A NOVA LEI 14.811/24 E AS MEDIDAS DE PROTEÇÃO À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE CONTRA A VIOLÊNCIA NOS ESTABELECIMENTOS EDUCACIONAIS OU SIMILARES

18/01/2024

Foi publicada no DOU em 15 de janeiro de 2024 e já entrou em vigor na mesma data a Lei n. 14.811/24 que institui medidas de proteção à criança e ao adolescente contra a violência nos estabelecimentos educacionais ou similares, prevendo a Política Nacional de Prevenção e Combate ao Abuso e Exploração Sexual da Criança e do Adolescente e alterando o Código Penal, a Lei dos Crimes Hediondos e o Estatuto da Criança e do Adolescente.

Como é sabido, a violência contra criança e adolescente nos estabelecimentos educacionais e similares é um grave problema que afeta milhões de crianças e adolescentes no Brasil, podendo assumir diversas formas, como o “bullying”, os maus-tratos, o abuso sexual e a exploração sexual, trazendo severas consequências às vítimas, como danos físicos (lesões corporais e morte), psicológicos (depressão, fobias, transtornos de ansiedade etc) e sociais (isolamento, dificuldade de relacionamento, dificuldade de integração na sociedade etc).

Trata-se, evidentemente, de um desafio que requer a atuação de toda a sociedade, que deve adotar, juntamente com o poder público, medidas para prevenir e combater essa violência com base em três eixos fundamentais: educação, prevenção e proteção.

É bem verdade que, desde o ano de 2015, se encontra em vigor a Lei n. 13.185, que instituiu o Programa de Combate à Intimidação Sistemática (“bullying”), prevendo o dever do estabelecimento de ensino, dos clubes e das agremiações recreativas de assegurar medidas de conscientização, prevenção, diagnose e combate à violência e à intimidação sistemática.

Agora, a Lei n. 14.811/24 foi mais longe, criminalizando o “bullying” e o “cyberbullying” e tornando hediondos outros crimes previstos no Código Penal e no Estatuto da Criança e do Adolescente, tais como o induzimento, instigação ou auxílio a suicídio ou a automutilação realizados por meio da rede de computadores, de rede social ou transmitidos em tempo real (art. 122, “caput” e § 4º, CP); o sequestro e cárcere privado cometido contra menor de 18 anos (art. 148, § 1º, inciso IV, CP); o tráfico de pessoas cometido contra criança ou adolescente (art. 149-A, “caput”, incisos I a V, e § 1º, inciso II, CP) e os crimes previstos no § 1º do art. 240 e no art. 241-B da Lei n. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente).

A nova lei incluiu no Código Penal a tipificação do “bullying (intimidação sistemática) no art. 146-A, definindo-o como “intimidar sistematicamente, individualmente ou em grupo, mediante violência física ou psicológica, uma ou mais pessoas, de modo intencional e repetitivo, sem motivação evidente, por meio de atos de intimidação, de humilhação ou de discriminação, ou de ações verbais, morais, sexuais, sociais, psicológicas, físicas, materiais ou virtuais”. A pena é de multa, se a conduta não constituir crime mais grave.

Também o “cyberbullying” foi previsto no parágrafo único do art. 146-A, consistente na intimidação sistemática por meio virtual. Se for realizado por meio da “internet”, rede social, aplicativos, jogos “on-line” ou transmitida em tempo real, a pena será de reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa, se a conduta não constituir crime mais grave.

No Estatuto da Criança e do Adolescente, a Lei n. 14.811/24 também acrescentou um novo delito de omissão de comunicação à autoridade pública do desaparecimento de criança ou adolescente, punindo o pai, a mãe ou o responsável com reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

Ainda no Estatuto da Criança e do Adolescente, a nova lei inseriu no art. 240 (“produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou adolescente”) figuras equiparadas, punindo com a mesma pena de reclusão de 4 (quatro) a 8 (oito) anos e multa, quem agencia, facilita, recruta, coage ou de qualquer modo intermedeia a participação de criança ou adolescente nas cenas referidas no “caput” do artigo, ou ainda quem com esses contracena; e quem exibe, transmite, auxilia ou facilita a exibição ou transmissão, em tempo real, pela “internet”, por aplicativos, por meio de dispositivo informático ou qualquer meio ou ambiente digital, de cena de sexo explícito ou pornográfica com a participação de criança ou adolescente. Também o art. 247, que trata da infração administrativa de “divulgar, total ou parcialmente, sem autorização devida, por qualquer meio de comunicação, nome, ato ou documento de procedimento policial, administrativo ou judicial relativo a criança ou adolescente a que se atribua ato infracional”, teve nova redação dada ao seu § 1º, punindo com a mesma pena do “caput” quem “exibe ou transmite imagem, vídeo ou corrente de vídeo de criança ou adolescente envolvido em ato infracional ou em outro ato ilícito que lhe seja atribuído, de forma a permitir sua identificação.”

Ainda de acordo com o art. 2º da nova lei, as medidas de prevenção e combate à violência contra criança e adolescente em estabelecimentos educacionais ou similares, públicos ou privados, deverão ser implementadas pelos municípios e pelo Distrito Federal em cooperação com os estados e a União. Os protocolos de proteção deverão ser desenvolvidos pelos municípios em conjunto com órgãos de segurança pública e de saúde, com a participação da comunidade escolar.

Vale ressaltar que a nova lei também acrescentou ao Estatuto da Criança e do Adolescente o art. 59-A, dispondo que as instituições sociais públicas ou privadas que desenvolvam atividades com crianças e adolescentes e que recebam recursos públicos deverão exigir e manter certidões de antecedentes criminais de todos os seus colaboradores, as quais deverão ser atualizadas a cada 6 (seis) meses. Além disso, os estabelecimentos educacionais e similares, públicos ou privados, que desenvolvem atividades com crianças e adolescentes, independentemente de recebimento de recursos públicos, deverão manter fichas cadastrais e certidões de antecedentes criminais atualizadas de todos os seus colaboradores.

Por fim, a Lei n. 14.811/24 ainda estabelece que a Política Nacional de Prevenção e Combate ao Abuso e Exploração Sexual da Criança e do Adolescente será elaborada no âmbito de conferência nacional a ser organizada e executada pelo órgão federal competente e deverá ter como objetivos o aprimoramento da gestão das ações de prevenção e de combate ao abuso e à exploração sexual da criança e do adolescente; a contribuição para o fortalecimento das redes de proteção e de combate ao abuso e à exploração sexual da criança e do adolescente; a promoção da produção de conhecimento, pesquisa e avaliação dos resultados das políticas de prevenção e de combate ao abuso e à exploração sexual da criança e do adolescente; a garantia do atendimento especializado, e em rede, da criança e do adolescente em situação de exploração sexual, bem como de suas famílias; e o estabelecimento de espaços democráticos para participação e controle social, priorizando os conselhos de direitos da criança e do adolescente. Essa Política Nacional de Prevenção e Combate ao Abuso e Exploração Sexual da Criança e do Adolescente deverá ser detalhada em um plano nacional e reavaliada a cada 10 (dez) anos, a contar de sua elaboração, com indicação das ações estratégicas, das metas, das prioridades e dos indicadores e com definição das formas de financiamento e gestão das políticas de prevenção e de combate ao abuso e à exploração sexual da criança e do adolescente.

 

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