CRIMES DE RESPONSABILIDADE DE PREFEITOS    

04/04/2019

 

Os crimes de responsabilidade de prefeitos vêm estampados no art. 1º, I a XXIII, do Dec.-Lei nº 201/67, sendo certo que os incisos XVI a XXIII foram introduzidos pela Lei nº 10.028/00. São 23 incisos que capitulam condutas que podem ser praticadas por prefeitos municipais no exercício do mandato, nada impedindo que venha o prefeito municipal a ser processado por outros delitos capitulados no Código Penal ou na legislação especial.

Esses crimes são denominados crimes de responsabilidade, mas, a rigor, são verdadeiros crimes funcionais, que têm como sujeito ativo somente o prefeito municipal.

É bom lembrar que se denominam crimes de responsabilidade as condutas que caracterizam infrações político-administrativas, de caráter não penal (não acarretam a imposição de pena criminal), que sujeitam seu autor, em regra, à perda do cargo ou mandato e à suspensão dos direitos políticos.

Já os crimes funcionais são efetivamente infrações penais, que têm como sujeito ativo o funcionário público (elementar do tipo), ostentando o prefeito municipal essa condição, para os efeitos penais, nos termos do disposto no art. 327 do Código Penal.

O Dec.-Lei nº 201/67 adota, no art. 1º, a terminologia crimes de responsabilidade como sinônimo de crimes funcionais, tipificando condutas sujeitas a julgamento pelo Poder Judiciário e cominando as respectivas sanções penais. No art. 4º, estabelece as infrações político-administrativas que podem ser praticadas por prefeitos, sujeitas ao julgamento pela Câmara dos Vereadores e sancionadas com a cassação do mandato.

Portanto, empregando rigor terminológico, as infrações tipificadas no art. 1º do decreto-lei são crimes funcionais, enquanto as infrações tipificadas no art. 4º são crimes de responsabilidade (político-administrativas).

No presente artigo, entretanto, manteremos a terminologia utilizada pelo decreto-lei, tratando os crimes funcionais como sinônimos de crimes de responsabilidade.

Impende citar, de início, que, para o julgamento dos crimes de responsabilidade de prefeitos pelo Poder Judiciário, não há necessidade de prévio pronunciamento da Câmara dos Vereadores.

As penas cominadas aos crimes de responsabilidade de prefeitos são privativas de liberdade, podendo consistir em: a) reclusão de 2 (dois) a 12 (doze) anos – nas hipóteses dos incisos I e II; e b) detenção de 3 (três) meses a 3 (três) anos – nas hipóteses dos incisos III a XXIII.

Cabe ressaltar que os crimes em análise, em razão do montante das penas, não são considerados de menor potencial ofensivo para efeitos de aplicação da transação, prevista na Lei nº 9.099/95. Cabível, entretanto, nas hipóteses dos incisos III e XXIII, preenchidos os requisitos legais, a suspensão condicional do processo, nos termos do art. 89 da Lei nº 9.099/95.

O procedimento dos crimes de responsabilidade de prefeitos é o comum. Determina, entretanto, o art. 2º, I, do Dec.-Lei nº 201/67, que, antes de receber a denúncia, o juiz ordenará a notificação do acusado para apresentar defesa prévia, no prazo de 5 (cinco) dias. Se o acusado não for encontrado, ser-lhe-á nomeado defensor, para a apresentação daquela peça no mesmo prazo.

Ao receber a denúncia, de acordo com o art. 2º, II, o juiz deverá manifestar-se obrigatoriamente, em decisão motivada, sobre a prisão preventiva do acusado (no caso de denúncia pelos crimes dos incisos I e II do art. 1º), e sobre o seu afastamento do exercício do cargo durante a instrução criminal (em todos os casos).

Do despacho (decisão), concessivo ou denegatório, de prisão preventiva, ou de afastamento do cargo do acusado, caberá recurso em sentido estrito, para o tribunal competente, no prazo de 5 (cinco) dias, em autos apartados. Se o despacho (decisão) for de decretação de prisão preventiva ou de afastamento do cargo, o recurso será processado com efeito suspensivo.

A instauração de inquérito policial, para a apuração de crime de responsabilidade de prefeitos, poderá ser requerida pelos órgãos federais, estaduais e municipais interessados. Poderá ainda ser requerida a propositura de ação penal diretamente ao Ministério Público. Os interessados poderão intervir em qualquer fase do processo como assistentes de acusação.

Caso a autoridade policial não instaure o inquérito requerido ou o Ministério Público não intente a ação penal, essas providências poderão ser requeridas pelo interessado ao procurador-geral da República. Portanto, se o Ministério Público estadual, por meio do Procurador-Geral de Justiça, não propuser a ação penal, ficando inerte, essa providência poderá ser requerida ao Procurador-Geral da República. Trata-se da ação penal pública subsidiária da pública.

Segundo disposição constante do art. 29, X, da Constituição Federal, os prefeitos são processados perante o Tribunal de Justiça de seu Estado, seja pela prática de crimes de responsabilidade, previstos no Dec.-Lei nº 201/67, seja pela prática de infrações capituladas no Código Penal e na legislação especial.

Tratando-se de crimes eleitorais, crimes políticos e crimes praticados em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, ou suas entidades autárquicas ou empresas públicas, a competência é da Justiça Federal (TRE e TRF).

Nesse sentido, inclusive, o disposto na Súmula 702 do STF: “A competência do Tribunal de Justiça para julgar Prefeitos restringe-se aos crimes de competência da Justiça comum estadual; nos demais casos, a competência originária caberá ao respectivo tribunal de segundo grau”.

Se o prefeito municipal pratica a infração penal antes de ser eleito, quando assume o cargo ganha prerrogativa de função. Caso expire o tempo do mandato sem pronunciamento definitivo do Tribunal, a ação penal retornará à primeira instância.

Pelo entendimento anterior, assentado na Súmula 394 do STF, se o prefeito municipal cometesse o crime no exercício do cargo, ainda que terminasse o mandato, continuaria a ter direito ao foro privilegiado. Mas isso não mais ocorre, tendo sido a referida súmula cancelada pelo STF. Na oportunidade do cancelamento, o STF, por unanimidade, entendeu que art. 102, I, b, da CF - que estabelece a competência do STF para processar e julgar originariamente, nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República - não alcança aquelas pessoas que não mais exercem mandato ou cargo. Assim, também no caso de prefeito municipal, a perda do mandato eletivo faz cessar a competência penal originária do Tribunal.

Nada impede, entretanto, que, de acordo com o disposto na Súmula 703 do STF, haja a instauração de processo pela prática dos crimes previstos no art. 1º do Decreto-Lei nº 201/67, mesmo após a extinção do mandato do prefeito.

Vale lembrar também que, mesmo para os processos em curso, não cabe a perpetuação da jurisdição, devendo eles, no caso de extinção do mandato, baixar à primeira instância.

Outrossim, pode ocorrer que o prefeito municipal pratique crime comum ou de responsabilidade em concurso com pessoa que não ostente essa condição.

Nesse caso, tratando-se de crime de responsabilidade tipificado no art. 1º do decreto-lei em análise, a qualidade de prefeito municipal constitui elementar do tipo, condição essa que se comunica ao coautor ou partícipe, que também responderá pelo crime funcional. No que tange à competência, nesse caso, será do Tribunal de Justiça, pois há continência (art. 77, I, do CPP), o que implica a unidade de processo e julgamento. No concurso de jurisdições de diversas categorias, predominará a de maior graduação (art. 78, III, do CPP), salvo nos crimes dolosos contra a vida. A propósito, o teor da Súmula 704 do STF: “Não viola as garantias do juiz natural, da ampla defesa e do devido processo legal a atração por continência ou conexão do processo do corréu ao foro por prerrogativa de função de um dos denunciados”.

Entretanto, o STF, em diversos precedentes, tem entendido que, havendo detentores e não detentores de prerrogativa de foro acusados no mesmo processo, o desmembramento do processo deve ser a regra, ressalvadas hipóteses excepcionais a exigirem julgamento conjunto. Assim, de acordo com o STF, cabe apenas ao próprio tribunal ao qual toca o foro por prerrogativa de função promover, sempre que possível, o desmembramento de inquérito e peças de investigação correspondentes, para manter sob sua jurisdição, em regra, apenas o que envolva autoridade com prerrogativa de foro, segundo as circunstâncias de cada caso, ressalvadas as situações em que os fatos se revelem de tal forma imbricados que a cisão por si só implique prejuízo a seu esclarecimento.

Por fim, a condenação definitiva (com trânsito em julgado) em qualquer dos crimes de responsabilidade do Dec.-Lei nº 201/67, acarreta perda do cargo, inabilitação, pelo prazo de 5 (cinco) anos, para o exercício do cargo ou função pública, eletivo ou de nomeação, e reparação civil do dano causado ao patrimônio público ou particular.

 

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