TJRS: precatórios podem ser utilizados na garantia da execução fiscal

18/03/2016

Por Charles M. Machado – 18/03/2016

O tribunal de justiça do Rio Grande do Sul Aceitou que uma empresa nomeasse como garantia no processo executivo fiscal, para discussão das dívidas por meio dos embargos, precatórios do Estado do Rio Grande do Sul.

Embora previstos na Lei de Execução Fiscal o aceite de precatórios por parte das fazendas, sempre foi um problema para o contribuinte. A Lei 6.830, Lei de Execuções Fiscais, conceitua como Dívida Ativa “ Art. 2º Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não tributária na Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, com as alterações posteriores, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.

§ 1º - Qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei às entidades de que trata o artigo 1º, será considerado Dívida Ativa da Fazenda Pública.

§ 2º - A Dívida Ativa da Fazenda Pública, compreendendo a tributária e a não tributária, abrange atualização monetária, juros e multa de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato.

A mesma Lei fixa os requisitos da Certidão de Dívida Ativa, bem com o rito dessa cobrança em seus dispositivos, e por gozar de liquidez e certeza, o ritmo da Execução Fiscal é quase sempre draconiano para o Contribuinte.

“Art. 3º - A Dívida Ativa regularmente inscrita goza da presunção de certeza e liquidez.

Parágrafo Único - A presunção a que se refere este artigo é relativa e pode ser ilidida por prova inequívoca, a cargo do executado ou de terceiro, a quem aproveite.”

Ocorre  porém que ilidir a presunção de certeza da certidão de dívida ativa, exige a formação de garantia para discussão da mesma em juízo, ou exceção que venha à ser aceita.

A lei especifica ainda quem são as pessoas, na qualidade de contribuinte e ou responsável pela garantia da execução, estendendo aos responsáveis a possibilidade de formar a garantia.

‘Art4°......

§ 3º - Os responsáveis, inclusive as pessoas indicadas no § 1º deste artigo, poderão nomear bens livres e desembaraçados do devedor, tantos quantos bastem para pagar a dívida. Os bens dos responsáveis ficarão, porém, sujeitos à execução, se os do devedor forem insuficientes à satisfação da dívida. “

O artigo 9°da LEF, efetua a ordem das garantias :

“Art. 9º - Em garantia da execução, pelo valor da dívida, juros e multa de mora e encargos indicados na Certidão de Dívida Ativa, o executado poderá:

I - efetuar depósito em dinheiro, à ordem do Juízo em estabelecimento oficial de crédito, que assegure atualização monetária;

II - oferecer fiança bancária ou seguro garantia; (Redação dada pela Lei nº 13.043, de 2014)

III - nomear bens à penhora, observada a ordem do artigo 11; ou

IV - indicar à penhora bens oferecidos por terceiros e aceitos pela Fazenda Pública.

§ 1º - O executado só poderá indicar e o terceiro oferecer bem imóvel à penhora com o consentimento expresso do respectivo cônjuge.

§ 2o  Juntar-se-á aos autos a prova do depósito, da fiança bancária, do seguro garantia ou da penhora dos bens do executado ou de terceiros. (Redação dada pela Lei nº 13.043, de 2014)

§ 3o  A garantia da execução, por meio de depósito em dinheiro, fiança bancária ou seguro garantia, produz os mesmos efeitos da penhora. (Redação dada pela Lei nº 13.043, de 2014)

§ 4º - Somente o depósito em dinheiro, na forma do artigo 32, faz cessar a responsabilidade pela atualização monetária e juros de mora.

§ 5º - A fiança bancária prevista no inciso II obedecerá às condições pré-estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional.

§ 6º - O executado poderá pagar parcela da dívida, que julgar incontroversa, e garantir a execução do saldo devedor.

Em se tratando de penhora a ordem dos bens e direitos fica assim estabelecida:

“Art. 11 - A penhora ou arresto de bens obedecerá à seguinte ordem:

I - dinheiro;

II - título da dívida pública, bem como título de crédito, que tenham cotação em bolsa;

III - pedras e metais preciosos;

IV - imóveis;

V - navios e aeronaves;

VI - veículos;

VII - móveis ou semoventes; e

VIII - direitos e ações.

......

Note-se que os precatórios estão evidentemente previstos na categoria dos direitos, inciso VIII, visto que fazem parte de sentença transitada em julgado.

Efetuada a penhora e garantida dessa forma a execução fiscal, o executado poderá oferecer embargos a execução, para discussão do mérito dos débitos, previsão essa do artigo 16°:

“Art. 16 - O executado oferecerá embargos, no prazo de 30 (trinta) dias, contados:

I - do depósito;

II - da juntada da prova da fiança bancária ou do seguro garantia; (Redação dada pela Lei nº 13.043, de 2014)

III - da intimação da penhora.”

A importância do rito da execução fiscal, e da sua formação de garantia, fica também evidenciada no artigo 38°:

“Art. 38 - A discussão judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública só é admissível em execução, na forma desta Lei, salvo as hipóteses de mandado de segurança, ação de repetição do indébito ou ação anulatória do ato declarativo da dívida, esta precedida do depósito preparatório do valor do débito, monetariamente corrigido e acrescido dos juros e multa de mora e demais encargos.”

A ordem de preferência na penhora acaba por causar inúmeros prejuízos ao penhorado, logo por conta disso essa decisão ganha enorme importância.

Trazemos ela na sua integra.

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. NOMEAÇÃO À PENHORA. PRECATÓRIO DO IPERGS. POSSIBILIDADE.

1. Os precatórios são títulos executivos judiciais certos, líquidos e exigíveis, previstos no art. 11, inc. VIII da LEF (direitos e ações), portanto, perfeitamente hábeis à garantia do juízo.

2. Sendo a parte executada cessionária de direitos creditórios por obrigação do Estado, é possível o oferecimento de precatório para garantir a execução fiscal, sobretudo quando expedido pelo próprio Estado ou suas autarquias, não importando qualquer prejuízo ao exequente o acolhimento da nomeação à penhora dos títulos indicados pela devedora.

3. O crédito de precatório é meio idôneo para realização do direito do exequente e acarreta menos onerosidade ao devedor, razão pela qual, é possível a sua nomeação à penhora.

RECURSO PROVIDO, EM DECISÃO MONOCRÁTICA.

AGRAVO DE INSTRUMENTO

PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Nº 70067856088 (Nº CNJ: 0470986-79.2015.8.21.7000)

COMARCA DE CACHOEIRINHA

LOJAS RADAN LTDA

AGRAVANTE

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

AGRAVADO

DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos.

Trata-se de agravo de instrumento interposto por LOJAS RADAN LTDA em face da decisão da fl. 69 que indeferiu o pedido de oferecimento de créditos oriundos de precatório para garantia prévia do juízo nos autos da execução fiscal ajuizada pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL.

Em suas razões recursais, alega a agravante que o precatório vencido e não pago, como no caso, nos termos

do art. 78, §2º dos ADCT, possui equivalência à moeda corrente, estando por esta razão, elencado no inciso I do art. 11 da LEF. Assevera que a própria Constituição assegura o direito à utilização dos precatórios vencidos e devidos pela entidade exeqüente, com poder liberatório do pagamento de tributo. Sustenta que mesmo que fosse considerado o precatório como direito creditório, o mesmo se configura em direito em relação ao próprio exeqüente, caracterizando-se como penhora de mão própria. Colaciona jurisprudência. Pugna pela concessão do efeito suspensivo e, ao final, pelo provimento do recurso (fls. 02-20).

O recurso foi recebido, sendo concedido o efeito suspensivo pleiteado e determinada a intimação do agravado para, querendo, apresentar contrarrazões (fls. 73-74).

Oferecidas contrarrazões (fls. 80-85).

Após, vieram conclusos.

É o relatório.

Decido.

Primeiramente, passo a apreciar a preliminar de intempestividade do recurso, suscitada em contrarrazões.

Razão não colhe ao agravado.

A decisão agravada da fl. 69 apresenta o seguinte teor:

“Vistos.

Acolho a impugnação do credor.

Não está provada a liquidez da dívida objeto do precatório, nem que haja parcela desonerada suficiente ao pagamento da dívida ora em execução e tampouco comprovada a legitimidade do devedor sobre o crédito.

Indique o credor bens a penhorar.

Dil. Legaisl.”

Tal decisão foi proferida em 18/12/2014. Contudo, conforme consulta ao sítio da internet desta Corte, verifica-se que a mesma não foi disponibilizada em nota de expediente, vindo a agravante a ser intimada de seu teor, somente em 09/12/2015, de acordo com a certidão à fl. 70v.

Portanto, se mostra tempestivo o presente agravo de instrumento, interposto em 17/12/2015, dentro do prazo previsto no art. 522, caput, do CPC.

Afasto a preliminar.

No mérito, a controvérsia em exame cinge-se ao oferecimento à penhora de precatórios vencidos e não pagos do IPERGS como garantia da execução fiscal ajuizada pelo Estado do Rio Grande do Sul visando à cobrança de crédito tributário de ICMS.

A Lei de Execução Fiscal, em seu artigo 9º, inc. III dispõe que o executado poderá nomear bens à penhora para garantir a execução, observada a ordem prevista no artigo 11, na qual a espécie “dinheiro” se sobrepõe as demais hipóteses.

Todavia, a ordem estabelecida no referido artigo para penhora ou arresto de bens não é absoluta e, sim relativa, podendo ser alterada quando acarretar menor onerosidade ao devedor, consoante prevê o artigo 620 do Código de Processo Civil.

Sobre o tema, trago à liça os ensinamentos doutrinários de Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero acerca do art. 620 do CPC, in verbis:

Modo menos gravoso para o Executado. Quando por vários meios idôneos o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado (art. 620, CPC), ainda que o exequente tenha indicado a forma mais onerosa (art. 615, I, CPC). O juiz pode agir de ofício. Observe-se que a aplicação do art. 620, CPC, pressupõe a existência de várias técnicas processuais igualmente idôneas para a realização do direito do exequente. Obviamente o juiz não pode preferir técnica processual inidônea, ou menos idônea que outra também disponível, para realização do direito do exequente, a pretexto de aplicar o art. 620, CPC.

Os precatórios são títulos executivos judiciais certos, líquidos e exigíveis, previstos no art. 11, inc. VIII da LEF (direitos e ações), portanto, perfeitamente hábeis à garantia do juízo.

Desse modo, sendo a parte executada cessionária de direitos creditórios por obrigação do Estado, é possível o oferecimento de precatório para garantir a execução fiscal, sobretudo quando expedido pelo próprio Estado ou suas autarquias, não importando qualquer prejuízo ao exequente o acolhimento da nomeação à penhora dos títulos indicados pela devedora.

Ainda, cumpre destacar, que o crédito de precatório é meio idôneo para realização do direito do exequente e acarreta menos onerosidade ao devedor, razão pela qual, é possível a sua nomeação à penhora.

Nessa linha, é a jurisprudência desta colenda Câmara:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. NOMEAÇÃO DE PRECATÓRIO À PENHORA. PRECATÓRIO DO IPERGS. A nomeação à penhora, de precatório expedido contra autarquia previdenciária estadual, possui liquidez, e, portanto, se presta a garantir executivo fiscal. Isso porque a gradação legal prevista no artigo 11 da Lei de Execuções Fiscais, não é regra fechada, livre de debate. Por certo, há de ter-se como norma geral. Contudo, cabe ao julgador equilibrar e adaptar as circunstâncias, o fato concreto à norma, observando sempre a regra contida no artigo 620 do CPC, segundo o qual a execução deve prosseguir da forma menos onerosa possível ao devedor. A Fazenda pode recusar a penhora sobre precatórios, desde que tal seja motivada. No caso, inexiste razão lógica legal e razoável para que a Fazenda recuse precatório do próprio Estado e/ou de suas autarquias. RECURSO PROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70056704406, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Roberto Lofego Canibal, Julgado em 11/12/2013).

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA. CRÉDITO DE PRECATÓRIO OBJETO DE CESSÃO. POSSIBILIDADE. 1. Está pacificado nos Tribunais a possibilidade de haver penhora de crédito de precatório, mesmo objeto de cessão. 2. É relativa, e não absoluta, a ordem estabelecida no art. 11 da LEF. Mesmo considerada a decisão do STJ pelo sistema de repercussão geral (REsp. 1.090.898-SP), no sentido da recusa da Fazenda Pública quanto à penhora de crédito de precatório por violar a ordem legal, não quer dizer que a recusa pode ocorrer de modo puro e simples, sem justificativa e demonstração de que a ordem legal foi efetivamente violada. Precedentes do STJ. 3. A Súm. 406 do STJ é restrita aos casos de substituição de penhora. 4. Recurso desprovido. (Agravo de Instrumento Nº 70054502612, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Irineu Mariani, Julgado em 11/12/2013).

Finalizando, saliento que a recusa do exequente à nomeação de precatório à penhora só pode ocorrer quando devidamente fundamentada, o que não se verifica no caso sub judice, pois a documentação juntada às fls. 27-32, demonstram a existência e liquidez dos créditos ofertados.

Ante o exposto, pelo que autoriza o artigo 557, §1º-A, do Código de Processo Civil, em decisão monocrática, dou provimento ao agravo de instrumento, para o fim de nomear a penhora os créditos dos precatórios oferecidos pela empresa executada.

Oficie-se ao juízo de primeiro grau, comunicando da decisão.

Diligências legais.

Intimem-se.

Porto Alegre, 19 de fevereiro de 2016.

DES. SÉRGIO LUIZ GRASSI BECK,

Relator.


Charles M. Machado é advogado formado pela UFSC, Universidade Federal de Santa Catarina, consultor jurídico no Brasil e no Exterior, nas áreas de Direito Tributário e Mercado de Capitais. Foi professor nos Cursos de Pós Graduação e Extensão no IBET, nas disciplinas de Tributação Internacional e Imposto de Renda. Pós Graduado em Direito Tributário Internacional pela Universidade de Salamanca na Espanha. Membro da Academia Brasileira de Direito Tributário e Membro da Associação Paulista de Estudos Tributários, onde também é palestrante. Autor de Diversas Obras de Direito. Email: charles@dantinoadvogados.com.br


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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


 

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