#29 - JULGAMENTOS VIRTUAIS: DE COMO A EXCEPCIONALIDADE TORNOU-SE REGRA E ESSA GANHOU VIÉS ARBITRÁRIO

09/09/2019

Coluna Garantismo Processual / Coordenadores Eduardo José da Fonseca Costa e Antonio Carvalho

 

 

 

 

Quando o direito não estava mais em condições de assumir sua tarefa suprema, a de garantir o bem comum, abandonava-se o direito por medidas adequadas à situação.

Giorgio Agamben

Não somos contra os julgamentos em ambientes eletrônicos, os denominados e conhecidos Plenários virtuais.

Disso não decorre que sejamos complacentes a todo e qualquer procedimento – recursal ou de ações originárias – realizados predominantemente em ambiente virtual, notadamente em hipóteses que destoam de casos repetitivos ou massificados (as chamadas listas de julgamento), bem como para a deliberação a respeito de matérias que suscitam o reconhecimento ou não de repercussão geral (CF, art. 102, § 3º).

Não se descura, por evidente, os números estratosféricos de recursos e ações originárias que aguardam processamento e decisões, sejam elas monocráticas, sejam colegiadas[1]. Ignorar isso não seria uma atitude inteligente e muito menos honesta por parte de qualquer um que milita no âmbito contencioso brasileiro.

Claro que a gestão é importante. Entretanto, isso não pode se transformar em um subterfúgio para retirar das partes uma garantia constitucional, qual seja: ampla defesa e contraditório com os meios a ela inerentes, particularmente, no ponto, a sustentação oral e o pedido de julgamento presencial.

É importante que se diga que, embora possam merecer análise mais apurada, a limitação do rol dos recursos em que a legislação processual civil (CPC, artigos 937 e 1.021) e o RISTF (artigo 131, § 1º), permitem sustentação oral pelos procuradores das partes, não nos dedicaremos a essa opção legislativa.

O ponto a ser objeto de nossa crítica é outro: será que a duração razoável do processo e a gestão procedimental no âmbito do Supremo Tribunal Federal (assim como no Superior Tribunal de Justiça e Tribunais locais, todos com suas normas infralegais disciplinando os julgamentos virtuais) podem mitigar/flexibilizar/abolir a garantia de às partes serem conferidas as prerrogativas constitucionais-processuais de exercerem sua ampla defesa e contraditório na perspectiva mais ampla possível? Será que o procedimento criado pela Corte (e aqui nos referimos ao STF em particular) pode atribuir critério exclusivo ao Ministro Relator com o objetivo de impedir a sustentação oral (nos casos expressamente admitidos no CPC e no próprio RISTF) e de obstar o pleito de destaque formulado pelos demandantes, ambas as hipóteses em pedidos fundamentados como determina a Resolução 642/2019 do STF? Tais atos normativos infralegais poderiam esvaziar as garantias insculpidas nos artigos art. 5º, LV, 93, X e 133 da Constituição Federal?

Pensamos que a Resolução 642/2019, uma espécie de soft law, não têm o condão de derrogar ou ab-rogar dispositivos constitucionais ou prerrogativas asseguradas por lei aos procuradores das partes, notadamente por decisão irrecorrível franqueada ao Ministro Relator ao qual, fazendo uma espécie de “ponderação” presumiria que não haveria prejuízo à parte em ter seu caso julgado em ambiente virtual, sem se dar conta, a priori, das nuances ou ineditismo no caso levado à apreciação da Corte.

A Resolução 642/2019 dispõe:

Art. 1º O ministro relator poderá submeter a julgamento listas de processos em ambiente presencial ou eletrônico.

§1º A critério do relator, poderão ser submetidos a julgamento em ambiente eletrônico, observadas as respectivas competências das Turmas ou do Plenário, os seguintes processos:

I – agravos internos, agravos regimentais e embargos de declaração;

II – medidas cautelares em ações de controle concentrado;

III – referendum de medidas cautelares e de tutelas provisórias;

IV – recursos extraordinários e agravos, inclusive com repercussão geral reconhecida, cuja matéria discutida tenha jurisprudência dominante no âmbito do STF;

V – demais classes processuais cuja matéria discutida tenha jurisprudência dominante no âmbito do STF.

 

Art. 4º Não serão julgados em ambiente virtual as listas ou os processos com pedido de:

I – destaque feito por qualquer ministro;

II – destaque feito por qualquer das partes, desde que requerido até 48 (quarenta e oito) horas antes do início da sessão e deferido pelo relator;

III – sustentação oral realizado por qualquer das partes, desde que requerido após a publicação da pauta de julgamento e até 48 (quarenta e oito) horas antes do início da sessão, cabendo ao relator, nos casos cabíveis, deferir o pedido.

§1º Nos casos previstos neste artigo, o relator retirará o processo da pauta de julgamentos eletrônicos e o encaminhará ao órgão colegiado competente para julgamento presencial, com publicação de nova pauta.

§2º Nos casos de destaques, previstos nos incisos I e II, o julgamento será reiniciado.

Note-se que, embora os pedidos das partes, tanto de destaque quanto de sustentação oral, sejam realizados nos prazos estabelecidos nos dispositivos acima transcritos, em ambas as hipóteses, caberá ao relator a análise da pertinência da postulação.

Claro que, pedidos de sustentação oral fora das hipóteses legalmente estabelecidas, principalmente no art. 937 do CPC, por uma opção legislativa, serão rechaçados. E assim deve o ser, pois!

Todavia, a questão é outra. Estamos tratando de hipóteses de destaques – as quais não possuem quaisquer travas restritivas, salvo o “critério do relator” (art. 1, § 1º).

Aqui abrimos um parêntese para demonstrar certa perturbação em relação à possibilidade de julgamentos de “medidas cautelares em ações de controle concentrado” por meio virtual (art. 1, § 1º, II).

Como sabemos, a Constituição Federal de 1988 atribuiu ao STF um papel central no sistema político brasileiro, colocando-o no cerne daquele e na cúpula do Estado, podendo, inclusive, minar, alterar, rever e até mesmo interferir diretamente na construção da política nacional com amplos poderes sobre o Parlamento e o Poder Executivo. Ao STF, portanto, é possível dar a última palavra sobre as decisões tomadas pelos demais poderes em relação a um extremo elenco de temas políticos, econômicos, morais e sociais, até mesmo quando essas decisões foram veiculadas por emendas constitucionais[2]. E o veículo para tudo isso, sem prejuízo das hipóteses cravadas no artigo 102 da Carta Constitucional, sem dúvida, se dá no âmbito do controle concentrado de constitucionalidade.

Exatamente por isso que decisões em sede dessa espécie de procedimento, tão caro à harmonia entre os Poderes da República, não se coadunam com ambientes virtuais – de gabinete – parecendo-nos extremamente inadequados, impertinentes e inconsistentes, além de inoportunos e antidemocráticos.

Apenas para reflexão, notem, por exemplo, a ausência total e completa de qualquer coerência na hipótese regrada no art. 1, § 1º, II da Resolução 642/2019 e na Lei 13.676/2018 – essa última conferiu nova redação ao artigo 16 da Lei 12.016/2009 (LMS) – estabelecendo que, “nos casos de competência originária dos tribunais, caberá ao relator a instrução do processo, sendo assegurada a defesa oral na sessão do julgamento do mérito ou do pedido liminar”.

Vejam: enquanto que para um mandado de segurança de competência originária do STF, o procurador da parte impetrante tem, com base legal, a garantia de apresentar sustentação oral tanto no que diz respeito ao pedido de medida liminar quanto ao mérito do writ, bastando requerê-la – tornando sem efeito o inciso V, § 1º, do artigo 1 da Resolução despiciendo – em sede de ação de controle de constitucionalidade os procuradores ficarão a critério do Ministro Relator para um pueril pedido de destaque.

Ora, se por um ângulo, permite-se a sustentação oral – pedido de destaque nem faz sentido conjecturar – para um mandado de segurança no bojo do qual, em regra, impugna-se um ato administrativo produzido por autoridade cujo foro por prerrogativa lhe assegura a competência do mais alto Tribunal da Federação, por outro, condiciona-se ao livre arbítrio do Ministro Relator um pedido de destaque no julgamento de uma medida liminar que, ao fim e ao cabo, poderá suspender a eficácia até mesmo de uma Emenda Constitucional!

Fechemos o parêntese.

Desse modo, caso a parte pretenda demonstrar que o seu recurso/ação possui aspectos dissonantes, afastando-o da chamada “jurisprudência dominante”, terá que se curvar diante da escolha arbitrária do Ministro Relator que, ao indeferir o pleito de destaque para julgamento presencial, frustrara a necessária interação entre os membros componentes do órgão colegiado na elucidação de aspectos relevantes do caso concreto.

Mas o que revela o alto grau de arbitrariedade das “escolhas” do Ministro Relator, mesmo diante de um pedido exaustivamente fundamentado de destaque, é o fato de que as decisões são temerariamente genéricas, capazes de se modelarem em quaisquer hipóteses, sejam elas relativas a recursos sejam atinentes às ações originárias. Vejam:

“Não há motivos que justifiquem o pedido de destaque. O julgamento em ambiente virtual não prejudica a discussão sobre a matéria, prevalecendo, portanto, a faculdade regimental conferida ao relator pelo art. 317, § 5º, do RISTF, com redação da Emenda Regimental 51/2016, de submissão do agravo interno a julgamento por meio eletrônico” (MI 7093)

“Verifica-se que, embora haja previsão para pedido de destaque seu deferimento está condicionado ao exame do relator. Registro, inicialmente, que o julgamento em ambiente virtual não prejudica a análise da matéria, uma vez que a decisão recorrida, o voto do relator, bem como as demais peças processuais podem ser visualizadas por todos os Ministros, o que propicia uma ampla análise do processo. Por esse motivo, só excepcionalmente se justifica a concessão de pedido de destaque” (SL 1157).

“Trata-se de petição por meio da qual a parte embargante pleiteia o destaque do presente recurso da sessão virtual da Segunda Turma, agendada para iniciar em 6/9/2019, “em razão das possibilidades de sustentação oral e de agendamento de horário para audiência com o Exmo. Min. Relator” (...). Como se vê, o pedido de destaque feito pela parte, com base no inciso II, não produz efeitos automaticamente, visto que submetido a deferimento ou indeferimento pelo relator. Quando as listas eram julgadas presencialmente, o destaque tinha como objetivo dar conhecimento mais detalhado aos demais Ministros sobre o recurso em apreciação. No julgamento em ambiente virtual, o voto do relator, assim como a decisão recorrida e a integralidade do processo, ficam à disposição de todos os Ministros, no próprio ambiente virtual. Nesse quadro, no qual está garantido o direito à ampla defesa, apenas excepcionalmente justifica-se o destaque de processo, quando existirem razões substanciais, devidamente demonstradas no pedido de destaque e acolhidas pelo relator” (HC 169894 ED/RJ). 

“Trata-se de petição por meio da qual a parte agravante pleiteia o destaque do agravo regimental na sessão virtual da Segunda Turma, agendada para iniciar em 6/9/2019, tendo em vista a relevância do tema versado no recurso e a intenção de fazer-se presente à sessão de julgamento para prestar eventuais esclarecimentos de fato. (...). Como se vê, o pedido de destaque feito pelas partes, com base no inciso II, não produz efeitos automaticamente, visto que submetido a deferimento ou indeferimento pelo relator. Convém lembrar que quando as listas eram julgadas presencialmente, o destaque tinha como objetivo dar conhecimento mais detalhado aos demais Ministros sobre o recurso em apreciação. No julgamento em ambiente virtual, o voto do relator, assim como a decisão recorrida e a integralidade do processo, ficam à disposição de todos os Ministros, no próprio ambiente virtual. Nesse quadro, no qual está garantido o direito à ampla defesa, apenas excepcionalmente justifica-se o destaque de processo, quando existirem razões substanciais, devidamente demonstradas no pedido de destaque e acolhidas pelo relator” (Pet 8062 AgR/RS) 

“Trata-se de petição, na qual os agravantes pedem destaque do julgamento do presente recurso, que foi incluído na pauta de julgamentos virtuais da Segunda Turma desta Corte. (...). Como se vê, o pedido de destaque feito pelas partes com base no inciso II não produz efeitos automaticamente, visto que submetido a deferimento ou indeferimento pelo relator. O pedido de destaque, quando as listas eram julgadas presencialmente, tinha o objetivo de dar conhecimento mais detalhado aos demais Ministros sobre o recurso em apreciação. No julgamento em ambiente virtual, o voto do relator, assim como a decisão recorrida e a integralidade do processo, ficam à disposição de todos os Ministros, no próprio ambiente virtual. Nesse quadro, no qual está garantido o direito à ampla defesa, apenas excepcionalmente se justifica o destaque de processo, quando existirem razões substanciais, devidamente demonstradas no pedido de destaque e acolhidas pelo relator” (RE 934245 AgR/RS). 

“Trata-se de requerimento apresentado pela Associação de Delegados de Polícia Civil do Estado de Santa Catarina – ADEPOL/SC (Petições STF 46.821/2019 e 51.924/2019, peças 49 e 54 dos autos eletrônicos, respectivamente), no qual pleiteia, como amicus curiae, a retirada da presente Ação Direta da pauta de julgamento do Plenário Virtual, cujo início da sessão está agendado para 6/9/2019 (lista 156-2019). Alega que a complexidade da matéria justifica o pedido de destaque, declinando o interesse em realizar sustentação oral, com fundamento no art. 4º, III, da Resolução 642/2019 da Presidência do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (...). E ainda que assim não fosse, verifica-se que, no caso, não há motivos que justifiquem o pedido de destaque. O julgamento em ambiente virtual não prejudica a discussão sobre a matéria, prevalecendo, portanto, a faculdade conferida ao relator pelo art. 4º, II, da Resolução 642/2019 da Presidência do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, de submissão do feito a julgamento por meio eletrônico” (ADI 5536). 

“Trata-se de petição por meio da qual o agravante pleiteia o destaque do presente recurso da sessão virtual da Segunda Turma, agendada para iniciar em 6/9/2019, “para possibilitar a realização de sustentação oral pelos agravantes, em homenagem aos princípios da ampla defesa e do contraditório” (pág. 2 do documento 27). (...). Como se vê, o pedido de destaque feito pela parte, com base no inciso II, não produz efeitos automaticamente, visto que submetido a deferimento ou indeferimento pelo relator. Quando as listas eram julgadas presencialmente, o destaque tinha como objetivo dar conhecimento mais detalhado aos demais Ministros sobre o recurso em apreciação. No julgamento em ambiente virtual, o voto do relator, assim como a decisão recorrida e a integralidade do processo, ficam à disposição de todos os Ministros, no próprio ambiente virtual. Nesse quadro, no qual está garantido o direito à ampla defesa, apenas excepcionalmente justifica-se o destaque de processo, quando existirem razões substanciais, devidamente demonstradas no pedido de destaque e acolhidas pelo relator” (ARE 1153976). 

“A embargante apresentou a Petição 52298/2019, requerendo o destaque do julgamento dos Embargos de Declaração, pautados para a sessão virtual que terá início no dia 6.9.2019, a fim de que sejam julgados fora do ambiente eletrônico (eDOC 258). Observo que o artigo 4º, inciso II, da Resolução STF 642/2019, embora preveja a possibilidade de pedido de destaque por qualquer das partes, não o torna, porém, de atendimento necessário, especialmente quando não se vislumbra prejuízo à parte requerente. Ante o exposto, indefiro o pedido” (MS 29039) Percebam que não importa a “classe procedimental”, a natureza da causa ou suas particularidades levadas pelos procuradores em petições fundamentadas; a decisão é sempre o indeferimento padrão[3]. Chegou-se ao ponto de no HC acima identificado, o Ministro Relator, ao indeferir o pedido de sustentação oral, ainda expressar que “ainda que assim não fosse, a sustentação oral, em princípio, não é ato essencial à defesa, pois se trata de uma faculdade concedida às partes, que as utiliza, ou não […]”, deixando de atentar ao óbvio e ululante do caso: a parte expressamente pleiteou o seu direito ao exercício de tal prerrogativa! 

Nessa perspectiva, não podemos comungar da ideia de que o princípio da celeridade processual por si só, o gerenciamento procedimental e a juscibernética[4] possam, a pretexto de acelerar o julgamento dos recursos/ações no STF, desnaturar a dialogicidade do processo.

Mais que isso, a pretexto de que “a justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada” (Rui Barbosa, em oração aos moços)[5], lembramos que não menos relevantes do que esse conceito performático, a justiça rápida também não é justiça! Aliás, não é papel do processo decidir de forma justa ou injusta. A finalidade do processo, como garantia individual de liberdade contrajurisdicional (art. 5º, LIV da CF)[6], é disciplinar através de regras o procedimento no bojo do qual será delimitado o objeto da controvérsia sobre a qual se reclama uma decisão a ser proferida por um juiz imparcial, aplicando, na espécie, o ordenamento positivado.  

O gerenciamento procedimental ou a busca por efetividade e celeridade – chamem como bem entenderem – não pode (i) implicar em tolher das partes, não obstante ofereçam petições suficientemente arrazoadas/motivadas, o pleito de destaque ou de sustentação oral, dada as particularidades do caso (ônus da demonstração exclusivo das partes por meio de seus procuradores) e (ii) conferir aos Ministros poderes angelicais para definirem se haverá ou não prejuízos ao demandante requerente, caso o julgamento ocorra no ambiente estéril do plenário virtual.

Ora, às partes são assegurados os meios inerentes à sua pretensão, como desdobramento lógico e inarredável da ampla defesa e do contraditório. Somente a elas é conferida a opção em destacar ou não o processo, de sustentar ou não (dentro das regras processuais) suas razões perante qualquer órgão do Poder Judiciário, seja ele um colegiado dos Juizados Especiais, um Tribunal local, um Tribunal Superior ou mesmo o Supremo Tribunal Federal.

Do contrário, o projeto da jurisdição como instrumento de poder caminha a passos largos para definhar as garantias individuais de liberdade contrajurisdicionais conferidas às partes no processo e, no limite, impor-lhes julgamentos virtuais diante de hipóteses nas quais se exigem maiores esforços cognitivos, quer sejam solucionando eventuais dúvidas de fato, quer exercendo o direito de influir na construção dos argumentos que serão levados perante o órgão colegiado na produção do ato decisório.

Desprezar os argumentos levados pelas partes – de forma padronizada –, ignorando a realidade objetiva de cada processo, tornando indiferente os pedidos fundamentados de destaque e de sustentação oral (esses por óbvio quando cabíveis) ao bel-prazer do órgão julgador (potestas despido de auctoritas) é, data venia, conferir a uma resolução o poder derrogatório das garantias fundamentais do processo (entre elas, o art. 5, LIV, art. 93, X e 133, para ficarmos nesses) e ao Ministro/Juiz mover-se através de suas avaliações de conveniência e oportunidade ou mesmo crenças subjetivas e retóricas ou no arbítrio, o que dá no mesmo.

Como Nissen já havia intuído (sec. XIX) e expressado em uma frase cristalina, “as medidas excepcionais desaparecem porque se tornam a regra[7].

Em uma perspectiva agambenniana, podemos arriscar que a novidade construída por essa soft law gerencialista/eficiencialista nada mais se revela do que a “incorporação direta do estado de exceção e da anomia diretamente na pessoa do soberano, que começa a libertar-se de toda subordinação ao direito para se afirmar como legibus solutus”. 

 

Notas e Referências

[1] Os números constam das informações disponíveis em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=estatistica&pagina=decisoesgeral>. acesso: 06/9/2019.

[2] Nesse sentido: VIEIRA, Oscar Vilhena. A batalha dos poderes: da transição democrática ao mal-estar constitucional. São Paulo: Companhia das letras, 2018, p. 163

[3] Ver: ROSSI, Júlio César. A (des)motivação per relationem: uma espécie non liquet na era do processo tecnocrático. <https://emporiododireito.com.br/leitura/abdpro-88-a-des-motivacao-per-relationem-uma-especie-non-liquet-na-era-do-processo-tecnocratico>. Acesso 06/09/2019.

[4] LOSANO, Mário G. Sistema e estrutura no direito. volume III: do século XX à pos-modernidade. Tradução Carlos Alberto Dastoli. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2011, p. 64.

[5] Referimo-nos ao artigo publicado no JOTA pelos juristas Rodrigo Becker e Marco Aurélio Peixoto <https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/coluna-cpc-nos-tribunais/a-consolidacao-das-sessoes-virtuais-no-stf-29082019>. acesso: 02/9/2019.

[6] A proposito ver: COSTA, Eduardo José da Fonseca. O processo como instituição de garantia. < https://www.conjur.com.br/2016-nov-16/eduardo-jose-costa-processo-instituicao-garantia> e As garantias arquifundamentais contrajurisdicionais: não criatividade e imparcialidade <https://emporiododireito.com.br/leitura/as-garantias-arquifundamentais-contrajurisdicionais-nao-criatividade-e-imparcialidade>. Acesso: 06/09/2019.

[7] NISSEN, A. Das iutitium: Eine Studie aus der römischen Rechtsgeschichte. Leipzig. Gebhardt, 1877, p. 140 apud AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção.Trad. Iraci D. Poleti. 2 Ed. São Paulo: Boitempo, 2004, p. 106.

 

O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

Sugestões de leitura