Foi publicada no DOU em 18.06.2024 e entrou em vigor na mesma data a Lei n. 14.899 que dispõe sobre a elaboração e a implementação de plano de metas para o enfrentamento integrado da violência doméstica e familiar contra a mulher, da Rede Estadual de Enfrentamento da Violência contra a Mulher e da Rede de Atendimento à Mulher em Situação de Violência, bem como altera a Lei nº 13.675/18, para determinar que o Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública, Prisionais, de Rastreabilidade de Armas e Munições, de Material Genético, de Digitais e de Drogas (Sinesp) armazene dados e informações para auxiliar nas políticas relacionadas com o enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a mulher.
Como é cediço, a violência doméstica e familiar contra a mulher é um problema persistente e complexo, que afeta uma grande quantidade de mulheres em todo o Brasil, atingindo dimensões epidêmicas. Dados alarmantes revelam a gravidade dessa questão, que necessita de uma abordagem integrada e eficaz para ser enfrentada. Segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2023 foram registradas cerca de 230 mil denúncias de violência doméstica, com um aumento significativo durante a pandemia de COVID-19. A Lei Maria da Penha, sancionada em 2006, foi um marco na proteção dos direitos das mulheres, estabelecendo medidas de prevenção e punição para os agressores. No entanto, apesar dos avanços, a implementação de políticas públicas eficazes ainda enfrenta desafios significativos.
A Lei Maria da Penha define a violência doméstica e familiar contra a mulher como qualquer ação ou omissão baseada no gênero que cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico, e dano moral ou patrimonial. Entre suas disposições, destacam-se as medidas protetivas de urgência, que visam garantir a segurança imediata da vítima, e a criação de Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, especializados no julgamento de casos dessa natureza.
Nesse contexto, a promulgação da Lei nº 14.899, de 17 de junho de 2024, representa um avanço significativo na busca por soluções concretas e coordenadas. A referida lei estabelece a elaboração e implementação de um plano de metas específico, além de instituir a Rede Estadual de Enfrentamento da Violência contra a Mulher e a Rede de Atendimento à Mulher em Situação de Violência.
A Lei nº 14.899/24 introduz a necessidade de elaboração e implementação de um plano de metas decenal para o enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a mulher. Essa abordagem estratégica é essencial para garantir a continuidade e a eficácia das políticas públicas, promovendo um monitoramento contínuo e a adaptação das ações conforme necessário.
O plano de metas deve ser atualizado a cada dois anos, permitindo a avaliação dos resultados e o ajuste das estratégias. Além disso, a lei condiciona o acesso aos recursos federais relacionados à segurança pública e aos direitos humanos à apresentação regular dos planos de metas pelos entes federativos. Essa vinculação é uma medida importante para assegurar o comprometimento das autoridades locais com a causa.
A Lei nº 14.899/24 também institui a Rede Estadual de Enfrentamento da Violência contra a Mulher e a Rede de Atendimento à Mulher em Situação de Violência, que devem ser compostas conforme os termos da Lei Maria da Penha. Essas redes são fundamentais para a articulação entre os diversos órgãos públicos e organizações da sociedade civil envolvidos no atendimento e proteção das vítimas.
A composição dessas redes pode incluir órgãos de segurança, saúde, justiça, assistência social, educação e direitos humanos, bem como organizações da sociedade civil, estrutura que permite uma abordagem multidisciplinar e integrada, essencial para lidar com a complexidade da violência doméstica e familiar. Além disso, a integração entre os diferentes setores facilita o compartilhamento de informações e a coordenação de ações, proporcionando um atendimento mais eficaz e humanizado às vítimas.
Nesse sentido, a Lei nº 14.899/24 detalha os componentes essenciais que devem ser incluídos nos planos de metas. Entre eles, destacam-se:
Ações de Formação e Treinamento: a inclusão de ações integradas de formação e treinamento contínuo para os profissionais envolvidos é crucial. A capacitação adequada dos recursos humanos garante que os atendentes estejam preparados para lidar com as vítimas de maneira sensível e eficaz.
Inclusão de Disciplina Específica nas Instituições Policiais: a lei determina a inclusão de disciplinas específicas sobre o enfrentamento da violência doméstica e familiar nos cursos regulares das instituições policiais. Esse treinamento deve abranger técnicas de busca ativa, abordagem, encaminhamento e atendimento humanizado.
Expansão das Delegacias de Atendimento à Mulher: a criação de novas delegacias de atendimento à mulher, especialmente em regiões geográficas mais vulneráveis, é essencial para facilitar o acesso das vítimas aos serviços de proteção e apoio.
Monitoração Eletrônica de Agressores: a implementação de programas de monitoração eletrônica para agressores e acompanhamento das vítimas é uma medida preventiva importante, ajudando a garantir a segurança das mulheres em situação de violência.
Reeducação e Acompanhamento Psicossocial dos Agressores: a reeducação e o acompanhamento psicossocial dos agressores são fundamentais para romper o ciclo de violência e prevenir a reincidência.
Expansão dos Horários de Atendimento: a ampliação dos horários de atendimento dos institutos médicos legais e outros órgãos de atendimento à mulher garante que as vítimas possam receber assistência em qualquer momento de necessidade.
Campanhas Educativas: a realização de campanhas educativas é crucial para conscientizar a sociedade sobre a gravidade da violência doméstica e familiar e promover uma cultura de respeito e igualdade de gênero.
Articulação das Redes de Atendimento: a articulação entre as diferentes redes de atendimento em nível municipal, estadual e regional é fundamental para garantir a eficácia das ações e o suporte adequado às vítimas.
Importante ressaltar, ademais, que a Lei nº 14.899/24 também altera a Lei nº 13.675/18 para garantir a interoperabilidade dos dados e informações relacionados à violência doméstica e familiar, integrando o Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública (Sinesp) com o Registro Unificado de Dados e Informações sobre Violência contra as Mulheres, conforme a Lei nº 14.232/21 (que institui a Política Nacional de Dados e Informações relacionadas à Violência contra as Mulheres – PNAINFO). A interoperabilidade dos sistemas é essencial para o compartilhamento de informações precisas e atualizadas, facilitando a formulação de políticas públicas eficazes e a coordenação das ações de enfrentamento.
Por fim, a promulgação da Lei nº 14.899/24 representa um avanço significativo no enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a mulher no Brasil. A exigência de elaboração e implementação de planos de metas decenais, juntamente com a criação da Rede Estadual de Enfrentamento da Violência contra a Mulher e da Rede de Atendimento à Mulher em Situação de Violência, oferece uma estrutura robusta para coordenar as ações e promover a proteção das vítimas. Nesse contexto, o compromisso dos entes federativos com a implementação dos planos de metas e a integração dos sistemas de informação são passos fundamentais para a eficácia das políticas públicas, propiciando o engajamento de toda a sociedade na luta contra a violência doméstica e familiar, promovendo a conscientização e a cultura de respeito e igualdade de gênero.
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