“STF, Revisão da Vida Toda e a falta de esperança dos aposentados”

27/03/2024

É o Tema 1.102 do STF[1], sem dúvidas, um dos mais relevantes e complexos do cenário previdenciário dos últimos tempos, notadamente pela pretensão de alcançar a justa compreensão jurídica das confusas normas de outrora que alteraram o sistema de cálculo das aposentadorias do regime geral de previdência.

Trata o tema da polêmica “Revisão da Vida Toda”, também chamada de “Revisão da Vida Inteira” ou simplesmente “RVT”, ganha novos ares de discussão jurídica perante a Suprema Corte brasileira, fazendo com que sua já reconhecida viabilidade jurídica seja colocada à prova novamente.

Importante tese revisional, originária de estudos doutrinários e da jurisprudência previdenciária que produziu sua força perante os Tribunais Brasileiros.

Assim, teve respaldo técnico tanto da doutrina especializada, quanto do poder informador da jurisprudência, enquanto válidas fontes da ciência jurídica, com o intuito claro e justificado de aprimoramento da técnica previdenciária, aliás, de dimensão constitucional e pertencente ao rol dos direitos e garantias fundamentais.

Tem como alvo afastar uma regra de cálculo prejudicial aos aposentados, fazendo com que seja observado o critério legal mais benéfico e favorável, notadamente, pelo fato de que a relação jurídica já se via pré-existente a ulterior mudança normativa.

Por aqui, longe a pretensão de exaurir a temática sob a perspectiva técnica, mas sim, de outro lado, traçar pequenas reflexões de projeções futuras da convalidação em definitivo da tese.

É também papel do Direito produzir respostas aos dilemas da sociedade conforme suas específicas diretrizes, traçando rotas e mecanismos de construção, aperfeiçoamento e consolidação normativa, para que possa ter seu papel-mor de regular os comportamentos sociais e assim produzir a evolução social com base no adotado sistema normativo enraizado em regras e princípios.

Ademais, o Direito não é aquilo que o STF diz, conforme a sempre lúcida lição de Lênio Streck.[2]

Entende a ampla doutrina e a advocacia especializada que a tese se sustenta, é constitucional, adequada, visa corrigir erros de cálculo e detém aptidão jurídica para conferir dignidade e justiça social a seus envolvidos.

Wagner Balera, referência doutrinária do Direito Previdenciário, neste sentido, assegura que: É justíssimo o modelo de cálculo dos benefícios que leva em conta todo o percurso contributivo do segurado. Essa é a melhor expressão da proteção social que é, sobretudo, programa coletivo, no qual, o indivíduo cede passo ao todo”.[3]

A tese não possui caráter universal e seu campo de pouso é limitado, com vários filtros[4], dentre eles o prazo decadencial de 10 (dez) anos a partir do primeiro julgamento; alcança unicamente certos benefícios do RGPS,  excluindo benefícios assistenciais, rurais e de regimes próprios; requer demonstração através de cálculos de seus efeitos positivos; alcança situações deferidas até a data da Emenda Constitucional n.103 de 12/11/2019, dentre outros. Portanto, é uma tese setorizada, razão de que os efusivos e midiáticos números de seus antagonistas não encontram sintonia com sua pequena incidência a um limitadíssimo número de aposentados.

Evidente assim que os segmentos contrários estão distantes da realidade de vida da própria tese, sua essência, viabilidade e importância em sede de aprimoramento da técnica constitucional de proteção previdenciária.

Ademais, comprovado a exaustão que existiram contribuições ao sistema, vale dizer, há prova do custeio, notadamente dos períodos pretéritos de plena e habitual contribuição ativa dos até então filiados trabalhadores, cujo período contributivo não foi utilizado no cálculo de sua aposentadoria, mas sim, mitigado pelo INSS, apesar de auferido em seus cofres.

Logo, as contradições e paradoxos do sistema são visíveis, sendo que na perspectiva contributiva o trabalhador foi um grande agente de custeio, durante toda sua vida laboral, contudo, quando da entrega da prestação previdenciária, parte considerável de suas obrigatórias contribuições ficaram de fora da base de cálculo, com apropriação dos valores por parte do ente previdenciário.

Por esse e outros argumentos é que a tese se sustenta, é válida, razoável e com sintonia à programação constitucional de bem-estar, dignidade e justiça social.

Tem a Corte Constitucional o desafio iminente de aprimorar a tutela previdenciária, ratificando as posições dos Tribunais inferiores a favor da tese, corroborar as lições doutrinárias, bem como dar vida a consolidada jurisprudência favorável sobre o tema.

Esse o desejo e a expectativa de todos, em meio as pessimistas projeções de alguns e a falta de esperança de muitos.

 

Notas e referências

[1] https://www.jusvox.com.br/opini%C3%B5es/item/262-revis%C3%A3o-da-vida-toda-entenda-a-decis%C3%A3o-do-stf-no-tema-1102-e-a-reviravolta.html

[2] https://www.conjur.com.br/2019-abr-11/senso-incomum-supremo-nao-salvar-mundo-basta-respeitar-direito/

[3] https://www.conjur.com.br/2022-dez-11/wagner-balera-revisao-vida-toda-igualdade/

[4] https://www.conjur.com.br/2022-dez-07/joao-badari-quem-direito-revisao-vida-toda/

 

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