Adotando a doutrina da proteção integral, o Estatuto da Pessoa Idosa (Lei n. 10.741, de 1º-10-2003) trouxe algumas modificações em tipos penais que já existiam, criando, ainda, outras figuras típicas até então inexistentes, com o propósito de tutelar a vida, a integridade corporal, a saúde, a liberdade, a honra, a imagem e o patrimônio da pessoa idosa, assim considerada a pessoa com idade igual ou superior a 60 anos.
No que se refere às figuras típicas incorporadas à legislação criminal, merece especial destaque aquela referente ao abandono de pessoa idosa em hospitais, casas de saúde, entidades de longa permanência, ou congêneres, crime previsto no art. 98 do Estatuto, com pena de detenção de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, e multa.
Pune-se a conduta de “abandonar a pessoa idosa em hospitais, casas de saúde, entidades de longa permanência, ou congêneres, ou não prover suas necessidades básicas, quando obrigado por lei ou mandado.”
Trata-se de crime que tem como objetividade jurídica a proteção à vida ou saúde da pessoa idosa.
Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, inclusive aquela obrigada, por lei ou mandado, a prover as necessidades básicas da pessoa idosa. Sujeito passivo é a pessoa idosa.
A conduta vem representada pelo verbo “abandonar” (desamparar, largar) e pela expressão “não prover” (não fornecer, não abastecer, não providenciar). Nessa última modalidade de conduta, deve o agente estar obrigado por lei ou mandado a prover à pessoa idosa ao idoso suas necessidades básicas.
O crime somente é punido na modalidade dolosa e se consuma com o efetivo abandono ou com o não provimento das necessidades básicas da pessoa idosa.
Segundo levantamento feito pelo antigo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, de janeiro a junho de 2022, o Disque 100 registrou 35 mil denúncias de violações de direitos humanos contra pessoas idosas. Em mais de 87% das denúncias (30.722), as violações ocorreram na casa onde a pessoa idosa reside. Destas, 16 mil ocorreram na casa onde residem a vítima e o agressor. Entre os agressores, os filhos são os principais responsáveis pela violação, figurando como envolvidos em mais de 16 mil registros, seguidos por vizinhos (2,4 mil) e netos (1,8 mil).
O panorama é assustador e faz com que essas condutas criminosas devam ser rigorosamente apuradas, com a severa punição dos responsáveis.
Outrossim, a problemática do abandono de pessoas idosas em hospitais, casas de saúde, entidades de longa permanência e congêneres no Brasil é uma questão preocupante e que merece uma atenção especial da sociedade e das autoridades competentes. Infelizmente, casos de abandono e negligência em relação aos idosos têm sido frequentemente relatados, revelando uma falha na proteção e no respeito aos direitos dessas pessoas.
O abandono de pessoas idosas em instituições pode ocorrer por diferentes motivos, como falta de recursos financeiros, sobrecarga familiar, falta de informação sobre os direitos dos idosos, negligência por parte dos responsáveis legais, entre outros.
A Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal recentemente aprovou o projeto PL 3.167/2019, que aumenta as penas de vários crimes previstos no Estatuto da Pessoa Idosa, dentre eles o de abandono, tipificado no art. 98, que passou a ter pena de 1 (um) a 3 (três) anos de reclusão, e multa. Portanto, a pena mínima foi duplicada e a espécie de pena privativa de liberdade que era de detenção passou a ser de reclusão.
Vale ressaltar que o abandono de pessoas idosas em hospitais, casas de saúde, entidades de longa permanência e congêneres gera consequências devastadoras para a vida dos indivíduos mais velhos. Além dos danos físicos e psicológicos que podem decorrer da falta de cuidados adequados, as pessoas idosas abandonados muitas vezes se sentem desvalorizadas, sem amor, afeto e respeito. Essa falta de atenção pode levar a quadros de depressão, ansiedade e outras doenças mentais.
Ademais, o abandono de pessoas idosas também pode abrir espaço para outras formas de violência e abusos. A ausência de supervisão e controle nas instituições facilita a ocorrência de maus-tratos, negligência, exploração financeira e até mesmo violência física. Essas situações de abuso agravam ainda mais a vulnerabilidade das pessoas idosas e comprometem sua integridade e qualidade de vida.
Enfim, para combater o abandono de pessoas idosas, é necessário um esforço conjunto da sociedade, do Estado, das famílias e das próprias instituições de saúde ou de acolhimento. É fundamental investir em políticas públicas voltadas para a proteção dos direitos das pessoas idosas, promovendo a conscientização, a formação de profissionais capacitados, a fiscalização rigorosa das instituições e a punição efetiva dos responsáveis pelo abandono, além de buscar fortalecer os laços familiares e comunitários, estimulando o respeito e o cuidado intergeracional.
A valorização das pessoas idosas como detentoras de saberes e experiências contribui inegavelmente para a construção de uma sociedade mais justa e solidária.
Imagem Ilustrativa do Post: "Vidas" / "Lifes" // Foto de: Rogerio Camboim S A // Sem alterações
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