DOS CRIMES CONTRA O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO  

09/09/2021

Foi sancionada pelo Presidente da República e publicada no DOU no dia 2 de setembro de 2021 a Lei n. 14.197, acrescentando o Título XII na Parte Especial do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), relativo aos crimes contra o Estado Democrático de Direito; revogando a Lei nº 7.170, de 14 de dezembro de 1983 (Lei de Segurança Nacional), e dispositivo do Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941 (Lei das Contravenções Penais).

A revogação, total ou parcial, da atual Lei de Segurança Nacional (Lei n. 7.170/83) voltou ao centro das discussões jurídicas e políticas na atualidade, haja vista a sua polêmica utilização para enquadramento de comportamentos e opiniões favoráveis e contrárias ao Governo Federal e ao Supremo Tribunal Federal.

A Lei n. 7.170/83 define os crimes contra a segurança nacional, a ordem política e social, estabelece seu processo e julgamento e dá outras providências. Prevê os crimes que lesam ou expõem a perigo de lesão: I - a integridade territorial e a soberania nacional; Il - o regime representativo e democrático, a Federação e o Estado de Direito; III - a pessoa dos chefes dos Poderes da União.

A nova Lei 14.197/21 revogou expressamente a Lei n. 7.170/83, revogando expressamente também a contravenção penal prevista no art. 39 do Decreto-Lei n. 3.688/41 – Lei das Contravenções Penais, que pune com prisão simples, de um a seis meses, ou multa, a conduta de “participar de associação de mais de cinco pessoas, que se reunam periodicamente, sob compromisso de ocultar à autoridade a existência, objetivo, organização ou administração da associação”.

Entretanto, a Lei n. 14.197/21 não tem vigência imediata, sendo previsto, em seu art. 5º, o período de “vacatio legis” de 90 (noventa dias).

O Título XII, acrescentado pela nova lei, veio a ocupar o último lugar no Código Penal, após o título que trata dos crimes contra a Administração Pública.

Foram incluídos os arts. 359-I a 359-U, sendo criados novos tipos penais (“novatio legis”) e abolidos outros tantos (“abolitio criminis”). Para alguns outros crimes, houve apenas mudanças na descrição típica, podendo, dependendo do caso, ser aplicado o princípio da continuidade normativo-típica.

O Título XII foi dividido em 6 (seis) capítulos. O Capítulo I cuida dos “Crimes contra a Soberania Nacional”; o Capítulo II cuida “Dos Crimes contra as Instituições Democráticas”; o Capítulo III dispõe sobre os “Crimes contra o Funcionamento das Instituições Democráticas no Processo Eleitoral”; o Capítulo IV trata dos “Crimes contra o Funcionamento dos Serviços Essenciais”; o Capítulo V, que cuida dos “Crimes contra a Cidadania”, foi integralmente vetado; e, por fim, o Capítulo VI trouxe as “Disposições Comuns”, dispondo, no art. 359-T que “não constitui crime previsto neste Título a manifestação crítica aos poderes constitucionais nem a atividade jornalística ou a reivindicação de direitos e garantias constitucionais por meio de passeatas, de reuniões, de greves, de aglomerações ou de qualquer outra forma de manifestação política com propósitos sociais.”

O Capítulo V (“Crimes contra a Cidadania”), composto de um único tipo penal denominado “atentado ao direito de manifestação”, teve vetado o art. 359-S, do seguinte teor:

“Art. 359-S. Impedir, mediante violência ou grave ameaça, o livre e pacífico exercício de manifestação de partidos políticos, de movimentos sociais, de sindicatos, de órgãos de classe ou de demais grupos políticos, associativos, étnicos, raciais, culturais ou religiosos:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.

§1º Se resulta lesão corporal grave:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos.

§2º Se resulta morte:

Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos.”

Ouvidos o Ministério da Defesa, o Ministério da Justiça e Segurança Pública, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos e o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, foram as seguintes as razões do veto:

“A proposição legislativa estabelece como tipo penal o atentado a direito de manifestação definindo-o como ‘impedir, mediante violência ou grave ameaça, o livre e pacífico exercício de manifestação de partidos políticos, de movimentos sociais, de sindicatos, de órgãos de classe ou de demais grupos políticos, associativos, étnicos, raciais, culturais ou religiosos’, que resultaria em pena de reclusão de um a quatro anos. Se culminar em lesão corporal grave, resultaria em pena de reclusão de dois a oito anos. Por sua vez, se resultar em morte, a reclusão seria de quatro a doze anos. A despeito da boa intenção do legislador, a proposição legislativa contraria o interesse público, ante a dificuldade de caracterizar, a priori e no momento da ação operacional, o que viria a ser manifestação pacífica, o que geraria grave insegurança jurídica para os agentes públicos das forças de segurança responsáveis pela manutenção da ordem. Isso poderia ocasionar uma atuação aquém do necessário para o restabelecimento da tranquilidade, e colocaria em risco a sociedade, uma vez que inviabilizaria uma atuação eficiente na contenção dos excessos em momentos de grave instabilidade, tendo em vista que manifestações inicialmente pacíficas poderiam resultar em ações violentas, que precisariam ser reprimidas pelo Estado.”

Vale ressaltar, ainda, que a nova Lei 14.197/21 modificou a redação do inciso II do art. 141 do Código Penal, que trata das causas de aumento de pena de um terço aos crimes contra a honra. A redação anterior do dispositivo (inciso II) previa o aumento de pena quando o crime contra a honra fosse cometido contra funcionário público, em razão de suas funções. Pela nova redação, a causa de aumento incide se o crime contra a honra é cometido “contra funcionário público, em razão de suas funções, ou contra os Presidentes do Senado Federal, da Câmara dos Deputados ou do Supremo Tribunal Federal.”

Por fim, o art. 286 do Código Penal, que trata da “Incitação ao crime”, também sofreu modificação, tendo sua redação acrescida de um parágrafo único do seguinte teor: “Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem incita, publicamente, animosidade entre as Forças Armadas, ou delas contra os poderes constitucionais, as instituições civis ou a sociedade.”

 

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