Os fins justificam os meios?  

13/07/2019

 

"...Nas ações de todos os homens, em especial dos príncipes, onde não existe tribunal a que recorrer, o que importa é o sucesso das mesmas. Procure, pois, um príncipe, vencer e manter o Estado: os meios serão sempre julgados honrosos e por todos louvados, porque o vulgo sempre se deixa levar pelas aparências e pelos resultados, e no mundo não existe senão o vulgo..." (Nicolau Maquiavel)

A antiguidade grega, informa Pablo Lucas Verdú,[1] manteve o ideal da lei diante do capricho despótico, e de maneira que os gregos se ostentaram de ser governados por leis e não por homens (Heródoto); porque as leis são menos apaixonadas que os homens (Aristóteles). A democracia ateniense representou, de certo modo, o modelo do Estado de Direito frente ao Estado-poder.

De acordo com Verdú, embora os direitos individuais fossem desconhecidos dos gregos, os defensores do Estado liberal de direito buscavam traçar paralelos com a herança grega e, pelo menos, assinalar antecedentes clássicos ao primado da lei sobre o poder.[2]

Verifica-se assim, que o tão proclamado Estado de Direito tem sua origem em uma concepção liberal. Pensava-se, deste modo, em “Estado Liberal de Direito”.

No que pese as diversas concepções e a amplitude genérica sobre o “Estado de Direito” que como visto remonta a ideia, a Platão e Aristóteles, do “governo das leis” contraposto ao “governo dos homens”, aqui se adota a simples, mas relevante, concepção de Estado de Direito como Estado Constitucional.

No Mercador de Veneza, William Shakespeare alerta-nos que “o demônio pode citar as Escrituras para justificar seus fins”. Nada mais correto, assevera Pablo Bezerra Luciano, para quem: “Não há nenhuma norma mais elevada ou ideia democrática que não possa ser usada com alguma técnica mais ou menos sofisticada pelo autoritarismo”. [3]

Não é de hoje que os atores da Operação “Lava Jato” vêm - em nome da perversa e maquiavélica lógica de que “os fins justificam os meios” - atropelando direitos e garantais fundamentais. Quando os condutores da “Lava Jato” defendem e insistem no emprego de “métodos especiais de investigações”, “medidas judiciais fortes” e “remédios excepcionais” para combater o crime, especialmente a corrupção, como fez o ex-juiz Federal e agora ministro da Justiça Sergio Moro, operam, sem qualquer parcimônia, defendendo métodos empregados pelo “Estado de Exceção”, como o aniquilamento do “inimigo”, elegido pelo soberano nos moldes de Carl Schmitt e Günther Jakobs.

Ainda na nefanda lógica de que “os fins justificam os meios”, os diálogos trazidos à tona pelo The Intercept demonstram que meios inescrupulosos foram utilizados para se chegar a determinados fins (lícitos ou ilícitos), não importa. Juiz e membros do Ministério Público Federal levaram a lógica maquiavélica as últimas consequências – com meios nada honrosos - em completa afronta ao devido processo legal e ao Estado de direito.

Por tudo, é necessário que a sociedade compreenda, definitivamente, que o Estado Democrático de Direito se fundamenta no governo das leis no qual os fins jamais podem justificar os meios.

 

 

Notas e Referências

[1] VERDÚ, Pablo Lucas. La lucha por el estado de derecho. Espanha: Publicaciones del Real Colegio de España Bolnia, 1975, p. 14-15.

[2] VERDÚ, ob. cit. p. 15.

[3] http://www.conjur.com.br/2013-jun-11/pablo-bezerra-dever-constitucional-obriga-juiz-fundamentar-decisoes?utm_source=feedburner&utm_medium=feed&utm_campaign=Feed%3A+ConsultorJurdico+%28Consultor+Jur%C3%ADdico%29

 

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