TRF2a.: Imposto de Renda sobre verbas trabalhistas deve seguir a alíquota do tempo da época do benefício

27/05/2016

Por Charles M. Machado – 27/05/2016

O Imposto de Renda incidente sobre os benefícios pagos acumuladamente, por causa de ação trabalhista, deve ser calculado de acordo com as tabelas e alíquotas vigentes à época em que os valores deveriam ter sido repassados, esse é o entendimento da 4ª Turma Especializada do Tribunal Regional da 2ª Região ao rejeitar cobrança sobre o montante global recebido.

A decisão trata de um trabalhador que recebeu o direito de receber diferenças salariais e parcelas de gratificações natalinas, férias e FGTS.

Segundo o entendimento da Fazenda Nacional, nas reclamações trabalhistas, o IRPF não deveria incidir sobre as parcelas, mas sim sobre o valor total dos recebimentos Para o relator do processo no TRF-2, juiz federal convocado Mauro Luís Rocha Lopes, considerou que os princípios constitucionais da capacidade contributiva e da progressividade seriam violados caso a incidência do imposto não espelhasse a realidade do direito assegurado ao autor na ação trabalhista, a percepção, em cada um dos meses a que se referiu a ação, de determinadas verbas que, somadas, resultaram no valor da condenação. Do contrário, afirmou o relator, o trabalhador seria prejudicado. Revela-se desarrazoado impor ao autor o ônus de pagar o IR à alíquota máxima prevista na tabela progressiva, quando, por razões alheias à sua vontade, a incidência do tributo deixou de se dar em percentual mínimo ou até mesmo dentro da faixa de isenção, se o recebimento das verbas trabalhistas tivesse ocorrido nos meses em que eram devidas, afirmou o magistrado.

O Imposto de Renda, como tributo de competência impositiva da união deve respeitar alguns princípios, quando do exercício desse poder constituinte derivado, que se encontra limitado aos princípios constitucionais.

O Código Tributário Nacional, estabelece, como Norma Nacional alguns desses limites, quando da sua regulamentação:

“Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:

I - de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;

II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.

§ 1o A incidência do imposto independe da denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção.(Incluído pela Lcp nº 104, de 2001)

§ 2o ........

Nota-se que o primeiro elemento definido è o da disponibilidade dos valores, e essa disponibilidade pode ser econômica ou jurídica, no caso das verbas trabalhistas a ação apenas identificou o Direito pretérito, dando ao reclamante o Direito extemporâneo de receber esses valores, por isso ao reconhecer o direito do trabalhador na sentença judicial, o magistrado produziu uma norma individual e concreta para o caso, reconhecendo que o trabalhador tinha direito na época em que foi pleiteado, e por decorrência a alíquota que deve ser aplicada, sobre a base de cálculo precisa ser à a alíquota do instante da aquisição do direito, ou seja no período laborado.

Caso fosse aplicado uma alíquota sobre o valor total dos valores acumulados ao longo de toda ação judicial, a alíquota aplicada sobre a base de recebimentos seria maior, prejudicando dessa maneira o trabalhador.

A ação trabalhista apenas reconheceu um direito pretérito, logo a alíquota também deve ser pretérita, e a base apurada deve ser à do momento da aquisição do Direito, como previsto no Código Tributário Nacional.

No caso da ação, o contribuinte é o trabalhador, e a responsabilidade pelo recolhimento na fonte dos valores totalizados é o juízo da ação, logo o pleito pela aplicação correta da alíquota deve ser formulado pelo advogado, no momento dos cálculos da ação, pois a incidência do IRPF é na fonte, e os valores serão descontados no instante do pagamento. Evitar esse desconto, com o pedido ao magistrado é fundamental para evitar a necessidade da produção de um pedido administrativo, sempre de difícil êxito, pelo entendimento distinto do fisco, obrigando dessa forma o contribuinte a uma ação de repetição do indébito.

A previsão da responsabilidade tributária já está no CTN:

Art. 45. Contribuinte do imposto é o titular da disponibilidade a que se refere o artigo 43, sem prejuízo de atribuir a lei essa condição ao possuidor, a qualquer título, dos bens produtores de renda ou dos proventos tributáveis.

Parágrafo único. A lei pode atribuir à fonte pagadora da renda ou dos proventos tributáveis a condição de responsável pelo imposto cuja retenção e recolhimento lhe caibam”.

A responsabilidade do juízo, na retenção prevista em lei abre espaço à determinação da autoridade do pleito, evitando assim a aplicação da alíquota equivocada.

Ainda quanto a decisão aqui trazida, ela ainda apontou que o Supremo Tribunal Federal, em repercussão geral, já considerou que não se pode penalizar duplamente o trabalhador (RE 614.406). Esse fenômeno ocorreria, já que o contribuinte, ao não receber as parcelas na época própria, deveria ingressar em juízo e, ao fazê-lo, seria posteriormente tributado com uma alíquota superior de imposto de renda.

Segue abaixo a ementa:

TRIBUTÁRIO. AÇÃO ORDINÁRIA. IMPOSTO DE RENDA. INCIDÊNCIA SOBRE O MONTANTE GLOBAL DA CONDENAÇÃO DE UMA ÚNICA VEZ. IMPOSSIBILIDADE. OBSERVÂNCIA DE TABELAS E ALÍQUOTAS VIGENTES À ÉPOCA EM QUE OS VALORES DEVERIAM TER SIDO ADIMPLIDOS. INCIDÊNCIA SOBRE OS JUROS DE MORA. RECLAMAÇÃO TRABALHISTA.

  1. O Imposto de Renda incidente sobre os valores pagos acumuladamente deve ser calculado de acordo com as tabelas e alíquotas vigentes à época em que os valores deveriam ter sido adimplidos, observando-se a renda auferida mês a mês pelo segurado, sob pena de violação das próprias normas legais que regem a incidência do imposto e dos princípios constitucionais da capacidade contributiva e da progressividade.
  2. Orientação firmada pelo STJ no julgamento do REsp 1.118.429/SP, realizado sob a sistemática dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC) e pelo STF no julgamento do RE nº 614.406-RS, em que foi reconhecida a repercussão geral da matéria.
  3. A jurisprudência do STJ e a da 2a Seção Especializada desta Corte firmou no sentido da incidência do imposto de renda sobre os juros de mora referentes a qualquer verba, inclusive em virtude de decisão judicial proferida em ação de natureza trabalhista, excepcionando-se (i) as hipóteses em que haja norma isentiva específica, ou em que os juros de mora sejam relativos a valores pagos no contexto de despedida ou rescisão do contrato de trabalho, e (ii) aqueles em que a verba principal for igualmente isenta ou estiver fora do âmbito de incidência do imposto.
  4. No caso, na ação trabalhista, o Autor postulou diferenças salariais e os respectivos reflexos nas gratificações natalinas, férias, FGTS, entre outras parcelas, fora do contexto de rescisão do contrato de trabalho, razão pela qual, nos termos do precedente mencionado, deve ser reconhecida a legalidade da incidência do imposto de renda sobre os juros de mora, ao contrário do consignado na sentença recorrida.
  5. Depreende-se, no caso, que o Autor restou vencedora quanto à incidência do IR sobre os rendimentos recebidos acumuladamente, mas vencida no que tange à incidência do IR. Assim, deve ser aplicada ao caso a regra do art.21 do CPC, afastando-se a condenação de qualquer das partes ao pagamento de honorários. 6. Apelação da União e remessa necessária a que se dá parcial provimento e nega-se provimento à apelação do Autor.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a 4ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, na forma do voto da relatora, dar parcial provimento à remessa necessária e à apelação da União e negar provimento à apelação do Autor.

Rio de janeiro, de 2016 (data do julgamento).

MAURO LUÍS ROCHA LOPES

Juiz Federal Convocado

Relator

Processo 0002788-32.2011.4.02.5101”

Nota-se na sentença que alguns pontos ainda podem ser questionados, entre eles a natureza de algumas dessas verbas.

As verbas de natureza indenizatória, não devem sofrer a incidência do IRPF, pois apenas procuram reparar os valores aos quais o trabalhador teria direito, é o caso de férias, e licenças não gozadas pelo trabalhador, bem como a correção monetária desses valores e dos valores das verbas, sob pena de o trabalhador ser duplamente penalizado.

O imposto de Renda da pessoa física, deve sempre incidir sobre o aumento do patrimônio, e nunca sobre a reparação do mesmo, por isso não incide sobre verbas de caráter indenizatório.

Logo no momento do cálculo devem ser observadas as alíquotas incidentes na época do Direito, bem como a tabela de isenção aplicada na época, do contrário estaríamos tratando de Imposto sobre a movimentação financeira e não sobre a renda.


Charles M. Machado é advogado formado pela UFSC, Universidade Federal de Santa Catarina, consultor jurídico no Brasil e no Exterior, nas áreas de Direito Tributário e Mercado de Capitais. Foi professor nos Cursos de Pós Graduação e Extensão no IBET, nas disciplinas de Tributação Internacional e Imposto de Renda. Pós Graduado em Direito Tributário Internacional pela Universidade de Salamanca na Espanha. Membro da Academia Brasileira de Direito Tributário e Membro da Associação Paulista de Estudos Tributários, onde também é palestrante. Autor de Diversas Obras de Direito. Email: charles@dantinoadvogados.com.br


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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


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