Perspectiva histórica acerca da tutela dos direitos e garantias fundamentais (e do próprio processo penal) e algumas breves ponderações sobre a Inquisição - Por Jorge Coutinho Paschoal

20/10/2016

Por Jorge Coutinho Paschoal – 20/10/2016

A vida do direito é uma luta: luta dos povos, do Estado, das classes, dos indivíduos. Todos os direitos da humanidade foram conquistados na luta; todas as regras importantes do direito devem ter sido, em sua origem, arrancadas àqueles que a elas se opunham, e todo o direito, direito de um povo ou direito de um particular, faz presumir que alguém esteja decidido a mantê-lo com firmeza”[1] (...) “... o nascimento do direito, como o dos homens, tem sido, uniformemente, acompanhado das vivas dores do parto[2]

Sem fazer digressões desnecessárias, pode-se afirmar que, antes do Cristianismo, não havia concepção frutífera, que incutisse entre os indivíduos a noção e o valor de respeito ao ser humano pelo simples fato de ser o que ele é, uma pessoa[3]. Foi com o Cristianismo que surge a noção de pessoa e de unidade do gênero humano, passando a igualdade a se tornar um critério de tratamento[4]. A esse respeito, ensina Ada Pellegrini Grinover que “é com o Cristianismo, através do conceito de transcendência da moral, da pessoa e de seu valor intrínseco, que o homem é visto como fim e não como meio, feito à imagem e semelhança de Deus”[5].

Segundo expõe Jorge Miranda, o Cristianismo veio implodir as bases que sustentavam a sociedade romana, por colocar o homem dentro de uma nova posição na comunidade política, contestando o caráter sagrado do Imperador, haja vista a valorizaçãode cada pessoa pelo valor intrínseco que ostenta, já que criada à imagem e semelhança de Deus[6].

João Mendes de Almeida Júnior expõe que: “O espírito do cristianismo vai penetrando nas instituições. Constantino proclama a igualdade dos acusados, perante a justiça (L 1, Cod. Theod.,de accusat). Graciano restringe os tormentos mesmo em relação aos escravos; aliás, já Deoclesiano os tinha restringido aos casos graves e de graves indícios (L. 8 Cod. dequaest.; L. 10 Cod . Theod.,de accusat). O mesmo Graciano proíbe prolongar a prisão preventiva (L. 6. Cod. Theod.,de custodia reorum). Constantino, Gaciano, Honório e Teodósio regulam o regime penitenciário e impõem a visita de inspeção das prisões. Valentiniano inicia o sistema das anistias e perdões no dia da paixão de NOSSO SENHOR JESUS CRISTO. Justino e Justiniano conferem aos bispos o direito de inspeção das prisões e dos processos e a fiscalização da administração da justiça[7].

A conscientização rumo a uma maior humanização das instituições obviamente não ocorreu de forma repentina. O progresso evolutivo – como bem mostra a experiência acumulada ao longo dos tempos -, não se faz por saltos[8], mas, muito ao contrário, se dá paulatinamente, através de um longo percurso, com muitas pedras e espinhos no caminho.

Nesse sentido, mesmo com a queda do Império Romano, pode-se dizer que a invasão da Europa pelos povos germânicos não trouxe maior progresso; os bárbaros tendiam a resolver seus conflitos mediante o uso da vingança de sangue, a qual acabou sendo substituída pelas ordálias, práticas não menos violentas, utilizadas como meio de verificação da verdade, colocando-se o próprio corpo do imputado à prova. João Mendes ensina, a respeito, que “as ordálias consistiam ou em ficar durante um certo tempo n’água, sem asfixiar-se, ou em mergulhar o braço em água fervente, ou em tocar com as mãos um ferro quente, etc”[9].

Se o direito germânico já era em si violento e cruel, a justiça aplicada às classes mais pobres, pelos senhores feudais (justiça feudal), não era melhor, já que deixados ao mais completo arbítrio[10]. Pode-se dizer que, por influência do direito canônico, houve avanço, em parte, com a gradativa superação das ordálias, que submetiam o investigado a duras provas físicas, - comumente, bem pouco lógicas[11] - das quais saía com feridas, inválido (quando não morresse)[12]. Assim, a supressão dos “juízos de Deus” representou um inegável progresso em relação ao que existia antes.

Como destaca Karl Heinz Gössel, com o direito canônico houve a previsão de novos institutos destinados a proteger o imputado contra persecuções arbitrárias[13].

Instituiu-se, inicialmente, a obrigatoriedade da inspeção judicial e perícia médica para constatar os traços materiais deixados pelo crime de homicídio, não podendo a prova ser suprida pela confissão, conferindo inquestionável garantia[14].

Apesar de ser criticado o sigilo, Ada Pellegrini Grinover discorre que, em um primeiro momento, ele foi instituído justamente para proteger os cidadãos: “o segredo foi utilizado não apenas para assegurar o bom êxito das investigações, mas também para evitar que os humildes fossem vítimas da cólera dos poderosos, e que os homens de bem sofressem na boa fama; o processo secreto foi documentado pela redução a escrito de todos os seus atos (quod non est in actis non est in mundo)”[15].

Se houve alguns avanços com o direito canônico, foram provisórios. O sigilo, então usado para proteção, depois foi empregado em prejuízo do indivíduo. A obrigatoriedade quanto à inspeção (a garantia do exame de corpo de delito) passou a ser cada vez mais dispensável, sendo em muito relativizada. Houve, por seu turno, diversos retrocessos, com a permissão da tortura, em 1252, como meio de obtenção de prova, a qual, como observa José Reinaldo Lima Lopes, implicou o retorno à irracionalidade típica das provas das ordálias, pois, com os suplícios, acreditava-se “que o justo seria capaz de passar pela tortura e resistir a ela sem confessar”, não deixando de constituir a tortura, a seu modo, também “uma prova à moda antiga[16].

Relata Rogério Lauria Tucci que são de triste memória[17] os processos inquisitoriais dos Tribunais do Santo Ofício, instituídos pela Igreja. A Inquisição, por meio de processo cujo nome ficou conhecido como inquisitorial (canônico), – em procedimento sigiloso e ardiloso, em que havia enorme concentração de poderes na figura do juiz inquisidor, e no qual, em regra, inexistia maiores possibilidades de defesa - chancelou várias atrocidades indefensáveis em um Estado de Direito que se fundamente pelo respeito ao indivíduo.

Por isso mesmo, ela é vista e descrita como uma instituição opressora e violenta, o que é um dado correto, sendo imprescindível lembrar e discutir a respeito dessa triste parte da história, para que tais barbaridades não voltem a ocorrer. Nesse sentido, o modelo de processo de cunho inquisitorial (sobretudo o canônico, já que é dele que se tem um maior registro histórico) serviu de exemplo para ilustrar tudo o que o processo penal não deve ser.

Sendo assim, muitos dos princípios que modernamente são ínsitos a um processo penal justo foram previstos e passaram a ser cultivados para evitar os abusos e os crimes praticados pelos agentes nos tempos da Inquisição. Seja como for, um pequeno aparte é necessário neste ponto da história. Apesar das críticas ao processo canônico, por meio da Inquisição, não se pode jogar em suas costas a culpa por tudo de mau, abusivo, iníquo e de arbitrário que ocorreu ao longo da história do processo penal.

O processo inquisitorial já existia muito antes da Inquisição, havendo, desde há muito tempo, largo emprego da tortura, já nos tempos da Antiguidade[18], adotada por todos os povos e civilizações do período. Esclarecedoras são as assertivas de Valéria Scarance Fernandes:

Na Antiguidade, os tormentos eram largamente empregados como pena corporal no Egito, na Grécia, em Roma, na Índia, na China e entre os povos germanos. Existiam diversas legislações que autorizavam e disciplinavam os suplícios. A famosa Lei de Talião, conhecida pela frase ‘olho por olho, dente por dente’, datada de 2000 a.C., autorizava a intervenção corporal na medida do gravame. Não obstante previsse expressamente a reação da parte ofendida, trazia em seu espírito o importante e então inusitado aspecto da proporcionalidade entre o mal causado. Esse princípio constava do Código de Hamurábi,que permitia a empalação, a fogueira, a amputação e a quebra de ossos. Na China, havia as conhecidas cinco penas, ou seja, ‘o homicídio penalizado com a morte, o furto e as lesões penalizados com a amputação de um ou ambos os pés, o estupro com a castração, a fraude com a amputação do nariz e os delitos menores com uma marca na testa’. Posteriormente, criaram-se penas mais cruéis, como ‘abraçar uma coluna de ferro incandescente, esquartejamento, tortura, açoitamento, espancamento, distintas formas de pena de morte, furar os olhos com ferro candente e, especialmente, a extensão do castigo à família do autor’”[19] (...) “No Egito (...) no caso de condenação, o acusado era preso e conduzido para o tormento previsto na lei. Considerava-se a acusação um dever cívico das testemunhas, ‘obrigadasa denunciar o crime e prosseguir na accusação, sob pena de umas tantas bastonadas’ (...) Havia penas de morte, simples ou qualificada (mediante tortura), mutilação, desterro, confisco, escravidão, trabalho forçado e maldição. Na Palestina, havia o Tribunal dos Vinte e Três e o Sinédrio, com hierarquia entre si, sendo que o último era o órgão supremo. Existiam penas pecuniárias, de morte (por lapidação, fogo, decapitação, estrangulamento), de flagelação e excomunhão. Os relatos históricos levam a crer que para os hebreus os suplícios eram utilizados somente como penas”[20] (...) “Na Grécia (...) a tortura probatória ‘era aplicada não só aos escravos como também a cidadãos livres e estrangeiros e descrita por Demóstenes como um meio seguro de obter evidências’. Em Roma (...) introduziu-se formalmente a tortura pela Cognitio Extra Ordinee ‘a princípio torturavam-se o réu. Depois, não só o réu como também as testemunhas para que falassem a verdade. Havia alguns privilégios em razão da classe dos acusados, como os soldados. Com o Cristianismo, foi minimizada a aplicação da tortura. Os romanos desenvolveram vários métodos de tortura, muito empregada com finalidade provatória (quaestio)”[21].

A própria justiça secular, na Idade Média - da mesma forma que a justiça dos povos bárbaros - foi extremamente violenta e cruel[22], sendo tão ou mais arbitrária que a própria justiça eclesiástica instituída nos Tribunais da Inquisição.

João Bernardino Gonzaga, um dos maiores estudiosos do assunto em nosso país, afirma que a Igreja sempre foi hostil à utilização de violência nas investigações; foi no século XIII que a tortura ingressa nos seus domínios, recurso que já era prática usual do direito comum, sendo que o direito canônico acolheu a medida com cautelas, mediante “condições muito mais suaves, portanto, do que as vigorantes na Justiça secular”[23]; por “muitos séculos, após a queda do Império Romano, o Direito laico desconheceu os suplícios como instituição oficial, o que não significa contudo sinal de brandura. Ninguém negará que as práticas punitivas dos povos chamados ‘bárbaros’ fossem violentas, e outro tanto terá ocorrido no regime feudal onde, excetuadas as castas superiores, o homem comum ficava inteiramente entregue aos caprichos do seu senhor, sem forma nem figura de Juízo”[24].

Aliado aos trabalhos técnicos apresentados, em análise bastante ponderável, evidencia-se, de certo modo, a incongruência em se criticar, duramente, a Inquisição, mas, ao mesmo tempo, fecharem-se os olhos para o terror e banho de sangue que representou, por exemplo, a Revolução Francesa. Julga-se a Inquisição com os olhos de hoje, mas se esquece que há todo um contexto histórico que não deve nem pode ser desprezado, sob pena se de perder cientificidade que deve vigorar na análise crítica que deve nortear o estudo do Direito na História.

“Professor (a), não havia tortura antes da Inquisição? - Professor (a), governos laicos também não torturavam? – Professor (a), o mundo antes da Igreja Católica era melhor e mais justo? (...). A Igreja tem de arcar com seus excessos (...). Mas o fato é que a Inquisição tinha mais critério e cuidados do que os governos laicos em seus interrogatórios. A Inquisição ibérica, especialmente a espanhola, fugiu ao controle de Roma. Ainda assim, documentação do Vaticano — que se desculpou — dá conta de que, em 125 mil processos, menos de 2% dos acusados foram condenados à morte. Em seis séculos! (...) Não estou estabelecendo uma hierarquia de assassinatos. Só estou dizendo que é preciso ver a coisa em seu tempo. Isso não é relativismo. É história. Ou, agora, chamaremos de ‘injusta’ a democracia grega porque excluía as mulheres, os escravos e os pobres? E a ação da Igreja Católica tem de ser vista à luz do que era a cultura política e jurídica do seu tempo. (...) Sempre tomando os chamados ‘direitos humanos’ como referência, pergunta-se: um inquisidor dos séculos 15, 16 ou 17 tinha de seus ‘crimes’ a mesma consciência que tinham de seus respectivos um Stálin ou um Hitler? Não! E a razão é simples: ‘direitos humanos’ também são humanas construções. O estoque de pensamento, nessa área, era muito maior, mais rico e mais variado no tempo em que viveram os dois ditadores do que naquele vivido pelos inquisidores. ‘Sei, então a Igreja Católica está livre de pecados!?’. Não! Não darei a ela o benefício que os próprios papas, ao longo do tempo, não deram. Só que é preciso saber também quem acusa, não é? Acabei de ler, por razões profissionais, uns tantos livros de história. Os professores estão dizendo aos alunos, por exemplo, que, da Revolução Francesa, restou o ideal de ‘liberdade, igualdade e fraternidade’. E, da Igreja, a Inquisição. Trata-se de uma falácia gigantesca. E o Terror jacobino? E as execuções sumárias praticadas inclusive por seus próprios pares? E o Império Romano pré-cristão?[25].

Não se pode julgar, condenar e, em alguns casos, até demonizar a Inquisição (e, por via reflexa, pretender jogar no lixo toda a história da Igreja Católica[26]), sem que se leve em conta o contexto histórico da época.

“Apresenta-se induvidoso o fato de que a Inquisição foi opressora, violenta, e nisso possuem inteira razão seus acusadores. São todavia especialmente delicadas as situações em que uma posição doutrinária se assenta em bases corretas, mas depois se desgarra, cumprindo então verificar em que ponto do caminho ela deixou de estar com a verdade. Comecemos lembrando que constitui erro crasso, se não má fé, julgar, à luz das circunstâncias atuais, um episódio histórico que viveu sob o domínio de outras circunstâncias, subjetivas e objetivas, totalmente diferentes. Em trabalhos recentes, lemos que a Inquisição reduziu todo o povo a uma ‘escravidão moral e intelectual’; acusam-na de ‘dogmatismo’, de ‘patrulhamento ideológico’, de ‘manipuladora de consciências’, de se arrogar a posição de ‘única detentora da verdade’; e nesse tom segue todo o palavreado que faz sentido hoje, mas que deve ser utilizado com muito comedimento e sob outros enfoques nas antigas épocas do mundo”[27].

A Inquisição deve ser lida e analisada em seu tempo, imerso em um contexto de violência e grande misticismo, como observa Aury Lopes Júnior[28].

Foi justamente esse ambiente, propício a uma série de abusos, que caracterizou a Idade Média e o Antigo Regime, no qual surgem os Estados Absolutistas, com sua justiça implacável, em tudo arbitrária e violenta[29]. De todo modo, ainda que o Absolutismo tenha se mostrado ainda hostil ao indivíduo, deve-se ponderar que ele cumpriu ao menos uma função: ofereceu mais de segurança (ainda que mínima) aos cidadãos, tanto do ponto de vista jurídico (unificação da legislação, absolutamente confusa e diversificada, à época[30]) quanto físico (proteção das pessoas pelos órgãos de segurança externa e interna)[31].

Contudo, inquestionável que o indivíduo continuava distante das preocupações do soberano. Na verdade, o cidadão era visto como mero súdito, um servo do rei, cujo poder ilimitado constituía a personificação do Estado (the king can do no wrong)[32], o que dava ensejo a todo tipo de abusos e arbitrariedades.

O cidadão reduzia-se a simples objeto de poder do soberano[33], o que influenciava a própria concepção que se tinha a respeito do direito da época e, também, como não poderia deixar de ser, da ideia de processo, sendo natural, para os olhos daqueles tempos, que houvesse concentração de poderes nas mãos do juiz (inquisidor).

Na verdade, o processo então vigente nada mais refletia um espelho do modelo de Estado da época, de cunho despótico[34].Frente aos abusos decorrentes do poder absoluto, ainda que de forma incipiente, foram surgindo documentos importantes, reconhecendo direitos, com o objetivo de limitar o poder estatal.

Entre os principais, podem ser citados os de origem inglesa, como a Magna Carta outorgada por João Sem-Terra, em 1215, o PetitionofRight, de 1628, o Habeas Corpus Act, de 1679, o Bill ofRights, de 1689, bem como o ActofSettlement, de 1701[35].

Não obstante o avanço alcançado com todos esses documentos, foi só com o Iluminismo que veio mesmo o golpe fatal contra o Antigo Regime, ao posicionar o homem no centro das preocupações do Estado, sendo ressaltado que o Estado se fundamenta e se justifica em função do indivíduo, e não o contrário. Foi com o Iluminismo que, de forma mais gritante, os ideais de igualdade ganharam maior ressonância, tornando-se um ponto essencial até mesmo para a própria organização estatal[36].

Foi se sedimentando o postulado de que a liberdade não precisa ser justificada; na verdade, o que precisaria de justificação seria justamente a sua restrição.

Nesse contexto propício ao culto das liberdades, direitos passaram a ser inscritos em declarações e cartas políticas, sendo pioneiros, nessa seara, os norte-americanos, com sua Declaração de Direitos (Bill of Rights), datada de 1776. Depois vieram os franceses, com seus “ideais revolucionários”[37], que tiveram grande importância para disseminação dos direitos humanos, com a sua Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, texto similar às Declarações estadunidenses, conforme observa a doutrina[38].

No início do século XX, com o florescimento do constitucionalismo, o conteúdo das principais declarações de direitos humanos veio a ser positivado nas Constituições das Nações, passando a vigorar como direitos positivos de cada Estado. Começa, assim, uma nova fase, que visa impor limites ao poder, ensejando uma nova concepção de Estado de Direito, alicerçado na separação de “poderes”, dos quais o Poder Judiciário constituiria um verdadeiro contrapoder[39], para fazer frente aos abusos dos demais, em prol da tutela dos direitos e garantias, bem como da ordem constitucional e legalmente instituída[40].

Para cumprimento desses objetivos, vem-se entendendo que a Constituição não só fornece anseios ou programas políticos, mas, sobretudo, estabelece vínculos jurídicos. Ela seria muito mais que uma mera “Carta” política de intenções[41], o que repercute em toda teoria dos direitos fundamentais.  O constitucionalismo não visa tutelar apenas a maioria, mas, sobretudo, garantir os direitos de uma minoria, ainda que contra a vontade daquela[42].

Assim, mais e mais, a ordem jurídica, em um Estado de Direito, pressupõe certeza e estabilidade na proteção de direitos, bem como em relação a expectativas juridicamente relevantes, ainda mais em se tratando de questões relativas à persecução penal, em que tais exigências de certeza são “particularmente intensas”[43], o que reflete no tratamento de seus institutos.

Para atingir esse nível de consciência, de que os direitos e garantias devem ser respeitados e ninguém pode ser julgado à margem do devido processo, a humanidade teve que percorrer um longo caminho, em meio a experiências históricas traumáticas, sendo importantes para mostrar que não se pode abrir mão de certos valores.

Analisar a marcha histórica, em matéria de direitos fundamentais, com vistas à humanização da persecução penal, mostra-se necessário, pois ela demonstra que, em diversas épocas, ao lado de conquistas, houve inúmeros retrocessos, o que demonstra o quanto é perigosa uma irrefletida (e ampla) relativização de direitos e garantias fundamentais.

A conformação do ordenamento ao Estado de Direito Democrático, juntamente à conscientização de que os direitos fundamentais devem ser tutelados (ainda que contra a vontade da maioria), aliado à concepção de que se deve resguardar o indivíduo contra abusos (violência ilegítima) – dentro de uma vertente de limitação do poder, própria do constitucionalismo[44], todo isso repercute em como o direito é construído.

Em seara penal, têm-se prestigiado sistemas jurídicos que procuram seguir um modelo de justiça que se convencionou denominar por garantista, alicerçado que está no respeito aos direitos fundamentais. No ponto, é esse o modelo seguido aqui, o que nem poderia ser diferente, pois nossa Constituição atual é uma das mais garantistas, sedimentando uma série de princípios caros ao processo penal, positivando vários direitos e garantias fundamentais.

Os direitos fundamentais, em sua maioria[45], encontram-se hoje positivados nas Constituições de grande parte dos Estados Nacionais, servindo de norteamento e limite à aplicação e interpretação de todos os demais institutos jurídicos, sobretudo no âmbito de direito processual penal. Nesse sentido, pode-se dizer que o direito, em sua integralidade, tem (se não tem, efetivamente, deveria ter) instrumentalidade constitucional.

Com efeito, todos os troncos do direito (quer dizer, não só a seara processual) pressupõem a instrumentalidade constitucional[46], sendo instrumento para materialização dos princípios da Magna Carta. Portanto, é dizer pouco pretender definir o processo penal por meio dessa mesma instrumentalidade, já que ela é ínsita e está pressuposta em todas as disciplinas jurídicas. Afinal, se não houver conformidade ou - como se queira chamar -, instrumentalidade constitucional, haverá inconstitucionalidade, não sendo a norma válida pelo ordenamento jurídico (o que vale para qualquer matéria do direito)[47].

A origem dos direitos fundamentais é antiga, passa pela teoria do direito natural, sendo que uma melhor teorização só foi possível com o Iluminismo. Contudo, os direitos humanos e garantias fundamentais ganharam um maior destaque recentemente, devido às arbitrariedades testemunhadas ante as Guerras Mundiais do século XX, colocando-se, como nunca antes, o problema da efetividade desses direitos (ou seja, que a sua proteção saia do papel e seja implementada na prática).

Os direitos fundamentais, inicialmente, tiveram toda uma justificação no direito natural, no sentido de serem direitos inatos, intrínsecos ao ser humano, baseado em uma natureza das coisas[48], muitas vezes de caráter religiosa.

Contudo, em decorrência de, ao longo dos tempos, ter havido as mais variadas concepções de direito(s), nas mais diversas sociedades, a tese quanto à existência de um direito natural, único, supostamente intrínseco à natureza das coisas, restou um tanto quanto enfraquecida. O fato de existirem diferenças gritantes entre o que prevê cada ordenamento jurídico contribuiu para o desprestígio de um direito de base “ontológica”, não se podendo falar de uma lei universal aplicável a todos os seres humanos.

“Pascal, por exemplo, que não duvidava, evidentemente, de seus cálculos e da exatidão das ciências enquanto ciências, era assaltado por dúvidas no plano do agir ou da conduta humana. Focalizando, por exemplo, o problema da justiça impressionava-se ele com a variação dos critérios legais de país para país, e mostrava-se perplexo na consideração do valor do justo. Que verdade moral é esta que dois graus da latitude bastam para destruir? Que verdade moral é esta posta como absoluta e objetiva quando ela se revela aquém, e outra além dos Pirineus?”[49].

Também as diversas circunstâncias sob as quais (sobre)viveu o homem, no curso da história, desprestigiam a tese de um direito natural, de um direito inato à natureza humana[50]. Apesar de o direito natural ser uma teoria instigante, vem perdendo adeptos, pois, da mesma forma que serviu para fundamentar um tratamento digno a todos os indivíduos, foi utilizado ao escopo oposto. Já se sustentou a existência de desigualdades naturais entre pessoas, o que, ao longo da história, acarretou a “justificação” dos mais variados tipos de exploração de um homem pelo outro, referendando guerras.

Sob todos os prismas que se olhem, sem se cair em um relativismo sem sentido, é mais acertado entender que o direito não tem mesmo uma base de cunho ontológico[51].

Dado o declínio da tese naturalista entre os estudiosos, passou-se a entender que os direitos fundamentais são fruto de um consenso quanto à “essencialidade” de proteção de determinados valores, em prol do indivíduo e da própria convivência social, consenso que veio a ser solidificado e legitimado mediante o processo histórico.

Evidentemente, o consenso só pode se tornar vinculante desde que venha a ser positivado, isto é, mediante a sua inscrição em uma norma constitucional formal[52], a qual - para ser considerada constitucionalmente válida - não exclui, mas antes pressupõe toda uma análise referente à historicidade e à legitimidade desses direitos.

Caso contrário, se incorrêssemos em um relativismo radical ou ceticismo extremo - aliás, perigoso e inútil[53] - não seria possível vincular o Poder Constituinte (originário) a nada, pois se daria ao Constituinte carta branca para absolutamente tudo.

E esse não é o objetivo do constitucionalismo moderno. Neste sentido, é não só útil, mas também necessário situá-lo dentro de uma ideia de limitação do poder, sendo adequado cultivar uma concepção de continuidade histórica quanto à tutela dos direitos, especialmente no que concerne aos fundamentais.


Notas e Referências:

[1] IHERING, Rudolf Von. A luta pelo direito. Tradução: João Vasconcelos. São Paulo: Martin Claret, 2009, p. 23.

[2] IHERING, Rudolf Von. A luta pelo direito. Tradução: João Vasconcelos. São Paulo: Martin Claret, 2009, p. 31 (destacamos).

[3] “A idéia de que o ser humano é singular e ocupa posição diferenciada de todas as outras criaturas deita raízes no Cristianismo – a partir das concepções de que o homem foi feito à imagem e semelhança de Deus e da inexistência de povo escolhido” (COSTA, Helena Regina Lobo da. A dignidade humana: teorias de prevenção geral positiva. São Paulo: RT, 2008, p. 21).

[4] COSTA, Paula Bajer Fernandes Martins da. Igualdade no direito processual penal brasileiro. São Paulo: RT, 2001, p. 57. Observa-se que, inicialmente, essa igualdade era aceita tão-somento no plano espiritual, pois se admitia a escravidão. De toda forma, o Cristianismo foi um marco em prol do respeito à dignidade humana.

[5]GRINOVER, Ada Pellegrini. Liberdades públicas e processo penal: as interceptações telefônicas. São Paulo: Saraiva, 1976, p. 08.

[6] MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. Coimbra: Coimbra, 2002, p. 46.

[7]ALMEIDA JÚNIOR, João Mendes de. O processo criminal brasileiro. Vol. I. 4.ª ed. São Paulo: Freitas Bastos, 1959 p. 49.

[8]“... tal qual a natureza, as ciências do pensamento também não fazem saltos”. (DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 14.ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 51).

[9]ALMEIDA JÚNIOR, João Mendes de. Processo criminal brasileiro. Vol. I. 4.ª ed. São Paulo: Freitas Bastos, 1959, p. 53. Um detalhe interessante é que “se o imputado fosse nobre de muito alto nível, um príncipe, um conde, era-lhe permitido indicar algum subordinado seu para participar dessas provas” (GONZAGA, João Bernardino. A inquisição em seu mundo. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 23). O procedimento seguia a lógica acusatória (GONZAGA, João Bernardino. A inquisição em seu mundo. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 22-23). Não raro era acompanhado de um rigor formal extremo, sobretudo no uso das palavras (FOUCAULT, Michel. A verdade e as formas jurídicas. 3.ª ed. Tradução: Eduardo Jardim Morais e Roberto Cabral de Melo Machado. Supervisão: Léa Porto de Abreu Novaes. Rio de Janeiro: NAU, 2003, p. 59-60). A acusação, em regra, era privada, isto é, “coisa de partes”, sendo que apenas em alguns poucos casos – bem curiosos, aliás, como observa Michel Foucault -, a acusação deveria ser pública (acusador público), assim ocorrendo nas hipóteses de traição e de uma relação de cunho homossexual (FOUCAULT, Michel. A verdade e as formas jurídicas. 3.ª ed. Tradução: Eduardo Jardim Morais e Roberto Cabral de Melo Machado. Supervisão: Léa Porto de Abreu Novaes. Rio de Janeiro: NAU, 2003, p. 56).

[10]GONZAGA, João Bernardino. A inquisição em seu mundo. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 24.

[11] “Havia ainda outras provas como o ordálio da água, que consistia em amarrar a mão direita ao pé esquerdo de uma pessoa e atirá-la na água. Se ela não se afogasse, perdia o processo, porque a própria água não a recebia bem e, se ela se afogasse, teria ganho o processo visto que a água não a teria rejeitado” (FOUCAULT, Michel. A verdade e as formas jurídicas. 3.ª ed. Tradução: Eduardo Jardim Morais e Roberto Cabral de Melo Machado. Supervisão: Léa Porto de Abreu Novaes. Rio de Janeiro: NAU, 2003, p. 60)(destacamos). Enfim: não tinha escapatória.

[12] Nas ordálias, submetia-se alguém a uma prova física (colocar a mão em água fervente, andar sobre brasas ou mesmo ser jogado em um rio, mas amarrado a uma pedra). Se as feridas cicatrizassem rápido ou se a pessoa sobrevivesse (o que dificilmente ocorria), seria sinal da inocência. Havia também duelos, reservados aos nobres. Cf.: ALMEIDA JÚNIOR, João Mendes de. Processo criminal brasileiro. Vol. I. 4.ª ed. São Paulo: Freitas Bastos, 1959, p. 53; BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 2.ª ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 97-98; FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal: parte geral. Atualização: Fernando Fragoso. 16ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 39.

[13] GÖSSEL, Karl Heinz. El Derecho Procesal Penal en el Estado de Derecho: obras completas.Dirigido por: Edgardo Alberto Donna.Santa Fe: Rubinzal-Culzoni, 2007, p. 16-17.

[14] RUSSO, Luciana. Exame de corpo de delito no direito processual. Dissertação (Mestrado) apresentada perante a Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2005, p. 49-50.

[15]GRINOVER, Ada Pellegrini. Liberdades públicas e processo penal: as interceptações telefônicas. São Paulo: Saraiva, 1976, p. 45.

[16] LOPES, José Reinaldo Lima. O direito na história: lições introdutórias. São Paulo: Max Limonad, 2000, p. 107. No mesmo sentido: GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. São Paulo: RT, 1997, p. 20-22.

[17] Assim fala: TUCCI, Rogério Lauria. Direitos e garantias individuais no processo penal brasileiro. 3.ª ed. São Paulo: RT, 2009, p. 42.

[18] “... é também preciso lembrar que justamente no sistema ateniense se encontram traços de tortura, como meio de prova. A tortura era utilizada geralmente para os escravos, porquanto não podiam eles, por sua condição, prestar juramento, entendendo-se, assim, possível dar um crédito de verdade a seus depoimentos, através da tortura; e é necessário sublinhar a presença desse meio de prova entre os atenienses, para refutar o entendimento bastante corrente pelo qual a tortura teria nascido com o sistema inquisitório” (GRINOVER, Ada Pellegrini. Liberdades públicas e processo penal: as interceptações telefônicas. São Paulo: Saraiva, 1976, p. 40).

[19] GOULART, Valéria DiezScarance Fernandes. Tortura e prova no processo penal. São Paulo: Atlas, 2002, p. 20-21 (grifamos e destacamos).

[20] GOULART, Valéria Diez Scarance Fernandes. Tortura e prova no processo penal. São Paulo: Atlas, 2002, p. 21-22 (grifamos e destacamos).

[21]GOULART, Valéria Diez Scarance Fernandes. Tortura e prova no processo penal. São Paulo: Atlas, 2002, p. 23-24 (grifamos e destacamos). Quanto aos métodos de tortura, a Autora narra: “usava-se ‘o fogo(tormentumignis), a fome (tormentumfamis), a sede (tormentumsitis), o pano com sal na goela(tormentumexsale ei lintes), a pendura(tormentum funis velcordae) e vários animais(tormentum cum capra, onde a  cabra lambia até descarnar as solas da vítima, previamente esfregadas com sal; tormentum cum scarabeoonde um escaravelho ou outro inseto era colocado sobre o corpo da vítima e tampado com um vaso, tal como o rato no penico). Usaram diversos tipos de açoite: férula, com uma só correia, scutica, com duas correias entrelaçadas; flagellum, três tiras com nós de osso; plumbatae, várias tiras com bolinhas de chumbo e cabo de madeira. Foram também mestres no emprego de máquinas como a rota (a roda) e o equuleus(cavalete). A roda, cuja invenção se atribui a Cômodo, tinha aplicação variada: móvel, servia para esmagar como um rolo compressor; fixa num eixo com manivela, servia para amarrar a vítima, provocar-lhe lentas cambalhotas sobre uma fogueira ou um chão de pregos. O cavalete, também conhecido como proto, não passava de um leito de madeira no qual a vítima era atada com braços e pernas separados em forma de X e esticada por meio de dois carretéis, um na cabeceira, outro nos pés, onde as cordas iam se enrolando. Entre as penas capitais, serviam-se da capitação, com machado ou espada, da precipitaçãodo alto da rochaTarpéia, do afogamento, das feras na arena e da cruz’(GOULART, Valéria DiezScarance Fernandes. Tortura e prova no processo penal. São Paulo: Atlas, 2002, p. 23-24)(grifamos e destacamos)

[22] Afirma João Mendes de Almeida Júnior, no que tange à justiça dos forais, da época: “havia penas tais como a de ser sepultado vivo, a de cortar o nariz aos ladrões, a desnudação, a descalvação, já usadas no Código Visigótico, o desorelhamento, além das muletas, calumpnias e alças, que eram prestações em dinheiro. No Foral de São Martinho de Mouros há a multa aos moradores das terras vizinhas ao lugar em que é achado um cadáver, se não souberem quem foi o assassino: ‘manda o corregedor que se aguarde um costume mau porque é antigo; porque por este pode ser mais toste descoberto o malfeitor” (ALMEIDA JÚNIOR, João Mendes de. Processo criminal brasileiro. Vol. I. 4.ª ed. São Paulo: Freitas Bastos, 1959, p. 69).

[23]GONZAGA, João Bernardino. A inquisição em seu mundo. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 88.

[24]GONZAGA, João Bernardino. A inquisição em seu mundo. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 88.

[25] AZEVEDO, Reinaldo. “História e histórias”. In: veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/historia-historias/. (grifamos e destacamos).

[26] Destacando, justamente, a importância do Direito Canônico no curso da história, em especial, no que concerne à limitação do poder real, Tércio Sampaio Ferraz Júnior ensina que “na Idade Média, porém, é o reverso que vale: a Igreja usa a concepção para advertir os princípios que seriam ‘protetores e não proprietários’ do povo. Esse apelo significa uma limitação: não se trata de permitir ao príncipe fazer indefinidamente a lei, mas de vincular o poder a uma lei divina que o domina e obriga. Não resta dúvida de que isso instaurou um controle eclesiástico sobre a sociedade e a supremacia do direito canônico sobre outros direitos, como forma de explicitação do poder (divino). De certo modo, o conceito de soberania divina, em vez de aumentar o poder, provocou, durante séculos, sua limitação” (FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Estudos de filosofia do direito: reflexões sobre o poder, a liberdade, a justiça e o direito. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 09).

[27]GONZAGA, João Bernardino. A inquisição em seu mundo. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 103.

[28] “Convém recordar que a inquisição é fruto de sua época, marcada pela intolerância, a crueldade, e a própria ignorância que dominava. Não deve ser lida (ou julgada) a partir dos parâmetros atuais, pois impregnada de toda uma historicidade que não pode ser afastada” (LOPES JÚNIOR, Aury. Introdução crítica ao processo penal. (fundamentos da instrumentalidade garantista). 3.ª ed. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005. p. 167, nota de rodapé n. 374)(destacamos)

[29] Para se ter uma dimensão do arbítrio presente nas legislações da época, bem como dos abusos cometidos àquele tempo, é interessante consultar as Ordenações Filipinas (Livro V) do reino de Portugal, as quais sintetizam o espírito de uma época, prevendo penas extremamente desproporcionais e discriminatórias, a exemplo do que já ocorria nas anteriores Ordenações; o mesmo, aliás, já se dava nas antigas leis que tiveram aplicação no território da Península Ibérica, tais como o LiberJudiciorum, Cartas de Forais, Sete Partidas, Lei das Posturas, etc. O Livro V das Ordenações Filipinas (dedicado às questões penais) pode ser consultado na obra de José Henrique Pierangeli, dedicada ao estudo histórico dos Códigos Penais do Brasil: PIERANGELI, José Henrique. Códigos penais do Brasil: evolução histórica. São Paulo: RT, 2004, p. 95-217

[30] GOMES, Mariângela Gama de Magalhães. Direito penal e interpretação jurisprudencial: do princípio da legalidade às súmulas vinculantes. São Paulo: Atlas, 2008, p. 06, nota de rodapé n. 02.

[31] DIMOULIS, Dimitri& MARTINS, Leonardo. Teoria geral dos direitos fundamentais. 2ª ed. São Paulo, RT, 2009, p. 30.

[32] CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 21.ª ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 73.

[33] GÖSSEL, Karl Heinz. El DerechoProcesal Penal en El Estado de Derecho: obras completas.Dirigido por: Edgardo Alberto Donna.Santa Fe: Rubinzal-Culzoni, 2007 p. 19.

[34] GÖSSEL, Karl Heinz. El Derecho Procesal Penal en El Estado de Derecho: obras completas.Dirigido por: Edgardo Alberto Donna.Santa Fe: Rubinzal-Culzoni, 2007 p. 19.

[35] PARIZ, Ângelo Aurélio Gonçalves. O princípio do devido processo legal: direito fundamental do cidadão. Coimbra: Almedina, 2009, p. 55-56. Destacando a importância da Magna Carta de 1215: COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 76; FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. Tradução: Ana Paula Zomer, Fauzi Hassan Choukr, Juarez Tavares e Luiz Flávio Gomes. São Paulo: RT, 2002, p. 433; GRINOVER, Ada Pellegrini. Liberdades públicas e processo penal: as interceptações telefônicas. São Paulo: Saraiva, 1976, p. 08, nota de rodapé n. 08. Com um olhar crítico, apontando que ela tinha o viés protetor só da nobreza, não tendo, portanto, um caráter geral: ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na constituição portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 1998, p. 25.

[36] COSTA, Paula Bajer Fernandes Martins da. Igualdade no direito processual penal brasileiro. São Paulo: RT, 2001, p. 27.

[37]Dimitri Dimoulis e Leonardo Martins lembram que os ideais revolucionários franceses, apesar de trazerem inegáveis avanços em racionalidade, inseriram “um novo elemento à filosofia política: a hipocrisia” (DIMOULIS, Dimitri& MARTINS, Leonardo. Teoria geral dos direitos fundamentais. 2ª ed. São Paulo, RT, 2009, p. 27). De fato, não há como deixar de mencionar o terror e a barbárie decorrentes da Revolução Francesa (milhares de mortes na guilhotina). Não obstante os franceses sejam os idealizadores da presunção de inocência (ao lado dos norte-americanos, pois o estado de inocência já estava previsto – ainda que com outro nome – pioneiramente, na Declaração de Direitos da Virgínia, de 1787, parágrafo 8.º), é fato notório e inquestionável que muitas cabeças rolaram sem a menor observância a esse princípio. Como afirma Paula Bajer Fernandes Martins da Costa, “aos inimigos da Revolução não se garantiram os direitos do homem. (...) Em junho de 1794 executaram-se 2 mil pessoas em Paris. A guilhotina funcionava seis horas por dia. Estava em operação o terror judiciário” (COSTA, Paula Bajer Fernandes Martins da. Igualdade no direito processual penal brasileiro. São Paulo: RT, 2001 p. 34-35).

[38] DIMOULIS, Dimitri& MARTINS, Leonardo. Teoria geral dos direitos fundamentais. 2ª ed. São Paulo, RT, 2009, p. 23-24.

[39] FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. Tradução: Ana Paula Zomer, Fauzi Hassan Choukr, Juarez Tavares e Luiz Flávio Gomes. São Paulo: RT, 2002, p. 465.

[40] GÖSSEL, Karl Heinz. El DerechoProcesal Penal en El Estado de Derecho: obras completas.Dirigido por: Edgardo Alberto Donna.Santa Fe: Rubinzal-Culzoni, 2007, p. 25.

[41] Por isso parte da doutrina discorre ser inadequado denominar a Constituição do Estado como “Carta Política”. (DIMOULIS, Dimitri& MARTINS, Leonardo. Teoria geral dos direitos fundamentais. 2ª ed. São Paulo, RT, 2009, p. 18).

[42] GLOECKNER, Ricardo Jacobsen. Uma nova teoria das nulidades: processo penal e instrumentalidade constitucional. Tese (Doutorado) apresentada perante a Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Paraná, 2010, p. 27, nota de rodapé n. 79.

[43] CORREIA, João Conde. Contributo para a análise da inexistência e das nulidades processuais. Coimbra: Coimbra, 1999, p. 23.

[44] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional. 3.ª ed. Coimbra: Almedina, 1999, p. 47.

[45] Pode haver direitos fundamentais fora do texto da Constituição, por exemplo, ao serem ratificados por meio de tratados e convenções internacionais. Esse é o modelo seguido pelo nosso sistema jurídico: artigo 5.º, §§ 2 e 3º da Constituição da República do Brasil.

[46] Quanto à constitucionalização de todo o direito e dos princípios gerais de direito civil, que perderam sua posição de primazia ante a Constituição, PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Vol. I. Atualizadora: Maria Celina Bodin de Moraes. 22.ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 75.

[47] FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 28.ª ed. São Paulo: RT, 2002, p. 21.

[48] Adotando a compreensão naturalista dos direitos fundamentais: MARTINS, Ives Gandra da Silva. Uma breve introdução ao direito. São Paulo: RT, 2010, p. 84.

[49] REALE, Miguel. Filosofia do direito. 20.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 160.

[50] DIMOULIS, Dimitri& MARTINS, Leonardo. Teoria geral dos direitos fundamentais. 2ª ed. São Paulo, RT, 2009, p. 50.

[51] REALE, Miguel. Filosofia do direito. 20.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 220.

[52] “Mais conveniente que basear o conceito de norma de direito fundamental em critérios substanciais e/ou estruturais é vinculá-lo a um critério formal, relativo à forma de sua positivação” (ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Tradução: Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 68).

[53] “Podemos distinguir duas atitudes céticas, que se têm revelado na História. Uma prende-se ao ceticismo da velhice, do abandono do poder criador do homem. É o ceticismo que aparece nas épocas em que uma civilização perde consciência de seu próprio destino, ou de seus valores. É o ceticismo do cansaço, dos que se sentem pequenos para a tarefa que outros souberam elevar tão alto: - é o ceticismo, por exemplo, da Nova Academia, em contraste com as afirmações maravilhosas do ciclo platônico-aristotélico. Em contraposição a esse, há o ceticismo metódico das épocas adolescentes e jovens, como, por exemplo, o de Descartes, com a dúvida metódica, não para fugir ou renunciar à verdade, mas para abrir caminhos mais seguros à conquista da verdade mesma. É a atitude cética ascendente das épocas históricas em eclosão, mas ceticismo provisório, que alberga as condições de seu superamento” (REALE, Miguel. Filosofia do direito. 20.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 164).


jorge-coutinho-paschoal. . Jorge Coutinho Paschoal é Advogado e Mestre em Direito Processual Penal pela Universidade de São Paulo (USP). . .


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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


 

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