Por Marta de Oliveira Torres – 11/01/2016
BOA: Está chovendo na Chapada Diamantina-BA!
RUIM: A maior queimada da história do Parque Nacional da Chapada Diamantina iniciada no final de 2015 acabou com grande parte da vegetação nativa da área de preservação nacional. O incêndio, supostamente criminoso (mas como sempre sem culpados), coincidentemente aconteceu meses após em Salvador ter se reunido,“a portas fechadas, mais de 50 representantes das principais economias mundiais interessadas na produção e no comércio responsável de madeira – norma florestal 19.228, que prenuncia impactar diretamente todos os produtores, distribuidores e revendedores de produtos florestais.”[1], evento organizado pela Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT e contou com o apoio do Sindicato das Indústrias de Papel, Celulose, Papelão, Pasta de Madeira para Papel e Artefatos de Papel e Papelão no Estado da Bahia.
A reunião, coincidentemente, aconteceu meses após o Governo da Bahia ter aprovado o Decreto Nº 15180 DE 02/06/2014, que regulamenta a gestão das florestas e das demais formas de vegetação do Estado da Bahia, e a conservação da vegetação nativa. Coincidentemente, como que reforçando uma dificuldade na apuração de responsabilidade pelo uso irregular do fogo em terras públicas ou particulares, o Decreto determina que a autoridade competente para fiscalização e autuação deverá “comprovar o nexo de causalidade entre a ação do proprietário ou qualquer preposto e o dano efetivamente causado”. Convenhamos, essa norma é “chover no molhado”: dizer que necessita comprovar o nexo de causalidade entre a conduta e o dano é a regra basilar da responsabilização. Mas para que repetir essa norma nessa legislação estadual?
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BOA: A vegetação da Chapada Diamantina é guerreira! Sempre se recompõe!
RUIM: O Novo Código Florestal, de maio de 2012, permitiu que a área de Reserva Legal (que seria supostamente uma área da propriedade privada na qual a vegetação nativa ficasse protegida) pudesse ser substituída por uma área sem equivalência ecológica e ainda em outro local. Ou seja, pode-se desmatar em um Estado e “replantar” em outro. É aí que entra a notícia pior. Para replantar, não precisa necessariamente ser da mesma espécie devastada, ou da espécie da área replantada. Sendo ainda mais claro que o Novo Código Florestal, o Decreto Estadual baiano permitiu expressamente que o plantio de árvores industriais, de espécies exóticas cultivadas em sistema intercalar nas margens dos cursos d'água de propriedade familiar, seja contabilizado na regularização das Áreas de Preservação Permanente. Em “exótica”, leia-se “eucalipto”.
A notícia ainda pior é que o próprio Estado (ou seja, com dinheiro público), através da Secretaria do meio ambiente, é responsável pela distribuição dessas sementes “exóticas”, dando apoio técnico e para a recomposição da vegetação das Áreas de Preservação Permanente das propriedades familiares.
Afinal, já de cara no art. 7º o Decreto diz logo em seu primeiro item que o florestamento e reflorestamento objetiva a utilização de técnicas voltadas para o suprimento do consumo de madeira, produtos lenhosos e subprodutos para uso industrial, comercial doméstico e social, bem como o desenvolvimento tecnológico, visando utilização de espécies nativas e/ou exóticas em programas de reflorestamento.
BOA: Mas eucalipto é uma planta! E tem um aroma tão bom!
RUIM: Dois corpos não ocupam o mesmo lugar no espaço. Ou é eucalipto ou é vegetação nativa. Procure se informar sobre essa planta pra entender a gravidade do dano ambiental da plantação. Além de tudo, essa danada bebe muita água.
BOA: Mas a Defensoria Pública, Ministério Público, entes federativos da administração direta e indireta, associações de defesa do meio ambiente, vão tentar fazer alguma coisa! Eles têm “a espada de Grescol”: a ação civil pública! E vão tentar resolver na justiça de alguma forma! Esse crime ambiental é inconstitucionalissimamente admissível!
RUIM: As principais ações ambientais julgadas no Brasil foram improcedentes, aliás, NÃO foram julgadas no mérito porque o STF deu um jeitinho brasileiro de inventar uma teoria. A OAB-BA juntamente a várias associações de defesa do meio ambiente ingressaram com uma ação para salvar o Rio São Francisco, perdeu (ACO 876 MC-AgR / BA). O Ministério Público Federal para ajudar a salvar a Amazônia, perdeu (ADI 1512 / RR, ADI 3388). O Estado do Paraná tentou criar uma lei pra conter os transgênicos, perdeu (ADI 3645).
BOA: Existe muita gente interessada em preservar a Chapada Diamantina. As pessoas vão despertar para uma solução de modo a conter a desertificação do Brasil, um futuro antes tão distante como descrevia Tchécov na peça “A Gaivota”, mas agora tão paupável e concreto!
RUIM: Eu particularmente não sei o que fazer.
Notas e Referências:
[1] http://www.fieb.org.br/Noticia/2631/III-Encontro-Mundial-da-ISO-Florestal-acontece-na-Bahia.aspx
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Marta de Oliveira Torres, Defensora Pública do Estado da Bahia, mestra em Relações Sociais e Novos Direitos pela UFBA, graduada em Direito pela UFAL. . .
Imagem Ilustrativa do Post: Chapada Diamantina // Foto de: Otávio Nogueira // Sem alterações
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