O CRIME DE VIOLÊNCIA POLÍTICA

22/09/2022

O crime denominado “violência política” vem previsto no art. 359-P do Código Penal, tendo sido acrescentado pela Lei n. 14.197/21.

Trata-se de crime que tem como objetividade jurídica a tutela da liberdade política de qualquer pessoa e não apenas da mulher, como o fazia o art. 326-B do Código Eleitoral, acrescentado pela Lei n. 14.192/21.

De fato, cuidando do tema violência política contra a mulher, a Lei n. 14.192/21 estabeleceu normas para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher, nos espaços e atividades relacionados ao exercício de seus direitos políticos e de suas funções públicas, e para assegurar a participação de mulheres em debates eleitorais.

Essa lei acrescentou ao Código Eleitoral um crime denominado “violência política contra a mulher”, punindo com reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa as condutas de “assediar, constranger, humilhar, perseguir ou ameaçar, por qualquer meio, candidata a cargo eletivo ou detentora de mandato eletivo, utilizando-se de menosprezo ou discriminação à condição de mulher ou à sua cor, raça ou etnia, com a finalidade de impedir ou de dificultar a sua campanha eleitoral ou o desempenho de seu mandato eletivo.”

Ocorre que, passados poucos dias da publicação da Lei n. 14.192/21, foi sancionada a Lei n. 14.197/21, cuidando dos crimes contra o Estado Democrático de Direito, a qual acrescentou ao Código Penal o crime de “violência política”, no art. 359-P, ora em comento.

O crime de “violência política” trouxe redação ligeiramente semelhante à do crime de “violência política contra a mulher”, embora mais abrangente. Em razão da nova tipicidade acrescentada ao Código Penal, a conclusão a que se chega é a de que houve revogação tácita do art. 326-B (violência política contra a mulher) do Código Eleitoral, pelo art. 359-P (violência política) do Código Penal.

O crime de violência política ressalta a prática da conduta em razão do sexo, raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional da vítima.

Nesse aspecto, o art. 3º, IV, da Constituição Federal, estabelece como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Vale ressaltar que a igualdade de oportunidades para todos os candidatos e a isonomia partidária constituem princípios importantíssimos do Direito Eleitoral, conferindo paridade de oportunidades aos candidatos e partidos na disputa por cargos políticos, ao largo de vantagens ilegítimas oriundas do acesso aos poderes econômico, midiático e político. A eliminação de todo preconceito e discriminação vem refletida na lei eleitoral, garantindo a todos o direito de participação política sem discriminação e desigualdade de tratamento.

Sujeito ativo do crime de violência política pode ser qualquer pessoa, cuidando-se de crime comum.

Sujeito passivo, entretanto, somente pode ser a pessoa que esteja no gozo de seus direitos políticos, que é o conjunto de regras constitucionalmente fixadas sobre a participação popular no processo político. Estar no gozo de seus direitos políticos significa estar a apto a votar e ser votado, participando de pleitos eleitorais, plebiscitos e referendos.

No que se refere à tipicidade objetiva, cuida-se de tipo misto-alternativo, em que a prática de mais de uma conduta não implica concurso de crimes, mas um único delito. Nesses crimes de ação múltipla, a prática de apenas um dos verbos contidos no tipo penal já é suficiente para a consumação do delito.

A conduta vem expressa pelos verbos “restringir” (limitar, reduzir), “impedir” (obstruir, obstar, tolher) e “dificultar” (complicar, estorvar, colocar empecilho).

Para a prática de uma ou mais das modalidades de conduta, o agente pode se valer do emprego de violência física, sexual ou psicológica. Embora a vítima do crime não seja apenas mulher, como ocorria com o revogado crime do art. 326-B do Código Eleitoral, mas qualquer pessoa, julgamos adequado lançar mão, como referência, das definições constantes do art. 7º, incisos I, II e III, da Lei n. 11.340/06 (Lei Maria da Penha).

Assim, a violência física pode ser entendida como qualquer conduta que ofenda a integridade ou saúde corporal da pessoa.

Violência psicológica pode ser entendida como qualquer conduta que cause à pessoa dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação.

Por seu turno, violência sexual pode ser entendida como qualquer conduta que constranja a pessoa a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força, ou que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, ou ainda, no caso de mulher, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação, ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos.

Além disso, o tipo penal destaca que a violência política deve ser praticada em razão do sexo, raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional da vítima, evidenciando um crime de intolerância.

No que se refere ao elemento subjetivo, trata-se de crime doloso, não sendo admitida a modalidade culposa.

Por fim, o crime se consuma com a prática de uma das condutas típicas, ou seja, com a efetiva restrição, com o efetivo impedimento ou com a efetiva dificultação dos direitos políticos da vítima. Admite-se a tentativa.

 

Imagem Ilustrativa do Post: Philip Guston - "The Street". (Close-up/ part of) // Foto de: jane cornwell // Sem alterações

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