INVASÕES DE TERRA E OS DELITOS DE ESBULHO POSSESSÓRIO E INCITAÇÃO AO CRIME

13/04/2023

As recentes invasões de terra no Brasil, ocorridas em grande número nos três primeiros meses do novo governo, reacenderam o debate sobre os limites do direito a uma justa reforma agrária e a garantia de segurança jurídica e cumprimento da lei no campo.

É bem verdade que as invasões de terra no Brasil são um tema bastante controverso e polêmico, que tem gerado muitos debates e discussões no âmbito político, social e jurídico. De um lado, temos os movimentos “sem terra”, que buscam a reforma agrária e a distribuição de terras para os trabalhadores rurais. De outro, temos os proprietários de terra, que defendem o direito à propriedade e o respeito à ordem jurídica.

Nesse contexto, é comum ocorrerem invasões de propriedades rurais por parte dos referidos movimentos, que muitas vezes utilizam a violência e a pressão social para ocupar as terras. Essas invasões, além de gerarem conflitos e tensões entre as partes envolvidas, também são consideradas ilegais e configuram o crime de esbulho possessório.

O esbulho possessório consiste na tomada da posse de um bem imóvel, edifício ou terreno alheio, por meio da violência, clandestinidade ou precariedade, sem o consentimento do proprietário. É um crime previsto no Código Penal, no art. 161, § 1º, II, que estabelece pena de detenção de 1 (um) a 6 (seis) meses e multa para quem comete esse tipo de delito.

No caso das invasões de terra, os movimentos “sem terra” costumam alegar que estão exercendo o direito de resistência, previsto na Constituição Federal, que garante a todos o direito de resistir a qualquer tipo de opressão. No entanto, essa alegação não é aceita nem pela sociedade e nem pelos tribunais, que consideram as invasões ilegais e configuradoras do crime de esbulho possessório. Isso sem dizer da destruição criminosa de plantações, abate de animais e utilização de armas de fogo contra empregados e proprietários das terras invadidas.

Além disso, o anúncio ostensivo feitos pelos meios de comunicação e pelas redes sociais das invasões de terra também pode configurar o crime de incitação ao crime, previsto no art. 286 do Código Penal. Esse crime consiste em incitar publicamente outras pessoas a cometer um crime, por meio de palavras, gestos ou qualquer outro meio de comunicação. No caso das invasões de terra, os líderes dos movimentos “sem terra” muitas vezes incitam seus integrantes a ocuparem as terras por meio de discursos inflamados e pressão social.

E o que gera mais indignação e perplexidade na sociedade brasileira é o silêncio e a complacência da maioria dos meios de comunicação de massa e a total inércia e passividades das autoridades públicas que deveriam, por missão constitucional, zelar pelo respeito à democracia e pela defesa do estado democrático de direito, como é o caso do Ministério Público e do Poder Judiciário, em outros tempos muito ativos em reprimir e responsabilizar movimentos sociais.

Diante desse cenário de conflito e violência, o Código Civil prevê o chamado desforço imediato, que consiste no uso da força para reaver a posse de um bem imóvel que foi ilegalmente tomado. Esse direito está previsto no art. 1.210, § 1º, do Código Civil, que estabelece que o possuidor tem direito de usar a força para reaver a posse do bem, desde que o faça imediatamente e sem excesso. Em outras palavras, trata-se do direito que o proprietário tem de se defender imediatamente quando é vítima de um esbulho possessório, sem a necessidade de recorrer aos tribunais ou às autoridades policiais.

Esse dispositivo legal estabelece que o proprietário ou possuidor que, por ato ou omissão voluntária de terceiro, sofrer turbação ou esbulho de seu imóvel, poderá reaver a posse por meio do desforço imediato, desde que o faça sem excessos e de forma proporcional ao esbulho sofrido.

Nesse sentido, é importante ressaltar que o desforço imediato não é uma medida que pode ser utilizada de forma indiscriminada pelo proprietário. É preciso que haja uma situação de esbulho possessório efetivo, ou seja, uma invasão ou ocupação ilegal do imóvel, para que seja possível a sua utilização. Além disso, é fundamental que o proprietário ou possuidor utilize a força de forma moderada e proporcional à agressão sofrida, sob pena de configurar crime de violência privada.

Caso o proprietário ou possuidor utilize o desforço imediato de forma excessiva, causando danos materiais ou pessoais ao invasor, poderá responder criminalmente pelo excesso. Além disso, o invasor poderá buscar a reparação civil dos danos sofridos, como a perda de bens ou a necessidade de pagar indenizações.

É importante lembrar que o desforço imediato é uma medida excepcional, que deve ser utilizada apenas em situações de urgência e necessidade, quando o proprietário ou possuidor não tem outra forma de reaver a posse do imóvel. Em casos de disputas fundiárias mais complexas, é recomendável que as partes busquem a mediação de órgãos competentes, como a Justiça, a Polícia Militar ou a Ouvidoria Agrária Nacional, para evitar conflitos e garantir uma solução justa e pacífica para todas as partes envolvidas.

Diante desse contexto complexo e controverso, é fundamental buscar soluções pacíficas e negociadas para as questões agrárias no Brasil. É preciso garantir o respeito à ordem jurídica e aos direitos fundamentais, como o direito à propriedade e ao trabalho digno, ao mesmo tempo em que se buscam alternativas para garantir o acesso à terra e a justiça social no campo.

Para isso, é importante que haja um diálogo franco e construtivo entre as partes envolvidas, com a participação de órgãos públicos e da sociedade civil. É fundamental que as políticas públicas de reforma agrária sejam fortalecidas e ampliadas, visando garantir o acesso à terra e a condições dignas de trabalho para os trabalhadores rurais sem terra.

Além disso, é preciso garantir a segurança jurídica para os proprietários de terra, assegurando-lhes o direito à propriedade e a proteção contra invasões ilegais. Nesse sentido, é importante que as autoridades competentes atuem de forma firme e imparcial para coibir as invasões de terra e garantir o cumprimento da lei.

Por fim, é preciso lembrar que a questão das invasões de terra no Brasil é complexa e multifacetada, envolvendo aspectos econômicos, sociais, políticos e jurídicos. É fundamental que se busque uma abordagem integrada e abrangente para enfrentar esse problema, que afeta não apenas os proprietários de terra e os movimentos sociais, mas toda a sociedade brasileira.

Para tanto, é preciso fomentar o debate e a reflexão sobre o tema, com a participação ativa de todos os setores da sociedade. Somente assim poderemos encontrar soluções justas e efetivas para garantir a justiça social e a paz no campo, tão necessárias para o desenvolvimento sustentável e o bem-estar de todos os brasileiros.

 

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