Coluna Atualidades Trabalhistas / Coordenador Ricardo Calcini
Aproxima-se o fim de mais um ano. Tempo de balanços, inclusive quanto aos trabalhos desenvolvidos pela ABPT – Associação Brasileira de Processualistas do Trabalho no âmbito do FPPT - Forum Permanente de Processualistas do Trabalho, iniciativa inspirada no modelo do FPPC – Forum Permanente de Processualistas Civis e que já realizou, desde 2016, seis encontros de operadores e estudiosos do Direito Processual do Trabalho.
Como salientado na Carta da última reunião, havida em São Paulo, nos dias 26 e 27 de outubro, o ano de 2018 foi profícuo para os esforços que caracterizam a realização do FPPT, na busca de caminhos que conduzam à preservação da cientificidade do Direito Processual do Trabalho, afastando-o do casuísmo e da aplicação pautada pela intenção ou mero entendimento isolado do intérprete – e não da finalidade da norma, considerada como parte de todo um sistema, na forma determinada pela vetusta Lei de Introdução às Normas do Direito brasileiro (art.5º) e, também, pelo Código de Processo Civil (art.8º).
Como pode ser afirmado na referida Carta, o processo, é sabido, tem origens históricas pautadas na constatação da necessidade de estabelecimento de instrumentos de controle e preservação da segurança jurídica, de modo a tornar previsível a forma como será oportunizada a participação dos interessados na análise dos meandros de suas causas, de modo justo, isonômico e adequado. Desse modo, não se pode aceitar que as normas processuais sejam interpretadas sem apego à melhor técnica: devem ser voltadas à perseguição, à uniformização e à busca de instrumentalizar a segura atuação dos operadores do Direito para a conquista da concretização da justiça na solução das controvérsias verificadas no seio da sociedade brasileira.
Assim, questões que despertam a dúvida daqueles que atuam nas causas levadas à Justiça do Trabalho foram enfrentadas, mais uma vez, neste VI FPPT, de modo a resultar em 37 novas conclusões, carregadas no mesmo número de enunciados, que logo serão divulgados no sítio do Forum (fppt.com.br).
Neste singelo texto, apresentamos à comunidade jurídica alguns dos últimos enunciados editados. Para tanto, escolhemos aqueles que tratam da Execução Trabalhista (de números 260 a 268).
O Enunciado 260 enfrentou a questão da possibilidade de execução de ofício nos casos de jus postulandi. A dúvida central colocada em debate guardava relação com o sentido do trazido no artigo 878 da CLT: para fim de que o juiz do trabalho inicie, de ofício, a fase executiva, na hipótese tratada no citado artigo, há de se verificar, especificamente, que o reclamante se encontra no exercício do jus postulandi? De outro lado, admite-se a providência frente à constatação de que qualquer das partes se encontra no exercício de suas capacidades postulatórias, sem a representação por advogado regularmente constituído?
Debateu-se, inclusive, acerca da mensuração do interesse do devedor no que toca ao início da fase de execução, haja vista os conhecidos prejuízos no que se refere ao incremento do débito, com juros, por exemplo, decorrentes do decurso do tempo. Considerou-se, outrossim, os casos de execução invertida e outros, dentre os quais a situação na qual a reclamada é reconhecida, ao final, como credora (por exemplo, nos casos de reconvenção), tendo, assim, interesse inequívoco no início da execução.
Concluiu-se, no âmbito do FPPT, que haveria afronta à isonomia e à própria finalidade da norma (logo, violação ao disposto no artigo 5º da Lei de Introdução e no artigo 8º do CPC) caso se restringisse a possibilidade de início da execução de ofício às situações nas quais o reclamante se encontrasse sem representação por advogado, haja vista que a mesma situação restaria caracterizada no caso da credora ser a reclamada, no exercício do jus postulandi. Haveria, assim, afronta aos fins da regra decorrente da alteração havida no texto da CLT, pela Lei 13.467/2017.
Considerada a mesma finalidade da norma, entendeu-se por bem afastar as demais hipóteses, de modo a resultar no seguinte entendimento:
“260. (art. 878 da CLT; art. 8º do CPC; e art. 5º do LINDB) É possível ao Juiz iniciar de ofício a execução nos casos em que quaisquer das partes, sendo credora, estiver no exercício pessoal do jus postulandi”.
Também foi objeto de debate, a partir do disposto nos artigos 878 e 879 da CLT, a possibilidade (ou não) do juiz do trabalho, de ofício, dar início à fase de liquidação de sentença. A conclusão foi no sentido positivo, estampada no Enunciado 262 do FPPT, verbis:
“262. (art. 878, 879 e 880 da CLT) É vedado ao Juiz do Trabalho iniciar de ofício a execução. Contudo, poderá o Magistrado iniciar de ofício a liquidação de sentença ou acórdão, cabendo-lhe intimar as partes para apresentação dos cálculos”.
Percebe-se, na parte final do enunciado, contudo, a conclusão firme no sentido de que, para tanto, há de se garantir a participação das partes com a apresentação dos cálculos. Desse modo, o juiz poderia dar início à fase instando as partes à apresentação dos referidos cálculos, sob a luz do impulso oficial que, como missão principiológica voltada à efetividade da prestação jurisdicional, lhe é entregue.
O Enunciado 261, por sua vez, pode-se afirmar, enfrentou questão intermediária entre o que foi definido nos dois outros, acima apresentados (260 e 262). Questionou-se sobre a hipótese de liquidação de sentença iniciada pelo juiz nos casos em que o credor está no exercício do seu jus postulandi. Consideradas as dificuldades técnicas do credor desassistido por advogado, a questão levantada apontava para a possibilidade, após a Reforma Trabalhista, do juiz, antes de intimar as partes para a apresentação dos cálculos, determinar a elaboração destes. Diante disso, levantou-se o problema de eventual desrespeito ao contraditório substancial – e até a possibilidade de ensejar decisão surpresa, vedada no sistema em vigor – CPC, artigo 10. A conclusão, consubstanciada no enunciado editado, foi a seguinte:
“261. (art.879 e 878 da CLT; art.10 do CPC) No caso de liquidação de sentença iniciada pelo Juiz nos feitos em que o credor está no exercício do seu jus postulandi, poderá o magistrado iniciar a referida fase com as providências necessárias à apuração do quantum debeatur antes de intimar as partes para apresentação dos cálculos. Todavia, antes da homologação, deverá, em respeito ao contraditório substancial e à vedação da decisão surpresa, oportunizar a manifestação de ambas, no prazo de 8 (oito) dias”.
Ainda na seara da fase de liquidação de sentença, debateu-se sobre a necessidade de reabertura de discussão dos cálculos para fim de atualização monetária e acréscimo de juros, exigidos pelo decurso do tempo. Eis a conclusão, carregada no Enunciado 263 também aprovado à unanimidade no âmbito da Plenária do VI FPPT:
“263. (art.879, §2º da CLT). Cumprida a determinação do art.879, §2º da CLT, deixa de ser obrigatória a reabertura de oportunidade de discussão dos cálculos, pelas partes, frente a meras atualizações do crédito e juros que se façam necessárias, pelo decurso do tempo. Contudo, não fica prejudicado, neste último caso, o direito pertinente às posteriores medidas impugnativas cabíveis”.
Outros temas relevantes foram enfrentados pelo grupo que, nas turmárias, ficou incumbido do estudo da Execução Trabalhista. Uma delas foi pertinente aos títulos executivos na Justiça do Trabalho. A sentença penal condenatória, ex vi do disposto na CLT, artigos 876 e 889, frente aos artigos 515,VI e 15 do CPC, pode ser considerada título executivo no âmbito do Processo do Trabalho? Entendeu-se que sim, caso o fato típico tenha ocorrido no âmbito da relação de emprego (particularmente, entende-se possível ler, aqui, no lugar de emprego, mais restritivo, trabalho, de modo atento à finalidade encontrada no disposto no artigo 114, caput e inciso IX, da CF). Traz o enunciado:
“264. (art.515, VI do CPC; arts. 72, 73 e 74 da Lei 9.099/1995). A sentença penal, se a lesão que se pretende reparar decorrer de relação de emprego, pode ser considerada título executivo a ser executado na Justiça do Trabalho”.
Questão também discutida guardou pertinência aos impactos da inclusão de permissivo expresso de solução arbitral de conflitos individuais do trabalho (observados os requisitos do artigo 507-A da CLT para tanto) no que toca ao rol de títulos executivos a serem admitidos para os feitos que tramitam perante a Justiça do Trabalho. Nesse sentido, de modo harmônico ao novo permissivo legal, editou-se o Enunciado 265, verbis:
“265. (arts.507-A e 877-A da CLT; art.515, VII do CPC). Sendo possível a utilização da arbitragem nas relações de trabalho, consoante previsto no art. 507-A da CLT, a sentença arbitral poderá ser executada perante a Justiça do Trabalho”.
No Enunciado 266, reconheceu-se a aplicação do disposto no artigo 852 do CPC ao Processo do Trabalho, frente à possibilidade de que o decurso do tempo venha a colocar em risco a efetividade da execução – e a causar prejuízos ao executado que extrapolem o limite do necessário, quando aqueles se mostrarem sujeitos à depreciação ou à deterioração. Nessas situações, há de se admitir a alienação antecipada (do mesmo modo quando se notar manifesta vantagem nisso). Traz o enunciado:
“266. (art.15 e 852 do CPC). Aplica-se ao Processo do Trabalho a alienação antecipada de bens penhorados, nos casos em que estes se mostrem sujeitos à depreciação ou à deterioração ou houver manifesta vantagem”.
Em harmonia com a conclusão de que não há autonomia na execução trabalhista fundada em título judicial, exibindo-se, esta, como fase do procedimento, tal qual se têm no Processo Civil, concluiu-se que o parcelamento previsto no artigo 916 do CPC (a possibilidade do devedor renunciar aos embargos para, no prazo destes, mediante depósito de 30% do valor do débito, obter o parcelamento do remanescente em seis vezes, iguais quanto ao valor, mensais e sucessivas) não se aplica à execução de título judicial que tramite perante a Justiça do Trabalho. O fundamento de tal conclusão encontra-se no disposto no §7º do mesmo artigo 916, que afasta a referida possibilidade da fase de cumprimento de sentença, cingindo-a à execução de título extrajudicial. Reconhecida que a execução fundada em título judicial, no Processo do Trabalho, também consiste em fase, voltada ao cumprimento do comando judicial, da mesma forma há de observar a exceção legal acima referida (artigo 916, §7º do CPC). Por isso, assim restou editado Enunciado 267 do VI FPPT:
“267. (art. 916 do CPC) O parcelamento previsto art. 916 do CPC não se aplica à execução de título judicial aos processos trabalhistas, ante a expressa vedação do §7º do art. 916, CPC”.
Por fim, sobre a inclusão dos sócios no polo passivo, editou-se o Enunciado 268, verbis:
“268. (arts.10 e 855-A da CLT; art.4º do CPC) A existência de decisão anterior, que indefere pretensão de inclusão de sócios no polo passivo de reclamação trabalhista, não impede a posterior desconsideração da personalidade jurídica da reclamada para fim de alcançar os mesmos sócios, caso as razões de fato do novo pleito se mostrem diversas do que, anteriormente, consubstanciou a pretensão não acolhida”.
O referido enunciado cuida da hipótese de pretensão de desconsideração da personalidade jurídica e consequente inclusão dos sócios no polo passivo já na petição inicial – o que dispensaria o incidente, na forma do CPC, artigo 134, §2º (admitida pelo artigo 855-A da CLT). Caso tal pretensão reste indeferida, não havendo recurso contra a referida decisão, restaria condenada a possibilidade de futura instauração, na fase executiva, do incidente de desconsideração da personalidade jurídica? Concluiu-se que não, desde que as razões de fato do novo pleito se mostrem diversas das que, anteriormente, consubstanciaram a pretensão não acolhida.
O propósito deste singelo texto foi o de apresentar os mencionados últimos entendimentos contidos nos enunciados do FPPT em matéria de Execução Trabalhista, com o pontuar das principais questões enfrentadas e das conclusões obtidas, sem o propósito de aprofundamento acerca dos fundamentos ensejadores de cada uma delas, que fica reservado para os próximos artigos.
Remanesce, assim, aberto o convite para o debate – e para a participação de todos os operadores do Direito, com atuação nas causas levadas à Justiça do Trabalho, bem como aos estudiosos dos temas que permeiam o Direito Processual do Trabalho, para que participem do FPPT, com edição já confirmada para 2019.
No mais, encerramos a nossa participação em 2018 na coluna coordenada pelo querido amigo, Professor Ricardo Calcini. No próximo ano, se Deus assim permitir, estaremos de volta. Por isso, desejamos, desde já, aos leitores desta coluna, aos demais autores, ao caro coordenador e a todos do Empório do Direito, um Natal abençoado, com muita luz, paz e felicidade, bem como um ano novo repleto de conquistas!
Grande abraço a todos!