Saúde suplementar e o novo cenário no processo judicial

27/03/2023

As alterações legislativas (Leis 14.307 e 14.454 de 2022) e a posição fixada pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ (EREsp 1.889.704/SP e EREsp 1.886.929/SP) trouxeram um novo cenário na judicialização da saúde suplementar. 

Tradicionalmente era comum encontrar processos em que as decisões apenas afirmavam genericamente que as operadoras de planos de saúde devem fornecer determinado tratamento em saúde, sem analisar questões fáticas sobre a questão judicializada. 

A nova orientação, contudo, indica claramente a necessidade de haver investigação profunda no processo judicial sobre as evidências científicas do caso clínico, principalmente segurança, eficácia, eficiência e efetividade. 

Neste sentido há várias decisões do STJ, por exemplo: 

AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - PLANO DE SAÚDE - AUTOGESTÃO - NEGATIVA DE COBERTURA DE ASSISTÊNCIA - ROL DA ANS - DELIBERAÇÃO UNIPESSOAL QUE DEU PARCIAL PROVIMENTO À INSURGÊNCIA PARA DETERMINAR O RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA NOVO JULGAMENTO DA CONTROVÉRSIA À LUZ DA DECISÃO EXARADA NOS ERESP 1.886.929/SP E ERESP 1.889.704/SP - INSURGÊNCIA DA AGRAVANTE.

[…] 2. Na presente hipótese, as instâncias ordinárias se limitaram a afirmar que o rol da ANS seria meramente exemplificativo, concluindo pela abusividade da recusa de cobertura, sem observar a efetiva necessidade do procedimento não previsto. Não houve debate acerca de elementos concretos que possam justificar, ou não, a cobertura do procedimento não previsto no rol mínimo de cobertura, mostrando-se necessário o retorno do feito à primeira instância, para novo julgamento da controvérsia à luz da orientação jurisprudencial supracitada.

3. Agravo interno desprovido. [grifado]

(AgInt nos EAREsp n. 1.328.686/DF, relator Ministro Marco Buzzi, Segunda Seção, julgado em 29/11/2022, DJe de 2/12/2022.) 

[…] 3. Hipótese em que o acórdão recorrido está em desarmonia com a orientação desta Corte sobre a natureza do rol de procedimentos e eventos em saúde da ANS, sendo, então, necessário analisar, na espécie, se estão preenchidos os requisitos do item 4, que impõem à operadora a obrigação de cobrir, excepcionalmente, procedimento ou evento não listado no rol e que não seja objeto de contratação de cobertura ampliada nem esteja previsto em aditivo contratual.

[...] forçoso determinar o retorno do processo ao Tribunal de origem, de modo a permitir o reexame dos elementos dos autos e da necessidade de produção de outras provas, a fim de que se realize novo julgamento da apelação com a aplicação da tese firmada pela Segunda Seção.

5. Agravo interno no recurso especial não provido.

(AgInt no REsp n. 2.011.209/RN, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 22/11/2022, DJe de 24/11/2022.) 

 

E também decisões monocráticas, tal qual esta: 

[…] Logo, não houve debate, pelas instâncias ordinárias, acerca de elementos concretos que possam justificar a cobertura do procedimento/medicamento não previsto no rol mínimo de cobertura.

Mostra-se, portanto, temerária a imediata solução do litígio, motivo pelo qual devem ser anulados acórdão e sentença, determinando-se o retorno do feito à primeira instância, para novo julgamento da controvérsia, à luz dos precedentes acima indicados, resguardada a possibilidade de reabertura de instrução processual. […]

2. Do exposto, conheço do agravo (art. 1.042 do CPC/15) para, de pronto, dar parcial provimento ao recurso especial, cassando acórdão e sentença, e determinar o retorno do feito à primeira instância, para novo julgamento da controvérsia, à luz dos precedentes indicados, resguardada a possibilidade de reabertura de instrução processual.

(AREsp 2226460, RELATOR Ministro MARCO BUZZI, PUBLICAÇÃO 20/12/2022)

 

Portanto, o atual cenário exige: 

a) análise fática do caso judicialização;

b) uso de notas técnicas do NatJus (para o caso concreto ou por analogia);

c) apresentação de outras provas técnicas, tais como revisões sistemáticas e estudos sérios acerca das evidências científicas;

d) decisão judicial que enfrenta a eficácia e, principalmente, o desfecho do tratamento judicializado (ou seja, importância do resultado pretendido).

Tal perspectiva é importante para qualificar o debate nos processos judiciais e permitir que as decisões sejam tecnicamente mais adequadas à luz do Direito Sanitário.

 

 

Imagem Ilustrativa do Post: COVID-19 – Ação Integrada SESAI e DSEI MRSA – 29.09 a 05.10.2020, Tefé-AM. // Foto de: Sesai | Ministério da Saúde // Sem alterações

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