O presente artigo pretende revisitar a questão da preservação dos recursos naturais e os impactos nas estratégias econômicas do Brasil em relação ao mundo, tomando como ponto de partida a visita do governo brasileiro a Oslo, Noruega, no dia 22/junho/2017.
O governo da Noruega criou uma saia justa para o governo brasileiro ao anunciar um corte de 50% no valor dos repasses realizados ao Fundo da Amazônia. A Noruega é um dos maiores doadores de recurso para o combate ao desmatamento, tendo destinado US$ 1.1 (hum vírgula hum bilhão de dólares) entre os anos de 2009 e 2016. Com o corte, o Brasil deve perder cerca de 500 milhões de coroas norueguesas, o equivalente a R$ 196 milhões de reais, metade do que recebeu no ano passado. O Fundo da Amazônia tem como base um acordo de 2008 que diz que quando o desmatamento aumenta, o dinheiro é cortado. O ministro do Meio Ambiente da Noruega, Vidal Helgeser, afirmou que as “contas estão baseadas nas taxas” de desmatamento e que o Brasil pode voltar a receber os valores integrais se houver o efetivo combate ao desmatamento. Afirmou, também, que as “decisões sobre as florestas brasileiras dependem do Brasil, não da Noruega”.[1]
O ministro Helgeser admitiu que o corte é baseado no avanço do desmatamento, que vinha em uma tendência de queda há alguns anos no Brasil, mas teve um aumento de 58% no ano passado, segundo estudo da Fundação SOS Mata Atlântica e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Além disso, destacou que ambientalistas têm criticado o fortalecimento de grupos "ruralistas" no governo Temer, com atuação para aprovar, no Congresso, a flexibilização das regras de licenciamento ambiental e a redução de áreas de proteção.[2]
Para entender a importância dos recursos naturais no mundo globalizado.
A ordem econômica e política internacional foram alteradas a partir do paradigma da globalização. A globalização promoveu a integração das economias e alterou a geografia do comércio internacional, forçando as corporações a buscar novos mercados e redistribuir os investimentos internacionais. Os governos, por sua vez, foram obrigados a definir novas políticas nacionais e novas formas de relacionamento internacional para enfrentar a forte competição, no mercado internacional, por matérias-primas estratégicas (o Fundo da Amazônia, por exemplo, é parte de uma estratégia do Brasil). O aumento na competição internacional gerou uma significativa pressão por novas fontes de matérias-primas, como petróleo, gás, minerais e, especialmente, por fontes alternativas de suprimento de água. Neste contexto, os países ricos em recursos naturais se confrontam com uma nova ordem internacional, intensiva no uso de matérias-primas estratégicas, que passa a determinar a regionalização geopolítica dos padrões de exploração e comercialização internacional. O Brasil, em razão da região Amazônica, detentora do maior estoque de recursos estratégicos – água, minerais e biodiversidade – do planeta, passou a ser o centro das atenções internacionais.[3]
A Amazônia e o mundo.
A Amazônia atraiu a atenção do mundo pela biodiversidade e pelo estoque de recursos estratégicos necessários para a geração das inovações tecnológicas. A riqueza da Amazônia é motivo de orgulho e, também, de preocupação nacional, pois, pela importância e pela exuberância, chama atenção do mundo quanto ao uso sustentável de seus recursos.
Para Bertha K.Becker[4], o bioma da Amazônia foi mercantilizado pela nova dinâmica do comércio internacional, constituindo o que se denomina de “mercantilismo do capital natural” ou mercantilização da natureza. A autora explica que nos últimos anos, novas tendências se delineiam no sentido de viabilizar a realização do capital natural através de um processo crescente de mercantilização da natureza. Alguns de seus elementos estão em vias de serem transformados em mercadorias fictícias e objeto de mercados reais, afetando intensamente a Amazônia.
A mudança de paradigma em relação à Amazônia, seja pelas nações, seja pelo comercio internacional, decorre de fatores que se relacionam com a necessidade de garantir disponibilidade de recursos naturais estratégicos para a manutenção do padrão de desenvolvimento e crescimento econômico do mundo. Assim, cabe ao Brasil, por sua soberania, garantir a governança sustentavel da Amazônia, afastando a sua mercatilização é o uso deletério de seus recursos naturais.
A governança da região da Amazônia pressupõe a criação de políticas ambientais que observem os recursos naturais estratégicos presentes na Amazônia a partir da legislação nacional e dos acordos e convenções internacionais, com destaque para:
Biodiversidade.
A Convenção de Diversidade Biológica – CDB, organizada na Conferência Rio-92, é específica quando dispõe sobre a forma de acesso a Recursos Genéticos. Pela CDB, as nações reconhecem a soberania dos Estados sobre seus recursos naturais e, também, a autoridade para determinar e autorizar o acesso aos recursos genéticos pertencentes aos governos nacionais, segundo a legislação nacional.
Entretanto, para Nelson de Figueiredo[5], o Brasil não possui uma política nacional clara sobre a proteção para a biodiversidade da Amazônia. Segundo o pesquisador, os estudos indicam um problema ambiental, pois, o Brasil mostra-se incapaz de formular uma política pública de controle o manejo da biodiversidade, seja por falta de recursos financeiros, seja por falta de pessoal técnico e científico qualificado.
Recursos Minerais.
A Amazônia, além de ser detentora de uma grande biodiversidade em seu subsolo, detém importantes estoques de recursos minerais. Os estudos mostram[6] que a região Amazônica é detentora de grandes estoques de ferro, manganês, alumínio, cobre, zinco, níquel, cromo, titânio, fosfato, ouro, prata, platina, paládio, ródio, estanho, tungstênio, nióbio, tântalo, zircônio, terras-raras, urânio e diamante.
A riqueza mineral da Amazônia, atrelada a falta de políticas públicas brasileiras e latino americanas, impõs à região uma dinâmica de ocupação exógena, focada em interesses desenvolvimentistas e mercadológicos, sem respeito ao equilíbrio ecológico.
Recursos hídricos.
A escassez de água, no Brasil e no Mundo, é o tema mais discutido nos últimos anos, tendo sido objeto do Fórum Mundial da Água, realizado pela ONU em Daegu, Coréia do Sul (2015) e, programada para acontecer no Brasil em 2018. Atualmente, há uma preocupação com a disponibilidade e o acesso à água como condição para a sobrevivência do planeta e especialmente da humanidade.
A preocupação decorre, dentre inúmeros motivos, pelo problema da distribuição da água nos diferentes continentes do planeta. A escassez de água é um processo gradativo que se intensifica pelo desperdício, pelo mau uso e pelos problemas ambientais que impactam o meio ambiente natural de forma que, aos poucos, os continentes vão sofrendo perdas de disponibilidade e, também, pressão pelo consumo de água per capita.
Diante de um quadro de possíveis conflitos internacionais por causa da escassez de água em determinadas regiões do mundo, a Bacia Hidrográfica da Amazônia encontra-se na contramão, apresentando elevado potencial hídrico e valor estratégico, econômico e social. O complexo da Amazônia, por sua vez, é importante, ainda, para as aguas subterrãneas, cujo equilibrio ambiental é responsável por alimentar o aquífero Alter do Chão, reconhecido como o maior do mundo.
Proeminência seja feita quanto à manutenção do aquífero Alter do Chão na Amazônia. A sustentabilidade perpassa pela conservação da floresta, pois, boa parte do abastecimento origina-se da abundante e generosa quantidade de chuvas existentes na região, o que ajuda a explicar o grande volume de água mesmo em uma área menor que a do Aquífero Guarani. Essa elevada pluviosidade é gerada pela umidade intensa produzida pela própria Floresta Amazônica, que, por sua vez, utiliza-se dos recursos hídricos para a realização da evapotranspiração, com o bombeamento da água dos solos para a atmosfera, o que se relaciona também com os Rios Voadores.[7]
Os ruralistas e a pressão sobre a Amazônia.
O desmatamento do bioma da Amazônia possui forte participação do fator real de poder atrelado à bancada ruralista no congresso nacional. No Brasil, a pressão da bancada ruralista acabou por promover alterações perigosas para o meio ambiente no ordenamento jurídico, a começar pelas novas regras do código florestal. Além disso, com o surgimento de novas potências econômicas como a China, cuja economia é voltada para o mercado internacional, houve o aumento pela demanda de recursos naturais e de alimentos, pressionando a floresta Amazônica com a finalidade de garantir mais espaço para a cultura da soja e da criação de gado.
A encruzilhada do Brasil em relação à Amazônia.
Considerando a abundância de recursos naturais existentes na região da Amazonia, é necessário que o governo do Brasil estabeleça uma estratégia que perpasse a afirmação da soberania sobre o território da Amazônia; a adoção de medidas estruturais para criação do sentimento nacional de pertencimento da Amazônia; a implementação de políticas públicas dirigidas à preservação e conservação ambiental e a promoção do desenvolvimento sustentável.
O governo brasileiro, quanto à região da Amazônia, encontra-se diante de uma encruzilhada, pois, ao mesmo tempo em que possui recursos naturais com capacidade de potencializar a atividade econômica; sabe que as nações do mundo querem a preservação e a conservação do bioma, considerando-o como espaço vital do século XXI.
A Amazõnia é um centro de mobilização e de estratégias internacionais que pode atentar, inclusive, contra a sobrenania nacional, considerando a necessidade que algumas nações possuem de assumir o controle das reservas de recursos estratégicos, como é o caso recorrente das reservas de petróleo.
Por tal motivo, cabe ao governo brasileiro formular políticas públicas sustentáveis dirigidas ao fortalecimento e a integração regional da Amazônia como forma de confrontar os constantes discursos internacionais dirigidos para definir uma dinâmica geopolítica sobre a maior fronteira de capital natural do planeta, garantindo aos brasileiros a soberania quanto ao uso dos recursos naturais do bioma.
Notas e Referências:
[1] http://www.em.com.br/app/noticia/economia/2017/06/23/internas_economia,878466/noruega-corta-pela-metade-fundo-para-a-amazonia-em-visita-de-temer.shtml - acesso em 25/junho/2017.
[2] Idem
[3] Mario Miguel Amin, A Amazônia na geopolítica mundial dos recursos estratégicos do século xxi, Revista Crítica de Ciências Sociais, 107 | 2015, 17-38.
[4] Becker, Bertha K. (2005), “Geopolítica da Amazônia”, Estudos Avançados, 19(53), 71-86. DOI : 10.1590/S0103-40142005000100005
[5] Ribeiro, Nelson de Figueiredo (2006), A questão geopolítica da Amazônia: da soberania difusa à soberania restrita. Belém: EDUFPA.
[6] http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142002000200009 – acesso em 28 de junho de 2017.
[7] http://brasilescola.uol.com.br/brasil/aquifero-alter-chao.htm - acesso em 29 de junho de 2017.
Imagem Ilustrativa do Post: Amazonia // Foto de: Omer Bozkurt // Sem alterações
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