Por Redação - 30/08/2017
A entrevistada de hoje é Tássia A. Gervasoni. Doutora em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos, com período de doutoramento sanduíche na Univesidad de Sevilla. Autora da obra Estado e Direito em trânsito na Pós-Modernidade, publicada pela Empório do Direito.
Por que começou escrever?
Escrevo desde sempre como uma forma de expressar sentimentos e visões de mundo, o que antecede a escrita e a pesquisa jurídica. Comecei a escrever porque sinto que me expresso melhor dessa forma do que qualquer outra; é como se por meio das palavras pudesse enxergar meus pensamentos fora de mim.
Qual é a importância do livro na vida das pessoas?
Um livro pode transformar a vida de uma pessoa, desde o desenvolvimento intelectual até a formação de personalidade e redefinição de padrões éticos. Uma leitura é uma imersão em um mundo de possibilidades e potencialidades inteiramente disponíveis ao leitor. É um chamado à criatividade.
Qual é o foco do seu(s) livro(s)?
Permitir o desenvolvimento de reflexões críticas acerca de temas sensíveis ao Estado Democrático de Direito. Esse sempre é o objetivo de cada pesquisa e texto que produzo.
De que maneira a temática que você aborda contribui com a área jurídica?
No meu último livro, trato sobre a crise paradigmática que afeta o Estado e o Direito, o que constitui um debate extremamente necessário. As diferentes manifestações de crise que perpassam as nossas instituições modernas colocam em xeque as possibilidades dessas estruturas em um mundo globalizado. A contribuição mais expressiva da obra talvez seja revelar esses pontos de desequilíbrio entre o que historicamente se consolidou do ponto de vista da teoria jurídica, mas que já não encontra correspondência com a realidade política, econômica e social.
Quanto tempo leva para escrever um livro?
Sequer tenho certeza de que um livro pode ser “terminado”. É claro que, em algum momento, se alcança a resposta pretendida desde o problema de pesquisa inicial e se põe um ponto final na escrita. No entanto, são tantos outros dilemas e desafios que acabam surgindo ao longo do processo de escrita que é difícil sentir-se tendo concluído efetivamente uma obra. Além disso, aquilo que se traduz em uma publicação é resultado de um acúmulo de leituras, experiências e aprendizados de uma vida toda.
Qual é a sensação de saber que alguém aprendeu sobre determinado assunto através do seu livro?
É extremamente gratificante, sobretudo porque, quando alguém lê um livro seu, significa que dedicou um tempo que é precioso às suas ideias. Quando essa confiança se reverte em aprendizado para o leitor, é a própria existência da obra que se justifica, que alcança o seu sentido.
Se já publicou mais de um, qual é o livro preferido que publicou? Por que?
Já publiquei outras obras, mas não posso negar um apreço especial pelo “Estado e Direito em trânsito na pós-modernidade”, porque foi o trabalho que me exigiu mais maturidade e persistência até hoje. Além disso, ou justamente por isso, as pesquisas feitas para a construção da obra mudaram a minha compreensão de mundo.
Qual é o ônus e o bônus de ser autor(a)?
O maior benefício de ser autor é a liberdade para manifestar as suas ideias e compreensões acerca de determinado tema, junto do crescimento e aprendizado que vêm no processo. O maior ônus talvez seja a responsabilidade dessa manifestação, porque toda publicação é uma exposição e, dessa forma, você fica sujeito a críticas e discordâncias, o que não é de todo ruim, considerando que é a partir dessas dinâmicas que a ciência progride. Por isso percebo a publicação de uma obra como uma responsabilidade enorme.
Qual é a situação atual da literatura jurídica no Brasil?
Os tempos pós-modernos são complexos. Enfrentamos uma crise paradigmática que abala todos os âmbitos da nossa forma de vida e o meio jurídico não se escapa a isso. Hoje é muito fácil exteriorizar uma ideia ou opinião sem que se precise fundamenta-las com profundidade científica. Como agravante, a academia é avaliada, em grande parte, por número/quantidade de publicações, não por conteúdo/qualidade, o que certamente contribui para a disseminação massiva de trabalhos sem um necessário aprofundamento teórico e teor crítico. Ainda assim, temos muitos autores e juristas extremamente qualificados e que cumprem o papel que incumbe à literatura jurídica.
Como a pós-modernidade contribui para o Direito?
Não sei se posso dizer exatamente que a pós-modernidade contribui para o Direito, pois o conjunto de fatores que culmina nessa designação, na verdade, coloca em xeque as estruturas e instituições modernas e o Direito talvez seja das mais afetadas. Se pensarmos, contudo, que as crises deflagradas ou reveladas pelo contexto pós-moderno servem a um repensar do Direito, aí sim temos uma contribuição significativa, que não só permite como exige uma reflexão profunda sobre o Direito que conhecemos hoje.
Qual era o seu objetivo com o livro?
Promover uma reconstrução crítica de todo um aporte teórico desenvolvido no entorno o Estado e Direito ao longo de séculos, mas que, hoje, mostra-se desencaixado do espaço-tempo. Ao propor como tema de estudo a situação do Estado e do Direito na “pós-modernidade” e as perspectivas do constitucionalismo para a (re) configuração do Estado Democrático de Direito em um novo paradigma espaço-temporal, pressupõe-se um árduo trabalho de refundação e relegitimação para trazer o Estado e o Direito nascidos a partir do século XVI, finalmente, para o século XXI.
Como você caracteriza as transformações no Estado e Direito?
A novidade do espaço-tempo presente parece ser uma constante: novas formas de comunicar(-se) e de conhecer(-se), novas formas de relacionar-se, novas formas de sentir e de ser, novas formas de nascer, viver e morrer, novas formas de libertação e opressão, por meio de igualmente novas formas de manifestação e atuação do poder, ou mesmo novos poderes. Quase tudo é inovação e invenção no “velho mundo”, o “mundo de sempre”, que (re)povoado pelo desconhecido acaba entrando em crise(s). Esse tem sido, pelo menos, um diagnóstico frequente para tantas mudanças e tamanho despreparo para recebê-las. Com a expressão “pós-modernidade”, a indicar, dentre outros sentidos, a superação e/ou crise da modernidade, sintetizam-se todas essas novidades e suas consequentes dificuldades para o Estado e para o Direito, já que se está tratando de uma transformação operada no paradigma de origem dessas instituições. Basicamente, quanto à estrutura, funcionamento e fundamentos, tanto o Estado quanto o Direito mantêm-se fieis às suas raízes, resistindo às mudanças que inundaram e redesenharam a realidade presente.
Existe crise na área jurídica? Explique.
Existem crises, de diversas ordens e manifestações. As intensas mudanças pelas quais passamos em termos de modo de vida e organização político-social não encontram mais respaldo nas instituições que construímos o que, na perspectiva apresentada pelo livro, explica as tantas crises que se atribuem ao Estado e ao Direito.
Confira aqui a obra Estado e direito em trânsito na pós-modernidade