Violência contra crianças e adolescentes: implicações jurídicas e psicológicas do crime

25/01/2017

Por Roberta Lídice – 25/01/2017

“Só é possível ensinar uma criança a amar, amando-a”

Johann Goethe

A Lei nº 8.069 de 13 de julho de 1990, trata do Estatuto da Criança e do Adolescente e assim dispõe em seu artigo 2º:

Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos e adolescentes aquela entre doze e dezoito anos de idade.

Parágrafo único. Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre dezoito e vinte e um anos de idade.

A violência contra crianças e adolescentes se faz presente em muitos lares brasileiros, ocorrendo em qualquer dia e horário, principalmente, nos fins de semana, quando o agressor encontra-se mais tempo em casa, sendo esta física, psicológica, sexual ou moral.

Há casos em que, as vítimas ou seus parentes não denunciam o crime, sendo assim, os praticantes da violência continuam agindo livremente, como se nada tivesse acontecido.

O silêncio é motivado pelo constrangimento ou pelo trauma de relatar a ocorrência. Também, pela certeza que muitas vítimas têm de que nada vai acontecer com o criminoso.

Não são poucas as denúncias de abusos sexuais em casa, castigos corporais e até mesmo, humilhações e discriminações na escola, cabendo às autoridades e a sociedade, um posicionamento firme e combativo contra esses crimes.

As marcas físicas, emocionais e psicológicas da violência podem ter sérias implicações no desenvolvimento das crianças e adolescentes, tanto na saúde, quanto na capacidade de aprendizagem. Alguns estudos mostraram que o fato de ter sofrido atos de violência na infância está relacionado com comportamentos de risco no futuro, tais como o consumo de tabaco, o abuso de álcool e drogas, sedentarismo e obesidade.

Dentre os ambientes em que os tipos de violência supracitados mais ocorrem, temos: em casa; na família; na escola.

Todas as crianças e adolescentes têm o direito à liberdade, ao respeito e à dignidade, conforme preceituam os artigos 15 a 18 do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA:

Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.

Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos:

I - ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais;

II - opinião e expressão;

III - crença e culto religioso;

IV - brincar, praticar esportes e divertir-se;

V - participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação;

VI - participar da vida política, na forma da lei;

VII - buscar refúgio, auxílio e orientação.

Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.

Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.

Art. 18-A. A criança e o adolescente têm o direito de ser educados e cuidados sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante, como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto, pelos pais, pelos integrantes da família ampliada, pelos responsáveis, pelos agentes públicos executores de medidas socioeducativas ou por qualquer pessoa encarregada de cuidar deles, tratá-los, educá-los ou protegê-los. (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014)

Parágrafo único.  Para os fins desta Lei, considera-se: (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014)

I - castigo físico: ação de natureza disciplinar ou punitiva aplicada com o uso da força física sobre a criança ou o adolescente que resulte em: (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014)

a) sofrimento físico; ou (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014)

b) lesão; (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014)

II - tratamento cruel ou degradante: conduta ou forma cruel de tratamento em relação à criança ou ao adolescente que: (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014)

a) humilhe; ou (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014)

b) ameace gravemente; ou (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014)

c) ridicularize. (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014)

Art. 18-B. Os pais, os integrantes da família ampliada, os responsáveis, os agentes públicos executores de medidas socioeducativas ou qualquer pessoa encarregada de cuidar de crianças e de adolescentes, tratá-los, educá-los ou protegê-los que utilizarem castigo físico ou tratamento cruel ou degradante como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto estarão sujeitos, sem prejuízo de outras sanções cabíveis, às seguintes medidas, que serão aplicadas de acordo com a gravidade do caso: (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014)

I - encaminhamento a programa oficial ou comunitário de proteção à família; (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014)

II - encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico; (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014)

III - encaminhamento a cursos ou programas de orientação; (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014)

IV - obrigação de encaminhar a criança a tratamento especializado; (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014)

V - advertência. (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014)

Parágrafo único.  As medidas previstas neste artigo serão aplicadas pelo Conselho Tutelar, sem prejuízo de outras providências legais. (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014)

DO ABUSO SEXUAL.

Uma questão muito delicada, porém, infelizmente, real, é a do abuso sexual.

Segundo dados estatísticos da Secretaria de Direitos Humanos, foram denunciados 4.480 casos de violência sexual contra crianças e adolescentes, no primeiro trimestre do ano de 2015, representando 21% das mais de 20 mil demandas relacionadas à violação de direitos da população infantojuvenil.

No que tange o perfil, 45% das vítimas eram meninas e 20% tinham entre 4 e 7 anos. Em mais da metade dos casos, precisamente, 58%, o pai e a mãe são os principais suspeitos das agressões, que ocorrem, principalmente, nos lares das vítimas.

A criança ou jovem que foi vítima de violência sexual ou outro tipo de crime deve contar o fato para seus pais, responsáveis, professores ou uma pessoa de sua confiança. Eles provavelmente relatarão o crime às autoridades, a fim de que sejam tomadas as medidas cabíveis.

DO BULLYING.

O BULLYING - uma situação que se tipifica por agressões intencionais, verbais ou físicas, feitas de maneira repetitiva, por um ou mais alunos contra um ou mais colega – é uma das violências que mais crescem no país. Esta pode ocorrer nas escolas, universidades, na família, no trabalho, entre outros ambientes.

De acordo com a Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e Adolescência (ABRAPIA), algumas atitudes são importantes, a fim de manter um ambiente saudável na escola, tais como:

- Conversar com os alunos e escutar atentamente reclamações ou sugestões;

- Estimular os estudantes a informar os casos;

- Reconhecer e valorizar as atitudes da garotada no combate ao problema;

- Criar com os estudantes regras de disciplina para a classe em coerência com o regimento escolar;

- Estimular lideranças positivas entre os alunos, prevenindo futuros casos;

- Interferir diretamente nos grupos, o quanto antes, para quebrar a dinâmica do bullying.

DA INTERNET.

A criança e o adolescente precisam ter outras atividades além da internet. A falta de diálogo entre pais e filhos, também é um fator preocupante, que leva ao afastamento entre estes, favorecendo a acessibilidade no ambiente virtual, como “fuga” e falsa ilusão de um mundo irreal, ficando vulneráveis aos perigos da internet.

A psicóloga Michella Vargas Flores, do Centro de Referência em Assistência Social – CREAS, assim define:

“Muitos adolescentes não entendem os riscos em acessar a internet e não têm cuidado ao adicionar estranhos como amigos.” 

Como prevenção e proteção, os pais devem orientar e supervisionar os filhos, inclusive restringindo o acesso à; determinadas páginas e sites, estimulando outras atividades.

Algumas orientações importantes:

- Procure ser educado e cordial também na hora de publicar ou comentar algo na internet;

- Evite colocar endereço, telefone, nome da escola e nome completo;

- Muito cuidado ao divulgar seus desejos, segredos e sonhos. Sua intimidade é muito valiosa, cuide bem dela;

- Você colocaria seu diário na praça pública, no mural do colégio ou na praia? Pense muito bem antes de publicar algo na internet;

- Cuidado com as fotos que posta, elas podem ser modificadas e usadas contra você. Não coloque fotos com uniforme da escola ou algo que possa indicar onde estuda;

- O que importa é a qualidade e não a quantidade de amigos. Cuidado com estranhos;

- Jamais aceite convite de encontro presencial com quem não conhece;

- Uma vez publicado, tudo pode ser gravado por outros e voltar ao ar.

- Quando publicamos algo, não podemos mais esconder. Qualquer um pode ver, gravar e usar sem nosso controle. Pense muito bem antes de publicar algo;

- As informações podem ser mal interpretadas e usadas contra você por pessoas mal intencionadas;

- Os comentários podem ser violentos e desrespeitosos;

- Lembre-se de que você é responsável legalmente por tudo o que publica.

- Pode ser prejudicial se usada sem limites ou quando substitui todas as outras atividades de lazer;

- Como todo espaço público, pode ser acessada por pessoas mal intencionadas;

- Não podemos confiar em todas as informações, nem em todas as pessoas conectadas;

- Proibir não educa nem previne. Dialogue e busque orientação.

http://www.laguna.sc.gov.br

DO APLICATIVO:

O PROTEJA BRASIL é um aplicativo desenvolvido pela UNICEF, juntamente com o Governo Federal, para iPhone ou celular com sistema Android, criado para facilitar denúncias e informar sobre violência contra crianças e adolescentes.

A partir do local onde o usuário está, o PROTEJA BRASIL indica telefones e endereços e o melhor caminho para chegar à delegacias especializadas de infância e juventude, conselhos tutelares, varas da infância e organizações que ajudam a combater a violência contra a infância e adolescência nas principais cidades brasileiras.

O aplicativo facilita a denúncia, sem expor o denunciante e mantendo o sigilo sempre.

http://www.protejabrasil.com.br

Toda e qualquer forma de violência deve ser coibida pelo Estado, repelida pela sociedade e combatida pela família, principalmente se o agredido for um menor, incapaz de se defender.

O momento é de unir forças e apresentar um posicionamento firme e combativo! A violência na família é inaceitável!

O silêncio é a principal causa do aumento da violência sexual contra crianças e jovens. Se as pessoas não usam o disque denúncia ou outras formas de denunciar o crime, fica muito difícil combater a violência.

A melhor forma combater o crime é impedindo que este ocorra.

Quebre o silêncio: denuncie!

ONDE DENUNCIAR:

- Disque 100: De qualquer telefone no território nacional. Denúncias de violação de direitos de crianças ou adolescentes, especialmente em casos de abuso ou exploração sexual. A denúncia é anônima e o serviço gratuito.

O Disque 100 funciona diariamente das 8h às 22h, inclusive nos fins de semana e feriados. As denúncias recebidas são analisadas e encaminhadas aos órgãos de proteção, defesa e responsabilização, de acordo com a competência e as atribuições específicas.

- 190 – Polícia Militar;

- 181 – Disque Denúncia (Estado de São Paulo);

- 0800 970 11 70 - “Alô Vida” – serviço telefônico de escuta e encaminhamento para casos de violência contra crianças, adolescentes e pessoas com deficiência, e de orientação para famílias interessadas ou envolvidas em processos legais de adoção.


Roberta LídiceRoberta Lídice é Advogada atuante nas áreas do Direito Empresarial e Penal (Preventivo/Consultivo). Consultora em Business Intelligence, com MBA em Gestão Pública: Políticas e Gestão Governamental e Especialização em Direito Empresarial. Ouvidora na Associação Brasileira de Advogados – ABA São Paulo. Membro da Comissão de Direitos Humanos e Examinadora da Comissão de Exame de Ordem da OAB-SP. Autora da obra jurídica: “O CONTRATO DE ADESÃO COMO INSTRUMENTO REGULATÓRIO NAS RELAÇÕES CONSUMERISTAS E EMPRESARIAIS” – Editora Lumen Juris. Ano 2017. (No prelo). Autora/Colaboradora da Revista SÍNTESE – IOB – Grupo SAGE – Publicações Jurídicas. Autora e coautora de artigos jurídico-sociais.


Imagem Ilustrativa do Post: question // Foto de: pawpaw67 // Sem alterações

Disponível em: https://www.flickr.com/photos/luschei/2746241376

Licença de uso: http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/legalcode


O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


 

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