Prova técnica simplificada nas lides empresariais, o impacto no custo do processo e os desafios do Advogado

10/05/2018

Cotidianamente nos preocupamos com os custos de transação que norteiam nossa atividade, raciocínio cabível para a advocacia, para o empresário e para todos que empreendem no Brasil.

Encontrar técnicas menos onerosas para reduzir os custos da atividade, aqui entendidos como custos de transação na linguagem econômica é fundamental para dar estabilidade ao negócio. O objetivo do texto é trazer uma abordagem no que diz respeito ao gerenciamento dos custos do processo, a partir da leitura sobre a prova técnica simplificada em matéria empresarial e o que isso representa para advocacia.

Como dito em outra oportunidade, o processo judicial nas palavras de Cooter e Ulen é desnecessariamente complicado e dispendioso diante de diferentes regras e práticas complexas que respondem ou procuram responder ao direito. O uso do processo tem um custo, chamado “custo administrativo”, além do que, a utilização desta porta de acesso, poderá causar erros na aplicação do direito e, portanto, seja em decorrência do custo administrativo, ou do erro, o processo judicial impõe custos à sociedade, entendidos como custos sociais.

Na realidade, como afirmam, os tribunais possuem informações imperfeitas (assimetria informacional), o que faz com que cometam erros na aplicação do direito.

Ao dedicarem uma teoria econômica ao processo judicial, esclarecem que a melhor solução, menos impactante em termos de custos sociais, é a solução do litígio pelo acordo, como forma de poupar os respectivos custos[i].

O tema probando sempre despertou muita atenção, considerando-se que são as afirmações o “objeto da prova”. Ela, a prova, tem como destinatário o juiz ou o árbitro, tratando-se da Jurisdição Estatal ou Arbitral, respectivamente.

No artigo publicado nesta coluna no dia 05 de abril de 2018 tratamos sobre a prova pré-programada nos contratos interempresariais, com o objetivo de pré-programar a prova antes da instauração do litígio, bem como exercer o controle no tocante a valoração da prova, pois a legislação brasileira não dedicou conteúdo legal de base científica para valorar a prova, independentemente da sua modalidade, permanecendo-se o conteúdo aberto do artigo 371[ii] do CPC, por meio do qual se estabelecem limites ao poder instrutório do juiz, cujo freio está no princípio da motivação e na necessidade de enfrentamento dos argumentos relevantes trazidos pelas partes que possam repercutir no resultado da demanda (artigos 9º, 10º e 489, parágrafo 1º, inciso IV[iii]).

Aliás, é realmente uma pena, como ressalva, que o artigo 489, parágrafo 1º, inciso IV do CPC enfrente tanta resistência, a partir de interpretações que ferem todas as razões da sua existência, devendo-se combater com veemência as decisões judiciais que concluem pela suficiência de se encontrar um ou mais argumentos relevantes e a partir dele (s), dar sustentação às razões de decidir. Isso fere o direito fundamental ao contraditório, a ampla defesa e ao devido processo legal, bem como os dispositivos processuais que exigem o enfrentamento de todos os argumentos capazes de influir no resultado útil do julgado.

Como, então, julgar, utilizando-se apenas de um ou mais argumentos, desprezando-se os demais?  É evidente que o entendimento sobre a relevância ou não do argumento pressupõe o seu exame, a sua avaliação e a sua contextualização com a lide, não sendo útil o desprezo ou a omissão. Isto porque, não se mostra crível deixar o jurisdicionado a mercê de um ato discricionário de escolha por esse ou aquele argumento, cuja conduta resultará em práticas muito piores e, ainda, mais danosas do que aquelas até então evidenciadas sob a égide do CPC/73.

Sempre pautamos uma preocupação imensa quanto ao comportamento do julgador, mas também devemos voltar os olhos para o exercício da advocacia. Exercer a advocacia no Brasil é para poucos, apesar da imensa massa de profissionais lançados no mercado ano-a-ano, muitos à deriva, com imensa dificuldade de atribuir valor ao seu precioso ofício.

É fato que o advogado deverá estar preocupado com os custos que o processo representa ao seu cliente e como lançar mão de estratégias para reduzi-los. Esse é o desafio. Um grande desafio para uma atividade meio, pois que a estratégia traçada poderá conduzir a erro e o benefício esperado transformar-se em custos inesperados ou não planejados. Carregar a incerteza da estratégia é quase que trazer o conceito de incerteza da economia. Assim, como confiar que, em determinada lide empresarial, ou qualquer outra que seja, a prova técnica simplificada resolverá? Como confiar que a prova pericial complexa resolverá? Como pensar que a prova documental será suficiente? Como ter a coragem de confiar em uma prova, dispensando-se, por exemplo, a prova oral? Como administrar tantas incertezas e passar confiança ao cliente, ao meio de tantos vazios? É sim, de esperanças que vivemos e do amor pelo direito, do contrário não há como navegar em águas tão escuras e densas. Esperança de que a tese alegada ao menos será avaliada e que os argumentos repercutirão, seja para aceitá-los ou refutá-los. Isso ao menos traz um alento, cabendo ressalvar, tantas e quantas explicações já foram dadas, no curso da carreira, a respeito do desprezo de argumentos relevantes. A vida do advogado, gratificante pelo que representa, bela na expressão de sua fé e na missão colaborativa com a justiça, mas arranhada, cotidianamente, em suas razões.

Isso tudo para dizer que é possível enxergar a prova técnica simplificada como uma estratégia para a redução dos custos de transação, pois se utilizar da prova pericial para situações de baixa complexidade não é razoável, por outro lado, é preciso confiar na parcela  gerencial do conflito que compete ao juiz e pré-entender o seu comportamento, inclusive,  sobre a maneira como conduz/induz a prática forense, missão difícil, outro encargo do advogado, levando-se em consideração o espelho das decisões e a vivência.

O artigo 464 do CPC estabelece que: A prova pericial consiste em exame, vistoria ou avaliação (...). § 2o De ofício ou a requerimento das partes, o juiz poderá, em substituição à perícia, determinar a produção de prova técnica simplificada, quando o ponto controvertido for de menor complexidade. § 3o A prova técnica simplificada consistirá apenas na inquirição de especialista, pelo juiz, sobre ponto controvertido da causa que demande especial conhecimento científico ou técnico. § 4o Durante a arguição, o especialista, que deverá ter formação acadêmica específica na área objeto de seu depoimento, poderá valer-se de qualquer recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens com o fim de esclarecer os pontos controvertidos da causa.

Pelo teor do citado artigo a prova técnica simplificada parece se resumir a oitiva de um especialista, que costuma ser chamado de “testemunha técnica”. Por este viés, caso o ponto controvertido for de natureza contábil, um contador especializado será ouvido; se for de natureza da gestão, um consultor em administração será ouvido; se for de natureza médica, um médico; de engenharia, um engenheiro e, assim, continuamente.

Apesar da expressão legal, a oitiva do especialista em audiência não pode ser entendida restritivamente, permitindo-se a ele, antes da respectiva audiência tomar conhecimento do ato ou fato a respeito do qual deverá prestar esclarecimentos especializados. Por exemplo: ao engenheiro, constatar in loco se a obra está em conformidade com a planta, quando se tratar de mera verificação, e não de questões de elevada indagação, por exemplo, no tocante a qualidade da obra ou dos materiais empregados ou, ainda, que envolva quesitos de grande ou relativa complexidade. Nas lides empresariais, societárias ou contratuais, que dependam do esclarecimento, de um ou outro ponto do balanço patrimonial, nada impede a utilização de um consultor especializado na área, podendo ser contador, administrador ou economista, que terá acesso ao balanço e esclarecerá quanto ao ponto controvertido de menor complexidade, em audiência.

A regra aqui descrita está em consonância com a essência do CPC/2015, no contexto de um novo profissional e de uma nova forma de realizar o direito, a partir de incentivos para uma mudança comportamental, ancorada em um processo comparticipativo, onde a cooperação é a regra (CPC, art. 6º[iv], 139, VI, 190 e 373, parágrafo 1º). Assim, poderá o juiz, em conjunto com as partes, definir sobre a dimensão da análise, das iniciativas e dos trabalhos do consultor técnico especializado, sempre que a questão se enquadre no conceito de menor complexidade, do contrário, inaplicável será a respectiva regra processual.  

Nas demandas empresariais, onde prevalece o princípio da autonomia privada, invariavelmente, os direitos em discussão comportam autocomposição. Nesse contexto, é possível a utilização máxima das regras processuais aqui pontuadas, que podem ser objeto do negócio jurídico processual, prévio ou no curso da demanda, nos termos do que dispõe o artigo 190 do CPC, bastante flexível para a regulação de negócios processuais atípicos.

Referências

[i] COOTER, Robert; ULEN, Thomas. Direito & economia. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2010. p. 405-406.

[ii] Art. 371.  O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento.

[iii] Art. 9o Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida. Parágrafo único.  O disposto no caput não se aplica: I - à tutela provisória de urgência; II - às hipóteses de tutela da evidência previstas no art. 311, incisos II e III; III - à decisão prevista no art. 701.

Art. 10.  O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.

Art. 489 (...)

1o Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: (...)

IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador.

[iv] Art. 6o Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.

 

Imagem Ilustrativa do Post: Tunnel // Foto de: Hernán Piñera // Sem alterações

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