A competência do Tribunal do Júri Federal – Por Ricardo Antonio Andreucci

20/10/2016

No dia 17 de outubro, última segunda-feira, foi realizado, perante a Justiça Federal de São Paulo, o julgamento pelo Tribunal do Júri de José Correia Neto, acusado de matar Célia Maria Galbetti, contadora nomeada perita em processo trabalhista, encarregada de avaliar livros contábeis da ótica do réu.

Segundo a imputação, o réu matou a vítima com tiros pelas costas, tendo sido, a final, condenado a 14 anos e 4 meses de reclusão por homicídio qualificado e posse ilegal de arma de fogo.

Esse caso seria somente mais um homicídio a ser julgado pelo Tribunal do Júri, dentre tantos outros semelhantes que ocorrem todos os dias no Brasil, não fosse a inusual competência federal para o processo e julgamento do mencionado crime contra a vida. Isso porque não são comuns os julgamentos por Tribunal do Júri Federal, o que nos leva a tecer algumas considerações interessantes sobre o assunto.

Na história mais recente, por volta de 1215, o júri foi implantado na Inglaterra, quando o Conselho de Latrão aboliu as ordálias e os juízos de Deus.

No Brasil, a instituição do Tribunal do Júri foi implantada em 1822, para julgar os crimes de imprensa. Em 1824, na Constituição do Império, passou a compor o Poder Judiciário, cuja competência foi ampliada para julgar as infrações civis e criminais.

A instituição foi mantida na Constituição de 1891 e nas demais Cartas e Emendas Constitucionais brasileiras que a sucederam, à exceção da Constituição de 1937.

Atualmente, na Carta de 1988, dispõe o art. 5º, XXXVIII:

“Art. 5º (...) XXXVIII -  é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:

a) a plenitude de defesa;

b) o sigilo das votações;

c) a soberania dos veredictos;

d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.”

A competência da Justiça Federal, por sua vez, vem prevista no art. 109 da Constituição Federal, nos seguintes termos:

“Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;

II - as causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e Município ou pessoa domiciliada ou residente no País;

III - as causas fundadas em tratado ou contrato da União com Estado estrangeiro ou organismo internacional;

IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral;

V - os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente;

V-A as causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5º deste artigo;

VI - os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira;

VII - os habeas corpus, em matéria criminal de sua competência ou quando o constrangimento provier de autoridade cujos atos não estejam diretamente sujeitos a outra jurisdição;

VIII - os mandados de segurança e os habeas data contra ato de autoridade federal, excetuados os casos de competência dos tribunais federais;

IX - os crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar;

X - os crimes de ingresso ou permanência irregular de estrangeiro, a execução de carta rogatória, após o "exequatur", e de sentença estrangeira, após a homologação, as causas referentes à nacionalidade, inclusive a respectiva opção, e à naturalização;

XI - a disputa sobre direitos indígenas.

No âmbito criminal, a competência da Justiça Federal se cinge ao processo e julgamento dos crimes políticos e das infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral; dos crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente; dos crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira; dos crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar; e dos crimes de ingresso ou permanência irregular de estrangeiro, a execução de carta rogatória, após o "exequatur", e de sentença estrangeira, após a homologação, as causas referentes à nacionalidade, inclusive a respectiva opção, e à naturalização.

Especificamente no que pertine aos crimes dolosos contra a vida, julgados pelo Tribunal do Júri, a competência federal se reduz drasticamente às hipóteses em que sejam cometidos em detrimento de bens, serviços ou interesses da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, bem como a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar.

Inclusive, o Decreto-lei nº 253/67 estabele, em seu art. 4º:

“Art. 4º Nos crimes de competência da Justiça Federal, que devem ser julgados pelo Tribunal do Júri, observar-se-á o disposto na legislação processual, cabendo a sua presidência ao juiz a que competir o processamento da respectiva ação penal.

Parágrafo único. Nas Seções Judiciárias, onde houver mais de uma Vara, competentes em matéria criminal, a lista dos jurados será organizada, anualmente por um dos Juízes, mediante rodízio observada sua ordem numérica.”

Em suma, a competência do Tribunal do Júri no âmbito da Justiça Federal envolve: o processo e julgamento de crime doloso contra a vida praticado contra funcionário público federal no exercício da função ou em virtude dela; o processo e julgamento de funcionário público federal que comete crime doloso contra a vida no exercício da função ou em razão dela; o processo e julgamento de crime doloso contra a vida ocorrido a bordo de navio ou aeronave, ressalvada a competência da Justiça Militar; e o processo e julgamento de crime doloso contra a vida envolvendo a disputa sobre direitos indígenas.


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