Os limites das certezas – Por Léo Rosa de Andrade

13/01/2016

No Facebook, uma frase de Nietzsche extraída de Assim Falava Zaratustra: “Homens convictos são prisioneiros”. Por que, ou do que seria prisioneira uma pessoa convicta? Está obvio: um convicto é prisioneiro da sua convicção.

Convicção é uma opinião assentada a respeito de alguma coisa. Nietzsche seguramente estava falando de convicções que os opiniosos adquirem e às quais se apegam obstinadamente: convicções de pensamento.

Adriano Gregório comenta a publicação. Edito: “convicções como certezas inflexíveis certamente inviabilizam transição de ideias, então, dessa forma, barram a chegada do super-homem proclamada por Zaratustra.

Ocorre que são opiniões arraigadas que nos permitem acordar todos os dias e não encarar cada minuto de nossa existência como uma infinidade assustadora de possibilidades.

Uma vida com ausência de certezas tem o fio de realidade no qual nos sustentamos rompido, e o que sobra é obviamente loucura. Assim, certezas são essenciais ao desenvolvimento da vida humana”.

Então Gregório modula: “Talvez o problema não esteja em sustentar uma convicção, mas em nutri-la como verdade absoluta. Talvez certezas somente engessem aqueles que se apeguem a elas tão fortemente que, sem elas, não existiriam”.

E encerra com uma afirmação com a qual, suponho, Zaratustra concordaria: “Quem sabe se certeza significasse a ausência de uma melhor e mais sólida opinião, aí faríamos das barras da prisão uma escada”.

O comentário é uma contribuição relevante a uma questão central em Nietzsche: as formatações ideológicas – as religiosas sobretudo – condicionam o humano a viver os valores morais circulantes sem indagá-los e, pior, convicto deles.

A moral estabelecida é mesmo um conforto. Ela nos dá as certezas de que precisamos para tocar a vida. Forma as balizas do bem e do mal. É como uma fórmula oferecida pelos sábios do mundo.

Mas essa mesma moral nos adstringe as aventuras da existência. Os que têm as prescrições morais como certezas tornam-se cativos do prescrito e se esquecem de sondar o mais, reprimindo até a imaginação.

Moral: “conjunto de valores, individuais ou coletivos, considerados universalmente como norteadores das relações sociais e da conduta dos homens” (Houaiss). O busílis está no “universalmente”. Não há (ainda) uma moral universal.

Sistemas de valores são objeto de estudo da ética. A ética investiga os sentidos dos preceitos morais, buscando compreender as razões de sua validade; não defende, pois, um código moral, mas o faz objeto de estudo.

Moral é doxa: “sistema ou conjunto de juízos que uma sociedade elabora em um determinado momento histórico supondo tratar-se de uma verdade óbvia ou evidência natural” (Houais).

Ética é episteme: compromisso com o conhecimento, com o abandono, se parecer sensato, de juízos, valores, paradigmas. E, sim, um investigador sensato sabe que não terá neutralidade, por isso submete-se a métodos.

Nietzsche tem razão: as mais seguras certezas são refutáveis. E quem tem certezas até pode ser um ingênuo ou um alienado, mas é, antes, um autoritário, e se puder impões suas convicções ao mundo.

Neste momento nacional em que o maniqueísmo político viceja, quiçá Adriano Gregório tenha razão: esta certeza toda que refestela um e outro lado talvez seja apenas a ausência de uma melhor e mais sólida opinião.


 

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