Por Redação - 18/05/2016
Marcelo Ramos Peregrino Ferreira lançou a segunda edição do livro O Controle de Convencionalidade da Lei da Ficha Limpa: Direitos Políticos e Inelegibilidades, confira a entrevista com o autor:
Qual a proposta do livro O Controle de Convencionalidade da Lei da Ficha Limpa: Direitos Políticos e Inelegibilidades?
O livro traz uma análise dos direitos políticos, incluindo-se aí a incidência normativa dos tratados internacionais de direitos humanos. Cuida da necessidade de abordagem dos direitos fundamentais políticos num cenário de pluralidade de ordens jurídicas e da necessidade de obediência aos parâmetros mínimos internacionais relacionados a esses direitos. Para o STF, os tratados internacionais de direitos humanos tem o status de supralegalidade, estando acima da legislação ordinária, numa análise mais formal do tema. Isto significa que toda autoridade brasileira tem a obrigação de respeito a esses tratados. O juiz brasileiro tornou-se um juiz interamericano, mas poucos se dão conta disso. A Convenção Americana Sobre Direitos Humanos só admite a restrição dos direitos políticos, em razão de condenação criminal pelo juiz competente e por idade, nacionalidade, residência, idioma, instrução, capacidade civil ou mental. A possibilidade de restrição do direito fundamental político, exclusivamente, por condenação criminal, como consta do Artigo 23, foi proposta pelo delegado do Brasil, Sr. Carlos A. Dunshee de Abranches, quando da discussão da Convenção Americana. Ocorre que no Brasil a legislação ordinária impõe inelegibilidades aos borbotões, o que contraria este tratado. Concluo, assim, realizando a adequação da legislação interna ao bloco de convencionalidade, o chamado controle de convencionalidade que, por exemplo, a Lei da Ficha Limpa destoa do piso mínimo de proteção aos direitos políticos.
Fale sobre a outra edição e o que há de novidade nesta 2ª edição.
Nesta edição faço junto com a Profa. Eneida Desiree Salgado uma análise da reforma eleitoral, comparando-a com os critérios de limitação dos direitos políticos admitidos pela Convenção Americana.
Quais as motivações para escrever sobre este tema?
O livro surgiu da minha dissertação de mestrado na PUC/SP, sob a orientação do Prof. Dr. Roberto Dias. Eu estava enredado na questão eleitoral, no exercício da função de Juiz do TRE/SC e muitíssimo interessado pelo direito internacional público, depois que tive contato com a disciplina da Profa. Dra. Flávia Piovesan, uma das maiores autoridades nacionais no assunto. Por insistência de meu orientador, juntei os temas e creio ter sido o primeiro a tratar do tema em livro, de forma mais aprofundada. O Prof. Dr. Luis Magno já havia escrito um artigo sobre o tema, o qual só conheci com a tese pronta e o Dr. Fernando Neisser já levara o assunto ao TSE, mas suspeito, modéstia às favas, como diria Machado de Assis, ser o primeiro a olhar os direitos políticos, a partir do sistema regional de proteção dos direitos humanos.
Como foi o processo de pesquisa para escrever?
Muita leitura dos clássicos sobre o tema e um garimpo na literatura estrangeira, em especial da jurisprudência das Cortes Internacionais.
Quais as principais conclusões adquiridas com a obra?
Estamos vivendo um retrocesso dos direitos políticos fundamentais com a instauração do que eu e o Prof. Fernando Faria chamamos de o "direito eleitoral do inimigo". O político e a política estão sendo demonizados com a diminuição do tempo de propaganda, tempo de campanha, com novas formas de inelegibilidade, fim do financiamento de campanha por pessoa jurídica, enfim, vivemos um momento em que se limita direitos sob o manto da periculosidade eleitoral. Michel Foucault fala em periculosidade significa que "o indivíduo deve ser considerado pela sociedade ao nível de suas virtualidades e não ao nível de seus atos; não ao nível das infrações efetivas a uma lei efetiva, mas das virtualidades de comportamento que elas representam”. O político é condenado e impedido de participar, bem assim o povo de escolhê-lo fundado em outras condutas que não tem qualquer relação com a questão eleitoral como a expulsão de um órgão de classe ou a demissão do serviço público. Todo o sistema de inelegibilidade repousa sobre o modelo haurido na ditadura militar que serve para perseguir opositores e constranger minorias. E há, igualmente, uma premissa falsa: a de que a limitação dos direitos políticos serve para diminuir a corrupção. O direito eleitoral é apenas um instrumento para transformar o poder popular em poder estatal legítimo. É um instrumento que não tem o condão de diminuir a corrupção estatal. A qualidade dos eleitos vai depender das escolhas do eleitor. Outro equívoco é a ideia de pureza das candidaturas. A democracia não é o regime que tem os líderes mais qualificados, nem será o regime mais eficiente sob o prisma administrativo. A democracia é simplesmente o regime onde se permite o florescimento dos direitos humanos. Tocqueville já vira isso na democracia norte americana no século XVIII ao criticar a baixa qualidade dos seus dirigentes chamando-os de inábeis e de desprezíveis. Nós estamos desprezando a história e indo na contramão do mundo nesta insana busca de candidaturas "cândidas". Com isso, só em 2014 foram estimados como potencialmente inlegíveis mais de 340 mil pessoas, segundo levantamento da Procuradoria-Geral da República. Não há democracia com a diminuição tão expressiva do universo de candidatos. Na realidade, estamos proibindo o povo de escolher livremente seus candidatos numa excessiva tutela estatal de um eleitor infantilizado. E aqui uma questão essencial: na democracia o povo pode escolher até candidatos ruins...
O livro está disponível para venda aqui.