A PREVARICAÇÃO E OUTRAS FIGURAS TÍPICAS CORRELATAS

15/03/2018

O crime de prevaricação vem previsto no art. 319 do Código Penal e tem como objetividade jurídica a proteção da Administração Pública. Trata-se de crime próprio, que somente pode ter como sujeito ativo o funcionário público (art. 327 do CP). Sujeito passivo é o Estado e, secundariamente, o particular eventualmente lesado.

Como bem ensina Paulo José da Costa Júnior (“Curso de Direito Penal”. 12ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva. 2010. p. 902/903), “’praevaricator’, em latim, é aquele que tem as pernas tortas, cambaias. Daí deriva ‘praevaricatio’, que significa o ato de andar tortuosamente, desviado do caminho certo.”

Na prevaricação, a conduta típica vem expressa de três formas: retardar ato de ofício, que significa protelar, procrastinar, atrasar o ato que deve ser executado (conduta omissiva); deixar de praticar ato de ofício, que significa omitir-se na realização do ato que deveria ser executado (conduta omissiva); e praticar ato de ofício contra disposição expressa de lei, que significa executar o ato de ofício de maneira irregular, ilegal (conduta comissiva).

Entretanto, no crime de prevaricação, o funcionário público não mercadeja sua função, não havendo que se falar em vantagem indevida.

O tipo penal, que tem como elemento subjetivo o dolo, exige do agente que se omita ou atue no intuito de satisfazer interesse (cobiça, vaidade, vingança, por exemplo) ou sentimento pessoal (amor, ódio, simpatia, corporativismo, coleguismo, amizade, por exemplo), indispensável para a caracterização do crime.

É interessante notar que subsiste o crime de prevaricação ainda que o sentimento pessoal do funcionário público seja nobre ou respeitável (dó, piedade, comiseração, por exemplo).

Entretanto, a inação ou o retardamento na prática do ato pelo funcionário, causado por indolência, desídia ou preguiça, não caracteriza fato típico, remanescendo apenas infração funcional a ser apurada no âmbito administrativo.

Mas há outras figuras típicas igualmente interessantes e que muito se assemelham à prevaricação, que são a corrupção passiva majorada e a corrupção passiva privilegiada.

Como é cediço, a corrupção passiva, prevista no art. 317 do Código Penal, se manifesta por meio das condutas solicitar (que significa pedir, requerer), receber (que significa tomar, obter) e aceitar (que significa anuir, consentir no recebimento). Nas duas primeiras modalidades de conduta, o crime tem por objeto a vantagem indevida. Na última modalidade de conduta, o objeto do crime é a promessa de vantagem indevida.

A corrupção passiva majorada vem prevista no § 1º do art. 317 do Código Penal e ocorre quando o funcionário público retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional, em consequência de vantagem ou promessa recebida. Nesse caso, o exaurimento do delito de corrupção passiva implica a imposição de pena mais severa, que será aumentada de um terço.

Na corrupção passiva privilegiada, prevista no § 2º do art. 317 do Código Penal, o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem. Nesse caso, o funcionário também não negocia o ato funcional em troca de vantagem, mas, antes, deixa de cumprir com seu dever funcional para atender um pedido de terceiro, influente ou não. É necessário que haja pedido ou influência de outrem, e que o sujeito ativo atue por essa motivação.

Por fim, há que se mencionar a curiosa figura da condescendência criminosa, prevista no art. 320 do Código Penal. Nela, a conduta típica se desenvolve por duas modalidades: deixar de responsabilizar o subordinado que cometeu infração no exercício do cargo; ou não levar o fato ao conhecimento da autoridade competente, quando lhe falte competência.

É imprescindível, para a caracterização da condescendência criminosa, modalidade específica de prevaricação, que haja relação de subordinação hierárquica entre o sujeito ativo (superior) e o funcionário não responsabilizado (subordinado).

Ademais, na condescendência criminosa é necessário que a omissão do sujeito ativo ocorra por indulgência, ou seja, por tolerância ou clemência, que, a rigor, constituem sentimentos pessoais específicos desse crime.

 

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