AGROTÓXICOS E RESPONSABILIDADE CRIMINAL - UMA ANÁLISE CRÍTICA DA LEI 14.785/23 E DOS NOVOS TIPOS PENAIS"

22/02/2024

Foi publicada no DOU em 28 de dezembro de 2023 e já entrou em vigor na mesma data a Lei n. 14.785, que passou a reger a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem, a rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e das embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, de produtos de controle ambiental, de seus produtos técnicos e afins.

Referida lei também revogou as Leis n. 7.802, de 11 de julho de 1989, e n. 9.974, de 6 de junho de 2000, além de partes de anexos das Leis n. 6.938, de 31 de agosto de 1981, e n. 9.782, de 26 de janeiro de 1999.

Anteriormente, a matéria era tratada pela Lei n. 7.802/89, que era considerada o principal diploma regente dos agrotóxicos no Brasil.

A nova lei manteve a terminologia “agrotóxico”, nomenclatura contestada por muitos integrantes do segmento agrícola brasileiro, que o julgam pejorativo e que consideram mais adequado o termo “defensivo agrícola” ou o termo “pesticida” (do inglês “pesticide”), utilizado mundialmente.

Vale lembrar que o Brasil é o único país a utilizar o termo “agrotóxico”, que surgiu em 1977 e foi criado pelo pesquisador e PhD em agronomia Adilson Paschoal, autor do livro "Pragas, agrotóxicos e a crise ambiente: Problemas e soluções".

De acordo com a Lei n. 14.785/23, “agrotóxicos” são produtos e agentes de processos físicos, químicos ou biológicos destinados ao uso nos setores de produção, no armazenamento e no beneficiamento de produtos agrícolas, nas pastagens ou na proteção de florestas plantadas, cuja finalidade seja alterar a composição da flora ou da fauna, a fim de preservá-las da ação danosa de seres vivos considerados nocivos.

A utilização de agrotóxicos e defensivos agrícolas é uma prática amplamente adotada na agricultura mundial, incluindo o cenário brasileiro. Esses produtos desempenham papel fundamental na proteção das plantações e lavouras contra pragas, doenças e ervas daninhas, contribuindo para o aumento da produtividade e para a garantia da segurança alimentar. No entanto, a problemática associada a esses compostos é complexa e multifacetada, envolvendo diversas questões que vão desde os benefícios para a agricultura até os impactos negativos para o meio ambiente e para a saúde humana.

É importante destacar as vantagens proporcionadas pelos agrotóxicos e defensivos agrícolas. Esses produtos desempenham um papel fundamental no controle de pragas e doenças que podem comprometer as plantações, ajudando os agricultores a garantir a qualidade e a quantidade dos alimentos produzidos. Além disso, os agrotóxicos possibilitam a produção em larga escala, contribuindo para o abastecimento do mercado e para a estabilidade econômica do setor agrícola, contribuindo, ainda, em grande parte, para o aumento do PIB brasileiro e para a redução da desigualdade social.

No entanto, o uso indiscriminado e inadequado dos agrotóxicos pode acarretar uma série de impactos ambientais negativos. A contaminação do solo, da água e do ar por resíduos de agrotóxicos representa uma ameaça à biodiversidade e aos ecossistemas naturais. A poluição decorrente da utilização inadequada desses produtos pode comprometer a saúde de animais e seres humanos, gerando consequências nocivas a longo prazo para a saúde pública.

Especificamente no Brasil, a questão dos agrotóxicos assume contornos específicos devido à extensão e diversidade do nosso território, bem como à importância do agronegócio para a economia do país. O Brasil é um dos maiores consumidores de agrotóxicos do mundo, o que levanta preocupações quanto aos seus impactos ambientais e à segurança dos alimentos produzidos. Apesar das regulamentações existentes, a fiscalização e o controle sobre o uso dessas substâncias nem sempre são eficazes, deixando margem para práticas inadequadas e para o uso de produtos proibidos.

Do ponto de vista legal, a recente Lei n. 14.785/23 é bastante específica e detalhada ao regulamentar não apenas a utilização, como também a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem, a rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e das embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, de produtos de controle ambiental, de seus produtos técnicos e afins.

Vale lembrar que, diante desse cenário, as novas tecnologias na área da agricultura e da ciência desempenham papel fundamental na busca por soluções mais sustentáveis e seguras. A pesquisa e o desenvolvimento de métodos alternativos de controle de pragas e doenças, como a agricultura orgânica, o uso de bioinsumos e a biotecnologia, oferecem alternativas promissoras para reduzir a dependência dos agrotóxicos e mitigar seus impactos negativos.

É bem verdade que, no âmbito governamental, os órgãos competentes têm a responsabilidade de promover políticas públicas que incentivem práticas agrícolas mais sustentáveis e seguras. Isso inclui a implementação de programas de educação e conscientização, o fortalecimento da fiscalização e o estímulo à pesquisa e inovação no setor agrícola. A atuação conjunta entre governo, sociedade civil e setor produtivo é essencial para enfrentar os desafios relacionados aos agrotóxicos e promover uma agricultura mais responsável e sustentável.

Em relação aos crimes e às penas que envolvem o tratamento ilegal dos agrotóxicos, a nova Lei n. 14.785/23 traz duas figuras típicas, nos arts. 56 e 57, de acentuada gravidade, ambas punidas com reclusão e multa.

No art. 56 vem punidas com reclusão, de 3 (três) a 9 (nove) anos e multa, as condutas de “produzir, armazenar, transportar, importar, utilizar ou comercializar agrotóxicos, produtos de controle ambiental ou afins não registrados ou não autorizados”, vindo previstas, no parágrafo único, causas de aumento de pena quando resultar dano à propriedade alheia ou ao meio ambiente, ou ainda quando resultar lesão corporal de natureza grave ou morte.

No art. 57, por seu turno, punem-se com reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos e multa, as condutas de “produzir, importar, comercializar ou dar destinação a resíduos e a embalagens vazias de agrotóxicos, de produtos de controle ambiental ou afins em desacordo com esta Lei.”

Por fim, é necessário ressaltar que a problemática dos agrotóxicos e defensivos agrícolas representa um desafio complexo que envolve questões ambientais, econômicas, sociais e de saúde pública, não podendo ser equacionada, evidentemente, apenas com a regulamentação legal e com a criminalização de condutas irregulares. É fundamental adotar uma abordagem integrada e multifacetada da questão, promovendo práticas agrícolas mais sustentáveis, garantindo a segurança alimentar e protegendo o meio ambiente e a saúde da população.

 

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