A regra geral é a de que todos os bens pertencentes ao executado são passíveis de penhora, sendo que, caso haja alguma exceção, esta deve ser expressa, como, por exemplo, a impenhorabilidade daqueles bens previstos no art. 833 do CPC e na Lei 8.009, de 29.3.1990, que trata do bem de família.
Também é considerado impenhorável o bem de família do Código Civil, ou seja, aquele previsto no art. 1.711,[1] que, aliás, afasta a aplicação da regra da Lei 8.009/90, na hipótese de averbação na matrícula do imóvel.
O rol do art. 833 do CPC estabelece a impenhorabilidade absoluta para os seguintes bens:
- os bens inalienáveis;
- os bens móveis, pertences e as utilidades domésticas, que guarnecem a residência do executado, com exceção daqueles de elevado valor ou os que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida;
- os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor;
- as remunerações, vencimentos, subsídios, salário, honorários de profissional liberal, proventos de aposentadoria, pensões, etc;
- bens móveis necessários ou úteis ao exercício da profissão do executado;
- o seguro de vida;
- os materiais necessários para obras em andamento, salvo se essas forem penhoradas;
- a pequena propriedade rural trabalhada pela família;
- os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social;
- a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 salários-mínimos;
- os recursos públicos do fundo partidário recebidos por partido político, nos termos da lei;
- os créditos oriundos de alienação de unidades imobiliárias, sob regime de incorporação imobiliária, vinculados à execução da obra.[2]
Existem, portanto, limitações à responsabilidade patrimonial, sendo que a sujeitabilidade dos bens à execução não é total, ou seja, nem todos os bens são penhoráveis.
A lei estabelece restrições, especificando os bens que não podem ser atingidos pela penhora.[3]
A impenhorabilidade de bens visa garantir a sobrevivência digna do devedor (pessoa física) ou a sobrevivência da empresa (pessoa jurídica).
A função básica da penhora na execução é a de garantir o juízo, seja por um ato judicial, efetivado por termo nos autos ou por oficial de justiça, apreendendo-se bens do executado ou de terceiro responsável, com a finalidade de satisfazer, direta ou indiretamente, o crédito objeto da execução.
Não se exige que o juízo seja garantido pela penhora para que seja possível ao executado a interposição dos embargos à execução ou impugnação ao cumprimento da sentença.
No entanto, se exige a garantia do juízo (preenchidos os demais requisitos) para a concessão do efeito suspensivo aos embargos à execução[4] ou à impugnação ao cumprimento da sentença.[5]
A penhora tem o condão de dar início à fase do processo que trará ao exequente a satisfação do crédito a que tem direito, pois, esse bem penhorado pertencente ao patrimônio do executado será expropriado e, com isso, pagará a dívida exequenda.
A impenhorabilidade absoluta prevista no art. 833 do CPC não é oponível à execução de dívida relativa ao próprio bem, inclusive àquela contraída para sua aquisição (§ 1º).
A penhora de salários.
Em relação ao salário mensal, no CPC, será admitida a penhora, não só no caso de execução de alimentos, de qualquer natureza, mas também da quantia que exceder a cinquenta salários mínimos (§ 2º do art. 833, CPC).
Assim, quando houver a penhora on-line de ativos financeiros do executado, prevista no art. 854, CPC, o executado não poderá alegar a impenhorabilidade da quantia que exceder a 50 salários mínimos.
Ressalta-se que o limite objetivo de cinquenta salários mínimos não deverá funcionar como regra absoluta.
De acordo com o entendimento já pacificado pela Segunda Seção do STJ, “a remuneração protegida pela regra da impenhorabilidade é a última percebida – a do último mês vencido – e, mesmo assim, sem poder ultrapassar o teto constitucional referente à remuneração de Ministro do Supremo Tribunal Federal. Após esse período, eventuais sobras perdem tal proteção”.[6]
Voltando a tratar do § 2º do art. 833,[7] o avanço legislativo está em reconhecer que o salário não é mais integralmente impenhorável, independentemente na natureza do crédito, embora o limite de 50 salários mínimos continue sendo desproporcional, tendo em vista que a finalidade da impenhorabilidade é a preservação da sobrevivência digna, do “mínimo existencial” garantido constitucionalmente.
Merece destaque outro trecho do § 2º do art. 833, que trata da possibilidade da penhora de salário, independentemente do valor, quando a execução estiver relacionada à natureza alimentar, qualquer que seja a sua origem, inclusive dos honorários advocatícios, conforme prevê o art. 85, § 14 – “Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial”.[8]
O § 2º do art. 833 remete também ao capítulo da execução de alimentos, quanto prevê que a constrição deve observar o disposto no art. 528, § 8º,[9] e no art. 529, § 3º.[10]
Só há que se falar em aplicação dos dispositivos relacionados à execução de alimentos no que diz respeito à penhora de salário para o pagamento de dívidas relacionadas a crédito de natureza alimentar, pois os dois dispositivos a que remete o § 2º do art. 833 dizem respeito à impossibilidade de prisão do devedor de alimentos se o rito escolhido for o de constrição judicial de salário e, ainda, que deve ser preservado o montante de 50% dos ganhos líquidos.
Conclusão.
Apesar de confuso, o § 2º do art. 833 autoriza a penhora de salário em duas situações:
1. Quando se tratar de dívida alimentar: não importa o valor do salário, desde que se respeite 50% do montante líquido percebido pelo executado.[11]
2. Quando a origem da dívida não for alimentar o salário somente pode ser penhorado quando o valor líquido ultrapassar os cinquenta salários mínimos, ou seja, R$ 44.000,00 em valores de março de 2016.
a. Entretanto a limitação aos 50% do que exceder não existe nesse caso. Significa dizer que quaisquer valores que excederem os cinquenta salários mínimos, sobre qualquer forma de remuneração prevista no inciso IV do art. 833.
Respondendo a indagação feita no título desse pequeno ensaio – sim, o salário pode ser penhorado no Novo CPC, mas o legislador poderia ter colocado um valor menor de impenhorabilidade no que diz respeito às dívidas não alimentares.
Notas e Referências:
[1] Do Bem de Família: Art. 1.711. Podem os cônjuges, ou a entidade familiar, mediante escritura pública ou testamento, destinar parte de seu patrimônio para instituir bem de família, desde que não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição, mantidas as regras sobre a impenhorabilidade do imóvel residencial estabelecida em lei especial. Parágrafo único. O terceiro poderá igualmente instituir bem de família por testamento ou doação, dependendo a eficácia do ato da aceitação expressa de ambos os cônjuges beneficiados ou da entidade familiar beneficiada.
[2] Esta hipótese de impenhorabilidade foi incluída pelo CPC.
[3] A penhora produz efeitos de duas ordens: processuais e materiais, que passamos a analisar. Diga-se, desde logo, porém, que são efeitos processuais da penhora: garantir o juízo; individualizar os bens que suportarão a atividade executiva; gerar para o exequente o direito de preferência. De outro lado, são efeitos materiais da penhora: retirar do executado a posse direta do bem penhorado; tornar ineficazes os atos de alienação ou oneração do bem apreendido judicialmente.
[4] Art. 919. Os embargos à execução não terão efeito suspensivo. § 1º O juiz poderá, a requerimento do embargante, atribuir efeito suspensivo aos embargos quando verificados os requisitos para a concessão da tutela provisória e desde que a execução já esteja garantida por penhora, depósito ou caução suficientes; e § 5º A concessão de efeito suspensivo não impedirá a efetivação dos atos de substituição, de reforço ou de redução da penhora e de avaliação dos bens.
[5] Art. 525, § 6º A apresentação de impugnação não impede a prática dos atos executivos, inclusive os de expropriação, podendo o juiz, a requerimento do executado e desde que garantido o juízo com penhora, caução ou depósito suficientes, atribuir-lhe efeito suspensivo, se seus fundamentos forem relevantes e se o prosseguimento da execução for manifestamente suscetível de causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação; e § 7º A concessão de efeito suspensivo a que se refere o § 6º não impedirá a efetivação dos atos de substituição, de reforço ou de redução da penhora e de avaliação dos bens.
[6] STJ, EREsp 1.330.567/RS, 2ª Seção, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 10.12.2014, DJe 19.12.2014.
[7] O salário e a quantia depositada em poupança podem ser penhorados para pagamento de prestação alimentícia. O § 2o do art. 833 diz que deve ser observado o disposto no § 3o do art. 529, portanto, tratando-se de prestação alimentícia, pode ser descontado dos rendimentos do executado não só as parcelas vincendas como também o débito vencido, de forma parcelada e desde que o total do desconto não ultrapasse 50% de seus ganhos líquidos.
[8] Entre as outras origens possíveis para a verba de natureza alimentar, estão os honorários advocatícios, contratuais ou sucumbenciais, consoante já decidiu reiteradas vezes o Superior Tribunal de Justiça: REsp 1.152.218/RS, Corte Especial, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 07.05.2014, DJe 09.10.2014 e EREsp 706.331/PR, Corte Especial, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 20.02.2008, DJe 31.03.2008. Existe previsão expressa no sentido de tratar-se de verba de natureza alimentar no art. 85, § 14, do CPC.
[9] Art. 528. No cumprimento de sentença que condene ao pagamento de prestação alimentícia ou de decisão interlocutória que fixe alimentos, o juiz, a requerimento do exequente, mandará intimar o executado pessoalmente para, em 3 (três) dias, pagar o débito, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo. (…) § 8º O exequente pode optar por promover o cumprimento da sentença ou decisão desde logo, nos termos do disposto neste Livro, Título II, Capítulo III, caso em que não será admissível a prisão do executado, e, recaindo a penhora em dinheiro, a concessão de efeito suspensivo à impugnação não obsta a que o exequente levante mensalmente a importância da prestação. – destacamos.
[10] Art. 529. Quando o executado for funcionário público, militar, diretor ou gerente de empresa ou empregado sujeito à legislação do trabalho, o exequente poderá requerer o desconto em folha de pagamento da importância da prestação alimentícia. (…) § 3º Sem prejuízo do pagamento dos alimentos vincendos, o débito objeto de execução pode ser descontado dos rendimentos ou rendas do executado, de forma parcelada, nos termos do caputdeste artigo, contanto que, somado à parcela devida, não ultrapasse cinquenta por cento de seus ganhos líquidos. – destacamos.
[11] Enunciado 587 do FPPC. (arts. 529, §3º; 833, IV e § 2º; 528, §8º) A limitação de que trata o §3º do art. 529 não se aplica à execução de dívida não alimentar. (Grupo: Cumprimento de sentença e execução).
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