Coluna Direito Médico e da Saúde
A Recomendação 11, de 07 de maio de 2021, do Conselho Nacional de Saúde, a partir de alguns pressupostos por ela escolhidos, recomendou ao Ministério da Saúde o seguinte: “I - Que considere a urgência e relevância de aprimorar a qualidade e segurança dos serviços obstétricos ofertados em estabelecimentos de saúde privados no Brasil, em especial pela redução dos índices de cirurgias cesarianas e pela promoção do parto vaginal seguro e prazeroso, e que tomem medidas nesse sentido”
Segundo o CNS, os serviços privados de saúde do Brasil possuem índices de parto cesáreo na ordem de 85%, o que seria algo contrário à tendência mundial. Ponderou, ainda, sem estabelecer base comparativa, que taxas superiores a 10% não estão associadas à redução de mortalidade materna e neonatal.
Da mesma maneira, a Recomendação em tela faz várias restrições às possibilidades do parto cesariano eletivo. Todas elas, em última escala, advogam a tese de que a escolha por tal procedimento aumentam : (a) as chances de morte da mãe e do recém nascido; (b) as respostas imunológicas adversas no recém-nascido; (c) as chances de o recém-nascido desenvolver asma, diabetes tipo 1, doença celíaca e alergias; (d) a interrupção precoce da amamentação.
A partir desse ponto, a Recomendação tenta fazer com que o parto cesariano eletivo seja uma exceção e propõe uma série de restrições ao seu uso. Basicamente, deixa o parto natural como a opção primeira, tudo isso, claro, com base nos argumentos anteriormente abordados.
O problema central aqui, contudo, é outro. Por se tratar de uma Recomendação, à evidência que deve obediência a uma série de regramentos legais e não pode, por si só, eliminar um fato muito simples: é direito da mulher a escolha do procedimento, inclusive nos casos dos planos de saúde, uma vez que se trata, em específico, de um contrato a ser respeitado pelas partes envolvidas.
Nesse sentido, em 24 de maio de 2021, isto é, apenas três semanas depois da sugestão do CNS, o Conselho Federal de Medicina publicou a Resolução 2284/2020, asseverando ser ético o médico atender à vontade da paciente em realizar o parto cesariano. Como refere, acertadamente, o artigo primeiro da Resolução: “é direito da gestante, nas situações eletivas, optar pela realização da cesariana”.
Deve-se, claro, ter consentimento livre e esclarecido da paciente. Demais disso, registre-se que a segurança (e não razões econômicas) do binômio materno-fetal é o núcleo de proteção dos direitos envolvidos. Tanto isso é verdade que, na hipótese de o médico discordar da cesariana como o método mais adequado para a preservação das vidas em jogo, o/a médico(a), poderá, então, alegar sua autonomia profissional e encaminhar a paciente a outro/outra profissional.
Não se esqueça, por fim, de que a dor, a privação, o corpo, dentre outros elementos, são exclusivos da mulher. Dificultar, nos casos possíveis, a cesariana eletiva, equivale a fazer biopolítica, isto é, impactar a vida humana por meio de estratégias políticas, e, portanto, de ideologias. Não é objetivo da saúde. Não é a razão precípua do Direito.
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