A nova dinâmica dos crimes contra a Administração Pública no contexto tecnológico e de compliance

08/08/2024

A Administração Pública, como gestora central dos interesses coletivos, enfrenta desafios contínuos em sua integridade e eficiência, especialmente em um cenário onde a tecnologia e a globalização ampliam as possibilidades de práticas ilícitas. Os crimes contra a Administração Pública, particularmente aqueles praticados por funcionários públicos, os crimes em licitações e contratos administrativos e as infrações abordadas pela Lei Anticorrupção Empresarial (Lei nº 12.846/13), estão no cerne deste complexo quadro jurídico.

A crescente digitalização das atividades administrativas e a integração de novas tecnologias nas operações governamentais têm oferecido tanto oportunidades quanto riscos. Nesse cenário, os crimes cibernéticos emergem como uma nova frente de combate, envolvendo atividades ilícitas como “hacking”, “phishing”, e o uso de “ransomware” para comprometer sistemas governamentais. Esses ataques não apenas perturbam o funcionamento da Administração Pública, mas também facilitam a corrupção digital, em que práticas corruptas são realizadas por meio de mecanismos tecnológicos avançados. Exemplos incluem a manipulação de processos de licitação eletrônica e o suborno utilizando criptomoedas, dificultando a detecção e a rastreabilidade dessas ações nocivas.

No contexto dos crimes em licitações e contratos administrativos, as fraudes tecnológicas são uma preocupação crescente. A introdução de sistemas eletrônicos para a gestão desses processos visa aumentar a transparência e a eficiência, mas também, em contrapartida, cria novas vulnerabilidades. Criminosos cibernéticos podem manipular essas plataformas para direcionar contratos de forma ilícita, em conluio com funcionários públicos corruptos. A Lei Anticorrupção Empresarial, por seu turno, desempenha um papel crucial na responsabilização das empresas envolvidas nessas práticas, impondo sanções severas e promovendo a implementação de programas de compliance robustos.

Os programas de compliance penal surgem como ferramentas indispensáveis na prevenção e combate a práticas corruptas. Esses programas não apenas garantem a conformidade com a legislação, mas também estabelecem mecanismos internos de controle que detectam e previnem condutas ilícitas. Assim, a implementação de políticas de compliance nas organizações é essencial para minimizar riscos e promover uma cultura de integridade e ética.

A proteção de dados e privacidade é outra área de crescente importância. Com a promulgação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), a Administração Pública deve assegurar que as informações pessoais sob sua guarda sejam protegidas contra acessos não autorizados. A falha em cumprir esses requisitos pode resultar em severas penalidades, além de prejudicar a confiança pública nas instituições governamentais. Para tanto, a gestão adequada desses dados é fundamental não apenas para a proteção dos direitos individuais, mas também para a prevenção de práticas ilícitas que possam emergir do acesso indevido a informações sensíveis.

No mesmo diapasão, a utilização de tecnologias avançadas, como inteligência artificial e “big data”, na investigação e na análise de provas digitais, é uma tendência crescente no enfrentamento dos crimes contra a Administração Pública. Essas ferramentas permitem uma análise mais eficiente e precisa de grandes volumes de dados, auxiliando na identificação de padrões de corrupção e outros crimes. No entanto, a aplicação dessas tecnologias também levanta questões sobre a privacidade e a ética, exigindo um equilíbrio cuidadoso entre eficiência investigativa e respeito aos direitos individuais.

Os crimes ambientais, facilitados pelo uso de tecnologias de monitoramento, como satélites e drones, representam outra frente de combate. A Administração Pública tem o dever de proteger o meio ambiente, e a utilização dessas tecnologias permite uma vigilância mais efetiva sobre atividades ilícitas, como o desmatamento ilegal e a poluição. A resposta penal a esses crimes deve ser ágil e eficaz, para garantir a preservação dos recursos naturais e a sustentabilidade.

No mesmo sentido, a globalização e a internacionalização do Direito Penal trazem novos desafios para a Administração Pública. A cooperação internacional é fundamental para combater crimes transnacionais, como o terrorismo e a lavagem de dinheiro. Além disso, a legislação nacional deve estar alinhada com os tratados e acordos internacionais, permitindo uma resposta coordenada e eficaz a essas ameaças.

Em suma, o enfrentamento dos crimes contra a Administração Pública no contexto atual exige uma abordagem multidisciplinar e integrada, demandando dos profissionais do Direito que atuam nessa área uma formação contínua e especializada em Direito Penal e Processual Penal, com foco nas novas tecnologias e nos mecanismos de compliance, sendo essencial que se preparem para os desafios contemporâneos. Afinal, o que se busca é a integridade e eficiência da Administração Pública.

 

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