COMPRA DE VOTO E FORNECIMENTO DE REFEIÇÕES E TRANSPORTE A ELEITORES EM DIA DE VOTAÇÃO

03/11/2022

A prática denominada captação de sufrágio, ou captação ilícita de sufrágio, também chamada de aquisição ilícita de pleito, nada mais é do que a popularmente conhecida “compra de voto”, prática abjeta e vedada por lei, que configura crime eleitoral e pode ensejar, além de pena privativa de liberdade e multa, a cassação do registro ou do diploma do candidato.

A captação de sufrágio vem tratada pelo art. 41-A da Lei n. 9.504/97, que estabelece normas para as eleições, acrescentado pela Lei n. 9.840/99, nos seguintes termos:

"Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinquenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990.

        § 1º. Para a caracterização da conduta ilícita, é desnecessário o pedido explícito de votos, bastando a evidência do dolo, consistente no especial fim de agir.

        § 2º. As sanções previstas no ‘caput’ aplicam-se contra quem praticar atos de violência ou grave ameaça a pessoa, com o fim de obter-lhe o voto.

        § 3º. A representação contra as condutas vedadas no ‘caput’ poderá ser ajuizada até a data da diplomação.

        § 4º. O prazo de recurso contra decisões proferidas com base neste artigo será de 3 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no Diário Oficial.”

No mesmo sentido, a Lei n. 4.737/65 (Código Eleitoral) prevê a compra de voto como crime, no art. 299:

“Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita:

Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa.”

Trata-se evidentemente de um dispositivo penal que tem como objetividade jurídica a tutela do regular funcionamento do processo eleitoral, vedando a corrupção do eleitor.

A lisura do processo eleitoral, permitindo ao povo a escolha livre, democrática e transparente de seus representantes, é o cerne do Estado Democrático de Direito.

Já no preâmbulo da Constituição Federal vem estabelecida a instituição de um Estado Democrático: “Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.”

No art. 1º da Carta Magna também vem estabelecido que a República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político, rematando o parágrafo único que todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos da Constituição.

Outra conduta vedada por lei, que constitui abuso de poder econômico ou administrativo, é o fornecimento gratuito de transporte e alimentação no dia da eleição.

A Lei n. 6.091/74 dispõe sobre o fornecimento gratuito de transporte, em dias de eleição, a eleitores residentes nas zonas rurais, e dá outras providências.

Essa lei dispõe que os veículos e embarcações, devidamente abastecidos e tripulados, pertencentes à União, Estados, Territórios e Municípios e suas respectivas autarquias e sociedades de economia mista, excluídos os de uso militar, ficarão à disposição da Justiça Eleitoral para o transporte gratuito de eleitores em zonas rurais, em dias de eleição.

É vedado, portanto, o transporte privado de eleitores, feito por qualquer pessoa, seja por políticos ou seus assessores, funcionários ou simpatizantes, seja por pessoas ligadas ou a serviço de partidos políticos.

Nesse sentido, dispõe o art. 5º da citada lei:

“Art. 5º Nenhum veículo ou embarcação poderá fazer transporte de eleitores desde o dia anterior até o posterior à eleição, salvo:

I - a serviço da Justiça Eleitoral;

II - coletivos de linhas regulares e não fretados;

III - de uso individual do proprietário, para o exercício do próprio voto e dos membros da sua família;

IV - o serviço normal, sem finalidade eleitoral, de veículos de aluguel não atingidos pela requisição de que trata o art. 2º.”

A conduta, inclusive, pode constituir crime previsto no art. 302 do Código Eleitoral:

“Art. 302. Promover, no dia da eleição, com o fim de impedir, embaraçar ou fraudar o exercício do voto a concentração de eleitores, sob qualquer forma, inclusive o fornecimento gratuito de alimento e transporte coletivo:

Pena - reclusão de quatro a seis anos e pagamento de 200 a 300 dias-multa.”

Vale lembrar que, no segundo turno das eleições deste ano de 2022, o Supremo Tribunal Federal, nos autos dos Embargos de Declaração na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 1.013/DF, tendo como relator o Ministro Roberto Barroso, autorizou que prefeituras e concessionárias ofertassem transporte público gratuito aos eleitores no dia da eleição.

Na oportunidade, justificou o eminente Relator:

“Portanto, os municípios estão autorizados a conceder, no limite de suas condições orçamentárias, gratuidade para uso de transporte público coletivo urbano nos dias de eleição, para todos os eleitores, em caráter geral e impessoal. Também fica permitida, para o mesmo fim, a utilização de ônibus escolares e outros veículos públicos. As medidas aqui autorizadas encontram fundamento constitucional na garantia do direito-dever de voto ‘com valor igual para todos’ (art. 14). Da dimensão objetiva do direito fundamental ao sufrágio decorrem deveres de proteção que dão amparo às decisões dos entes públicos de disponibilizar transporte gratuito aos eleitores, inclusive com linhas especiais para regiões mais distantes dos locais de votação, não se podendo alegar, nessa hipótese, a configuração de ato de improbidade administrativa, crime eleitoral ou outra infração à lei.”

Por fim, com relação ao fornecimento de alimentos ou refeições aos eleitores no dia da eleição, também é prática vedada e criminosa, estando o agente incurso no art. 302 do Código Eleitoral se a finalidade for impedir, embaraçar ou fraudar o exercício do voto, ou no art. 299 do mesmo diploma se a finalidade for obter ou dar voto, ou conseguir ou prometer abstenção.

Nesse aspecto, segundo dispõe o art. 8º da Lei n. 6.091/74, “somente a Justiça Eleitoral poderá, quando imprescindível, em face da absoluta carência de recursos de eleitores da zona rural, fornecer-lhes refeições, correndo, nesta hipótese, as despesas por conta do Fundo Partidário.”

 

 

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