Para onde vai o Direito Penal?

26/01/2016

Por Yuri Carneiro Coelho - 26/01/2016

A construção de um direito que possibilite a solução dos anseios de justiça da sociedade e que seja adequado à construção do Estado Social e Democrático de Direito, voltado aos anseios fundamentais do homem, pressupõe o recurso a mecanismos que satisfaçam esta finalidade[1].

Isto implica na seleção não apenas de institutos da dogmática que permitam esta possibilidade, mas também a escolha de caminhos de política criminal compatíveis com estas opções dogmática e com uma concepção de democracia material.

O que vemos em nosso país e em nossa cultura jurídica, entretanto, é uma completa falta de sintonia, de ajuste e conexão entre estas perspectivas, fruto de uma política legislativa e de gestão governamental que não se preocupam com o “ser” e com a democracia em sua essência, mas, sim, com a manutenção de situações preestabelecidas voltadas a satisfação de interesses políticos imediatos.

Dentro deste caminho acima apontados observamos inúmeros exemplos em nosso cotidiano e o mais recente que me deixou perplexo foi uma declaração apontada ao governador da Bahia, já alvo de inúmeras críticas de juristas e acadêmicos de minha terra querida, que reflete exatamente o quanto apontado acima.

Postei em minhas redes sociais[2], declaração do governador Ruy Costa, divulgada na imprensa de nosso Estado, que “a polícia baiana estava autorizada a indicar pais ou responsáveis por crianças ou adolescentes acusados de cometerem algum tipo de delito”. A declaração do governador ocorreu após receber informações do secretário de segurança pública da apreensão de um menor com 14 (quatorze) anos portando uma metralhadora e ele determinou que se procedesse ao indiciamento dos pais ou responsáveis do menor por este fato.

Isto só pode beirar o absurdo, não tenho outras palavras! Inicialmente porque o governador esqueceu – ou não tem conhecimento – que o ato de indiciamento é privativo do delegado de polícia, conforme preceitua o § 6o do art.2º da lei nº12.830/13, que diz: “O indiciamento, privativo do delegado de polícia, dar-se-á por ato fundamentado, mediante análise técnico-jurídica do fato, que deverá indicar a autoria, materialidade e suas circunstâncias.”.

Ademais, em uma interpretação jurídico penal do fato, não há que se proceder à nenhuma espécie de indiciamento ou falar-se na possibilidade de mover-se ação penal contra ais ou responsáveis que não tenham nenhuma vinculação subjetiva com o fato, pois estar-se-ia violando o princípio da responsabilidade penal subjetiva.

O que “salta aos olhos”, entretanto, não se refere apenas aos aspectos jurídicos do fato, mas a perspectiva político criminal da ação do governador, que ressalta e corrobora uma política de repressão como forma de combate à criminalidade, tradicional nos discursos políticos da atualidade, e que serve como um instrumento de legitimação de políticas públicas ineficientes e omissas.

Deve-se perguntar: Porque este menor foi encontrado com uma metralhadora em suas mãos, quais foram as políticas públicas de inserção social e educacional em que ele e sua família foram inseridos? Responder à estas perguntas certamente é muito mais difícil para o governador do que “determinar” o indiciamento de pais ou responsáveis, invadindo uma esfera de atribuições que não é sua e corroborando um discurso antidemocrático e que em nada contribui para a cessação da criminalidade violenta em nosso pais!

Que fique pontuado neste momento nossa crítica e a certeza de que não podemos fechar os olhos à estes discursos e práticas que não possibilitem a inclusão da pessoa no centro de nosso sistema jurídicos e do respeito ao ser humano em todas as suas dimensões, sendo nossa obrigação alertar e difundir que a democracia real só poderá ser alcançada com a inclusão em todos os seus aspectos e afastando-se esta forma de fazer política criminal.


Notas e Referências:

[1] COELHO, Yuri Carneiro, As teorias da conduta no Direito Penal: O conceito de conduta e sua importância para um Direito Penal de garantia: in https://repositorio.ufba.br/ri/bitstream/ri/9025/1/YURI%20CARNEIRO%20CO%C3%8ALHO%20-%20TESE.pdf, p.12.

[2]https://www.facebook.com/photo.php?fbid=1702016086686458&set=a.1403040829917320.1073741832.100006342491180&type=3&theater


Yuri Carneiro Coêlho

.

Yuri Carneiro Coêlho é Mestre e Doutor em Direito pela UFBA. Professor de Direito penal Unijorge / Ruy / Estácio (SSA) e FAN (FSA). Professor das Pós-Graduações em Direito Penal da UCSal / SSA e do Damásio Educacional (SP). .


Imagem Ilustrativa do Post: Choose your path // Foto de: Jonas Boni // Sem alterações

Disponível em: https://www.flickr.com/photos/daoro/7983607496

Licença de uso: http://creativecommons.org/licenses/by/2.0/legalcode


O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

Sugestões de leitura