Os presos por crimes contra à vida em tempos de pandemia

19/06/2020

Coluna Vozes-Mulheres / Coordenadora Paola Dumont 

Desde que o Brasil reconheceu que estava diante de uma pandemia, todos os setores ligados ao Poder Judiciário foram imediatamente afetados. Neste período de quarentena, algumas medidas vêm sendo implementadas para que, mesmo com restrições, os locais atingidos possam funcionar. Isso é feito seguindo protocolos e recomendações de órgãos sanitários e de saúde. As sessões dos Tribunais Superiores passaram a ser virtuais, os fóruns reduziram o número de servidores, as audiências foram suspensas ou realizadas virtualmente, etc.

Todavia, houve um local diretamente acometido e que, até o momento, não foi objeto de adaptação: O plenário do tribunal do júri. Consequentemente, os acusados presos por delitos contra a vida e que aguardam julgamento estão a latere sem uma resposta.

Inicialmente, pela própria liturgia, as sessões do tribunal devem ser públicas e delas participarem, sob pena de nulidade, pelo menos 15 jurados, o Juiz Togado, o Ministério Público, a Defesa, o acusado, além da vítima e das testemunhas, quando for o caso. Colaboram com a sessão plenária o escrivão, serventuários, policiais militares, garçons e estagiários. Em outras palavras, é um ambiente com “aglomeração” obrigatória.

Até que o vírus seja erradicado, fica impossibilitada a retomada das sessões da forma como a lei determina. Não obstante, também não há como vislumbrar que os julgamentos ocorram em ambiente virtual. A tendência é que fiquem suspensas enquanto persistir a pandemia.

Nesse cenário, observa-se que: 1) réus inocentes, que seriam absolvidos pelo conselho de sentença, vão permanecer por tempo indeterminado no cárcere; 2) acusados que fariam jus à progressão de regime caso houvesse sentença condenatória, e consequente expedição de guia de execução, também continuam detidos.

O fato de estarem em prisão preventiva e poderem ser soltos a qualquer momento para aguardar o julgamento, não parece algo convincente. Segundo noticiado pelo próprio Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em apenas uma sessão virtual, que ocorreu dia 05/05, a 1ª Câmara Criminal julgou 711 processos. Nessa sistemática, não podemos concluir que a garantia e a primazia da liberdade foram norteadoras dos acórdãos.

Além disso, o CNJ, na Recomendação nº 62, que expediu como forma de prevenir a propagação da Covid-19 nos presídios, ressaltou que as medidas de liberdade oferecidas aos grupos de risco, devem preferir os acautelados por crimes sem violência ou grave ameaça à pessoa.

Ou seja, de um lado, há detentos acusados de estupro seguido de morte, por exemplo, mas que ainda têm seus processos em trâmite e possibilidade e a possibilidade serem absolvidos ou progredirem de regime, em razão dos magistrados proferirem as sentenças em casa. De outro, há presos por fraudes na compra de insumos médicos e respiradores para o enfrentamento da pandemia, – teoricamente – poderiam ser soltos conforme a Recomendação do CNJ. Os acusados no tribunal do júri não se enquadram nessas hipóteses.

Dada a impossibilidade julgamento em plenário e deste grupo ter menores chances de deixarem o presídio pela gravidade abstrata do delito, é de extrema importância que a comunidade jurídica reconheça a situação peculiar que se encontra os detidos acusados de crimes dolosos contra a vida e discuta meios para que não sejam deixados de lado das medidas de saúde e liberdade. Caso a situação se mantenha, muitos desses cidadãos permanecerão sem julgamento e injustamente na prisão por muito tempo.

 

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