REMOTO CONTROLE

25/04/2020

Coluna Direito e Arte / Coordenadora Taysa Matos

Drummond perguntou a José:

“E agora, José?

A festa acabou,

a luz apagou,

o povo sumiu,

a noite esfriou,

e agora, José?

e agora, você?”

[...]

 

Eu lhe pergunto:

 

E você, Maria?

que viu a porta fechar,

aparência cessar,

o social findar

a maquiagem acabar

e a realidade chegar.

 

E você, Maria?

que vive de engano,

que suporta o desamor,

que se contenta com o desvalor,

que se esqueceu até da dor.

 

E você, Maria?

que sonhou com o amor,

que imaginou o sabor,

que sorriu ao som do ardor.

 

Cadê você, Maria?

A mulher guerreira,

arteira,

de palavra firme,

mãos afetuosas,

olhar certeiro

e direção traçada.

 

Perdeu-se nos discursos, Maria?

Entregou-se as promessas?

Acreditou nas desculpas?

Fechou os olhos, fingiu não ver?

Aceitou o inaceitável?

Calou-se para não ouvir?

 

Ah, Maria, e você?

Não há controle,

nem estabilidade.

Não há velhice acompanhada,

nem filhos que justifiquem.

 

Ah, Maria!

O dia e a noite são um só momento,

a escuridão tomou conta do tempo,

a traição é um constante tormento.

A mentira, a companheira diária.

 

Acorda Maria!

A porta fechou,

o leite derramou,

tudo acabou.

 

No lugar da alegria,

somente a dor.

No lugar do carinho,

a mão do horror.

No cristal da beleza,

o vidro despedaçado.

 

Grita, Maria!

chora,

esconde a mancha com pó,

sofre,

geme,

diz que foi só hoje.

Mente...

e acredita que a porta há de se abrir novamente.

 

Mas não esquece, Maria!

Nada será como antes,

nada é só instante.

Após a porta, só o mar e a ilusão,

o sorriso forçado,

o apego ao imaginário,

a incoerência das aparências.

 

E agora, Maria?

Que a realidade chegou,

e o corpo mostrou que o ódio se consumou.

E agora, Maria?

Que a verdade se manifestou,

a paciência se esgotou

e o amor acabou.

 

E você, Maria?

A quem pouco resta.

Que ao cerrar a porta, se deparou com um espelho quebrado,

com sua imagem embaçada,

machucada,

doída,

ferida,

iludida,

mas ainda viva!

E agora, Maria?

 

Foto enviada pela autora

O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

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