A presunção de inocência e a (in)segurança jurídica 

06/12/2016

Por Vinícius Anacleto Burato - 06/12/2016

O Supremo Tribunal Federal – STF tem por sua principal função a guarda da Constituição, nos termos do artigo 102, caput, da CRFB. No entanto, verifica-se que a primordial atribuição do órgão máximo do Poder Judiciário brasileiro não esta sendo devidamente cumprida. Para exemplificar esta afirmação, podemos mencionar o óbito do princípio da presunção de inocência, que diz que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” (art. 5º, inc. LVII, da CRFB). Seu falecimento deu-se em decorrência do HC 126.292, julgado em 17 de fevereiro de 2016, onde, por maioria de votos, a Suprema Corte entendeu que a execução da pena decorrente de decisão condenatória confirmada em segundo grau de jurisdição pode ser iniciada antes do trânsito em julgado.

Em 01 de julho de 2016, o ministro Celso de Mello concedeu liminar para suspender a execução de mandado de prisão expedido pelo Poder Judiciário do Estado de Minas Gerais contra uma pessoa condenada pela prática do crime de homicídio (HC 135.100). Em sua decisão, o decano seguiu seu posicionamento no julgamento do HC 126.292 (votou pela exigência do trânsito em julgado para cumprimento da pena), afirmando que esta decisão não possui eficácia vinculante, ou seja, tribunais e juízes não estão obrigados a seguir o entendimento do STF no HC julgado em fevereiro do corrente ano.

Elogios e críticas foram feitos ao posicionamento do ministro. Os defensores da execução da pena após condenação em segunda instância antes do trânsito em julgado afirmam que a liminar concedida pelo ministro Celso de Mello é prejudicial à segurança jurídica.

Grande parte das palavras que dão estrutura ao discurso jurídico possui são instrumentos de retórica, que tem por objetivo o convencimento do seu destinatário e que sempre são utilizadas para fins de prevalecimento de um entendimento, seja ele doutrinário ou jurisprudencial. Um dos maiores exemplos disso é o argumento da segurança jurídica, que ninguém sabe explicar ao certo o que significa. Não há conceituação universal e unânime do termo e quando utilizado, aparentemente diz tudo, mas na realidade nada diz. Pietro Barcellona, citado por Andrade (2008, p. 55-56), define isto como “conceitos vazios”. Seu emprego serve para fins de convencimento e não possuem vinculação com a realidade social do país, pois se de fato tivesse, observariam a grave situação do sistema carcerário em todo território nacional, devido aos problemas de estrutura, superlotação, entre outros.

Determinar o cumprimento de prisão antes do trânsito em julgado é abrir precedentes para que direitos e garantias fundamentais, essenciais ao Estado Democrático de Direito, dê largos passos ao retrocesso, desvirtuando-se dos progressos da história da humanidade. Mas assim decidiu o STF no HC 126.292 e, portanto, a decisão do ministro Celso de Mello, segundo aqueles que se manifestaram favoráveis a maioria de votos no habeas corpos citado, põe em risco a “segurança jurídica”.

A Constituição Federal de 1988 é a norma mais violada e desrespeitada do país. Milhares de brasileiros estão excluídos dos direitos sociais expressos no artigo 6º da Carta Magna. Não tem acesso à educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, lazer, segurança, entre outros direitos fundamentais essenciais para construção de uma sociedade livre, justa e igualitária (art. 3º, inc. I, da CRFB). Sem direitos sociais não há o que se falar em dignidade da pessoa humana. O Supremo Tribunal Federal, que deveria cumprir com sua principal função (art. 102, caput, da CRFB), não dá o exemplo. Não traz a devida eficácia as suas normas, essenciais ao Estado Democrático de Direito, agravando o caos jurídico no julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) 43 e 44, ocorrido em outubro deste ano, interpretando o artigo 283 do Código de Processo Penal em desconformidade com o texto constitucional e mantendo a tese firmada no HC 126.292. Assim sendo, ao defender o princípio da presunção de inocência, torna-se perceptível as injustas críticas a decisão de Celso de Mello no HC 135.100, que nada mais fez o que um ministro do STF deve fazer, isto é, o de cumprir e fazer cumprir a Constituição.


Notas e Referências:

ANDRADE, Lédio Rosa de. O que é Direito Alternativo?. 3. ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2008.


vinicius-anacleto-burato. . Vinícius Anacleto Burato é acadêmico do curso de Direito do Centro Universitário Barriga Verde – UNIBAVE, campus Orleans/SC. . .


Imagem Ilustrativa do Post: in the prison // Foto de: jam343 // Com alterações

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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito. 


 

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