Ara Pinilla, “la preconizada igualdad de todos frente a la ley (...) ha venido evolucionando en un sentido cada vez más contenutista, comprendiédose paulatinamente como interdicción de discriminaciones, o, por lo menos, como interdicción de discriminaciones injustificadas.[51]

Como ensina Celso Antônio Bandeira de Mello, “há ofensa ao preceito constitucional da isonomia quando a norma singulariza atual e definitivamente um destinatário determinado, ao invés de abranger uma categoria de pessoas, ou uma pessoa futura e indeterminada.[52]

Em qualquer fase processual (após o recebimento da peça acusatória) admite-se a habilitação para a assistência, respeitando-se apenas o trânsito em julgado da sentença. Aliás, no julgamento da Petição nº. 3898, por maioria, os Ministros do Supremo Tribunal Federal não aceitaram que o advogado de um assistente da acusação fizesse sustentação oral durante uma sessão em que se analisava o recebimento de uma denúncia oferecida contra um Deputado Federal.No plenário do Tribunal do Júri a intervenção do assistente deverá ser requerida com antecedência de pelo menos cinco dias (art. 430 do CPP).

Para a admissão do assistente é indispensável a ouvida do Ministério Público (art. 272). Por força do art. 273, CPP não é cabível nenhum recurso da decisão que admitir ou não o assistente. Nada obstante, é indiscutível a possibilidade da interposição de mandado de segurança (que não é recurso), embargos declaratórios (pelos motivos acima expostos), correição parcial (dada a sua natureza jurídica) e mesmo o habeas corpus. A utilização deste último remédio jurídico estaria justificada pela possibilidade, em tese, de prejuízo para o réu, considerando-se que o assistente pode recorrer de uma decisão absolutória.

Observa-se que é direito da vítima ter o seu pedido de habilitação analisado pelo Juiz de Direito. Neste sentido, em decisão unânime, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal confirmou decisão judicial que, por falta de intimação do assistente de acusação, impediu o trânsito em julgado de sentença que havia reconhecido a prescrição da pretensão punitiva do Estado contra o réu. Segundo explicou o Ministro Gilmar Mendes, relator do caso, o direito da vítima de exercer o papel de assistente de acusação foi processualmente negado por “exclusiva omissão” do Magistrado de 1ª instância da causa. A matéria foi julgada na análise de Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC 106710) interposto pelo réu no processo, acusado pelo Ministério Público por denunciação caluniosa contra um Desembargador do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM). A denúncia começou a tramitar na Justiça federal, mas, posteriormente, foi transferida para a Justiça estadual, considerada competente para julgar o processo. Quando isso ocorreu, todos os atos processuais da Justiça Federal foram anulados. Inclusive o pedido da vítima para ingressar na denúncia como assistente de acusação. Na Justiça estadual, o Magistrado de 1ª instância deixou de admitir a vítima como assistente de acusação. O réu foi condenado e somente a defesa apelou, argumentado em favor da prescrição da pena, que acabou sendo reconhecida. Contudo, por meio de uma reclamação apresentada ao TJ-AM, a vítima conseguiu reverter a decisão que decretou a extinção da punibilidade do réu e obteve o direito de ser intimada da decisão de 1ª instância, para apresentar seu recurso de apelação. No STF, o réu afirmou que uma vez declarada a prescrição da pretensão punitiva do Estado, a mudança dessa decisão por meio de uma apelação criminal da defesa significaria uma reforma em seu prejuízo (reformatio in pejus). Em outras palavras, ao reconhecer a necessidade de intimação de assistente não formalmente habilitado no processo, vítima no processo, o Tribunal estadual teria reformado a sentença de 1º grau prejudicando o réu, sem que houvesse sido interposto recurso Ministério Público, o titular da ação. O ministro Gilmar Mendes rebateu o argumento. Ele explicou que a transferência da denúncia para a Justiça estadual anulou todos os atos praticados pela Justiça federal, inclusive o pedido da vítima de figurar como assistente de acusação, mas “não teve o condão de desconstituir o direito material da parte ofendida de figurar no pólo ativo da demanda”. Segundo o relator, o direito da vítima de exercer a figura de assistente de acusação foi processualmente negado por exclusiva omissão do magistrado da 5ª Vara Criminal da Comarca de Manaus, que deixou de despachar o pedido efetuado. “As nulidades absolutas podem ser arguidas a qualquer tempo, porque os atos nulos não podem gerar efeitos processuais. O assistente de acusação deve ser intimado de todas as decisões e, caso não tenha sido, tem-se a nulidade dos atos praticados após a omissão”, disse. Assim, não há como alegar a ocorrência de trânsito em julgado para a acusação diante da ausência de intimação do assistente. “Dessa forma, a omissão consistente em desconhecer o pleito de habilitação da vítima na qualidade de assistente, bem como de negar-lhe o direito de figuração no pólo ativo da demanda representa, a meu ver, ofensa ao devido processo legal, que nulifica os atos posteriores à omissão”, reiterou. Fonte: STF.

A propósito, Defensores públicos têm legitimidade para atuar como assistentes de acusação do Ministério Público. A decisão é da Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Alagoas. O colegiado tomou o posicionamento ao rejeitar a alegação, em preliminar, dos advogados de defesa de um empresário acusado de homicídio qualificado. Um Defensor Público atuou como assistente do Ministério Público Estadual no caso, representando a família da vítima. O Desembargador relator, João Luiz Azevedo Lessa, destacou que a Constituição Federal e a legislação específica sobre as atribuições da Defensoria Pública permitem tal atuação, que efetiva o direito fundamental de assistência jurídica integral para aqueles que não têm condições financeiras de contratar um advogado.“Declarar a impossibilidade de tal atuação seria restringir um direito da vítima e seus familiares, que, decerto, são atingidos pelas disposições constitucionais, ao considerar a própria literalidade do caput do artigo 5º de nossa Carta Magna, onde registra que todos são iguais perante a lei, não existindo distinção legal em razão da condição econômico-social das partes de processos judiciais”, afirmou o relator.O Desembargador reforçou ainda que, como o instituto do assistente de acusação é plenamente admitido no sistema jurídico brasileiro, este deve ser acessível a todos. “Se determinada parte possuir recursos financeiros suficientes e puder contratar um advogado para figurar no polo acusatório do processo penal, aquele que comprova insuficiência financeira também deve possuir o mesmo direito, sendo que este é efetivado pela Instituição da Defensoria Pública”, analisou.O Desembargador José Carlos Malta Marques, presidente da Câmara Criminal, destacou a importância do trabalho exercido pela Defensoria Pública para a população e de se deliberar sobre esse assunto na sessão.“No tempo que estou no Tribunal, nós não havíamos nos deparado com essa questão. A provocação da defesa foi bastante providencial, porque ensejou o posicionamento da Câmara sobre o assunto. Acredito que a partir do conhecimento desse julgado, nós teremos vários outros casos. Esta sessão vai inaugurar a possibilidade de a defensoria atuar no polo acusador”, disse. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-AL.Processo 0005214-21.2012.8.02.0001 (Veja aqui).

Questão controvertida consiste na (i)legitimidade da Defensoria Pública como representante processual do assistente do Ministério Público. A propósito, concordamos inteiramente com Lenio Luiz Streck:

"A notícia vinda de Vespasiano (MG) de que, em um júri, o promotor requereu a absolvição dos acusados (o que, aliás, é de sua prerrogativa) e o assistente da acusação, a condenação, faz-me retornar a um assunto sobre o qual já há muito me debrucei. Qual é o papel das instituições em uma democracia? Vamos complicar um pouco o exemplo, supondo que esse assistente de acusação seja um defensor público. Pronto: temos o prato feito. No primeiro exemplo, o Estado, que tem um agente político com a garantia da vitaliciedade e que possui o monopólio da ação penal pública, ao mesmo tempo admite que possa haver um “auxílio” de “terceiro interessado” para essa tarefa. Já no segundo caso, o Estado paga — caro — duas vezes: para acusar e para “auxiliar” a acusação. Se no primeiro caso até poderíamos dizer que, afinal, quem paga é o particular, no segundo caso temos uma esquizofrenia institucional: em um país carente de recursos, o Estado-se-dá-ao-luxo-de-pagar-duas-acusações-públicas. Bingo! Contei isso para um jurista alemão. E ele farfalhava de tanto rir. E brincou: —“Por isso, perderam de 7 a 1 (não gostei da gozação, mas, o que fazer?). Enfim... País rico é país sem pobreza, diriam os governos Lula e Dilma. Fechemos as cortinas e façamos uma anamnese do problema.O primeiro ponto é a constitucionalidade ou a adequação ao Estado de Direito Democrático da própria figura do assistente de acusação. Não serei peremptório. Apenas proponho a discussão. Já houve momento em que essa questão teve repercussão no judiciário, quando, pela primeira vez, sustentei a não recepção da figura da assistência de acusação. Naquele momento, porque o dispositivo era anterior à Constituição, sustentei a não recepção, mostrando como a nova conformação do Ministério Público afastava a participação da vítima, que ficaria reservada à busca de indenização civil (como verão, esta também é a tese do ministro Marco Aurélio e do ex-ministro Cezar Peluso). A assistência da acusação, na verdade, significa(ria) vingança privada. A questão se agrava(va) nos casos em que o Ministério Público pedia a absolvição e o assistente pedia a condenação do réu, o que suscitava discutir o interesse de agir da vítima.Se o réu é acusado pela sociedade e essa não tem interesse, qual a razão para a vítima intervir na ação? Obtive várias vitórias no TJ-RS, ao ponto de a 5ª Câmara Criminal, por um determinado período, não mais aceitar recursos advindos do assistente de acusação. Aliás — para minha satisfação — essa também era a tese da Defensoria Pública do RS e da União, como se pode ver no HC 102.085-RS.Veio uma minirreforma no processo penal e o dispositivo prevendo o assistente de acusação foi “novado”. Logo, já não seria o caso de não recepção — questão que não demanda(va) incidente de inconstitucionalidade — e, sim, de inconstitucionalidade de uma “nova” lei. Nesse sentido, não encontrei clima para um incidente. Tentei e fui derrotado.Passado um tempo, penso que devemos voltar a discutir o tema. Qual é o sentido da assistência à acusação? A busca da indenização ou (um)a vingança privada? Ou as duas coisas? Ora, só para começar, mesmo que o réu seja absolvido, isso não impede a ação civil, porque nem todos os dispositivos que tratam da sentença no Código de Processo Penal conduzem diretamente à não possibilidade de ação civil (sim, sei que, se a absolvição é por negativa de autoria ou da inexistência do fato, não cabe indenização; mas, convenhamos, são as hipóteses radicais de absolvição, pois não?). Elementar isso.A questão, agora, assume foros diferenciados, em face de um novo elemento. Mesmo que se admita que a assistência à acusação (em si) seja constitucional, pode um defensor público ingressar como assistente? A Defensoria foi criada para isso? E, uma vez aceita a tese, como ficam os casos em que o-titular-exclusivo-da-ação-penal requer a absolvição do réu e defensor, “contratado” para a assistência, vê-se na obrigação — porque, afinal, é assistente por parte da vítima — de pleitear a condenação? Ou o defensor, com sua independência funcional, poderia também pedir a condenação de seu cliente? Qual é a posição que deve valer? A do promotor ou do defensor, atuando como assistente? E como fica o réu, que tem contra si alguém que não é indicado pela Constituição para acusá-lo? E como ficam os casos em que tanto promotor e defensor-assistente requerem a condenação (caso recente em São Paulo)? Não se trata de manifesto excesso de acusação?Daí a pergunta: podemos transferir recursos do restante da população para pagar um defensor que irá fazer a assistência da acusação em nome de uma vítima em particular, sem que possamos estender esse direito para todas as demais vítimas de terrae brasilis? Ou seja: se uma vítima tem direito a um defensor fazendo a assistência de acusação, devemos ter presente que todas as demais vítimas devem ter o mesmo direito. Elementar isso também. Logo, haveria dois agentes do Estado acusando réus. Como coadunar isso, quando a própria Defensoria diz que faltam defensores? Para que serve o Ministério Público? É incompetente? O promotor é um néscio que não tem condições de sustentar a visão da sociedade acerca de um processo criminal? Afinal: quem representa a sociedade: O Ministério Público, dominus litis ou a Defensoria, que representa o hipossuficiente?Veja-se que essa questão é antiga. No HC 102.085, estivemos juntos. Eu, sustentando, de há muito, no segundo grau, a inconstitucionalidade do assistente de acusação (tese criada por mim e Marcellus Polastri há 20 anos ou mais) e a Defensoria impetrando Habeas Corpus para impedir que o recurso do assistente (advogado pago pela vítima) vingasse junto ao STJ, repetindo a ação através de HC junto ao STF. Apenas quero que os juristas e os políticos pensem sobre isso. Em uma sociedade carente de recursos, terrae brasilis é jabuticaba (só tem por aqui isso). Nenhum país do mundo tem dois agentes — bem pagos (e que bom que sejam bem pagos) — acusando um réu (na maioria das vezes, superhipossuficiente). Só Pindorama tem. E, pior: pode ocorrer de ter dois agentes públicos (promotor e defensor) acusando e... outro agente público (também defensor público) defendendo. País rico é país sem pobreza! E então, a esquizofrenia é total. A malta paga tudo isso com seus impostos. Ah: como todos são iguais, sendo caso de duas vítimas, poderemos ter dois Defensores assistentes e mais dois defendendo os acusados. Logo, três acusando e dois defendendo. Todos pagos pela Viúva. Afinal, se o Juiz concede um defensor como assistente para um familiar, por que um segundo familiar (de outra família) pode ter negado pedido semelhante, se forem várias as vítimas? Tirante outras hipóteses, como o prazo em dobro que dispõe a Defensoria... Além do fato de que o defensor, atuando como assistente, tem poderes que o Advogado privado não possui. Como fica a isonomia?Sigo. Terrae brasilis é demais. A saúde é um bom exemplo disso. Os patuleus tomam soro em pé nas filas do SUS. Enquanto isso, numa sala de audiências qualquer, digladiam-se um defensor público, um procurador do estado, um procurador do município, um promotor de Justiça e um juiz de Direito, todos muito bem remunerados pela Viúva, em torno da grande questão de saber quem é que paga pelos remédios. Mas não há recursos públicos suficientes...Não me entendam mal (nesse país onde até mesmo a ironia tem de ser explicada, não cabe vacilar). É claro que vejo, no fortalecimento em si das Defensorias Públicas, um bem e não um mal. É preciso garantir acesso à justiça, e a contratação de advogados públicos é uma etapa importante para que isso aconteça. Franz Klein, um dos corifeus do socialismo processual, lá pelo fim do século XIX, já apontava para isso, ao defender que o Juiz, enquanto não houvesse advogados pagos pelo Estado, deveria assumir a defesa endoprocessual dos mais pobres (que o socialismo processual tenha ecos ainda hoje no processo jurisdicional, é um daqueles mistérios insondáveis da nossa existência). Também no célebre texto de Garth e Cappelletti sobre o acesso à Justiça aparecem apontamentos interessantes sobre essa temática. Se é verdade que o Poder Judiciário passava a ter um papel importante na resolução de “novas” questões, no enfrentamento de demandas políticas (ou com estas imbricadas), era preciso que alguém as levasse até ele, pois não?No contexto do constitucionalismo brasileiro, em que se encontram, de um lado, um generoso catálogo de direitos fundamentais, e, de outro, uma realidade bruta e (em alguns aspectos) pré-moderna, é mesmo indispensável a figura de um advogado público. A judicialização das omissões concreta e individualmente geradas pelo Estado lato sensu deve poder ser feita com alguém competente. Então, loas às Defensorias. Que devem ser fortalecidas. Devo ter sido o primeiro, ou um dos primeiros ao menos, a sustentar que a não implementação de Defensorias, no âmbito dos estados, implicava omissão inconstitucional (judicializável, portanto). Também, de nada adiantaria trocar as filas do SUS por “filas nas Defensorias”. Fichas para atendimento por médico e por advogado. Troca-se de fila, segue-se sem o remédio, entendem?Agora, que justificativas há para que se crie um “superadvogado público”, com poderes e prerrogativas que não alcançam aos demais advogados? O que justifica esta distinção? Por que alguém optaria por contratar um Advogado particular se poderá ser assistido, gratuitamente, por alguém que pode requisitar documentos e providências de órgãos públicos, além de possuir prazo dilatado para se manifestar nos processos? Vejam, aliás, como a questão da hipossuficiência vem sendo relativizada... A questão não é mais saber quem é hipossuficiente... A questão é: “— Quem não é?”. O “conceito” de hipossuficiente, agora, é organizacional. Não é mais econômico. Confesso que não entendi a “sofisticação” desse conceito... Mas, se o cidadão não é hipossuficiente econômico, não pode, ele, contratar advogado? Para que serve o advogado, afinal? Parece que “hipossuficiente” quer dizer: “basta alegar”. Há, com efeito, uma esquizofrênica superposição de funções e poderes entre a Defensoria Pública e o Ministério Público. É possível dizer que o Ministério Público não tem cumprido a contento sua missão constitucional (isso é tema para outra coluna); mas dois erros não fazem um acerto. Principalmente enquanto ainda estiverem sendo distribuídas fichas de atendimento individual aos cidadãos que madrugam na esperança de obter, na coloração tupiniquim, o seu day in court.É nesse sentido que devemos discutir o que vem acontecendo, com a atuação da Defensoria Pública como assistente de acusação em ações penais. Como disse, não quero ser peremptório. Quero colocar o problema para a comunidade jurídica discutir.E para que isso não fique incompleto, trago a lume o HC 102.085, no qual o Supremo Tribunal Federal enfrentou o assunto (neste caso, tratava-se de um assistente privado), ainda que não estivessem presentes três ministros. Nesse writ, a Defensoria Pública pleiteava a nulidade de decisão do STJ, que deu guarida a Recurso Especial contra decisão do TJ-RS, que inadmitira recurso de apelação feito por assistente de acusação privado. Por maioria de votos, o STF sustentou a validade da velha Súmula 210 (corretamente, a Defensoria da União sustentava a sua não recepção!).Permissa vênia, penso que o Supremo se equivocou. Os dois votos vencidos, da lavra dos ministros Marco Aurélio e Cezar Peluso, foram precisos e corretos. Para o ministro Marco Aurélio,“o próprio constituinte abriu exceção única à regra da promoção privada em substituição à ação penal pública do Estado acusador. Fê-lo, de forma exauriente, mediante o preceito do inciso, já muito referido, LIX, do artigo 5º (será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada – está em bom vernáculo, em bom português – “no prazo legal. (...). Será que, diante desses dois dispositivos, é possível ter-se a transmudação da ação penal pública que existiu em ação penal privada? A resposta, para mim, é desenganadamente negativa. Uma ação que nasce pública incondicionada não pode, na fase recursal, transformar-se em uma ação penal privada. (...)”Para encerrar, disse o ministro: a ação penal pública não pode se transformar em uma corrida de revezamento. Assistente só se justifica quando o Ministério Público for inerte.Já o ministro Peluso asseverou que o texto constitucional derrogou a velha concepção de justiça privada e por isso, deferiu ao Ministério Público, em caráter privativo e exclusivo, a titularidade da ação penal.“Para quê? Para a defesa de interesse estatal específico, que é o de punir criminosos (...). De modo que nem sequer se pode cogitar de que haja, nisso, algum interesse estatal em defender interesses patrimoniais do ofendido.Em segundo lugar, porque costuma acontecer, como em qualquer instituição, que os agentes às vezes falhem, nos casos em que eventualmente o Ministério Público se omita, dada a relevância do mesmo interesse estatal, a Constituição atribuiu a titularidade da ação ao particular ofendido, mas em caráter de exceção e apenas na hipótese de omissão. (...) Só pode agir em termos de recurso quem tem direito de ação, direito de agir. Ora, quem tem direito de agir? O Ministério Público, como regra, e o querelante, como exceção, não o assistente. O assistente não exerce direito de ação, nem na concepção do processo criminal, nem na concepção, muito mais generosa, da ação civil. O assistente simplesmente adere ao titular da ação. (...) Ora, o assistente penal, não sendo titular de ação nenhuma, senão assistente de quem o é, a meu ver não pode recorrer (...).”Sigo. Admitindo que a decisão do STF esteja correta, ainda assim teríamos que ver se a decisão é extensível aos casos em que o assistente da acusação é um defensor Público. Neste caso, uma interpretação conforme (verfassungskonforme Auslegung) ao dispositivo do CPP poderia resolver o assunto, ressalvando que o Estado (no caso, via defensor-assistente) não pode incorrer em bis in idem e excesso de acusação, tendo na mesma ação penal e do mesmo lado, um agente do Ministério Público e um agente da Defensoria. Neste caso, poder-se-ia admitir que, em uma democracia, não se pode impedir que um cidadão que tenha recursos contrate um advogado privado para buscar seus interesses (claro, de novo, vem a questão: qual é a leitura que se faz da Constituição, que, no seu artigo 5º., LIX, coloca como exceção à titularidade exclusiva do MP a hipótese de sua inércia, isto é, voltar-se-ia à discussão do cabimento stricto sensu da figura do assistente: afinal, ela é ou não constitucional?).Sei das posições que sustentam tanto a permanência da assistência para a advocacia privada como para a Defensoria. No próprio HC 102.085 essas posições estão desenhadas. Mas com elas não concordo. De todo modo, o que não podemos fazer é colocar recursos públicos onde não se deve pô-los e onde já existe alguém (bem) pago para fazer essa função.Assim, ou é excesso de acusação, considerando-se inclusive o pressuposto não apenas da competência do Ministério Público, mas também o princípio da presunção de inocência, ou então, como no caso em que o promotor pede a absolvição e o defensor-assistente persiste na acusação, "esquizofrenia" estatal, em que deve prevalecer a posição do MP. Ou não? Como fica isso?Enfim, como diz Marcellus Polastri, assistente de acusação é “intervenção de terceiro”: se for para interesse de ressarcimento cível. Isso para os que acham constitucional a figura do assistente, é claro.Em um país carente de recursos, essa questão assume foros de dramaticidade. Admitamos, como disse — no limite — que prevaleça a tese da adequação constitucional do instituto da assistência da acusação. Mas, ainda que essa tese se consolide, uma questão deve ser discutida, isto é: como colocar um defensor público como assistente de acusação para a vítima, se essa atitude não pode ser universalizada? Eis o busílis. E se fosse possível universalizar a concessão de um defensor para cada vítima (e levando-se em consideração o elástico conceito de hipossuficiência), qual seria o sentido da existência do titular da ação penal? Tornar-se-ia inútil, porque poderia ser substituído pelo defensor-assistente, poupando valiosos recursos públicos. Pronto: substitua-se o promotor pelo defensor, que pode, assim, fazer as duas coisas. Simples. E mais barato. Ou, quem sabe, que sejam unificadas as duas carreiras... Em outras palavras: temos que, urgentemente, reexaminar as nossas “bondades” e estudar as “fragilidades” de tais bondades, para usar uma expressão de Nussbaum.Enfim, parece que os recursos públicos em terrae brasilis dão em árvore. Depois nos queixamos. Estamos indo com muita sede ao pote. E brincando de “relações institucionais”. O estado brasileiro parece ser um universo em expansão. Incha dia a dia. E sobrará pouco espaço para “as coisas privadas”. Só quero saber o que faremos com as mais de mil faculdades de Direito, se tudo será bancado pelo Estado. É inexorável que venha a explodir (ou implodir). E as instituições fazem uma disputa pelos pobres. O Estado é muito bondoso, pois não? Terrae brasilis é realmente incrível. Incrível no sentido de que não dá para acreditar. Vamos refletir sobre isso? Temos maturidade para tal? Tenho convicção que sim. Sou um otimista do tipo “als ob” (como se), isto é, “é como se tivéssemos”. Enfim, um pouco da filosofia do “como se”, de Hans Vahinger: uma ficção necessariamente útil..." Fonte: Revista Consultor Jurídico, 24 de julho de 2014, 8h00 (aqui).

Por fim, ressalvamos a posição pacífica da jurisprudência em não admitir a intervenção do assistente nos processos de habeas corpus; a propósito:

SUPREMO TRIBUNAL FEDERALC - HC 84022 AgR / CE - AG.REG.NO HABEAS CORPUS. Relator: Min. CARLOS VELLOSO. Julgamento:  03/08/2004. Órgão Julgador: Segunda Turma. Publicação:  DJ DATA-20-08-2004 PP-00053 O assistente de acusação não possui legitimidade para intervir no processo de habeas corpus ajuizado pelo réu em crime de ação penal pública. II. - Precedentes da Corte. III. - Agravo não provido.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - AgRg no HABEAS CORPUS Nº 72.726 - SP (2006/0276683-5) - RELATORA: MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA – Nos termos da orientação jurisprudencial dominante, não se admite o ingresso do assistente de acusação em sede de habeas corpus. 3. Agravo não conhecido.

Vejamos este trecho do voto da Ministra Maria Theresa de Assis Moura:

“(...) Segundo, como já muito bem explicado no recurso, é pacífico o entendimento contrário à admissão do assistente de acusação no writ. Não prospera o raciocínio calcado no paralelo entre os bens jurídicos vida e honra. As características de cada uma das modalidades de ação penal, de iniciativas pública e privada, garantem-lhes tratamentos distintos, justamente pela extraordinária inserção do particular no pólo ativo desta última categoria processual. (...) Neste diapasão é a "jurisprudência desta Corte e do c. Pretório Excelso, que não admite a intervenção do assistente de acusação no habeas corpus. Nesse sentido, os seguintes jugados: AEDRHC nº 505/SP, Rel. Min. Assis Toledo, DJU de 17/09/1990, Resp 17039/GO, Rel. Min. Assis Toledo, DJU 16/11/1992, MS 7073, Rel Min. Edson Vidigal, DJU 06/02/2001. E no colendo Supremo Tribunal Federal: RHC 65.781, Rel. Min. Moreira Alves, RTJ 126/154, HC nº 72710/MG, Rel. Min. Sydney Sanches, DJU de 27/10/1995. A questão é, inclusive, objeto do Enunciado da Súmula nº 208, da Augusta Corte" (AgRg nos EDcl no HC 43127/GO - Rel. Min. Félix Fischer - DJ 28.11.2005 p. 320). Cumpre destacar ainda o seguinte aresto do Supremo Tribunal Federal:"A intervenção do assistente do Ministério Público na presente causa não se justifica, eis que lhe falece legitimidade para atuar no processo penal de habeas corpus. Sabemos que, na ação de habeas corpus, os sujeitos da relação processual penal, além do órgão judiciário competente para julgá-la, são, apenas, (1) o impetrante/paciente, (2) a autoridade apontada como coatora e (3) o Ministério Público. Eles compõem o quadro dos elementos subjetivos essenciais da relação jurídico-processual do habeas corpus. São, por isso mesmo, os sujeitos processuais relevantes, principais e imprescindíveis da ação de habeas corpus, não obstante PONTES DE MIRANDA, em clássica monografia sobre o tema ('História e Prática do Habeas Corpus ', tomo II, p. 23/24, § 105, 7ª ed., 1972, Borsoi), ao versar essa mesma questão, tenha acrescentado ao rol a figura, por ele reputada essencial, do detentor do paciente. As vítimas de qualquer infração penal, ou aquelas pessoas mencionadas no art. 268 do Código de Processo Penal, mesmo quando habilitadas como assistentes da Acusação - o que só ocorre nos crimes de ação penal pública - não possuem qualidade e nem dispõem de legitimação, por ausência absoluta de previsão legal, para intervir no procedimento judicial de habeas corpus. Na realidade, a atividade processual do assistente do Ministério Público não se revela ampla e nem ilimitada, especialmente no que concerne à sua participação no processo de habeas corpus, eis que são de direito estrito as faculdades jurídicas a ele outorgadas pelo ordenamento positivo (CPP, art. 271, caput). O assistente do Ministério Público, bem por isso, somente pode intervir ad coadjuvandum no processo penal condenatório (CPP, art. 268), assistindo-lhe, no plano estrito das ações penais de condenação - com as quais não se confunde a ação de habeas corpus (JOSÉ FREDERICO MARQUES, 'Elementos de Direito Processual Penal', vol. 4/380-382, item n. 1.178, 1965, Forense) -, a prerrogativa de propor meios de prova, de requerer perguntas às testemunhas, de aditar o libelo e os articulados, de participar do debate oral e de arrazoar os recursos interpostos pelo Parquet ou por ele próprio, inclusive extraordinariamente, nos casos dos arts. 584, § 1º, e 598 (CPP, art. 271, caput, e Súmula 210/STF). Vê-se, portanto, que a atividade processual do assistente do Ministério Público sofre explícitos condicionamentos impostos pela lei, a cuja disciplina está ela juridicamente sujeita. É por isso que o assistente do Ministério Público, mesmo nas estritas hipóteses legais que justificam a sua intervenção assistencial, '... não pode recorrer, extraordinariamente, de decisão concessiva de habeas corpus' (Súmula 208/STF); não pode recorrer em sentido estrito da sentença de pronúncia (RTJ 49/344); não pode interpor recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal de decisão que absolve o condenado em revisão criminal (RTJ 70/500); não pode, ainda, postular, nas causas de competência do Júri, o desaforamento de seu julgamento (RTJ 56/381). A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, por tal razão, não tem admitido a participação do assistente do Ministério Público na relação processual penal instaurada com a impetração do habeas corpus. (...) Também o Egrégio Superior Tribunal de Justiça - apreciando essa mesma questão - perfilhou igual orientação, rejeitando a possibilidade de intervenção do assistente do Ministério Público no processo penal de habeas corpus: 'Processo penal. Habeas corpus. Assistente de acusação. Inadmissibilidade. Não cabe intervenção do assistente da acusação no processo de habeas corpus, visto como a função do assistente é restrita à parte acusatória (art. 271 do CPP), enquanto que, no habeas corpus, onde não existe sequer acusação, o Ministério Público não desempenha o papel de acusador, e sim de fiscal da lei. Precedentes jurisprudenciais.' (RT 666/352, Rel. Min. ASSIS TOLEDO - grifei) Em suma: o assistente de acusação não ostenta a situação jurídica de parte nas ações de habeas corpus, cujos sujeitos processuais, como já ressaltado, são, unicamente, o impetrante, o paciente, a autoridade coatora, o Ministério Público e o próprio Juiz. O assistente de acusação, portanto, é um extraneus na formação da relação processual penal instaurada com o ajuizamento da ação de habeas corpus. Não ostentando a condição jurídico-formal de litigante nesse processo não-condenatório, não há como invocar a regra consubstanciada no art. 268 do Código de Processo Penal, cuja incidência restringe-se ao plano das ações penais condenatórias. Não custa enfatizar, portanto, que, no processo penal de habeas corpus, o assistente de acusação não é parte e nem ostenta a condição de litigante. Parte adversa ao impetrante/paciente é o próprio Estado, cuja atuação administrativa ou jurisdicional enseja o ajuizamento do writ. Compõem, destarte, a relação processual penal instaurada com a impetração do habeas corpus, como litigantes - e, portanto, como destinatários da garantia do contraditório proclamada pelo art. 5º, LV, da Constituição - o impetrante/paciente, de um lado, e a autoridade coatora, de outro. Daí a observação de JOSÉ FREDERICO MARQUES (op. cit. vol. 4/406), no sentido de que o conteúdo do processo de habeas corpus 'é uma lide ou litígio entre o que sofre a coação ou ameaça ao direito de ir e vir, e o Estado, representado pela autoridade coatora'. O assistente de acusação, na realidade, é terceiro formalmente estranho à discussão, que, sob a égide do contraditório, se estabelece no processo penal de habeas corpus entre o paciente e o Estado. Não há como se lhe aplicar a garantia inscrita no art. 5º, LV, da Constituição, pois, não sendo parte litigante nesse procedimento penal não-condenatório, não pode, o assistente do Ministério Público, pretender o amparo da cláusula constitucional mencionada. Cumpre assinalar, ainda, que pertence ao Estado, de modo absoluto, o direito de punir. Sendo assim, não há que se cogitar de qualquer direito material titularizável pelo assistente do Ministério Público, cuja intangibilidade possa justificar o seu chamamento ou a sua intervenção no processo de habeas corpus, em cujo âmbito um dos sujeitos - o próprio Estado, titular do jus puniendi - já se faz presente por intermédio da autoridade coatora. A circunstância de o Ministério Público poder intervir no processo de habeas corpus, nas condições referidas na legislação processual (CPP, art. 654, caput, e DL nº 552/69), não traduz, só por si, situação jurídica invocável pelo assistente da acusação, para legitimar o seu ingresso na relação processual instaurada com a impetração do writ. Tais situações são absolutamente inassimiláveis. O Ministério Público, na presente causa - que configura processo penal de caráter não-condenatório - desempenha a típica função institucional de custos legis. Ressalvada a hipótese legal de ser, ele próprio, o impetrante do writ (situação inocorrente neste caso), o Ministério Público atua como órgão interveniente, velando pela correta aplicação das leis. Daí o já haver sido proclamado que o Ministério Público, na ação penal de habeas corpus, exerce, ordinariamente, a função de custos legis. Em sendo assim, e '... não havendo, no processo de habeas corpus, quem acuse, não se pode falar em assistente do Ministério Público, pois tal assistência não diz com todas as funções daquela Instituição, já que a interferência do particular na ação penal pública é de conteúdo específico' (RT 590/359-361, 360, TACRIM/SP, Rel. Juiz Adauto Suannes). Sendo assim, e tendo em consideração as razões invocadas, não conheço dos pedidos formulados nesta sede processual de habeas corpus pelo assistente do Ministério Público, a quem deverão ser devolvidas as petições protocoladas sob nº 014738/00-STF, nº 015098/00-STF e nº 016172/00-STF, acompanhadas de cópia da presente decisão. 09 de março de 2000. Rel. Ministro CELSO DE MELLO" (STF - HC 80.022-0 - Rel. Min. Celso de Mello - j. 09.03.2000, p. 29).Deve-se transcrever também a recente decisão do eminente Ministro Hamilton Carvalhido, nos autos do Habeas Corpus n. 55.631, datada de 13 de junho de 2006:“Persisto no entendimento de ser incabível a pretendida intervenção na ação de habeas corpus. É que, em tema de liberdade, a interpretação há de ser sempre em seu obséquio e, portanto, restritiva, excluindo, por certo, qualquer outra, assim como a aplicação analógica ou subsidiária de norma, devendo ser afirmada, por isso, a inadmissibilidade da assistência da acusação, no processo de habeas corpus.Não é outra a compreensão desta Corte Superior de Justiça:'EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. HABEAS CORPUS. AÇÃO PENAL PRIVADA. LITISCONSÓRCIO. INCABIMENTO. OMISSÃO. INOCORRÊNCIA. NULIDADE. INCARACTERIZAÇÃO.1. Diversamente do que ocorre com o mandado de segurança, inexiste, relativamente ao habeas corpus, no Código de Processo Penal, norma autorizativa de intervenção de terceiros, devendo ser afirmado, por isso, a sua inadmissibilidade, porque em tema de liberdade, a interpretação há de ser sempre em seu obséquio e, portanto, restritiva, excluindo, por certo, pretendida aplicação analógica ou subsidiária.2. De qualquer modo, as questões em que se visava à assistência ao Juízo impetrado como coator foram decididas pelo acórdão embargado, impondo-se a rejeição dos embargos declaratórios.''PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. AGRAVO REGIMENTAL. ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO. INADMISSIBILIDADE. Em sede de habeas corpus é inadmissível a intervenção do assistente de acusação, ainda que esteja atuando na ação originária. (Precedentes doPretório Excelso e desta Corte) Agravo Regimental desprovido. ' (AgRg nos EDcl no HC nº 43.127/GO, Relator Ministro Felix Fischer, in 28/11/2005).'HABEAS CORPUS.- No habeas-corpus não cabe a manifestação do assistente da acusação. Decisão unânime. - Pedido prejudicado. Maioria. ' (HC nº 11.649/GO, Relator Ministro Fontes de Alencar, in DJ 28/5/2001).'PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO. INADMISSIBILIDADE. Não cabe intervenção do assistente da acusação no processo de habeas corpus, visto como a função do assistente é restritiva à parte acusatória (art. 271 do CPP), enquanto que, no habeas corpus, onde não existe sequer acusação, o Ministério Público não desempenha o papel de acusador e sim de fiscal da lei.Precedentes jurisprudenciais.Despacho de Relator que negou seguimento a embargos de declaração em recurso de habeas corpus, interpostos por quem se intitula assistente de acusação.Agravo regimental improvido, confirmando-se aquele despacho pelos seus próprios fundamentos. ' (AgRg no EDcl no RHC nº 505/SP, Relator Ministro Assis Toledo, in DJ 17/9/90).'RHC - CONSTITUCIONAL - HABEAS CORPUS - VÍTIMA - LITISCONSÓRCIO - O Habeas Corpus , ação constitucionalizada, visa a preservar o direito de liberdade. Admissível ser concedido de ofício. Daí, a vítima, ou qualquer interessado ser carecedor de ação para atuar como litisconsórcio, visando a impedir a concessão do 'writ'' (RHC nº 8.063/CE, Relator Ministro Vicente Cernicchiaro, in DJ 22/2/99).'RECURSO ORDINÁRIO DE 'HABEAS CORPUS' (ART. 105, II, 'a', DA CONSTITUIÇÃO). Querelante. Falta de legitimidade. O recurso ordinário de habeas corpus é privativo do impetrante, 'quando denegatória a decisão'. Das decisões deferitórias de habeas corpus cabe apenas, em tese, o recurso especial (art. 105, III, 'a' e 'c', da Constituição). Recurso não conhecido. ' (RHC nº 2.646/PA, Relator Ministro Assis Toledo, in DJ 3/5/93).E também do Excelso Supremo Tribunal Federal, valendo invocar, a propósito e, em remate, o voto do ilustre Ministro Celso de Mello, no HC nº 72.710/MG (Questão de Ordem), verbis: 'Os sujeitos da relação processual penal instaurada com a impetração do remédio constitucional do habeas corpus são, além do órgão judiciário competente para julgá-Io, apenas (1) o impetrante/paciente, (2) a autoridade apontada como coatora e (3) o Ministério Público.Compõem, eles, o quadro dos elementos subjetivos essenciais da relação jurídico-processual do habeas corpus. São, por isso mesmo, os sujeitos processuais relevantes, principais imprescindíveis da ação de habeas corpus, não obstante PONTES DE MlRANDA, em clássica monografia sobre o tema ('História e Prática do Habeas Corpus', tomo II, p. 23/24, § 105, 7ª ed., 1972, Borsoi), ao versar essa mesma questão, tenha acrescentado ao rol a figura, por ele reputada essencial, do detentor do paciente.As vítimas de qualquer infração penal, mesmo quando habilitadas como assistentes da Acusação - o que só ocorre nos crimes de ação penal pública -, não possuem qualidade e nem legitimação, por ausência absoluta de previsão legal, para intervirem no procedimento judicial de habeas corpus.Na realidade, a vítima de qualquer infração delituosa perseguível mediante ação penal pública pode intervir ad coadjuvandum na relação processual, como assistente do Ministério Público (CPP, art. 268), desde que o faça estritamente no plano das ações penais condenatórias - com as quais não se confunde o habeas corpus -, sendo-lhe reconhecido o direito de exercer, no âmbito desse procedimento judicial, determinadas prerrogativas taxativamente definidas pelo texto legal (CPP, art. 271, caput, e Súmula 210/STF).A atividade processual do ofendido, portanto, sofre limitações derivadas dos condicionamentos impostos pela lei, a cuja disciplina está ela juridicamente sujeita. Por isso, mesmo nas estritas hipóteses legais que justificam a sua intervenção assistencial - crimes perseguíveis mediante ação penal pública -, o assistente do Ministério Público '... não pode recorrer, extraordinariamente, de decisão concessiva de habeas corpus' (Súmula 208/STF); não pode recorrer em sentido estrito da sentença de pronúncia (RTJ 49/344); não pode interpor recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal de decisão que absolve o condenado em revisão criminal (RTJ 70/500); não pode, ainda, postular, nas causas de competência do Júri, o desaforamento de seu julgamento (RTJ 56/381).A jurisprudência desta Corte, tendo presente esse contexto emergente de nosso sistema normativo, não tem admitido a participação do assistente do Ministério Público na relação processual instaurada com a impetração do habeas corpus. O remédio constitucional do habeas corpus nada mais é do que uma ação penal tendente à obtenção de provimentos jurisdicionais não-condenatórios. Assume o perfil - tal seja a natureza da postulação nele veiculada ora de ação penal declaratória, ora de ação penal constitutiva, ora de ação penal cautelar. O magistério de JOSÉ FREDERICO MARQUES ('Elementos de Direito Processual Penal', vol. 4/380-382, item 1178, 1965, Forense) é definitivo a esse respeito, verbis: 'A ação de habeas corpus terá a natureza da prestação jurisdicional invocada. O direito de liberdade, lesado ou ameaçado, recebe a tutela jurisdicional para o seu pronto restabelecimento, graças à ação de habeas corpus (...). Assim sendo, ao lado do direito de liberdade, há o 'direito público subjetivo' de impetrar-se o habeas corpus, isto é, o direito de deduzir em juízo a pretensão fundada no status libertatis, para que o Judiciário a aprecie e decida.O pedido de habeas corpus, levado a juízo, pode ter por objeto imediato ou um pronunciamento declaratório, ou uma providência cautelar, ou uma decisão constitutiva, ou ato jurisdicional que imponha à autoridade coatora o restabelecimento acautelatório da liberdade atingida e violada. Donde poder a ação de habeas corpus ter a natureza de ação declaratória, ou constitutiva, ou cautelar. Esse jus actionis, por outro lado, terá a natureza de ação penal, desde que o seu fundamento esteja no direito penal de liberdade, o que acontecerá quando a lesão ou ameaça, que pese sobre o jus libertatis, derivar de atos da persecutio criminis, tendo, assim, como autoridade coatora, algum dos órgãos da Justiça Criminal, ou mesmo outro órgão estatal que arrogue para si, ainda que indevidamente, a prática de ato persecutório-penal.'O ofendido é, portanto, um extraneus na formação da relação processual penal instaurada com o ajuizamento da ação de habeas corpus. É preciso salientar, por isso mesmo, que, no processo penal de habeas corpus, o ofendido não é parte e nem ostenta a condição de litigante. Parte adversa ao impetrante/paciente é o próprio Estado, cuja atuação administrativa ou jurisdicional - a que se atribuiu o vício da ilegalidade tornou necessário o ajuizamento do writ constitucional. Compõem, destarte, a relação processual penal instaurada com a impetração do habeas corpus, como litigantes, apenas o impetrante/paciente, de um lado, e a autoridade coatora, de outro. Daí a observação de JOSÉ FREDERICO MARQUES (op. cit. voI. 4/406) no sentido de que o conteúdo do processo de habeas corpus 'é uma lide ou litígio entre o que sofre a coação ou ameaça a direito de ir e vir, e o Estado, representado pela autoridade coatora'.A circunstância de o Ministério Público poder intervir no processo de habeas corpus não traduz, por si só, situação jurídica invocável pelo Assistente da acusação para legitimar o seu ingresso na relação processual instaurada com a impetração do writ.O Ministério Público - cuja atuação processual nas ações de habeas corpus é necessária no segundo grau de jurisdição em face de expressa determinação legal (Decreto-lei nº 552/69) - desempenha, nesse processo penal de caráter não-condenatório, a típica função institucional de custos legis. Ressalvada a hipótese legal de ser ele próprio o impetrante, o Ministério Público atua como órgão interveniente, velando pela correta aplicação das leis.Daí, o já haver sido proclamado que o Ministério Público, na ação penal de habeas corpus, exerce, normalmente, a função de custos legis. Em sendo assim, e '... não havendo, no processo de habeas corpus, quem acuse, não se pode falar em assistente do Ministério Público, pois tal assistência não diz com todas as funções daquela instituição, já que a interferência do particular na ação penal pública é de conteúdo especifico' (RT 590/359-361, 360, TACRIM/SP, Rel. Juiz Adauto Suannes). A jurisprudência dos Tribunais, por isso mesmo, e considerando a estrita disciplina jurídico-legal a que se acha submetida a atuação processual penal do ofendido, tem proclamado a inadmissibilidade de sua intervenção no processo de habeas corpus, ainda quando habilitado como assistente do Ministério Público (RT 557/350 - RT 598/325 - RTJ 56/693-695).Bem por isso, impende salientar que esta Colenda Primeira Turma, ao julgar o RHC nº 65.181-8-SP, de que foi relator o eminente Ministro MOREIRA ALVES (RTJ 126/154), reiterou o entendimento de que, tratando-se de processo de habeas corpus, nele não cabe a intervenção assistencial do ofendido. Assim sendo, e tendo presentes as razões expostas, não atribuo legitimidade ao assistente do Ministério Público para intervir no processo de habeas corpus e, em conseqüência, não lhe reconheço o direito de fazer sustentação oral, como ora pretendido.'Pedido indeferido."Assim, tem-se claramente como inviável o ingresso do assistente de acusação no writ. A despeito de não ser possível conhecer-se do agravo regimental em razão dos jurídicos argumentos alinhavados acima, cumpre-me abrir um parêntese. Independentemente das características desta ou daquela causa, esta relatora, no exercício de suas funções, vem dispensando o tradicional, e isonômico, empenho que sempre marcou a atuação dos Ministros desta Casa. 

Não é possível a intervenção da parte acusadora em processo de Habeas Corpus, pois este é um instrumento exclusivo da defesa. Com base nesse entendimento, a Ministra Laurita Vaz, do Superior Tribunal de Justiça, rejeitou Recurso Extraordinário apresentado contra decisão da 5ª Turma que concedeu Habeas Corpus. A relatora avaliou que, sendo um instrumento exclusivo da defesa, “não cabe, na referida via, qualquer intervenção do acusador ou de assistente do Ministério Público, sob pena de desvirtuamento da finalidade constitucional do writ”. Ela ainda mencionou a Súmula 208 do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual o assistente do Ministério Público não pode recorrer extraordinariamente de decisão que concede Habeas Corpus. (aqui).


Notas e Referências:

[2]Art. 12. A prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima ou à entidade pública ou privada com fim social, de importância, fixada pelo juiz, não inferior a um salário mínimo nem superior a trezentos e sessenta salários mínimos. O valor pago será deduzido do montante de eventual reparação civil a que for condenado o infrator.”

[3]Art. 45. Na aplicação da substituição prevista no artigo anterior, proceder-se-á na forma deste e dos arts. 46, 47 e 48. § 1º. - A prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social, de importância fixada pelo juiz, não inferior a 1 (um) salário mínimo nem superior a 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos. O valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil, se coincidentes os beneficiários.”

[4]Art. 297. A penalidade de multa reparatória consiste no pagamento, mediante depósito judicial em favor da vítima, ou seus sucessores, de quantia calculada com base no disposto no § 1º do art. 49 do Código Penal, sempre que houver prejuízo material resultante do crime. (...) § 3º Na indenização civil do dano, o valor da multa reparatória será descontado.”

[5]  Ada Pellegrini Grinover e outros, Juizados Especiais Criminais, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2ª. ed., p. 129.

[6]  Juizados Especiais Criminais, São Paulo: Atlas, 1997, p. 78.

[7] Neste sentido é o pensamento de Ada et alli: “A composição dos danos civis pode ser parcial. Embora a transação civil implique, via de regra, quitação recíproca, é possível que haja nela a repartição entre danos materiais (imediatamente compostos) e danos morais (a serem apurados no juízo civil). A quitação poderá, assim, ser parcial, ressalvada a controvérsia sobre os danos morais. Mas a composição, conquanto parcial, dos danos civis importará, de qualquer modo, na renúncia ao direito de representação ou queixa, com a conseqüente extinção da punibilidade.” (ob. cit., p. 133).

[8] Para Weber Martins Batista, “nos crimes de ação penal pública incondicionada, ela não impede a aplicação de pena ao autor do fato, mas não deixa de influir na qualidade e quantidade da pena a ser imposta, pois a indenização dos danos deve aconselhar um tratamento menos severo do autor do fato.” (Juizados Especiais Cíveis e Criminais e Suspensão Condicional do Processo Penal, Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 314).

[9]  Ob. cit., p. 110.

[10] Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, n. 21, p. 422.

[11] O Papel da Vítima no Processo Criminal, Malheiros Editores, 1995. Indicamos também o trabalho intitulado “El papel de la víctima en el proceso penal según el Proyecto de Código Procesal Penal de la Nación”, por Santiago Martínez (Fonte: www.eldial.com – 12/08/2005).

[12] La Vittima nel Sistema Italiano Della Giustizia Penale – Un Approccio criminologico, Padova, 1990, p. 144. Na doutrina estrangeira, também indicamos “De los delitos y de las víctimas”, obra coletiva com trabalhos de Claus Roxin, Julio Maier, Nils Christie, dentre outros.

[13] Processo Penal, São Paulo: Atlas, 5ª. ed., p. 1996.

[14] Comentários à Lei dos Juizados Especiais Civis e Criminais, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1995, p. 356.

[15] Ação Penal Pública – Princípio da Obrigatoriedade, Rio de Janeiro: Forense, 3ª. ed., p. 46.

[16] Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - IBCCrim, n.º 48.

[17] Não desconhecemos que parte da doutrina nega a existência do conceito de pretensão no Direito Processual Penal. Por todos, conferir Rogério Lauria Tucci, para quem “os conceitos de pretensão punitiva, ou, ainda, de pretensão executória, não se adequam ao processo penal, sendo-lhe de todo estranhas” (Teoria do Direito Processual Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 36). Na doutrina estrangeira, leia-se Fernando Luso Soares, “O Processo Penal como Jurisdição Voluntária”, Coimbra: Almedina, 1981 (citado nas referências bibliográficas da citada obra do Professor Tucci). Como se evidencia, este autor lusitano chega ao extremo de denominar o processo penal como de jurisdição voluntária, concepção, nas palavras de Tucci, “de todo inaceitável.” (p. 46). Tampouco, desconhece-se a reação à existência do conceito carneluttiano de lide no processo penal. Sobre esta matéria, por todos, veja-se a obra indispensável de Jacinto Nelson de Miranda Coutinho, “A Lide e o Conteúdo do Processo Penal”, Curitiba: Juruá Editora, 1998.

[18] idem.

[19] Juizado Especial Criminal, São Paulo: Atlas, 3ª. edição, 1999, p. 45.

[20] Ada Pellegrini Grinover et alli, Juizados Especiais Criminais, 2ª. ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,  p. 108.

[21] Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada, São Paulo: Saraiva, 4ª. ed., p. 70.

[22] Weber Martins Batista, Juizados Especiais Cíveis e Criminais e Suspensão Condicional do Processo, Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 313.

[23] Juizados Especiais Criminais, São Paulo: Atlas, 1997, p. 68.

[24] Juizados Especiais Criminais e Alternativas à Pena de Prisão, Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 3ª. ed., págs. 76 e 78.

[25] Teoria e Prática dos Juizados Especiais Criminais, Curitiba: Juruá Editora, 1996, p. 44.

[26] Ob. cit., p. 39.

[27] Ob. cit., p. 74.

[28] Neste sentido Damásio de Jesus, ob. cit., p. 69 e Maurício Antônio Ribeiro Lopes, in Comentários à Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1995, p. 335.

[29] Ob. cit., p. 336.

[30] O art. 16 da Lei nº. 11.340/2006 (que criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher) refere-se à retratação da representação, verbis: “Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.” Observe-se que, diferentemente do art. 25, CPP, a retratação pode ser feita até o recebimento da denúncia (Neste sentido conferir a nossa obra sobre a Lei Maria da Penha, em co-autoria com Isaac Sabbá Guimarães, Salvador: Editora JusPodivm, 2008).

[31] Certamente já terá feito, autorizando a lavratura do Termo Circunstanciado (art. 5º., § 4º., CPP).

[32] Ada, Scarance, Luiz Flávio e Gomes Filho entendem diferentemente, sendo, para eles, “possível, no entanto, que, apesar de um só dos possíveis ofensores transacionar, a reparação dos danos sofridos pela vítima seja integral. Nesse caso, haverá renúncia tácita e extinção da punibilidade com relação a todos.” (ob. cit., p. 137).

[33] Como exemplo, podemos citar o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição – ECAD, que é uma sociedade civil privada instituída pela Lei Federal nº. 5.988/73 e mantida nos moldes da atual Lei nº. 9.610/98.

[34] Inocêncio Borges da Rosa, Processo Penal Brasileiro, Porto Alegre: Globo, vol. 2, 1942, p. 202.

[35] Apud Fernando da Costa Tourinho Filho, Processo Penal, 20ª. ed., São Paulo: Saraiva, vol. 2, 1998, p. 498.

[36] Ob. cit. p. 498.

[37] Conferir sobre a ação civil ex delicto o nosso Direito Processual Penal, Salvador: JusPodivm, 2008.

[38] Victor Moreno Catena, Derecho Procesal Penal, Madrid: Editorial Colex, 1999, p. 250.

[39] Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, 3ª. ed., Lisboa: Verbo, vol. 1, 1996, p. 308.

[40] Ob. cit., p. 311.

[41] Ob. cit., p. 496.

[42] Não é possível, porém, arrolar testemunhas, mesmo para completar o número legal, pois a peça acusatória já foi formulada e precluso estará o direito da acusação de propor este meio de prova (art. 41 do Código de Processo Penal). Tampouco ao assistente cabe aditar a denúncia.

[43] E também ao acusado no interrogatório, tendo em vista o disposto no art. 188 do Código de Processo Penal, alterado posteriormente pela Lei nº. 10.792/2003.

[44] Discutindo em sala de aula este assunto, e defendendo a tese de que não cabia ao assistente aditar a peça acusatória, o aluno Rodrigo Souza Britto, hoje colega, complementou, aduzindo que, acaso fosse permitido também este aditamento, maculado estaria o disposto no art. 129, I da Constituição Federal.

[45] Ob. cit. p. 514.

[46] Fonte: Revista Consultor Jurídico, 8 de agosto de 2006.

[47] Ada Pellegrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho e Antonio Scarance Fernandes, Recursos no Processo Penal, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1996, p. 229.

[48] Comentários ao Código de Processo Civil, Rio de Janeiro: Forense, Vol. V, 7a. ed., 1998, p. 536.

[49] Teoria dos Princípios, São Paulo: Malheiros, 4ª. ed., 2004, p. 131.

[50] O Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 67.

[51] “Reflexiones sobre el significado del principio constitucional de igualdad”, artigo que compõe a obra coletiva denominada “El Principio de Igualdad”, coordenada por Luis García San Miguel, Madri: Dykinson, 2000, p. 206.

[52] Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade, São Paulo: Malheiros, 1999, 3ª. ed., 6ª. tiragem, p. 47.


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Rômulo Moreira

Rômulo de Andrade Moreira é Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado da Bahia. Professor de Direito Processual Penal da UNIFACS, na graduação e na pós-graduação (Especialização em Direito Processual Penal e Penal e Direito Público). Pós-graduado, lato sensu, pela Universidade de Salamanca/Espanha (Direito Processual Penal). Especialista em Processo pela UNIFACS.                                                                                   


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