O CRIME DE COAÇÃO NO CURSO DO PROCESSO

14/05/2020

Coação no curso do processo é um dos principais crimes contra a administração da justiça, sendo previsto art. 344 do Código Penal, punindo a conduta de usar de violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio, contra autoridade, parte, ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamada a intervir em processo judicial, policial ou administrativo, ou em juízo arbitral. A pena prevista é de reclusão, de um a quatro anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

Infelizmente, é um crime cada vez mais comum nos dias de hoje, em que vítimas e testemunhas de crimes, além de outros personagens processuais, invariavelmente são ameaçadas com a finalidade de garantir a impunidade de criminosos das mais variadas vertentes penais.

Conforme bem salienta o ilustre penalista Luiz Regis Prado (“Tratado de Direito Penal Brasileiro”, vol. IV, parte especial, 2ª ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017, p. 443), “a proteção jurídico penal dispensada alcança, de modo mediato, a incolumidade física e psíquica daqueles que intervêm em processo judicial, policial ou administrativo, ou em juízo arbitral. Com efeito, no primeiro momento, vem a ser tutelada a função jurisdicional, com a proteção da independência judicial, que radica não apenas na liberdade interna do juiz para prolatar sua decisão, mas também na liberdade processual como um todo – a fim de que ninguém se sinta coagido quando funciona ou é chamado a intervir em processo judicial ou juízo arbitral -, bem como da atividade dos órgãos judiciais, na realização dos mecanismos processuais destinados à obtenção de uma prestação jurisdicional exata e justa. No segundo momento, é forçoso reconhecer que há, ao lado da efetiva lesão dos interesses judiciais, ofensa a bens jurídicos de pessoas concretas, com a qual se pretende atingir a Administração da Justiça.”

Com relação aos sujeitos do delito, insta ressaltar que sujeito ativo pode ser qualquer pessoa e sujeito passivo é o Estado e, secundariamente, a pessoa sobre quem recai a conduta criminosa.

Com relação à tipicidade objetiva, a conduta típica vem expressa pelo verbo usar (utilizar, empregar), referindo-se a violência física (“vis corporalis”) e grave ameaça (“vis compulsiva”), que nada mais é que a violência moral.

A conduta deve ser realizada contra autoridade, parte ou qualquer outra pessoa que participe do processo judicial, policial, administrativo, ou do juízo arbitral. Não há restrição no tipo penal quanto à espécie de processo ou procedimento, podendo ser penal, civil, trabalhista etc.

O Superior Tribunal de Justiça já entendeu que o crime de coação no curso do processo pode ser praticado no decorrer de Procedimento Investigatório Criminal instaurado no âmbito do Ministério Público. Isso porque, além de o PIC servir para os mesmos fins e efeitos do inquérito policial, mesmo as ameaças proferidas antes da formalização do inquérito caracterizam o crime de coação no curso do processo, desde que realizadas com o intuito de influenciar o resultado de eventual investigação criminal. Nesse sentido: HC 315.743-ES, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 6/8/2015, DJe 26/8/2015.

Caso seja empregada violência física, o agente responderá por dois crimes, em concurso material (art. 69 do CP), ou seja, receberá a pena da coação no curso do processo cumulada com a pena do ato de violência.

Impende destacar que o crime de ameaça é absorvido pelo crime de coação no curso do processo. O crime de ameaça vem previsto no art. 147 do Código Penal, punindo a conduta de ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave.

Trata-se de crime doloso, exigindo-se que a finalidade do agente seja a satisfação de interesse próprio ou alheio (especial fim de agir).

Por fim, o crime se consuma com o efetivo emprego da violência física ou grave ameaça. Cuida-se de crime formal, não exigindo para sua consumação que o agente consiga obter o favorecimento próprio ou de terceiro e nem tampouco que a vítima se sinta intimidada. A tentativa é admissível.

 

Imagem Ilustrativa do Post: Martelo da justiça // Foto de: Fotografia cnj // Sem alterações

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