Por Alan Pinheiro de Paula - 01/06/2016
Depois da sanção do Presidente da República em exercício Michel Temer, foi publicada no dia 24 de maio de 2016 a Lei n° 13.290/2016[1], que atualizou o Código de Trânsito Brasileiro e tornou obrigatório o uso, nas rodovias, de farol baixo aceso ainda que durante o dia.
De acordo com a Resolução n° 18/1998 do Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN[2], já era recomendado o uso de farol baixo aceso nas rodovias durante o dia. No entanto, tratava-se de uma mera recomendação, uma vez que, de acordo com o princípio da autonomia da vontade previsto no art. 5°, II da Constituição Federal, ninguém pode ser constrangido a fazer ou a deixar de fazer alguma coisa sem previsão legal[3]. Agora é LEI.
De acordo com o projeto de Lei n° 156/2016[4], esta obrigatoriedade passaria a vigorar a partir do dia 24 de maio de 2016, data da publicação da Lei n° 13.290/2016. No entanto, este dispositivo foi vetado pelo Presidente em exercício Michel Temer por contrariedade ao interesse público, pelas seguintes razões: “A norma possui amplo alcance, pois afeta os motoristas que circulam em rodovias nacionais e os órgãos de trânsito da Federação, e resulta na previsão de nova infração de trânsito, de gravidade média. Sempre que a norma possua grande repercussão, deverá ter sua vigência iniciada em prazo que permita sua divulgação e conhecimento. Assim sendo, é essencial a incidência de vacatio legis que permita a ampla divulgação da norma”[5].
Desta forma, não havendo mais qualquer previsão expressa quanto à entrada em vigor da citada Lei, esta passará a “valer” a partir do dia 8 de julho de 2016, ou seja, 45 dias depois de sua publicação, adotando-se assim regra geral disposta na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINBD, em seu art. 1°, “Caput”[6].
Agora, a inobservância da medida será considerada infração média, computando-se 4 pontos na Carteira de Habilitação, além da reprimenda pecuniária equivalente a R$ 85,13. Vale ressaltar que a medida é justificada em face da segurança nas estradas e tem por objetivo a redução da ocorrência de acidentes automobilísticos. De acordo com o autor da proposta, deputado federal Rubens Bueno (PPS-PR): “Os condutores envolvidos em acidentes nas rodovias continuam relatando que não visualizaram o outro veículo a tempo para tentar uma manobra e evitar a colisão”[7].
Mas essa imposição já não era regulamentada por lei? Na verdade, a Lei n° 11.766/1997 do Estado do Paraná já tornava obrigatório o trânsito permanente de veículo automotor com os faróis acesos nas rodovias paranaenses[8]. Não obstante, esse regramento foi objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI – n° 3.055/PR, proposta pelo então Procurador Geral da República Cláudio Fonteles, sendo reconhecida formalmente inconstitucional, uma vez que a Constituição Republicana de 1988 confere privativamente à União legislar sobre “trânsito”, nos termos do art. 22, XI, da Constituição [3].
De acordo com Gilmar Mendes, “os vícios formais traduzem defeito de formação do ato normativo, pela inobservância de princípio de ordem técnica ou procedimental ou pela violação de regras de competência”[9].
“Legislação sobre trânsito: competência privativa federal: CF, art. 22, XI. Lei 11.766, de 1997, do Estado do Paraná, que torna obrigatório a qualquer veículo automotor transitar permanentemente com os faróis acesos nas rodovias do Estado do Paraná, impondo a pena de multa aos que descumprirem o preceito legal: inconstitucionalidade, porque a questão diz respeito ao trânsito.” (ADI 3.055, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 24-11-2005, Plenário, DJ de 3-2-2006)[10]. Não havendo lei complementar delegando aos Estados legislar sobre esta questão, não poderia o Estado do Paraná fazê-lo.
Sem embargo, a exposição de motivos da Lei n° 13.290/2016 é das mais nobres: Segurança no Trânsito. Não obstante, durante o ápice de um período de recessão na economia nacional, a aprovação de uma lei que constrange o condutor a uma multa pecuniária não teria algum cunho econômico?
Levando-se em consideração o atributo da presunção de veracidade do ato administrativo[11], depois de autuada a infração, caberá ao condutor comprovar que não estava com os faróis baixos apagados durante o tráfego nas rodovias. Ou seja, o ônus de eventual recurso será mais uma vez do administrado, já que muitas autuações nem sequer trazem provas de que foi o próprio veículo autuado.
Em fevereiro de 2016 um motorista paulista foi autuado por excesso de velocidade com o carro estacionado, conforme demonstrado no próprio auto de infração[12]. Em 2010 um condutor carioca foi multado porque dirigia um carro sem capacete[13]. Desde quando é exigido capacete para condução de carro? Ele conduzia um veículo modelo Gol motor 1.0 e com certeza não participava de uma corrida de Fórmula 1.
Em síntese, a partir do dia 8 de julho de 2016 será obrigatório o uso de farol baixo aceso durante o dia nas rodovias. Embora a exposição de motivos da citada lei seja louvável, se efetivamente resultará na redução do número de acidentes nas rodovias... ninguém sabe. Mas todos sabemos quem “pagará o pato”. Fique atento!
Notas e Referências:
[1] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Lei/L13290.htm
[2] http://www.cnm.org.br/portal/images/stories/Links/27062013_resolucao_18_98.pdf
[3] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm
[4] https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/123539
[5] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Msg/VEP-287.htm
[6] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del4657compilado.htm
[7] http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/publicacaoLegislacaoAnotada/anexo/Completo.pdf
[8] http://www.leisestaduais.com.br/pr/lei-ordinaria-n-11766-1997-parana-torna-obrigatorio-a-qualquer-veiculo-automotor-transitar-permanentemente-com-os-farois-acesos-nas-rodovias-do-territorio-do-estado-do-parana
[9] MENDES, Gilmar Ferreira. Controle de constitucionalidade. In: BRANCO, P. G. G.; COELHO, I. M.; MENDES, G. M.Curso de direito constitucional. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
[10] http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/publicacaoLegislacaoAnotada/anexo/Completo.pdf
[11] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 22.ed. São Paulo, RT, 1997.
[12] http://g1.globo.com/sp/sao-carlos-regiao/noticia/2016/02/carro-estacionado-recebe-multa-por-alta-velocidade-em-araraquara-sp.html
[13] http://extra.globo.com/noticias/rio/detran-multa-motorista-que-dirigia-carro-sem-capacete-363194.html
. Alan Pinheiro de Paula é Especialista em Gestão de Segurança Pública pela Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL). Professor de Direito Administrativo na Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). Professor convidado em diversos cursos preparatórios para concursos públicos. Professor da Academia de Polícia Civil do Estado de Santa Catarina (ACADEPOL). Delegado de Polícia.
Imagem Ilustrativa do Post: Fotos produzidas pelo Senado // Foto de: Senado Federal // Sem alterações
Disponível em: https://www.flickr.com/photos/agenciasenado/15035425595
Licença de uso: http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/legalcode
O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.