O CRIME DE EPIDEMIA E O NOVO CORONAVÍRUS – COVID-19

12/03/2020

O surto do novo coronavírus, que tem atualmente assolado o país e o mundo, nos chama à reflexão sobre as consequências da propagação, dolosa ou culposa, da doença COVID-19.

Conforme amplamente noticiado pelos meios de comunicação, no final do mês de dezembro de 2019, a Organização Mundial da Saúde – OMS - foi alertada sobre vários casos de pneumonia na cidade de Wuhan, província de Hubei, na República Popular da China. Tratava-se de uma nova cepa de coronavírus que não havia sido identificada antes em seres humanos.

Aproximadamente uma semana depois, as autoridades chinesas confirmaram haver identificado um novo tipo de coronavírus.

Segundo as autoridades da área da saúde, ao todo são sete tipos de coronavírus humanos (HCoVs) já foram identificados: HCoV-229E, HCoV-OC43, HCoV-NL63, HCoV-HKU1, SARS-COV (que causa síndrome respiratória aguda grave), MERS-COV (que causa síndrome respiratória do Oriente Médio) e, mais recente, o novo coronavírus (que no início foi temporariamente nomeado 2019-nCoV e, em 11 de fevereiro de 2020, recebeu o nome de SARS-CoV-2). Esse novo coronavírus é responsável por causar a doença batizada de COVID-19.

Posteriormente, em 30 de janeiro de 2020, a OMS declarou que o surto do novo coronavírus constitui uma Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII). A ESPII é considerada, nos termos do Regulamento Sanitário Internacional (RSI), “um evento extraordinário que pode constituir um risco de saúde pública para outros países devido à disseminação internacional de doenças; e potencialmente requer uma resposta internacional coordenada e imediata”.

Nesse panorama, haveria ilícito penal na conduta de uma pessoa que, sabendo estar acometida da doença ou ser portadora do vírus, ou mesmo tendo sido exposta ao perigo de contágio, pratica, com o fim de transmitir a outrem, ato capaz de produzir o contágio?

Ou ainda, haveria crime na conduta de uma pessoa que propagasse, dolosa ou culposamente, o novo coronavírus, causando ou contribuindo para a epidemia de COVID-19?

Com relação à primeira indagação, o Código Penal brasileiro, em seu artigo 131, tipifica o crime de “perigo de contágio de moléstia grave”, punindo a conduta daquele que pratica, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de que está contaminado, ato capaz de produzir o contágio.

Nesse caso, o sujeito ativo é qualquer pessoa contaminada por moléstia grave que pratica dolosamente com a vítima, que também pode ser qualquer pessoa, ato capaz de transmitir a doença, não sendo necessário para consumar o delito que haja a efetiva contaminação, bastando a prática do ato.

Evidentemente, o conceito de moléstia grave deve ser dado pela medicina, sendo imprescindível perícia médica para determinar a sua contagiosidade e o perigo concreto a que foi exposta a vítima.

Vale ressaltar que a consumação, nesse caso, ocorre com a prática do ato, independentemente do efetivo contágio, exigindo-se, ainda, para a caracterização do delito em tela, a finalidade específica de transmitir a moléstia.

Com relação à segunda indagação feita acima, o crime de “epidemia” vem previsto no art. 267 do Código Penal, tendo como objetividade jurídica a proteção da incolumidade pública, no particular aspecto da saúde do grupo social.

Pune-se a conduta de “causar epidemia, mediante a propagação de germes patogênicos”, punida com reclusão, de dez a quinze anos. Se do fato resulta morte, a pena é aplicada em dobro.

Epidemia significa doença que surge rapidamente num lugar e acomete simultaneamente numerosas pessoas. A epidemia deve ser causada mediante a propagação de germes patogênicos. Propagar significa espalhar, disseminar, difundir. Germes patogênicos são micróbios ou micro-organismos, seres microscópicos, animais ou vegetais, causadores de doenças. O vírus, inegavelmente, é um agente patogênico.

A consumação se dá com a ocorrência da epidemia, da difusão da doença. É crime de perigo concreto.

A modalidade culposa do crime de epidemia vem prevista no § 2º do art. 267 do Código Penal, ocorrendo quando o agente, por imprudência, imperícia ou negligência, inobservando o cuidado necessário, dá causa à propagação dos germes patogênicos, ocasionando epidemia. Se ocorrer o resultado morte por culpa do agente, a pena de epidemia culposa será duplicada.

Portanto, pesa uma grande responsabilidade sobre aqueles que, apresentando sintomas da nova doença COVID-19, ou tendo sido expostos a este tipo de coronavírus, insistem em conviver normalmente e frequentar lugares movimentados e com grande concentração de pessoas, ou mesmo desrespeitar quarentena ou indicação de segregação domiciliar, podendo, eventualmente, ser responsabilizados pelo contágio a que porventura derem causa, ou ainda, numa dimensão mais alargada, pelo crime de epidemia, ainda que na modalidade culposa, por imprudência ou negligência.

 

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