Justiça desobriga Município de fornecer medicamento

22/02/2017

Por Redação - 22/02/2017

Por maioria de votos, a 5ª Turma de Recursos do Tribunal de Justiça de Santa Catarina decidiu revogar tutela provisória que impunha ao Município de Joinville-SC o fornecimento do medicamento Ácido Ursodesoxicólico. 

De acordo com os autos do Agravo de Instrumento nº 4000013-77.2016.8.24.9005, o Município catarinense recorreu da decisão proferida pelo Juízo do 2º Juizado Especial da Fazenda Pública daquela comarca que, nos autos da ação de obrigação de fazer, ajuizada pela agravada contra o agravante e o Estado de Santa Catarina, deferiu a antecipação dos efeitos da tutela, determinando que os réus fornecessem o medicamento à autora. 

Em seu voto, o relator do recurso ressaltou que "não se deve adotar uma postura típica de Robin Hood, apoiando-se em argumentos principiológicos completamente distantes da dura realidade orçamentária brasileira e dos cuidados e alertas consagrados pelos Tribunais Superiores acerca da matéria".

Confira a íntegra do acórdão:

Agravo de Instrumento n. 4000013-77.2016.8.24.9005, de Joinville

Relator: Juiz Yhon Tostes

AGRAVO DE INSTRUMENTO. JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONCEDIDA PARA FORNECIMENTO DE REMÉDIO URSACOL (ÁCIDO URSODEOXICÓLICO). INSURGÊNCIA DO MUNICÍPIO. LIMINAR DEFERIDA. PARÂMETROS DEFINIDOS PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA STA 175-AGR/CE. ATESTADO MÉDICO SEM A NECESSÁRIA ROBUSTEZ SUSTENTANDO EFICÁCIA E NECESSIDADE DO MEDICAMENTO SUBSCRITO PELA MÉDICA DO PACIENTE. INOBSERVÂNCIA DO PARECER EMITIDO PELA CONITEC. REFORMA DA DECISÃO DE 1º. GRAU. PROVIMENTO DO RECURSO.

Inegável que "o direito à saúde se trata de direito público subjetivo, não podendo ser reduzido à promessa constitucional inconsequente” (STF, Agravo Regimental no RE 271.286-8/RS), todavia, ninguém pode esconder que o sistema de saúde público no Brasil está sem atender a todos de forma digna e eficiente por ausência de recursos financeiros. No meio desse “incêndio” de direitos e deveres, já tarda a hora de levantarmos mais a cabeça e deixarmos de lado a observação exclusiva das "árvores" que estão pegando fogo e olharmos para a "floresta" inteira que precisa ser salva.

De nada adianta retóricas sobre justiça social e direitos fundamentais que são apresentadas apenas a uns poucos e potencialmente afetam ao restante da coletividade que também clama e merece ser atendida nas questões envolvendo a saúde pública. “Justamente o que caracterizaria um direito como social é sua não apropriação por um indivíduo, mas estar à disposição de toda a sociedade. De modo que o direito social à saúde é um direito de todos terem um hospital funcionando com um nível x de atendimento, ainda que limitado (por exemplo, urgências). Não significa o direito de um indivíduo contra todos da sociedade obter um medicamento que poderá provocar o fechamento do posto de saúde. Este não é um direito social ou coletivo, mas individual.” (TIMM. Luciano Benetti. Direito à saúde e a maneira mais eficiente de prover direitos fundamentais: uma perspectiva de Direito e Economia).

Dispõe o Enunciado n. 33, da Jornada de Direito da Saúde: “Recomenda-se aos magistrados e membros do Ministério Público, da Defensoria Pública e aos Advogados a análise dos pareceres técnicos da Agência Nacional de Saúde Suplementar e da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (CONITEC) para auxiliar a prolatação de decisão ou a propositura da ação.”

A importância da CONITEC não pode ser singelamente ignorada e nem tampouco suas recomendações. “Em suma: onde não haja lei ou ação administrativa implementando a Constituição, deve o Judiciário agir. Havendo lei e atos administrativos, e não sendo devidamente cumpridos, devem os juízes e tribunais igualmente intervir. Porém, havendo lei e atos administrativos implementando a Constituição e sendo regularmente aplicados, eventual interferência judicial deve ter a marca da autocontenção.” (BARROSO. Luís Roberto. Da falta de efetividade à judicialização excessiva: Direito à saúde, fornecimento gratuito de medicamentos e parâmetros para a atuação judicial).

A deliberação final da CONITEC, em seu parecer 38 (Portaria 10/2013), é no sentido de “Não recomendar o ácido ursodesoxicólico para o tratamento da doença hepática associada à fibrose cística no SUS.”

Buscando conciliar o mínimo existencial com a reserva do possível, o Supremo Tribunal Federal definiu, na STA 175- AgR/CE, que, em regra, a concessão de ação de saúde não padronizada pelo SUS depende da observância de três parâmetros: a) registro ou aprovação do procedimento ou tratamento na ANVISA; b) demonstração de ineficácia das opções alternativas disponibilizadas pelo SUS; c) que o procedimento ou tratamento não seja experimental, o que não se confunde com um novo tratamento ainda não testado pelo Sistema de Saúde brasileiro.

Ausente o preenchimento de algum desses requisitos, mostra-se inviável a concessão de medicamento ou tratamento requerido pela parte, sobretudo se, como no caso, houver decisão da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema de Saúde CONITEC rejeitando a incorporação do fármaco pleiteado, diante da falta de evidências científicas de sua eficácia terapêutica.

Inviável se aceitar um singelo atestado médico desacompanhado de maiores elementos e força probante contra todo o arcabouço administrativo-legal erigido no sentido de tornar mais eficiente e eficaz o sistema de acesso à saúde pública.

Em havendo decisão da CONITEC desautorizando o uso do remédio pleiteado e na falta de elementos concretos e bem delineados sobre a ineficácia dos medicamentos do SUS para o paciente em questão, apesar das pressões inerentes a esse tipo de hard case (MacCormick), não se deve adotar uma postura típica de Robin Hood, apoiando-se em argumentos principiológicos completamente distantes da dura realidade orçamentária brasileira e dos cuidados e alertas consagrados pelos Tribunais Superiores acerca da matéria.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 4000013-77.2016.8.24.9005, da comarca de Joinville, em que figura como agravante Município de Joinville, e agravada Noeli Regina Tromm:

A 5ª Turma de Recursos decidiu, por maioria, conhecer e dar provimento ao recurso, para revogar a tutela provisória concedida na origem. Vencido o Juiz Augusto Cesar Allet Aguiar. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado no dia 9 de novembro de 2016, os Exmos. Srs. Juízes Augusto Cesar Allet Aguiar e Décio Menna Barreto de Araújo Filho.

Joinville, 15 de dezembro de 2016.

Yhon Tostes

PRESIDENTE E RELATOR

RELATÓRIO

Dispensado o relatório na forma do art. 46 da Lei 9.099/95 c/c art. 27 da Lei 12.153/2009 e do art. 63, § 1º, do Regimento Interno das Turmas de Recursos Cíveis e Criminais dos Juizados Especiais do Estado de Santa Catarina. Todavia, diante da enorme importância da matéria e da solução a ser encaminhada, entendo como pertinente a realização de uma pequena exposição dos fatos.

VOTO

Cuida-se de agravo de instrumento interposto pelo Município de Joinville contra a decisão proferida pelo Juízo do 2º Juizado Especial da Fazenda Pública de Joinville que, nos autos da ação de obrigação de fazer n. 0300138-72.2016.8.24.0038, ajuizada pela agravada contra o agravante e o Estado de Santa Catarina, deferiu a antecipação dos efeitos da tutela, determinando que os réus forneçam à autora o medicamento Ácido Ursodesoxicólico 300mg, na quantidade e pelo período que se fizerem necessários.

O agravante sustenta, em síntese: a) a impossibilidade de deferimento de liminar com base em receituário de médico privado (art. 28, II, do Decreto 7.508/2011); b) a existência de opções no Sistema Único de Saúde – SUS; c) a ausência de adequação do medicamento à enfermidade da agravada, havendo expressa recomendação da CONITEC pela não incorporação; d) a necessidade de fixação de contracautela.

Deferido o efeito suspensivo (fls. 99-104), a agravada apresentou contrarrazões (fls. 116-131). Aduziu, em resumo, que: i) embora atendida em sede particular, sua médica é credenciada pelo SUS; ii) tem direito a receber o medicamento, porque provada sua necessidade por atestado médico; iii) inexiste remédio substitutivo para a patologia que lhe acomete; iv) os medicamentos alternativos indicados no parecer do agravante não suprem suas necessidades, porque a composição do remédio pleiteado é única. Juntou o atestado de fls. 134 e pleiteou o desprovimento do recurso.

O Ministério Público manifestou-se pelo provimento do agravo, haja vista que um atestado de médico particular não pode se sobrepor à avaliação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema de Saúde – CONITEC (fls. 139-140).

Tendo em vista a aparente divergência entre as alegações do Município nestes autos e no Agravo de Instrumento n. 4000031- 98.2016.8.24.9005, determinei a intimação do ente público agravante para prestar esclarecimentos, bem como da recorrida e do Ministério Público, na sequência (fls. 141-142).

O Município aduziu, então, que não há tratamento definitivo para a doença cirrose biliar hepática e que o ácido ursodesoxicólico serve apenas para tratar os efeitos acessórios da doença, tal como os medicamentos disponibilizados pelo SUS (fls. 145-153).

A seu turno, a recorrida ratificou, basicamente, os argumentos já expostos em suas contrarrazões (fls. 157-167).

O prazo transcorreu sem manifestação do Ministério Público (fls. 173).

É a síntese do necessário em termos de exposição dos fatos.

Passo a delinear primeiros meus argumentos de forma mais ampla e tentando compreender a matéria como um todo, diante do caráter jurisprudencial que se pretende.

Por conseguinte, faz-se necessária uma exposição do tema da judicialização da saúde no Brasil, que tem sido alvo de acendrada discussão na mídia, no meio médico-hospitalar, no Congresso e, obviamente, no seio da Justiça.

O Supremo Tribunal Federal já disse que o direito à saúde se trata de direito público subjetivo, não podendo ser reduzido à promessa constitucional inconsequente (STF, Agravo Regimental no RE 271.286-8/RS). Honestamente, acho que disso ninguém duvida ou é contra!

A busca pelo Judiciário para solucionar as questões de saúde é, por vezes, indispensável. Entretanto, a judicialização do direito à saúde relaciona-se diretamente com a disponibilidade de recursos para a efetividade desses direitos, não cabendo a esse Poder criar e executar políticas públicas de saúde.

Ora, ninguém desconhece o renhido conflito de interesses entre o direito individual à saúde (vida) e o do Estado (proteção da coletividade) a quem compete garantir esse direito consagrado na Constituição Federal.

Com a crise econômica que assolou o país nos últimos tempos, ficaram ainda mais expostos os perigos da desgastada retórica individualista do cidadão que lembra que “paga todos os impostos” e, via de consequência, argumenta que tem direito absoluto e pleno ao fornecimento de bens ou serviços públicos, sem medir as consequências dessa pretensão eventualmente atendida para o restante da coletividade.

Todavia, poucos se atrevem a enfrentar com absoluta sinceridade essa questão tão complexa que envolve problemas orçamentários e estampar com honestidade que direitos e dinheiro (orçamento público) não nascem em árvores.

Essas questões do que realmente é “justiça” intrigam a humanidade há séculos e, sem descuidar de um viés crítico, Friedman não deixa de reconhecer que há uma surpreendente correspondência entre justiça e eficiência, e o que se costuma chamar de princípios de justiça podem ser regras de ouro para produzir um resultado eficiente, mesmo que de alguma forma internalizadas. Agora, se isso realmente é justiça, cada um deve definir por si mesmo, ou seja, exprimindo seus valores através de suas ações:

Enquanto a estátua da justiça permanecer firmemente fixada ao seu pedestal em vez de descer e assumir o controle, as ações das pessoas são as únicas ferramentas disponíveis para mover o mundo. Isso nos deixa com o problema de achar uma \'outra pessoa\' que saiba de ambos os meus interesses melhor que eu mesmo, e que possa ser confiável para realizá-lo [1] FRIEDMAN, David D. Law\'s order: what economics has to do with law and why it matters. New Jersey: Princeton University Press, 2000. p. 23.

Ora, só alguém com alguma psicopatia grave é que não teria um sentimento elevado e protetivo para salvar a vida de outrem. Basta olhar o sofrimento de alguém, para no âmago de qualquer um despertar o sentimento de justiça e luta para preservação da espécie:

Como no exemplo hipotético acima, absolutamente ninguém iria para casa sem querer cessar eventual sofrimento dessa infante, buscando de todas as formas minorar a sua dor e de todos que a cercam.

Quem não mandaria pagar até milhões de reais para salvar a vida de seu semelhante?

Todavia, impossível também não se ter a mente e o espírito aberto para os milhares de brasileiros – que também pagam os seus impostos e são amados por seus entes queridos – que estão morrendo nos hospitais que não possuem mais a mínima condição de fazer frente à elevada demanda por saúde e atender de forma justa, humana e eficiente a todos que lá vão em busca de auxílio médico-hospitalar.

Quem poderá também explicar e até justificar que, eventualmente, os milhões de Reais para salvar alguns poucos, foram retirados do sistema de saúde que potencialmente afetam a vida e a dignidade de outros milhares?

No meio desse “incêndio” de direitos e deveres, já tarda a hora de levantarmos mais a cabeça e deixarmos de lado a observação exclusiva das “árvores” (indivíduos) que estão pegando fogo e olharmos para a “floresta” (sociedade) que precisa ser salva.

Para realmente serem efetivos, os direitos individuais devem ser orientados com os direitos sociais com vistas a coexistirem de forma harmônica e pacífica com os demais direitos que cada cidadão possua, numa cooperação social que ocorre para o benefício mútuo.

E não há resposta simples e nem fácil para essa delicada questão que envolve profundamente questões morais.

Lapidar são os comentários do Ministro Barroso, do Supremo Tribunal Federal, quando bem alerta:

O sistema, no entanto, começa a apresentar sintomas graves de que pode morrer da cura, vítima do excesso de ambição, da falta de critérios e de voluntarismos diversos. Por um lado, proliferam decisões extravagantes ou emocionais, que condenam a Administração ao custeio de tratamentos irrazoáveis seja porque inacessíveis, seja porque destituídos de essencialidade , bem como de medicamentos experimentais ou de eficácia duvidosa, associados a terapias alternativas. Por outro lado, não há um critério firme para a aferição de qual entidade estatal União, Estados e Municípios deve ser responsabilizada pela entrega de cada tipo de medicamento. Diante disso, os processos terminam por acarretar superposição de esforços e de defesas, envolvendo diferentes entidades federativas e mobilizando grande quantidade de agentes públicos, aí incluídos procuradores e servidores administrativos. Desnecessário enfatizar que tudo isso representa gastos, imprevisibilidade e desfuncionalidade da prestação jurisdicional.

Tais excessos e inconsistências não são apenas problemáticos em si. Eles põem em risco a própria continuidade das políticas de saúde pública, desorganizando a atividade administrativa e impedindo a alocação racional dos escassos recursos públicos. No limite, o casuísmo da jurisprudência brasileira pode impedir que políticas coletivas, dirigidas à promoção da saúde pública, sejam devidamente implementadas. Trata-se de hipótese típica em que o excesso de judicialização das decisões políticas pode levar à não realização prática da Constituição Federal. Em muitos casos, o que se revela é a concessão de privilégios a alguns jurisdicionados em detrimento da generalidade da cidadania, que continua dependente das políticas universalistas implementadas pelo Poder Executivo.

(...).

O Judiciário não pode ser menos do que deve ser, deixando de tutelar direitos fundamentais que podem ser promovidos com a sua atuação. De outra parte, não deve querer ser mais do que pode ser, presumindo demais de si mesmo e, a pretexto de promover os direitos fundamentais de uns, causar grave lesão a direitos da mesma natureza de outros tantos. Na frase inspirada de Gilberto Amado, “querer ser mais do que se é, é ser menos”.

5. Aqui se chega ao ponto crucial do debate. Alguém poderia supor, a um primeiro lance de vista, que se está diante de uma colisão de valores ou de interesses que contrapõe, de um lado, o direito à vida e à saúde e, de outro, a separação de Poderes, os princípios orçamentários e a reserva do possível. A realidade, contudo, é mais dramática. O que está em jogo, na complexa ponderação aqui analisada, é o direito à vida e à saúde de uns versus o direito à vida e à saúde de outros. Não há solução juridicamente fácil nem moralmente simples nessa questão. (BARROSO. Luís Roberto. Da falta de efetividade à judicialização excessiva: Direito à saúde, fornecimento gratuito de medicamentos e parâmetros para a atuação judicial).

Essas questões não afligem somente o Brasil, tanto é verdade que, até mesmo Canotilho adverte que não é possível resolver o problema na base do tudo ou nada (regra):

Acresce que o facto de se reconhecer um direito à vida como direito positivo a prestações existenciais mínimas, tendo como destinatário os poderes públicos, não significa impor como o Estado deve, prima facie, densificar este direito. Diferente do que acontece no direito à vida na sua dimensão negativa não matar -, e na sua dimensão positiva impedir de matar -, aqui, na segunda dimensão, positiva, existe um relativo espaço de discricionariedade do legislador (dos poderes públicos) quanto à escolha do meio (ou meios) para tornar efectivo o direito à vida na sua dimensão existencial mínima. (Canotilho, José Joaquim Gomes. Estudos sobre Direitos Fundamentais. Coimbra Editora, 2004, p.58).

E por que não se pode resolver tal matéria em termos de tudo ou nada? Pelo fato de que ela envolve outro universo de variáveis múltiplas e complexas, a saber: disponibilidade de recursos financeiros alocados preventivamente, políticas públicas integradas em planos plurianuais e em diretrizes orçamentárias, medidas legislativas ordenadoras das receitas e despesas públicas, etc. Todos estes condicionantes, por sua vez, encontram-se dispersos em diferentes atores institucionais, com competências e autonomias reguladas também pela Constituição.

É claro que o simples argumento da escassez de recursos dos cofres públicos não pode autorizar o esvaziamento de direitos fundamentais, muito menos os relacionados à saúde, eis que diretamente impactantes em face da vida humana e sua dignidade mínima, e por isso estarão sujeitos ao controle jurisdicional para fins de se aferir a razoabilidade dos comportamentos institucionais neste sentido.

Por outro lado, toda e qualquer ponderação entre as colisões de princípios (Alexy) deve observar com especial atenção e cuidado não só o argumento mais sedutor (proteção individual), mas ter abertura com o resultado final, ou seja, que a resposta judicial atenda ao maior número de indivíduos (proteção da coletividade).

Sobre a conduta judicial, Timm diz que

Mas uma vez tomada a decisão, ela deve valer para todos, impessoalmente. Pois realmente o maior problema do país parece ser se ater impessoalmente à regra e agir fora da lógica do patrimonialismo estatal (que vê a coisa pública justamente como res nullius). Justamente o que caracterizaria um direito como social é sua não apropriação por um indivíduo, mas estar à disposição de toda a sociedade. De modo que o direito social à saúde é um direito de todos terem um hospital funcionando com um nível x de atendimento, ainda que limitado (por exemplo, urgências). Não significa o direito de um indivíduo contra todos da sociedade obter um medicamento que poderá provocar o fechamento do posto de saúde. Este não é um direito social ou coletivo, mas individual. (TIMM. Luciano Benetti. Direito à saúde e a maneira mais eficiente de prover direitos fundamentais: uma perspectiva de direito e economia).

O STF já demonstrou enorme preocupação que essas análises e ponderações sejam realizadas no palco das cautelares, dada a singeleza de sua cognição, conforme se destaca do julgamento do Agravo Regimental na Suspensão de tutela Antecipada nº 175/CE:

não se pode esquecer de que a gestão do Sistema Único de Saúde, obrigado a observar o princípio constitucional do acesso universal e igualitário às ações e prestações de saúde, só torna-se viável mediante a elaboração de políticas públicas que repartam os recursos (naturalmente escassos) da forma mais eficiente possível. Obrigar a rede pública a financiar toda e qualquer ação e prestação de saúde existente geraria grave lesão à ordem administrativa e levaria ao comprometimento do SUS, de modo a prejudicar ainda mais o atendimento médico da parcela da população mais necessitada. Dessa forma, podemos concluir que, em geral, deverá ser privilegiado o tratamento fornecido pelo SUS em detrimento de opção diversa escolhida pelo paciente, sempre que não for comprovada a ineficácia ou a impropriedade da política de saúde existente.

(...)

Parece certo que a inexistência de Protocolo Clínico no SUS não pode significar violação ao princípio da integralidade do sistema, nem justificar a diferença entre as opções acessíveis aos usuários da rede pública e as disponíveis aos usuários da rede privada. Nesses casos, a omissão administrativa no tratamento de determinada patologia poderá ser objeto de impugnação judicial, tanto por ações individuais como coletivas. No entanto, é imprescindível que haja instrução processual, com ampla produção de provas, o que poderá configurar-se um obstáculo à concessão de medida cautelar.

Portanto, independentemente da hipótese levada à consideração do Poder Judiciário, as premissas analisadas deixam clara a necessidade de instrução das demandas de saúde para que não ocorra a produção padronizada de iniciais, contestações e sentenças, peças processuais que, muitas vezes, não contemplam as especificidades do caso concreto examinado, impedindo que o julgador concilie a dimensão subjetiva (individual e coletiva) com a dimensão objetiva do direito à saúde. Esse é mais um dado incontestável, colhido na Audiência Pública – Saúde. (STA 175 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, j. em 17/03/2010, DJe-076, pub. em 30-04-2010).

Recentemente, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, ao enfrentar de forma inédita essa questão num incidente de resolução de demandada repetitiva (IRDR), apresentou dados econômicos para demonstrar a situação econômica e o panorama global em que as decisões judiciais estão interferindo:

Os dados estatísticos demonstram que o fenômeno da judicialização na área da saúde tem sido responsável por consumir grande parte dos recursos governamentais destinados a esta rubrica, consoante denota o ofício n. 461/2016, juntado ao presente incidente pela consultoria jurídica da Secretaria de Estado da Saúde de Santa Catarina.

Referido documento demonstra que, somente no ano de 2015, foram gastos mais de cento e cinquenta milhões de reais para atender pouco mais de trinta mil pacientes em razão de medidas judiciais, com um custo médio de cinco mil reais por pessoa.

Extrai-se também dos gastos públicos referentes ao ano de 2014 - pouco mais do que cento e cinquenta e seis milhões de reais para o cumprimento das ordens judiciais em favor de pouco mais do que vinte e seis mil pacientes - que tal montante seria suficiente para manter dois dos Hospitais sob a administração da Secretaria Estadual de Saúde (Celso Ramos e Nereu Ramos), por quase um ano, viabilizando o atendimento de quase cento e noventa e cinco mil pessoas.

Ainda, a quantia destinada aos vinte e seis mil chamados pacientes judiciais em 2014 asseguraria, por dois meses, a manutenção de todos os treze hospitais administrados diretamente pela Secretaria da Saúde, beneficiando mais de cento e setenta mil pessoas.” (TJSC, Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas n. 0302355-11.2014.8.24.0054, de Rio do Sul, rel. Des. Ronei Danielli, j. 09-11-2016).

Necessário esclarecer que o IRDR não poderá ser utilizado para nortear esse recurso em razão de que essa lide foi julgada anteriormente, todavia, vale ressaltar que os princípios gerais norteadores do referido julgado não foram ignorados, mormente na questão do maior cuidado no tocante à concessão do medicamento via atestado médico. É esta a ementa do julgado:

INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDA REPETITIVA - IRDR. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. DISPENSAÇÃO DE MEDICAMENTOS E TERAPIAS PELO PODER PÚBLICO. DISTINÇÃO ENTRE FÁRMACOS PADRONIZADOS DOS NÃO COMPONENTES DAS LISTAGENS OFICIAIS DO SUS. NECESSÁRIA REPERCUSSÃO NOS REQUISITOS IMPRESCINDÍVEIS AO NASCIMENTO DA OBRIGAÇÃO POSITIVA DO ESTADO.

1. Teses Jurídicas firmadas:

1.1 Para a concessão judicial de remédio ou tratamento constante do rol do SUS, devem ser conjugados os seguintes requisitos: (1) a necessidade do fármaco perseguido e adequação à enfermidade apresentada, atestada por médico; (2) a demonstração, por qualquer modo, de impossibilidade ou empecilho à obtenção pela via administrativa (Tema 350 do STF).

1.2 Para a concessão judicial de fármaco ou procedimento não padronizado pelo SUS, são requisitos imprescindíveis: (1) a efetiva demonstração de hipossuficiência financeira; (2) ausência de política pública destinada à enfermidade em questão ou sua ineficiência, somada à prova da necessidade do fármaco buscado por todos os meios, inclusive mediante perícia médica; (3) nas demandas voltadas aos cuidados elementares à saúde e à vida, ligando-se à noção de dignidade humana (mínimo existencial), dispensam-se outras digressões; (4) nas demandas claramente voltadas à concretização do máximo desejável, faz-se necessária a aplicação da metodologia da ponderação dos valores jusfundamentais, sopesando-se eventual colisão de princípios antagônicos (proporcionalidade em sentido estrito) e circunstâncias fáticas do caso concreto (necessidade e adequação), além da cláusula da reserva do possível.

2. Aplicação ao caso concreto:

2.1 Recursos do Município e do Estado conhecidos e parcialmente providos para excluir da condenação o fornecimento dos fármacos não padronizados. (TJSC, Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas n. 0302355-11.2014.8.24.0054, de Rio do Sul, rel. Des. Ronei Danielli, j. 09-11-2016).

Moraes ainda bem demonstra o tamanho dos gastos no Brasil inteiro, com ações de saúde pleiteadas judicialmente, sendo interessante anotar que entre os medicamentos mais requeridos (10+) está exatamente o ácido ursodesoxicólico:

“Ademais, em 2014, os dez medicamentos mais postulados foram concedidos em 223.431 unidades, enquanto em 2015, o número foi para 348.650, o que demonstra um aumento de 56,04%, sendo as unidades contadas em comprimidos, ampolas ou frascos, conforme a substância (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2016c).

(...).

Ainda, destaca-se que o valor dos dez medicamentos mais postulados em 2014 equivale a 79,48% do total gasto no mesmo ano, enquanto em 2015 o percentual é de 76,05%, sendo, portanto, valores muito relevantes. 

A apresentação de todas essas informações tem por objetivo demonstrar que a concessão judicial de medicamentos não é irrelevante, nem sob o aspecto social, nem econômico. É necessária, portanto, a compreensão de que, a longo prazo, a falta de análise, de conhecimento, e de critérios, pode ser amplamente prejudicial para todos os indivíduos que dependem de prestações estatais para a manutenção de sua qualidade de vida. [2]

Feitas essas considerações gerais, passo a uma detida análise do caso em particular, com vistas a tentar solucionar de uma forma republicana, transparente e justa para todos. 

Consoante anotei na decisão de fls. 99-104, entendo que as demandas cujo pedido seja o fornecimento de medicamento ou tratamento de saúde devem ser analisadas nos termos do que deliberou o STF na STA 175 AgR/CE.

O STF decidiu, em síntese, que: a) o procedimento ou medicamento esteja, de preferência, registrado ou aprovado pela ANVISA; b) existindo tratamento alternativo disponibilizado pelo Poder Público, incumbe à parte demonstrar sua ineficácia ao seu caso; c) o procedimento ou tratamento não seja experimental, o que não se confunde com um novo tratamento ainda não testado pelo Sistema de Saúde brasileiro, caso em que imprescindível a instrução processual para que se comprove a eficácia da medida.

Nessa linha, vale frisar que:

(...) o Sistema Único de Saúde filiou-se à corrente da \'Medicina com base em evidências\'. Com isso, adotaram-se os \'Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas\', que consistem num conjunto de critérios que permitem determinar o diagnóstico de doenças e o tratamento correspondente com os medicamentos disponíveis e as respectivas doses. Assim, um medicamento ou tratamento em desconformidade com o Protocolo deve ser visto com cautela, pois tende a contrariar um consenso científico vigente.

(...). Dessa forma, podemos concluir que, em geral, deverá ser privilegiado o tratamento fornecido pelo SUS em detrimento de opção diversa escolhida pelo paciente, sempre que não for comprovada a ineficácia ou a impropriedade da política de saúde existente.

Essa conclusão não afasta, contudo, a possibilidade de o Poder Judiciário, ou de a própria Administração, decidir que medida diferente da custeada pelo SUS deve ser fornecida a determinada pessoa que, por razões específicas do seu organismo, comprove que o tratamento fornecido não é eficaz no seu caso. (STA 175 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 17/03/2010)

Por conseguinte, sendo esses os requisitos, afasta-se o argumento de que necessária receita de médico do SUS para deferir tutela provisória concessiva de medicamento. Além disso, o art. 28, II, do Decreto 7.508/2011, está inserido na Seção II, que trata da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais – RENAME, o que significa que o receituário de médico do SUS é imprescindível apenas quando se trata da concessão de medicamento já incorporado ao SUS (o que não é o caso dos autos), isso para evitar que um médico particular tenha ingerência no sistema público (é o que se depreende do enunciado 11 da Jornada de Direito da Saúde, citado pelo agravante – fls. 05). Aliás, raciocínio em sentido diverso nem teria lógica, por implicar distinção entre médico público e particular sem motivo para tanto, o que seria, inclusive, de duvidosa constitucionalidade.

Ademais, indispensável registrar novamente o que já anotei na decisão de fls. 99-104, porquanto nem os argumentos expedindos pela agravada, tampouco o novo atestado carreado ao feito (fls. 134), afastam as conclusões lá consignadas:

(...). o medicamento pleiteado, ácido ursodeoxicólico, (i) não é custeado pelo SUS, porque a CONITEC entendeu que o fármaco não é adequado para tratar a enfermidade que acomete a agravada, uma vez que inexistem evidências científicas da eficácia terapêutica de sua utilização (item 3.2, fls. 20-21) e (ii) existem tratamentos alternativos disponibilizados pelo SUS (item 2.2, fls. 17-19).

Apesar dessas conclusões, nada obstaria o fornecimento do medicamento caso houvesse comprovação de ineficácia ou impropriedade dos tratamentos oferecidos pelo SUS, como salientou o próprio Min. Gilmar Mendes em seu voto, supracitado.

Ora, o único documento que ampara a pretensão da agravada é o atestado médico de fls. 55, do qual se extrai a necessidade pelo fármaco requerido, bem como a inexistência de remédio substituto para a patologia.

Ocorre que essas singelas declarações não são suficientes para afastar todos os tratamentos disponibilizados pelo SUS, sobretudo levando em conta a decisão da CONITEC, acima mencionada, acerca do remédio postulado.

Com efeito, deveria a agravada ter comprovado que as alternativas oferecidas pelo SUS, ou seja, tudo o quanto exposto às fls. 17-19, são ineficazes para o seu caso.

Aliás, nesse sentido é o enunciado 12 da I Jornada de Direito da Saúde promovida pelo Conselho Nacional de Justiça:

"12 - A inefetividade do tratamento oferecido pelo SUS, no caso concreto, deve ser demonstrada por relatório médico que a indique e descreva as normas éticas, sanitárias, farmacológicas (princípio ativo segundo a Denominação Comum Brasileira) e que estabeleça o diagnóstico da doença (Classificação Internacional de Doenças), tratamento e periodicidade, medicamentos, doses e fazendo referência ainda sobre a situação do registro na ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária)."

Frise-se que a CONITEC manifestou-se por não incorporar o ácido ursodesoxicólico para o tratamento de doença hepática relacionada à fibrose cística (fls. 21), patologia diversa daquela que acomete a agravada (cirrose biliar primária).

De todo modo, a demonstração da necessidade do medicamento é tão frágil que sequer a agravada ou sua médica tiveram o cuidado de expor as similitudes ou diferenças entre cada enfermidade. Seja como for, o fato é que há dúvidas sobre a eficiácia do fármaco requerido e inexistem razões para afastar os tratamentos disponibilizados pelo SUS.

Ressalte-se também que a ANVISA aprovou o uso do ácido ursodesoxicólico (ursacol) para "tratamento de forma sintomática da cirrose biliar primária" (fls. 22), o que significa dizer que o remédio não age diretamente na doença, mas sim em seus sintomas, da mesma forma que as opções previstas no SUS (fls. 17-19).

Além do enunciado 12, transcrito acima, existem outros enunciados da Jornada de Direito da Saúde aplicáveis ao caso. Confira-se:

14 - Não comprovada a inefetividade ou impropriedade dos medicamentos e tratamentos fornecidos pela rede pública de saúde, deve ser indeferido o pedido não constante das políticas públicas do Sistema Único de Saúde.

16 - Nas demandas que visam acesso a ações e serviços da saúde diferenciada daquelas oferecidas pelo Sistema Único de Saúde, o autor deve apresentar prova da evidência científica, a inexistência, inefetividade ou impropriedade dos procedimentos ou medicamentos constantes dos protocolos clínicos do SUS.

19 - Nas ações que envolvam pedido de assistência à Saúde, é recomendável à parte autora apresentar questionário respondido por seu médico para subsidiar o deferimento de liminar, bem como para ser utilizado na instrução probatória do processo, podendo-se fazer uso dos questionários disponibilizados pelo CNJ, pelo Juízo processante, pela Defensoria Pública, pelo Ministério Público ou pela OAB, sem prejuízo do receituário competente.

33 - Recomenda-se aos magistrados e membros do Ministério Público, da Defensoria Pública e aos Advogados a análise dos pareceres técnicos da Agência Nacional de Saúde Suplementar* e da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (CONITEC)** para auxiliar a prolatação de decisão ou a propositura da ação.

*http://www.ans.gov.br/aans/transparencia-institucional/pareceres-tecnicosda-ans **http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/oministerio/principal/secretaria s/sctie/conitec

51 - Saúde Pública - Nos processos judiciais, a caracterização da urgência/emergência requer relatório médico circunstanciado, com expressa menção do quadro clínico de risco imediato.

59 - Saúde Pública - As demandas por procedimentos, medicamentos, próteses, órteses e materiais especiais, fora das listas oficiais, devem estar fundadas na Medicina Baseada em Evidências.

61 - Saúde Pública - Proposta de alteração do enunciado n°4 da I Jornada - Os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) são elementos organizadores da prestação farmacêuticas, de insumos e de procedimentos, e não limitadores. Assim, no caso concreto, quando todas as alternativas terapêuticas previstas no respectivo PCDT já tiverem sido esgotadas ou forem inviáveis ao quadro clínico do paciente usuário do SUS, pelo princípio do art. 198, II, da CF, pode ser determinado judicialmente o fornecimento, pelo Sistema Único de Saúde, do fármaco, insumo ou procedimento não protocolizado.

É de uma clareza solar como os enunciados chegam até ser repetitivos quanto à necessidade de que se comprove a ineficácia dos tratamentos disponibilizados pelo Poder Público e, realmente, essa medida é inarredável, porquanto não faz sentido algum custear um tratamento ou medicamento sem prova adequada de sua indispensabilidade.

O próprio Min. Gilmar Mendes, relator da STA 175 AgR/CE, chega a salientar que:

Não se pode esquecer de que a gestão do Sistema Único de Saúde, obrigado a observar o princípio constitucional do acesso universal e igualitário às ações e prestações de saúde, só torna-se viável mediante elaboração de políticas públicas que repartam os recursos (naturalmente escassos) da forma mais eficiente possível. Obrigar a rede pública a financiar toda e qualquer ação e prestação de saúde existente geraria grave lesão à ordem administrativa e levaria ao comprometimento do SUS, de modo a prejudicar ainda mais o atendimento médico da parcela da população mais necessitada.

Deve-se ter em mente que o fornecimento de tratamento ou medicamento numa ação individual acaba, sempre, prejudicando a coletividade, ante o desvio de recursos públicos não previstos originariamente para esse fim. Portanto, a intervenção judicial só se justifica quando houver inequívoca demonstração da necessidade da ação de saúde pleiteada.

Por outro lado, cabíveis ainda alguns comentários em relação à Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema de Saúde – CONITEC.

A CONITEC é um órgão federal criado pela Lei 12.401/2011 e regulamentado pelo Decreto 7.646/2011, com o objetivo de assessorar o Ministério da Saúde nas atribuições relativas à incorporação, exclusão ou alteração de tecnologias em saúde pelo SUS, bem como na constituição ou alteração de Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas – PCDT [3]. 

Importante frisar que a CONITEC tem o prazo de 180 dias (prorrogáveis por mais 90 dias) para tomar uma decisão e que o órgão é composto por: i) representantes de cada Secretaria do Ministério da Saúde (num total de 7); ii) Conselho Federal de Medicina; iii) Conselho Nacional de Saúde; iv) Conselho Nacional das Secretarias Estaduais de Saúde; v) Conselho Nacional das Secretarias Municipais de Saúde; vi) Agência Nacional de Saúde Suplementar; vii) Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

Nesse contexto, não há como negar a eficiência e alto nível da discussão científica travada pelo órgão em suas decisões.

Em consequência, a decisão da CONITEC por não incorporar o medicamento pleiteado (ácido ursodesoxicólico – ursacol) e a falta de comprovação da ineficácia de todos os tratamentos disponibilizados pelo Poder Público (fls. 17-19) conduz, inevitavelmente, ao provimento do agravo.

Diante do exposto, voto pelo provimento do agravo, para revogar a tutela provisória concedida na origem.

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Fonte: Tribunal de Justiça de Santa Catarina


Notas e Referências:

1.  Tradução livre realizada do texto original: “As long as the statue of justice remains firmly attached to her pedestal instead of stepping down and taking charge, people\'s actions are the only tools available for moving the world. That leaves us with the problem of finding a "someone else" who both knows my interest better than I do and can be trusted to pursue it.”

2. MORAES. Luíza Pizetta. “O custeamento público de medicamentos sob a ótica da Análise Econômica do Direito.” Joinville. 2016. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado perante a Sociedade Educacional de Santa Catarina (SOCIESC). Anoto que tive a inegável honra de participar da banca dessa jovem estudante que, com todos os méritos, tirou nota máxima no TCC desenvolvido com muita delicadeza, seriedade e competência.

3. Em http://conitec.gov.br/entenda-a-conitec-2. Acesso em 3 de novembro de 2016.
Imagem Ilustrativa do Post: medicine // Foto de: rodrigo simoes // Sem alterações Disponível em: https://www.flickr.com/photos/rodrigo_simoes/4429866526/ Licença de uso: https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/legalcode
 

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