Por Germano Schwartz - 23/06/2015
Tenho lido as notícias a respeito do seguimento do projeto de lei que pretende diminuir a maioridade penal no Brasil. Os argumentos favoráveis são vários. Poucos científicos, todavia. Carecem de comprovação, que é encontrada, de modo farto, nos posicionamentos em contrário. O que me desanima, sinceramente, é o nível raso dos debates. Nesses momentos, de desespero jurídico, é que me lembro da cover de uma música de Sonny Curtis – “I Fought the Law”- feita pela banda punk inglesa The Clash. Nela se encontra a seguinte frase: “I fougth the law but Law won”. Em outras palavras: o rock lutou contra e pela Lei, mas, ao final, o Direito venceu.
https://www.youtube.com/watch?v=KsS0cvTxU-8
O mesmo ocorre nos dias de hoje? Quando vejo as discussões sobre a maioridade penal, fico a me perguntar: O Estado de Direito e o pedido de reforço do Direito pelo Direito não representariam um retrocesso e um perigo ao Estado Democrático de Direito? E, ainda, qual seria o papel do rock nessa sanha reaquecida de manutenção do status quo em clara contradição com o mundo fático experimentado pelos brasileiros?
Adiantando: a falta de relevância (política) do rock atual, por não ser subversivo e por não estar ligado à defesa da democracia, mostra que, sim, infelizmente, O DIREITO VENCEU. Relembre-se de que a função dos mecanismos de acoplamento estrutural (Constituição) é o de canalizar as irritações provenientes do entorno dos subsistemas da Política e do Direito.
O rock é capaz de produzir tais perturbações a partir de dois aspectos: (a) enquanto discurso e (b) em relação à sua forma. A primeira está ligada aos aspectos comunicacionais da música rock (subversão); a segunda, por seu turno, à sua autorreferência. Esta diz respeito à clausura operativa e aquela, à abertura cognitiva. A unidade distintiva de tais características proporciona a produção de sentido típica do rock. Quando uma delas é perdida, sua função desaparece e ele deixa de produzir irritações para os demais subsistemas. Ele repete o passado incessantemente, em um looping infindável.
Em outras palavras: o abandono de seu código (subversivo/não subversivo) fez com que o rock contemporâneo não fosse mais relevante socialmente porque sua comunicação musical não se diferencia das outras produzidas pelo sistema artístico e porque não perturba os demais subsistemas sociais.
Refere Luhmann que “o artista só pode ser observado na medida em que introduz uma distinção na obra de arte” (2009, p. 173). Nesse sentido (Luhmann, 2000, p. 232), quando existe esse distanciamento entre o sistema da arte em relação à evolução da sociedade, a tendência é que o rock (arte) também não evolua.
Daí minha pergunta: onde estão os rockeiros a protestar contra a redução da maioridade penal? Bobear, vão cantar a favor dela, bradando a mesma retórica infundada de seus defensores. E o que fazer, enquanto isso? Outra música consegue traduzir o meu estado atual: gostaria de ficar confortavelmente anestesiado (Confortably Numb) até que tudo isso passasse e eu pudesse acordar desse pesadelo.
https://www.youtube.com/watch?v=pl9dc5FhFYU
Notas e Referências:
LUHMANN, Niklas. Introdução à Teoria dos Sistemas. Petrópolis: Vozes, 2009.
LUHMANN, Niklas. Art as a Social System. California: Stanford University Press, 2000
Germano Schwartz é Diretor Executivo Acadêmico da Escola de Direito das FMU e Coordenador do Mestrado em Direito do Unilasalle. Bolsista Nível 2 em Produtividade e Pesquisa do CNPq. Secretário do Research Committee on Sociology of Law da International Sociological Association. Vice-Presidente da World Complexity Science Academy.
Publica coluna semanal no Empório do Direito, às terças-feiras.
Imagem ilustrativa do post: Autor desconhecido // Sem alterações
Disponível em: http://www.correioacreanense.com/2015/04/maioridade-penal-bebe-chuta-barriga-da.html